Acórdão nº 01705/05.5BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 02-06-2022

Data de Julgamento02 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão01705/05.5BEVIS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Viseu)
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


AA E BB interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA dos anos de 2001, 2002 e 2003, por entenderem que as liquidações devem ser anuladas.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
A. Ao contrário do que entende a sentença recorrida, as liquidações adicionais de IRS dos exercícios de 2001 a 2003 devem ser anuladas, por falta de fundamentação dos pressupostos do recurso a métodos indiretos.
B. Não decorre do relatório a impossibilidade de determinação direta e exata da matéria tributável e, por conseguinte, a necessidade de recorrer a tributação por métodos indiciários.
C. Não foram carreados indícios suficientemente sólidos de que os proveitos declarados não conferem com a realidade fiscal dos ora recorrentes.
D. A única coisa feita foi pôr em causa a escrita dos ora recorrentes e proceder às correções aqui questionadas, sem atender ao que deve ser tributado: o lucro real.
E. Resulta ser ilegal o recurso à avaliação indireta da matéria tributável de IRS e IVA dos anos de 2001 a 2003 e os critérios e fatores utilizados na avaliação indireta, porque excluídos, pelo legislador da LGT, dos taxativamente permitidos pelo artigo 90º daquela lei-cúpula do ordenamento tributário, e porque falhos, também por isso, da objetividade técnico-científica exigida, conduziram à errónea quantificação da matéria tributável dos dois impostos nos mesmos exercícios.
F. Ora, demonstrado fica que a sentença errou, como errou a AT na feitura dos números e valores, errando a AT, a sentença foi ao encalço da pretensão da mesma e validou os critérios, que afinal não existem.
G. Com efeito, não pode a sentença recorrida validar uma presunção “... registos da contabilidade e valores declarados pela financeira...”. Errou a sentença ao admitir o margem de lucro bruta, quando tem como suporte valores corrigidos e valores indicados por terceiros.
H. A sentença recorrida, não atentou aos factos e demonstrações que comprovam que os critérios utilizados foram desadequados e inadmissíveis, pelo que se verifica erro ou excesso na quantificação da matéria tributável.
I. Utilizou critérios desconformes com a verdade e objetividade, princípios impostos a todo o procedimento administrativo, especialmente ao procedimento tributário.
J. Apenas tomou por base os elementos recolhidos junto da financeira, sem confrontar o recorrente com os mesmos e tomou por base critérios que a própria lei não comporta. Ao seguir a norma já revogada do artigo 52º do CIRS.
K. Existem, nos autos, elementos de prova suficientes para reconhecer a ilegalidade dos critérios utilizados na quantificação da matéria coletável. Ao contrário de tais elementos, os cálculos e critérios seguidos pela AT e validades pela sentença recorrida, não têm nenhuma base científica e/ou real, pois para presumir resultado e lucros, também é necessário presumir gastos/custos razoáveis e reais.
L. Foi o que não sucedeu com o procedimento tribuário e com a sentença recorrida; donde resulta errónea quantificação da matéria coletável.
M. Além da violação dos princípios enunciados (necessária fundamentação, verdade, objetividade e respeito pelo contraditório em relação ao recorrente, pelos critérios eu elementos utlizados), foi particularmente desrespeitado na avaliação indireta, o princípio da Justiça, justiça no seu sentido material, como decorre, quer do artigo 266.º da Constituição, quer do artigo 55.º da LGT.
N. E justiça essa que impõe “que a administração tributária se norteie por critérios de isenção na averiguação das situações fácticas, realizando todas as diligências que se afigurem como necessárias para averiguar a verdade material, independentemente de os factos a averiguar serem contrários aos interesses patrimoniais que à administração tributária cabe defender” (Obra citada – pg.164),
O. Sendo tal procedimento imposto pelo artigo 58.º da LGT, a cuja elaboração presidiu sem dúvida a exigência constitucional de a atuação da administração tributária ter na justiça material unia das suas referências fundamentais.
P. E a avaliação indireta não terá respeitado a justiça material, ao fixar, para os exercícios de 2001 a 2003, o rendimento líquido para efeitos de IRS, correspondendo o valor fixado, exatamente, ao produto da aplicação da margem apurada com base em valores que nada têm a ver com a atividade passível de tributação, correções técnicas no que à venda respeita, presunção no que aos custos toca.
Q. A sentença recorrida viola as normas constantes dos artigos 87.º e 90º da Lei Geral Tributária (LGT) e 39.º do Código do IRS.
Nestes termos e mais de direito, pelos fundamentos expostos, DEVERÁ A SENTENÇA RECORRIDA SER REVOGADA e substituída em conformidade com os termos e com os fundamentos acima enunciados, com as legais consequências, ou seja anulação das liquidações impugnadas.
E assim, V. Excias farão
JUSTIÇA

