Acórdão nº 00927/23.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15-12-2023

Data de Julgamento15 Dezembro 2023
Ano2023
Número Acordão00927/23.1BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
«AA», com domicílio na Travessa ...., ..., instaurou acção para reconhecimento do direito ou interesse legalmente protegido contra a Caixa Geral de Aposentações, I.P., com sede na Avenida ..., ..., por via da qual peticiona a condenação desta no ressarcimento das despesas por si suportadas, decorrentes de acidente em serviço e consequente incapacidade parcial permanente para o serviço.
Pugnou pela condenação da Ré:
a) A ressarci-lo na quantia de € 635,05, relativa a despesas decorrentes do acidente em serviço já apuradas; e
b) Na reparação futura do Autor, em dinheiro ou em espécie, das prestações que se mostrem necessárias e decorrentes do acidente em serviço.
Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgada procedente a acção e,
consequentemente foi condenada a Ré:
a) A apreciar os requerimentos de ressarcimento de despesas médicas já apresentados pelo Autor, no valor total de € 635,05, realizando todas as provas legalmente admissíveis para apurar do nexo de causalidade entre tais despesas e o acidente em serviço sofrido pelo Autor; e
b) Futuramente, a reparar o Autor, em dinheiro ou em espécie, das prestações que se mostrem necessárias e que decorram do acidente em serviço por aquele sofrido.
Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Ré formulou as seguintes conclusões:
1.ª Este Instituto Público não vem colocar em causa a decisão recorrida na parte em que conclui que compete à CGA o pagamento das prestações em espécie decorrentes do acidente, uma vez
que, face à jurisprudência que sendo recentemente proferida pelos Tribunais superiores, esta questão terá já deixado de merecer possibilidade de nova ponderação.

2. Mas impõe-se interpor recurso daquela decisão apenas na parte em que decidiu condenar a CGA a apreciar e reparar os requerimentos de ressarcimento de despesas médicas, independentemente de se mostrarem cumpridas as condições legalmente exigidas para o pagamento das despesas pelo n.º 7 do art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 503/99 e “...realizando todas as provas legalmente admissíveis para apurar do nexo de causalidade entre tais despesas e o acidente em serviço sofrido pelo Autor.”

3. A decisão recorrida defende que os documentos de prescrições e faturação não têm necessariamente de preencher as condições legalmente previstas no n.º 7 do art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 503/99, por entender que tal omissão “...não pode repercutir-se negativamente na esfera jurídica do Autor.”.

4. Para suportar tal entendimento, o Tribunal a quo invoca o “...o Acórdão do Venerando Tribunal Central Administrativo do Norte, de 10/02/2023, P. 477/22.3BEPNF.”. aresto que a CGA não logrou localizar, nem mesmo através de pesquisa que efetuou à base de dados do IGFEJ em www.dgsi.pt.

5. Não obstante, a solução preconizada pelo Tribunal a quo desvirtua a vontade expressa do legislador, constitui uma solução propensa a abusos e constitui um entendimento absolutamente contrário ao que vem sendo definido na matéria pela jurisprudência quer do Tribunal Central Administrativo Norte quer do Tribunal Central Administrativo Sul (vejam-se o Acórdão do TCA Norte de 2022-10-03, proc.º 00620/21.0BEAVR, o Acórdão do TCA Sul de 09-02-2023, proc.º 2429/22.4BELSB, o Acórdão do TCA Norte de 13-09-2019, proc. n' 564/15.4BECBR e o Acórdão do TCA Sul de 12-11-2020, proc.º 303/20.8BEALM, estes últimos com a mesma fundamentação, todos parcialmente transcritos supra em Alegações e todos eles disponíveis base de dados do IGFEJ em www.dgsi.pt).

6. Sendo que, de acordo com essa jurisprudência, para efeitos de pagamento das despesas, nas prescrições médicas e respetivos documentos de faturação deve obrigatoriamente constar a situação de acidente em serviço ou doença profissional e, bem assim, devem estar preenchidas as demais condições legalmente previstas no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.

7. Mais resultando da mesma jurisprudência que a qualificação das despesas se integra no domínio da discricionariedade técnica dos serviços da CGA, a quem compete – previamente ao pagamento – a avaliação da justificação formal e material das despesas apresentadas, não competindo ao Tribunal identificar quais as despesas efetivamente elegíveis para o efeito.

8. A ser a CGA a entidade responsável pelo pagamento das prestações em espécie, então terão de ser conjugadamente aplicadas as condições legalmente previstas do Decreto-Lei n.º 503/99 para a justificação desse pagamento, assim como as normas igualmente previstas no regime geral, para o qual remete expressamente o n.º 1 do art.º 34.º daquele diploma.

