Acórdão nº 01869/08.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-04-27

Ano2023
Número Acordão01869/08.6BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – A Representação da Fazenda Pública – RFP (Recorrente) veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual se julgou procedente a impugnação deduzida pela "X, S.A." (Recorrida), intentada contra a liquidação de IRC do exercício de 2009.

No presente recurso, a Apelante (RFP) formula as seguintes conclusões:
a) O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo douto Tribunal a quo, que julgou totalmente procedente a impugnação interposta, determinando a anulação da liquidação impugnada, no que respeita ao reporte dos prejuízos fiscais apurados.
b) A douta sentença recorrida, após citação da legislação (artigos 46.º e 60.º, ambos do CIRC), considerou que “tendo sido julgada parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada pela Impugnante quanto à liquidação adicional de IRC do exercício de 1993, (…), o pressuposto da liquidação adicional ora impugnada (…) deixou parcialmente de existir, por ser de atender aos prejuízos fiscais dos exercícios de 1994 (…), de 1995 (…) e 1996 (…), o que determina a anulação da liquidação (…), concretamente no que respeita ao reporte dos prejuízos fiscais apurados nos identificados exercícios”.
c) Fazendo apelo aos doutos Acórdãos do TCAS, proferidos, em 04/10/2011 (proc. 03321.09), e, em 16/12/2020 (proc. 9723/16.1BCLSB), concluiu a douta sentença que “sem necessidade de outros considerandos, procede, na íntegra, a presente impugnação judicial”.
d) A Meritíssima juíza a quo proferiu decisão com base na mera citação da legislação e de dois Acórdãos, sem que dali extraísse qualquer ilação, sem analisar os elementos tidos, nos autos, nem a matéria em discussão, não especificando as razões que a levaram a fundamentar-se, exclusivamente naqueles arestos, desprezando todos os demais elementos juntos aos autos e não fazendo qualquer análise crítica das provas produzidas, no processo.
e) É certo que o cumprimento do dever de fundamentação das sentenças não exige uma fastidiosa explanação que transforme o processo oral em escrito, devendo deixar claro o porquê da decisão tomada, de forma a permitir a avaliação segura e cabal do processo lógico-mental que serviu de suporte ao respetivo conteúdo.
f) É certo, também, que o princípio da livre apreciação das provas ou da prova livre impõe ao juiz exercer, sobre todas as provas produzidas, a sua atividade crítica e mover-se, na sua apreciação, com inteira liberdade e sem outros limites que não sejam os que lhe são impostos pela sua convicção íntima ou pelo seu próprio juízo, apenas se exigindo que o juiz deixe consignada nos autos, convincentemente, a sua motivação (cf. os artigos 607.º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Civil - CPC).
g) Exige-se, sobretudo, que a sentença esclareça, as razões que levaram a Meritíssima juíza a quo a aderir, na íntegra, aos referidos Acórdãos, não sendo suficiente citá-los, dispensando outras considerações;
h) não basta, também, que indique as normas jurídicas correspondentes, devendo interpretá-las e aplicá-las, concluindo pela decisão final, o que, in casu, não aconteceu.
i) A transparência das decisões judiciais, o cumprimento do dever de fundamentação de todas as decisões que afetem os interessados e o dever de obediência à lei (cf. o artigo 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC) implicam a necessidade de uma racionalização suficiente do processo de formação e explanação da sua convicção.
j) Não especificou a douta sentença, os fundamentos de facto e de direito que justificam a sua decisão, não tendo respeitado o disposto no artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, e nos artigos 154.º e 659.º, n.º 2, do CPC, bem como no artigo 123.º, n.º 2, do CPPT.
k) Com total ausência de fundamentação, não pode a Fazenda Pública sindicar tal decisão, por falta de um dos pressupostos necessários, não sendo possível aferir se, no caso em apreço, foi bem ou mal aplicado o direito correspondente, entendendo-se que se está perante uma nulidade da sentença, por falta de fundamentação (cf. artigos 125.º, do CPPT, e 615.º, n.º 1, al. b), do CPC).
l) Por outro lado, no que respeita à factualidade considerada como provada e sem colocar em causa a mesma, a sentença em análise regista, nos pontos 1 a 12, os factos tidos por pertinentes pelo douto Tribunal a quo.
m) Entende a Fazenda Pública, com o devido respeito, que não foram devidamente valorados, nem levados ao probatório, factos que resultam dos autos, mais concretamente, as informações prestadas em cumprimento dos despachos proferidos pelo Tribunal a quo, em 11/02/2020, 10/02/2021 e 12/04/2021, das quais consta, designadamente, que “a liquidação de IRC, referente ao período de tributação de 1999, vai ser anulada parcialmente”.
