Acórdão nº 01904/05.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão01904/05.0BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

"AA", interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRS do ano de 2001, por entender que ocorre erro de facto e de direito.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
A- Ocorre erro de apreciação da prova, quando, em face das declarações prestadas pela testemunha ouvida nos autos, e cujo depoimento acima se reproduziu, e aqui se renova, o tribunal não deu como provado que:
. Que o Impugnante, nas deslocações para França se deslocava em viatura própria e não em viatura da empresa, pagando do seu bolso as despesas;
- Que era o trabalhador quem pagava as despesas de alojamento e alimentação, que lhe não era fornecida pela empresa, ou seja, recebia compensação de tais despesas;
B- Como decorre do Ac. do TCAS Ac. do TCAS de 11 de Março de 2021, relatado por Tânia Meireles da Cunha no Proc. n.º: 98/09.6BESNT, cujo sumário se reproduz:
I. Em regra, os valores pagos a título de ajudas de custo, dado o caráter compensatório que lhes é reconhecido (compensação por despesas que o trabalhador é obrigado a suportar, designadamente por motivo de deslocações), não se integram no conceito de remuneração, para efeitos de IRS.
II. Gozando as declarações de rendimentos apresentadas pelos contribuintes de uma presunção de veracidade, cabe à AT de forma sustentada afastar tal presunção, o que não ocorre quando a fundamentação do ato se consubstancia em afirmações genéricas e não especificadas.
III. A circunstância de terem sido pagos valores, a título de ajudas de custo, ao longo de todo o ano e com valores em parte aproximados não é suficiente para a caraterização de tais valores como remuneração para efeitos de IRS.
IV. A salvaguarda do interesse público, ao nível tributário, não se reduz ao interesse na mera arrecadação de receitas, configurando-se, sim, como salvaguarda desse interesse, uma atuação em respeito pelos princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade e em respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários.
C- Do conjunto de factos dados como provados, que no seu essencial, são conclusões encerradas nos relatórios da AT em sede de inspecção e realizada com a entidade patronal que não directamente com o trabalhador, não se encerra nos mesmos qualquer elemento de prova concreta, nomeadamente a existência dos chamados factos- indices, os quais aliás se encontram contrariados pelo depoimento recolhido junto da testemunha arrolada nos autos e ouvida em audiência de julgamento;
D- A douta decisão em recurso não atentou no regime legal da prestação de trabalho temporário, e bem assim, na relação laboral decorrente da prestação de trabalho à empresa de trabalho temporário e posterior locação dos serviços do trabalhador ao cliente final, confundindo a relação de trabalho com a relação de contrato de trabalho realizado com empresa em que o posto de trabalho fosse o no estrangeiro; Por outro lado, e ao contrário do referido na decisão, não era ao trabalhador que cabia fazer a prova que o seu local de trabalho era em Portugal, porquanto tal já decorre da relação de emprego entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador;
E- A douta sentença viola o disposto no Art.º 74º da LGT, ao operar a inversão do ónus da prova, e dispensando a AT de cumprir com o ónus da prova que lhe cabia, devendo por tal facto ser revogada;
Termos em que ao presente recurso deve ser concedido provimento, revogando-se a decisão recorrida e bem assim, sendo proferido acórdão que a final venha a julgar procedente a presente impugnação, como é de
JUSTIÇA

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser recusado em função do valor da causa ser inferior à alçada.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se as quantias recebidas pelo Impugnante correspondiam ou não a ajudas de custo.