9. Se a presente ação visa efetivar a responsabilidade pela reparação dos danos resultantes de acidente em serviço, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 503/99, e não nos termos de outro regime legal, há que aplicar todas as normas que integram este regime jurídico, independentemente de a aplicação de algumas dessas regras se poderem mostrar mais onerosas à concreta pretensão que possa ter sido deduzida por parte do Administrado.

10.ª Afigurando-se inaceitável o entendimento propugnado pelo Tribunal a quo, que defende que os documentos de prescrições e faturação não têm necessariamente de preencher as condições legalmente previstas no n.º 7 do art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 503/99 e que é à CGA – não a quem apresenta as despesas – que recai a responsabilidade de realizar “...todas as provas legalmente admissíveis para apurar do nexo de causalidade entre tais despesas e o acidente...”

Termos em que deverá ser revogada a decisão recorrida na parte impugnada e substituída por outra que acolha a mesma orientação que sendo seguida na jurisprudência acima referenciada, segundo a qual a qualificação das despesas se integra no domínio da discricionariedade técnica dos serviços da CGA, a quem compete, previamente ao pagamento, a avaliação da justificação formal e material das despesas apresentadas
O Autor juntou contra-alegações e concluiu:
I.O Tribunal a quo, na douta sentença proferida, julgou a ação totalmente procedente e condenou a Recorrente a apreciar os requerimentos de ressarcimento de despesas médicas já apresentados pelo Recorrido, no valor total de € 635,00, realizando todas as provas legalmente admissíveis para apurar o nexo de causalidade entre tais despesas e o acidente em serviço sofrido pelo A; e, futuramente, a reparar o Recorrido, em dinheiro e em espécie, das prestações que se mostrem necessárias e que decorram do acidente em serviço por aquele sofrido.
II. A Apelante, insurge-se contra tal decisão, alegando que o Tribunal a quo defende que os documentos de prescrição e faturação não tem necessariamente de preencher as condições legalmente previstas no n.° 7 do art.° 6.° do Decreto-Lei n.° 503/99, e que tal omissão, não pode repercutir-se negativamente na esfera jurídica do Autor.
III. Ora, o entendimento que a Recorrente retira da decisão recorrida não reflete o ali decidido,
IV. O Tribunal a quo, traça uma interpretação clara, estribada nos diversos normativos expressamente referidos, mormente o Decreto-Lei n.° 503/99, de 20 de novembro, quanto à competência da CGA para decidir e ressarcir o Recorrido, assim como na mais recente jurisprudência sobre esta temática, realçando de forma fundamentada, tão somente, que a menção de acidente em serviço nas prescrições médicas e respetivos documentos de faturação é apenas um dever acessório, não expressamente cometido a alguém, e não se elevando a dita formalidade ad probationem, não está precludida a possibilidade de prova de tal nexo causal pelos demais meios admissíveis, cabendo tal ponderação, no domínio da discricionariedade técnica dos serviços da CGA.
V. E só assim não será, se depois de a Recorrente atender a todos os meios de prova legalmente admissíveis, não for possível estabelecer a relação de causalidade e necessidade, das despesas com o acidente, a omissão poderá repercutir-se na esfera jurídica do Recorrido.
VI. De todo o modo, a repercussão na esfera jurídica do Recorrido, nunca poderá ter a virtualidade de precludir o seu direito à reparação em dinheiro ou em espécie, mas tão somente a ser chamado a fazer a competente prova, pelo que a Recorrente, sempre estará obrigada a previamente ponderar, a possibilidade da prova de tal nexo causal pelos demais meios admissíveis.
VII. A sentença recorrida não refere, nem dela se infere, que os documentos de prescrições e faturação não têm necessariamente de preencher as condições legalmente previstas para pagamento das despesas, como pretende fazer crer a recorrente.
VIII. Como sustenta a Apelante, a qualificação das despesas integra-se no domínio da discricionariedade técnica dos serviços da CGA, a quem compete, previamente ao pagamento, a avaliação da justificação formal e material das despesas efetivamente elegíveis para o efeito.
IX. Nesse domínio, recai à priori sobre a Recorrente CGA, a responsabilidade de realizar todas as provas legalmente admissíveis para apurar do nexo de causalidade entre tais despesas e o acidente e não sobre quem as apresenta.
X. Como se evidencia nas presentes contra-alegações, é desprovido de fundamento todo o argumentário expendido pela Recorrente, que com a interposição deste recurso, mais não pretende do que protelar o desfecho da ação, adiando uma decisão que bem sabe ser inevitável,
XI. Não merecendo a sentença recorrida qualquer censura.

Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado integralmente improcedente e, em consequência, ser confirmada a decisão recorrida.
O Senhor Procurador Geral Adjunto notificado, nos termos e para os efeitos do artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão foi fixada a seguinte factualidade:
A)O Autor é militar da GNR, com a categoria de 1° Sargento n° ...80 e encontrava-se...

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