n) Esta informação refere-se à concretização do Acórdão proferido, pelo TCAS, em 31/10/2019, proc. 273/04, relativo ao recurso apresentado pela Fazenda Pública, no âmbito da impugnação judicial, com o n.º 8675/15.0BCLSB, atinente à liquidação adicional de IRC, do exercício de 1993, causa prejudicial dos presentes autos.
o) Tal omissão é demonstrativa de que a sentença, sob recurso, incorre em erro de julgamento de facto e de direito, porquanto não foi corretamente valorada a prova documental produzida, nos autos, sendo que, entende a Fazenda Pública, que, devidamente valorados tais factos, em conjunto com os demais elementos tidos, nos autos, seria outra a decisão tomada a final pelo Tribunal a quo, como constataremos.
p) Assim, para que sejam devidamente valorados, entende a Fazenda Pública, que, ao acervo probatório, deverão ser acrescentados os referidos factos, resultantes dos documentos tidos, nos autos, o que desde já se requer, aditando os pontos 13 e 14, nos seguintes termos:
“(…) 13. Em 12/02/2020, foi a FP notificada para, «atenta a procedência parcial do processo de Impugnação n.º 00273/04 (já transitada) e considerando que a liquidação, ora, impugnada (liquidação adicional de IRC de 1999 na parte referente à correcção respeitante à dedução do saldo de prejuízos reportáveis a anos anteriores) está directamente relacionada com a desconsideração dos prejuízos fiscais apurados pelo Grupo no exercício de 1993 (causa prejudicial), (…) informar os autos se a AT já deu cumprimento ao disposto no artigo 100.º da LGT, i.é., se a liquidação de IRC de 1999 na parte ora impugnada, se mantém ou se, pelo contrário, já se encontra anulada» - cfr. fls. 339 e 340 do processo SITAF;
14. Na sequência da notificação efetuada e constante do ponto 13 supra, veio a FP informar que «a liquidação de IRC, referente ao período de tributação de 1999, vai ser anulada parcialmente», bem como que, «os prejuízos de 1993 só eram suscetíveis de reporte nos seguintes cinco anos subsequentes, pelo que a anulação da liquidação de 1993 não vai ter qualquer influência na liquidação de 1999» e ainda que, «[n]ão obstante, os prejuízos fiscais de 1994 já são reportáveis para o ano de 1999, pelo que a liquidação vai ser anulada» - cfr. fls. 399 do processo SITAF”.
q) Ao serem dados como provados tais factos, como deveriam ter sido, apenas se pode concluir que a ATA já procedeu à concretização do Acórdão proferido pelo TCAS, em 31/10/2019, proc. 273/04, estando apenas pendente, à data da informação, da anulação parcial da liquidação ora controvertida, redundando a concretização daquela decisão na anulação da liquidação relativa ao exercício de 1993, com o correspondente reembolso da quantia paga indevidamente.
r) Constata-se que os prejuízos fiscais gerados, em 1993, apenas são dedutíveis pelo prazo de 5 anos, não podendo ser considerados no exercício de 1999, mas o mesmo não acontece quanto aos prejuízos gerados em 1994, os quais devem ser considerados no exercício de 1999 (cf. o artigo 47.º, n.º 2, do CIRC), o que resulta numa anulação parcial da liquidação controvertida, revertendo a favor da impugnante um lançamento a crédito e consequente reembolso, ambos de igual valor (€ 183.166,35).
s) Face ao supra exposto, considera a Fazenda Pública que, ao decidir como decidiu, a douta sentença fez uma incorreta apreciação da prova constante dos autos, não se extraindo de qualquer elemento probatório destes autos, fundamentos que permitam válida e logicamente julgar “procedente a presente impugnação, com a consequente anulação da liquidação impugnada, no que respeita ao reporte dos prejuízos fiscais apurados”.
t) pelas razões acabadas de explanar, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida decidiu, à revelia de factos que resultam do processo, nos termos expostos, incorrendo em erro de julgamento de facto e de direito, devendo ser revogada, com as legais consequências.
u) Acresce que, entendendo o Tribunal a quo, como entendeu no decurso do processo, ser relevante que a Fazenda Pública prestasse informação sobre se a ATA já havia dado cumprimento ao disposto no artigo 100.º, da LGT, ou seja, se a liquidação de IRC de 1999, na parte ora impugnada, se mantinha ou se, pelo contrário, já se encontrava anulada, e,
v) tendo a Fazenda Pública informado que tal liquidação iria ser anulada, face ao reporte dos prejuízos do exercício de 1994, deveria o Tribunal a quo procurar saber se tal anulação e correspondente reembolso já haviam sido concretizados - o que não fez -, porquanto tal informação poderia determinar uma distinta decisão.
w) A atividade instrutória pertinente, para apurar a veracidade dos factos, compete também ao Tribunal, que deve realizar ou ordenar todas as diligências que considerar úteis ao apuramento da verdade, atendendo a que o processo judicial tributário é regulado pelo princípio do inquisitório (cf. o artigo 114.º, do CPPT).
x) Nesta conformidade, entende a Fazenda Pública, com o devido respeito por melhor opinião, enfermar a...

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