Acórdão nº 01232/20.0BEPRT-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-02-24

Ano2023
Número Acordão01232/20.0BEPRT-S1
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO ..., EPE, AA, e BB, [devidamente identificados nos autos], Co-Réus na acção que contra si foi intentada pela Autora CC [também devidamente identificada nos autos], inconformados, vieram apresentar recurso das decisões proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a final da sessão da Audiência prévia realizada em 13 de junho de 2022, sob as alíneas F) e G), pelas quais foi indeferido o pedido de realização de perícia colegial, assim como o pedido de parecer ao Colégio da especialidade de Anatomia Patológica da Ordem dos Médicos, que haviam formulado a final da Contestação por si deduzida.

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No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencaram a final as conclusões que ora se reproduzem:

Conclusões:

Está legalmente consagrado um direito à realização de perícia colegial, como resulta da norma do artigo 468º do CPC ao estatui que «a perícia é realizada por mais de um perito, até ao número de três, funcionando em moldes colegiais ou interdisciplinares: … Quando alguma das partes, nos requerimentos previstos no artigo 475.º e no n.º 1 do artigo 476.º, requerer a realização de perícia colegial»

Tal direito processual é corolário do princípio e do direito ao contraditório instituído no artigo 3º do CPC ao consagrar que « que «o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem» o qual em matéria probatória, como flui do artigo 413º «o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las, sem prejuízo das disposições que declarem irrelevante a alegação de um facto, quando não seja feita por certo interessado.»

A consulta técnico-científica e ou o parecer emanado do Conselho Médico-Legal não constituem perícias médicas daquelas a que se referem os artigos 467º/ e 468º do CPC nem substituem as perícias colegais que as partes requeiram;

A recusa de realização de prova pericial colegial quando requerida pelas partes, em âmbito que excede e é diferente do de uma perícia médico-legal de avaliação do dano, constitui uma restrição desproporcionada e ilegal do direito das partes à produção da prova, com violação do contraditório, por deixar sobrepor o direito da parte contrária, violando ainda o direito a um processo judicial equitativo;

Ao decidir como o fez, não obstante o procurado merecimento, violou a decisão recorrida as indicadas normas dos artigos 468º, 3º e 413º do CPC comprometendo o contraditório e a tramitação do processo com equidade.
Termos em que, e nos melhores do douto suprimento, na atendibilidade das presentes conclusões, deve ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que admita e determine a realização das provas recusadas,
Assim se fazendo JUSTIÇA!“

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A Recorrida DD não apresentou Contra alegações.

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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, com fixação dos seus efeitos.

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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.

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Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que a declare nula, sempre tem de decidir “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.” [Cfr. artigo 149.º, n.º 1 do CPTA], reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

Assim, as questões que vêm suscitadas pelos Recorrentes e patenteadas nas conclusões das suas Alegações resumem-se, a final e em suma, em apreciar e decidir sobre se as decisões recorridas padecem de erro de julgamento em matéria de interpretação e aplicação do direito em torno do direito à prova, e por consequência, ao contraditório, face à não admissão da realização da perícia colegial requerida, nem do pedido de parecer a um Colégio de Especialidade da Ordem dos Médicos, e assim, se as decisões recorridas violam o disposto nos artigos 468.º, 3.º e 413.º, todos do CPC.

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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

Para efeitos da apreciação do presente recurso jurisdicional, em face do que resulta do seu processado, é possível com toda a segurança jurídica fixar a que segue:

1 – A final da Contestação deduzida nos autos pelos Réus ora Recorrentes, os mesmos formularam o pedido tendente à produção de prova pericial – Cfr. a Contestação constante dos autos -, dele para aqui se extraindo o que aí foi enunciado, no que releva em termos do presente recurso, o que segue:

“Pericial: logo que admitida apresentará os seus quesitos; de realização de perícia médico-legal, a realizar junto do INML, IP, para apuramento da afetação da integridade física da autora;
Bem como perícia colegial tendo como objeto a emissão de parecer sobre a correção técnico-científica do exame de anatomia patológica e a cirurgia associada a que se submeteu a autora;
E ainda pedido de ‘parecer’ ao Colégio da Especialidade de Anatomia Patológica da Ordem dos Médicos, com o mesmo objeto.” [sublinhado da autoria deste TCA Norte]

2 – Os pedidos de realização da perícia, da perícia colegial, assim como de “parecer” ao Colégio de Especialidade, foram apreciados a final da Audiência prévia - Cfr. fls. dos autos -, nos termos que, por facilidade para aqui se extrai como segue:

“[…]
F) Não se vislumbrando, nem vindo densificado, qualquer argumento que denote a especial complexidade nas questões técnicas em apreço que demandassem a utilização da prerrogativa excepcional (de perícia colegial) consagrada na parte final do n.º 4 do artigo 21.º da Lei n.º 45/2004, de 19/08, logo se antevê, pois, que este Tribunal jamais poderia deferir tal modalidade de perícia, indeferindo-se, por isso, a pretensão dos 1.º, 2.º e 5.º Réus, atento que a entidade que deverá levar a cabo a perícia a realizar, em toda a sua linha, deverá ser, à luz da Lei, o INMLCF.

G) Pela mesma razão, indefere-se, de igual forma, o pedido de parecer ao Colégio da Especialidade de Anatomia Patológica da Ordem dos Médicos, na medida em que tal matéria será objecto de juízo técnico a emitir por parte do INMLCF;

H) Não se afigurando, nem impertinentes, nem dilatórias, notifique-se as demais partes para que, no prazo de 10 [dez] dias, querendo, se pronunciem, nos termos do n.º 1 do artigo 476.º do CPC, quanto às perícias...

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