Acórdão nº 01685/17.4BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2023-11-08

Ano2023
Número Acordão01685/17.4BESNT
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)


ACÓRDÃO

1. RELATÓRIO

1.1. AA, inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 31 de Outubro de 2022, que julgou improcedente a Impugnação Judicial que deduziu na sequência da formação de indeferimento tácito do pedido formulado no recurso hierárquico interposto do indeferimento da Reclamação Graciosa n.º ...85, relativa à liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) do ano de 2015, no valor de 41.661,31EUR, interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo.

1.2. Nas alegações de recurso mostram-se formuladas as seguintes conclusões:

«a) O Tribunal a quo andou mal ao ter declarado improcedente a impugnação judicial.

b) Para a situação em apreço, existem dois momentos a ter em consideração para efeitos de liquidação do imposto em sede de IRS relativamente às mais-valias obtidas pela venda de um imóvel.

c) O primeiro momento, ocorrido em 2002, no qual a Recorrente adquiriu a nua-propriedade do imóvel supra referido, com um valor patrimonial tributário de € 2.812,82 (dois mil, oitocentos e doze euros e oitenta e dois cêntimos).

d) O segundo momento, ocorrido em 2014, com a extinção do usufruto, no qual o imóvel tinha o valor patrimonial tributário de € 64.850,00 (sessenta e quatro mil euros e oitocentos e cinquenta euros).

e) Por conseguinte, os valores que deverão ser tidos em consideração para efeito de contabilização das mais-valias em sede de IRS deverão respeitar de forma integral as regras constantes dos artigos 13.º, n.º 4 e n.º 6 do CIS, no artigo 13.º, al a) do CIMT e o artigo 45.º, n.º 1, al. b) do CIRS.

f) No caso em concreto, uma eventual liquidação de imposto de selo relativamente a qualquer dos momentos (receção do legado e extinção do usufruto) seria encontrada através da dedução da percentagem correspondente ao valor da patrimonial tributário, ou seja:

No primeiro momento, em 2002, o valor seria de € 2.250,25 – ou seja, € 2.812,82 - (€ 2.812,82 X 20%);

No segundo momento, em 2014, o valor seria de € 58.365,00 – ou seja, 64.850,00 – (10% x 64.850,00)

g) Devendo ter sido estes os montantes a considerar para efeitos de determinação de mais-valias sujeitas a IRS relativo ao exercício de 2015, e não os atendidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira e, por inerência os valores confirmados pelo Tribunal a quo.

h) Pelo que deverá ser anulada a liquidação de IRS da Reclamante relativa ao exercício de 2015.

1.3. A Fazenda Pública não contra-alegou.

1.4. A Exma. Procuradora-Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal Administrativo, a quem os autos foram presentes para emissão de parecer, pronunciou-se sentido da improcedência do recurso jurisdicional, destacando-se deste o seguinte:

«Concordando-se integralmente com o decidido, entendemos que no caso concreto se verificam dois momentos distintos de aquisição de direito sobre o imóvel (momento da transmissão da nua propriedade e momento da extinção do usufruto).

Num primeiro momento, a ora Recorrente adquiriu a nua propriedade do imóvel, inexistindo dissidência quanto a esta parte - cujo valor tributável seria de € 2.250,25 – ou seja, € 2.812,82 - (€ 2.812,82 X 20%), por força do disposto no art. 13º, al. a) do CIMT, que equivale à antiga regra 4ª do art. 31º do Código do Imposto Municipal de SISA e do Imposto sobre as Sucessões e Doações.

Num segundo momento, com a extinção do usufruto, a ora Recorrente passou a ter a propriedade plena do imóvel, momento em que se verifica a discordância da Recorrente quanto à forma do cálculo das mais-valias, para efeitos de liquidação do IRS.

A AT fez apenas o cálculo do valor do usufruto, não deduzindo este montante ao VPT, por conjugação do art. 13º, al. b) do CIMT e do art. 13.º, n.º 6, do CIS – ou seja, € 64.850,00 X 10% = € 6.485,00.

Deste modo, como o realça a douta sentença, “Ao indicar que o imposto deve incidir sobre a diferença entre o valor patrimonial tributário do prédio constante da matriz e o valor da sua propriedade considerado na respectiva liquidação, tal consubstancia, no caso concreto, à diferença entre o VPT fixado em 64.850,00EUR, e o valor da propriedade da impugnante à data da liquidação, que corresponde ao VPT deduzido do usufruto (64.850,00EUR-6.285,00EUR), ou seja, 6.285,00EUR.”

Aliás, o Ministério Público emitiu parecer em 1ª instância, no sentido da improcedência da impugnação, cujo teor acompanhamos e damos por integralmente reproduzido, que conclui “Assim, a diferença entre o valor patrimonial tributário do prédio constante da matriz (€64.850,00) e o valor da nua propriedade (€ 58.365,00) é de € 6.485,00, sendo este o valor que se considera como valor de aquisição, para efeitos do disposto no art.º 45.º n.º 1 do CIRS.”

Pelo exposto, entendemos que a quantificação dos montantes relativos às mais-valias resultantes da venda do imóvel foram devidamente calculados e que, por isso, a douta sentença não padece do vício de erro de julgamento na aplicação do direito que lhe é imputado».

1.5. Colhidos os vistos dos Excelentíssimos Juízes Conselheiros Adjuntos, submetem-se agora os autos à Conferência para julgamento.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva oficiosamente conhecer, o âmbito de intervenção do tribunal de recurso é determinado pelo teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte da decisão de mérito proferida quanto a questões por si suscitadas, desta forma impedindo que essas questões voltem a ser reapreciadas pelo Tribunal de recurso (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC). Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso directo para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida nos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

2.2. No caso concreto, face ao que ficou dito, a questão a decidir é a seguinte: devia o Tribunal a quo, face ao regime consagrado, conjugadamente, nos artigos 45.º, n.º 1 do Código de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), 13.º do Código de Imposto de Selo (CIS) e 13.º do Código de Imposto sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), ter julgado ilegal a liquidação impugnada?

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra declarou como provados e com relevo para a discussão da causa os seguintes factos:

A. Por testamento outorgado em 20-11-2001, no 1.º Cartório Notarial de Lisboa, BB instituiu suas herdeiras, a sua irmã, CC, a quem legou o usufruto da fracção autónoma designada pela ..., correspondente ao ... andar do...

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