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente, por considerar que a AT demonstra que a matéria coletável apenas podia ser apurada através de avaliação indireta, pois que a contabilidade dos Impugnantes não oferecia credibilidade, omitindo vendas e que os elementos em que a AT se baseou para calcular a matéria tributável, é percetível e contém os elementos de facto e de direito utilizados, não havendo excesso de quantificação.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber: (1) se estão verificados os pressupostos legais para aplicação da avaliação indireta; (2) se os critérios utilizados na avaliação indireta foram adequados; e (3) se o recurso aos métodos indiretos está fundamentado.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
III. Fundamentação de facto
Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos consideram-se provados os seguintes factos:
A) A impugnante foi objeto de uma ação de inspeção levada a cabo pelos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Viseu, com base na ordem de serviço n.º ...14, a qual incidiu sobre os exercícios económicos de 2001 a 2003, em sede de IRS e IVA – cfr. fls. 4 e ss. do processo de reclamação apenso, que, tal como as demais que se seguem se dá por integralmente reproduzido.
B) No âmbito do referido procedimento inspetivo, em 31/05/2005, foi elaborado o relatório de inspeção tributária constante de fls. 4 e ss. do processo de reclamação graciosa apenso, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, destacando-se o seguinte:
[...]
I DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO
I.1) DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO
IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTOS DAS PESSOAS SINGULARES – RENDIMENTOS EMPRESARIAIS
O s.p. omitiu vendas de viaturas, nos exercícios de 2001, 2002 e 2003, provocando correcções de natureza meramente aritmético, aumentando o valor declarado para os proveitos.
Para a realização daqueles proveitos o s.p. teve, naturalmente, custos nomeadamente com as compras das mesmas viaturas, pelo que foram presumidas.
Verificou-se ainda a existência de uma viatura no inventário final do exercício de 2001 que havia sido vendida naquele ano, pelo que as existências finais foram corrigidas.
Em consequência das correcções descritas, foram efectuadas correcções positivas aos resultados da categoria B -rendimentos empresariais, nos exercícios de 2001, 2002 e 2003, nos seguintes montantes:
IRS 2001 2002 2003
Correcção às Vendes – técnicas 1) 287.307,61 € 222.743,72 € 197.675,00
Correcção às compras – presunções 2) 193.187,27 € 165.388,78 € 159.023,10
Correcções totais 3) = 1) - 2) € 88.134,77 € 57.354.94 € 38.651.90
Correcção o favor do s.p – existências 4) € 5.985,57 €0,00 €0,00
Acréscimo ao resultado 5) = 3) - 4) € 88.134,77 € 57.354,94 € 38.651 9C
IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO - CORRECCÕES ARITMÉTICAS
OMISSÃO DE VIATURAS REGIME MARGEM TOTAL GLOBAL
PERÍODO BASE IVA EM FALTA BASE IVA EM FALTA BASE IVA EM FALTA
0103T € 56.862,95 € 9.666,70 € 3.328,47 € 565,84 € 60.191,42 € 10.232,54
0106T € 72.325,71 € 12.295,37 € 3.812,41 € 648,11 € 76.138,12 € 12.943,48
0109T € 12.469,97 € 2.119,89 € 2.266,47 € 385,30 € 14.736,44 € 2.505,19
0112T € 145.648,98 € 24.760,33 €0,00 €0,00 € 145.648,98 € 24 760,33
2001 € 287.307,61 € 48.842,29 € 9.407,35 € 1.599,25 € 296.714,96 € 50.441,54
OMISSÃO DE VIATURAS REGIME MARGEM TOTAL GLOBAL
PERÍODO BASE IVA EM FALTA BASE IVA EM FALTA BASE IVA EM FALTA
0203T € 106 343,72 € 18 078,43 € 8 002,47 € 1360,42 € 114.346,19 € 19438,85
0206T € 24 900,00 € 4.559,00 € 10.603,18 € 1.958,55 € 35.503,18 € 6.517,55
0209T € 54.500,00 € 10355,00 € 4 466,84 € 848,70 € 58.966,84 € 11.203,70
0212T € 37.000,00 € 7.030,00 € 3.901,37 € 741,26 € 40.901,37 € 7.771,26
2002 € 222.743,72 € 40.022.43 € 26 973,86 € 4.908,93 € 249.717,58 € 44.931,36
OMISSÃO DE VIATURAS REGIME MARGEM TOTAL GLOBAL
PERÍODO BASE IVA EM FALTA BASE PERÍODO BASE IVA EM FALTA
0303T € 11.650,00 € 2.213,50 € 4.784,42 € 909,04 € 16.434 ,42 € 3.122 ,54
0306T € 36.750,00 € 6.982,50 € 3.245,11 € 616,57 € 39 995,11 € 7 599,07
0309T € 8475,00 € 1.610,25 €0,00 €0,00 € 8.475,00 € 1.610,25
0312T € 140.800,00 € 26.752,00 €0,00 €0,00 € 140.800,00 € 26.752,00
2003 € 197.675,00 €37 558,25 € 8.029,53 € 1.525,61 € 205.704,53 € 39.083,86
Em consequência dos irregularidades descritos, os...

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