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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
III. FUNDAMENTAÇÃO
1. FACTOS PROVADOS
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se ainda provados os seguintes factos:
A) Entre o Impugnante, na qualidade de trabalhador, e a sociedade “T, Lda.” foi celebrado, ao abrigo do D.L. n.º 358/89, de 17/10, um “contrato de trabalho temporário”, datado de 02/05/2001, através do qual o trabalhador se obrigou a prestar trabalho à utilizadora "Y”, sob as suas ordens e orientações, desempenhando as funções de serralheiro montador, tendo ficado consignado no referido contrato que este tem como fundamento a necessidade de serralheiros montadores para a obra “W/Aeroporto de Nice”, em França, sendo este o local de trabalho – cfr. fls. 257 do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
B) Entre o Impugnante, na qualidade de trabalhador, e a sociedade “T, Lda.” foi celebrado, ao abrigo do D.L. n.º 358/89, de 17/10, um “contrato de trabalho temporário”, datado de 03/09/2001, através do qual o trabalhador se obrigou a prestar trabalho à utilizadora "Y”, sob as suas ordens e orientações, desempenhando as funções de serralheiro montador, tendo ficado consignado no referido contrato que este tinha como fundamento a necessidade de serralheiros montadores para a obra “W/Aeroporto de Nice”, em França, sendo este o local de trabalho – cfr. fls. 257 verso do suporte físico do processo, cujo teor se dá por reproduzido.
C) O Impugnante foi alvo de um procedimento interno de inspeção, realizado pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças ... a coberto da ordem de serviço n.º ...71, da qual resultou uma correção de € 16 218,06 ao rendimento declarado em sede de IRS (categoria A) no ano de 2001, correção essa que apresenta a seguinte fundamentação (cfr. relatório de inspeção tributária inserto a fls. 28 a 32 do processo administrativo [PA] apenso aos autos):
“(...)
No decurso da acção inspectiva externa realizada à sociedade “T, Lda.” – NIF ..., com sede na Rua ..., ..., ..., foi verificado, cf. informação dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças ... que acompanha o Ofício nº ...85, de 25/03/03, o seguinte:
1 – A sociedade analisada desenvolve uma actividade que consiste na contratação de pessoal em regime de trabalho temporário, que em simultâneo é cedido a determinado cliente e sob a autoridade deste irá exercer funções em local pré-determinado. Estas condições são previamente definidas no contrato de trabalho temporário, comprovando-se através dos contratos estabelecidos.
2 – No exercício de 2001, a empresa efectuou pagamentos a título de ajudas de custo, ao pessoal contratado em regime de trabalho temporário, no qual se inclui o contribuinte alvo desta acção inspectiva, processadas e suportadas com base nos recibos de vencimento dos respectivos funcionários.
3 – O princípio em que assenta a atribuição de efectivas “Ajudas de Custo” é o da compensação dos encargos dos trabalhadores, com deslocação do “Domicílio Profissional” para um outro local.
4 – Por “Domicílio Profissional” temos ... “a área delimitada pela periferia da localidade onde o funcionário ou agente tomou posse no cargo, se aí ficou a prestar serviço ou daquele onde exercer as respectivas funções, se for colocado noutro local” ... cf. dispõe o artº 2º do Dec. Lei nº 519-M/79, de 28/12, com a redacção dada pelo Dec. Lei nº 248/94, de 07/10.
5 – Os pagamentos efectuados pela sociedade “T, Lda.”, designados de “Ajudas de Custo” pagas a pessoal de trabalho temporário, no qual se inclui o contribuinte aqui em análise, destinam-se a compensar a deslocação do local de residência para o local de trabalho, considerado “Domicílio Profissional”, cf. está definido na segunda parte do artº 2º do D.L. nº 519-M/79, de 28/12 com a redacção dada pelo Dec. Lei nº 248/94, de 07/10, e, consequentemente não se enquadram no conceito de “Ajudas de Custo” (deslocação do domicílio profissional para um outro local) nem verificam os pressupostos impostos pela legislação que regula tais atribuições, como se conjugou.
6 – Acresce ainda, o facto de a sociedade “T, Lda.” contabilizar diversos custos relativos a despesas com “pessoal temporário”, no qual se inclui o contribuinte alvo desta acção, custos que dizem respeito a “deslocações e estadas”, “transportes”, “alimentação”, “portagens”, etc. Verifica-se portanto, que as referidas despesas, são suportadas pela empresa “T, Lda.” não pelos trabalhadores (entre os quais se inclui o contribuinte alvo desta acção inspectiva), concluindo-se, face ao exposto, que o pagamento efectuado a título de “ajudas de custo” mais não é que um efectivo complemento das remunerações, consubstanciando um rendimento de trabalho dependente (Categoria A/IRS).
Resulta do exposto, que o contribuinte recebeu da sociedade “T, Lda.” (...) o valor de 16 218,06 €, a título de “ajudas de custo”, não os declarando à administração tributária na DR Mod. 3 de IRS do ano de 2001, para efeitos de cálculo dos seus rendimentos sujeitos a IRS, quando, tal como se expôs nos pontos precedentes, tais valores consubstanciam rendimentos do trabalho dependente (Cat. A/IRS), como dispõe a segunda parte da alínea d) do nº 3 do artº 2º do Código do IRS.
(.....

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