Acórdão nº 01462/10.3BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08-11-2023

Data de Julgamento08 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão01462/10.3BELRS
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO

O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 26-03-2019, que julgou procedente a pretensão deduzida por “A... 6 - …, S.A.” no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com a decisão de indeferimento tácito do recurso hierárquico interposto do despacho da Direcção de Finanças de Lisboa, de 30-11-2009, notificado pelo ofício n.º ...98, que indeferiu parcialmente a reclamação graciosa apresentada sob o processo n.º ...96, que inviabilizou a dedução ao lucro tributável do valor da majoração de custos consignada no benefício fiscal atribuído pelo artigo 17.º, actual 19.º, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) no âmbito da autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) respeitante ao exercício de 2006.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

I - Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a impugnação judicial, intentada por A... 6 - …, S.A., já devidamente identificado nos autos e que, em consequência, ordenou a anulação do despacho de indeferimento parcial da Reclamação Graciosa n.º ...96, o qual determinou a não aceitação de benefício fiscal no montante de € 25.312,89, inviabilizando assim a dedução ao lucro tributável deste valor a título de majoração de custos consignada no artigo 17.º, atual 19.º, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) e que diz respeito à autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) respeitante ao exercício de 2006.

II - A Fazenda Pública não se conforma com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa ao considerar demonstrada a permanência dos vínculos contratuais, para além dos contratos a termo certo celebrados e a consequente existência de contratos de trabalho sem termo, porquanto a mesma não encerra um correto entendimento da legislação pertinente, na medida em que dispunha o n.º 1 do artigo 17º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na redacção anterior ao Decreto-lei n.º 108/2008, de 26 de junho, que “[P]ara efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%”.

III - Do teor literal do referido preceito legal resulta que, para aceder ao benefício fiscal em questão, a admissão do trabalhador na empresa deve ser realizada por contrato de trabalho sem termo. Importa assim que a constituição do vínculo laboral se dê naquela qualidade, gerando assim a expectativa, ab initio, de criação de um efetivo posto de trabalho. Da letra da lei emana a intenção legislativa de favorecer vínculos laborais estáveis favorecendo as empresas que optem pela criação de vagas em seus quadros através da atribuição de um benefício fiscal.

IV - O artº 17º do EBF prevê um incentivo fiscal à criação de emprego para jovens sob condição de que com ele se esteja a criar novos postos de trabalho. O espírito da lei é, pois, estimular a criação de postos de trabalho que resultem de projetos geradores de novos empregos.

V - O preceito legal em causa deve ter subjacente uma leitura jurídica à luz do direito ao trabalho, direito este constitucionalmente consagrado no art.º 58º da Constituição da República Portuguesa e que deve ser promovido pelo legislador ordinário, servindo ainda de parâmetro interpretativo ao julgador. A posição vertida na sentença recorrida não tem assim fundamento legal, não sendo admissível que o benefício fiscal previsto no art.º 17º do EBF, na redação anterior ao Decreto-lei n.º 108/2008, de 26 de junho, destinado à promoção da criação de emprego, seja atribuído a empresas que não comprovem a celebração de contratos de trabalho sem termo mas que viriam a beneficiar deste regime através de sucessivas renovações que, ope legis. implicam a conversão legal de um vínculo laboral precário num vínculo laboral estável.

VI - Mal esteve o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, violando o n.º 1 do artigo 17º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na redação anterior ao Decreto-lei n.º 108/2008, de 26 de junho, fazendo uma interpretação errada deste preceito legal e incorrendo em erro de julgamento, motivo pelo qual deve a sentença proferida pelo Tribunal a quo ser revogada, e daqui resultar a improcedência da impugnação apresentada com a consequente manutenção do despacho de indeferimento parcial da Reclamação Graciosa sub judice na ordem jurídica.

TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO RECURSO, DEVE A DECISÃO SER REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA QUE DECLARE A IMPROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.

PORÉM, V. EX.AS, DECIDINDO, FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!”

A Recorrida “A... 6 - …, S.A.” não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em indagar da bondade da decisão recorrida que julgou procedente a impugnação judicial no segmento em que não aceitou o benefício fiscal previsto no artigo 17.º do EBF (redacção vigente à data do facto tributário), no entendimento de que a recorrida não tinha de fazer prova da celebração de contratos de trabalho sem termo à data da admissão dos trabalhadores, uma vez que se mostra feita a prova da existência desse vínculo contratual, através da conversão, nos termos legais, dos contratos de trabalho a termo certo celebrados aquando da admissão ao serviço da recorrida em contratos sem termo.




3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

1. Em 01.08.2004, entre AA, nascida em 29.04.1983 e A... 7 - …, S.A., (…), contribuinte n.º ...90, ora Impugnante, foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo, constando do mesmo, designadamente, o seguinte:

O presente contrato é celebrado por um período de 6...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT