Acórdão nº 014/22.0BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2022-05-26

Ano2022
Número Acordão014/22.0BALSB
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (PLENO DA SECÇÃO DO CT)

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Processo n.º 14/22.0BALSB (Recurso para Uniformização de Jurisprudência)



Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

A Autoridade Tributária e Aduaneira, devidamente identificada nos autos, inconformada com a decisão proferida nos autos de processo arbitral - Proc. nº 237/2021-T - que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral deduzido por A….., B….. e C….., tendo em vista os actos de liquidação do ISV (Imposto Sobre Veículos) resultante da não aplicação da redução prevista no art. 11.º do CISV à componente ambiental, veio interpor Recurso para Uniformização de Jurisprudência ao abrigo do disposto nos artigos 25.º e 26.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) e no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do artigo 25.º, n.º 3 do RJAT, com base em oposição de acórdãos, apontando como acórdão fundamento, o Acórdão deste Supremo Tribunal de 27-02-2019, Proc. nº 022/18.5BALSB, disponível em www.dgsi.pt.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

A) A Autoridade Tributária e Aduaneira vem, nos termos do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável por força do artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para esse Supremo Tribunal da Decisão Arbitral proferida em 29.12.2021, no processo n.º 237/2021-T, por estar em contradição com o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 27.02.2019, no Processo n.º 022/18.5BALSB, que se indica como fundamento, designadamente, no segmento decisório respeitante à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do respetivo pagamento até à data do efectivo reembolso, mais precisamente, o dies a quo a partir do qual devem ser contabilizados os juros indemnizatórios.

B) A Decisão Arbitral recorrida colide frontalmente com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão proferido em 27.02.2019, no processo n.º 022/18.5BALSB, que se indica como fundamento, relativamente ao termo inicial de contagem dos juros indemnizatórios, no caso de revisão oficiosa do ato tributário por iniciativa do contribuinte.

C) O pedido de pronúncia arbitral foi deduzido na sequência dos despachos de indeferimento de 22.03.2021 e 31.03.2021, prolatados após os pedidos de revisão oficiosa, apresentados em 19.01.2021, de seis liquidações de Imposto sobre Veículos, efetuadas pela Alfândega do Freixieiro, que sustentou a tempestividade das pretensões dos Requerentes junto da instância arbitral.

D) A Decisão Arbitral recorrida incorreu em erro de julgamento ao enquadrar o pedido de pagamento de juros indemnizatórios no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, e considerar como termo inicial de contagem dos juros indemnizatórios a data do pagamento indevido do imposto, contrariando a Jurisprudência reiterada do STA, que se cita, por todos, o Acórdão proferido em 23.05.2018, pelo Pleno STA no Processo n.º 01201/17, e que determina quanto ao termo inicial dos juros indemnizatórios de revisão oficiosa do acto tributário por iniciativa do contribuinte, com o entendimento vertido no respectivo Sumário: “O artigo 43º, nº 3, c) da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, aplicável apenas em situações de revisão do ato tributário em que os mesmos são devidos decorrido um ano após o pedido de revisão.”

E) Laborando neste erro, decidiu o Tribunal Arbitral, em contradição total com o Acórdão fundamento, condenar a AT a pagar aos Requerentes arbitrais juros indemnizatórios contados desde a data do pagamento do imposto por aplicação do n.º 1, do artigo 43.º da LGT e do artigo 61.º do CPPT, diversamente do que determina esse normativo legal para as situações, como a dos autos, de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte, em que são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.

F) No Acórdão fundamento estava em causa “a extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art. 43.º n.º 3 al. c) LGT)”, tendo esse douto STA decidido quanto à extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art. 43º, nº 3, al c) da LGT), que “A decisão recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação”, concluindo que “não há lugar a juros indemnizatórios visto o pedido de revisão do acto tributário haver sido decidido em período inferior a um ano contado da apresentação deste pedido de revisão, como resulta do disposto no art.º 43.º, n.º 3, c) da Lei Geral Tributária.”.

G) Demonstrada está, assim, uma evidente contradição entre a Decisão recorrida e o Acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito que se prende com o pagamento de juros indemnizatórios nas situações de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte, que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição do mesmo por nova Decisão que determine a improcedência do pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do n.º 6, do artigo 152.º do CPTA.

H) A infração a que se refere o n.º 2, do artigo 152.º do CPTA, traduz-se num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que a Decisão Arbitral viola o disposto no n.º 3, alínea c), do artigo 43.º da LGT, o qual determina que, nas situações de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte, são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.

I) Ora, os pedidos de revisão oficiosa cujo indeferimento constitui o objeto da ação arbitral foram apresentados no dia 19.01.2021, sendo que, apenas são devidos juros indemnizatórios decorrido um ano após aquela data, de acordo com o prazo estabelecido no n.º 3, alínea c) do artigo 43.º da LGT, sendo que, tendo os mesmos pedidos sido objecto de decisão em 22.03.2021 e 31.03.2021, ao contrário do que decidiu a Decisão arbitral recorrida, não há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios.

J) Como tem sido entendido pela Jurisprudência e Doutrina, o regime estabelecido no artigo 152.º do CPTA, para os recursos para uniformização da jurisprudência, destina-se a obter decisão que fixe a orientação jurisprudencial nos casos em que se verifiquem os seguintes pressupostos: i) existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA ou deste e do TCA ou entre acórdãos do TCA; ii) contraditoriedade decisória “sobre a mesma questão fundamental de direito”; iii) verificação do trânsito em julgado, quer do acórdão recorrido, quer do acórdão fundamento, devendo o recurso se mostrar interposto no prazo de 30 dias contado do trânsito do acórdão recorrido; iv) não conformidade da orientação perfilhada no acórdão impugnado com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA; a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

K) No presente caso, estão preenchidos todos os requisitos de admissibilidade do Recurso, impostos pelo artigo 152.º do CPTA, designadamente os enunciados no Acórdão do Pleno do STA de 21.04.2016, proferido no processo n.º 0698/15, quanto à contradição da mesma questão fundamental de direito, que pressupõe “identidade essencial quanto à matéria litigiosa”, conforme o Acórdão do S.T.J. de 02.02.2017, proferido no proc. 4902/14.9T2SNT.LI.SI-A.

L) Está em causa a aplicação de forma diversa dos mesmos preceitos legais em situações fácticas substancialmente idênticas, não se entendendo estas como total identidade dos factos, mas apenas a sua subsunção às mesmas normas legais, na linha do entendimento de Jorge Lopes de Sousa (CPPT anotado, p. 809), e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no recurso n.º 87156, de 26.04.1995.

M) Decorre, de todo o exposto, que a Decisão recorrida, ao não ter subsumido o caso sub judice à alínea c), do n.º 3 do artigo 43.º da LGT, evidencia manifesta contradição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada pelo STA no Acórdão fundamento, devendo ser substituída por nova decisão que julgue improcedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser admitido por se mostrar verificada a contradição entre a Decisão Arbitral proferida no Proc. n.º 237/2021-T e o Acórdão fundamento, proferido pelo STA no Proc. n.º 022/18.5BALSB, de 27.02.2019, devendo, em consequência, o mesmo ser julgado procedente e, nos termos e com os fundamentos acima indicados, ser revogada a Decisão Arbitral no segmento decisório sob recurso, e substituído por decisão consentânea com o quadro legal vigente, de acordo com o qual não existe direito a juros indemnizatórios.

O recurso foi admitido por despacho de 03-02-2022.

Foi cumprido o disposto no artigo 25º nº 5 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária.

Os Recorridos A….., B….. e C…. não apresentaram contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso e em consequência, revogar-se a decisão arbitral recorrida e declarando-se que não há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios.

Cumprido o estipulado no n.º 2 do artigo 92.º do Código de Processo nos Tribunais...

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