Acórdão nº 00750/09.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-01-12

Ano2023
Número Acordão00750/09.6BEBRG
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Braga)
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – A "A..., Lda." (Recorrente), veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual se julgou improcedente a impugnação intentada contra as liquidações de IVA referentes aos anos de 2004, 2005 e 2006, assim como contra as correspetivas liquidações de juros compensatórios.

No presente recurso, a Apelante formula as seguintes conclusões:
A- A liquidação de IVA, controvertida nos autos, resultou do entendimento por parte da A.F., de que a Recorrente prestou serviços que não facturou e em consequência omitiu à tributação.
B- As anomalias apuradas pela A.F. reconduzem-se a três categorias de anomalias em concreto: (i) omissão de custos incorridos; (ii) omissão de proveitos advenientes de prestações de serviços; (iii) ausência de documentos susceptíveis de comprovar a realização de suprimentos por parte dos sócios.
C- Tendo apenas como substrato as referidas anomalias o Tribunal a quo entendeu que o caso sub judice a A.F. reuniu todos os pressupostos legais da avaliação indirecta, com fundamento na “Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável.” – al. b) do art. 87º da LGT.
D- Não obstante a fundamentação em que se encontra ancorada a decisão a quo, crê-se que em abstracto, os motivos e pressupostos arrolados no RIT não preenchem a previsão da al. b) do art. 87º da LGT.
E- Desde logo, porque ao contrário de quanto foi considerado pelo Tribunal a quo, a A.F. no seu RIT não alega, nem demonstra em que medida os factos apurados impossibilitam a quantificação correcta e exacta da matéria colectável declarada pela "A..., Lda.".
F- A A.F. poderia ter quantificado o valor das prestações de serviços omissas na contabilidade e subtraídas à tributação, para tanto, bastaria recolher as tabelas de preços praticados pela impugnante em cada um dos exercício[s], confrontando as referidas tarifas com o preço efectivamente recebido por prestações de serviços equiparados, para numa fase posterior, atribuir a cada uma das prestações não facturadas o respectivo preço.
G- Em face dos elementos constantes do RIT, é possível concluir que os factos em que a A.F. sustentou as suas correcções à matéria tributável de IRC, são essencialmente os seguintes: i) omissão de facturação de serviços prestados na sua totalidade; ii) omissão de facturação de serviços prestados em caso de desistência ou transferência de escola; iii) omissão de facturação de serviços prestados em caso de repetição de exame teórico ou prático.
H- Relativamente à omissão de facturação de serviços na sua totalidade, a A.F. cita apenas onze exemplos (num total de 965 prestações de serviços), sem explicitar o número exacto de prestações de serviços em que a "A..., Lda." terá omitido facturação, ou evidenciar tal facto pela junção das listagens fornecidas pela Direcção Geral de Viação ao relatório de fundamentação.
No que refere ao segundo argumento – omissão de facturação de serviços prestados em caso de desistência ou transferência de escola – a A.F. cita apenas doze exemplos (num total de 965 prestações de serviços), sem explicitar o número exacto de prestações de serviços em que a "A..., Lda." terá omitido facturação, ou evidenciar tal facto pela junção das listagens fornecidas pela Direcção Geral de Viação ao relatório de fundamentação.
J- A A.F. vem, ainda, referir a omissão de facturação de serviços prestados em caso de repetição de exame teórico ou prático, citando cento e cinquenta e dois casos (num total de 965 prestações de serviços), sem explicitar o número exacto de prestações de serviços em que o adquirente terá contratualizado um pacote de serviços, independentemente do número de vezes que tivesse que se submeter a exame teórico ou prático, que deveria ter individualizado, daqueles outros, em que o candidato ia adquirindo serviços de forma faseada.
K- Ao contrário de quanto decorre da decisão a quo, a A.F. não estava impossibilidade de quantificar de forma exacta o rendimento colectável dos exercícios de 2004, 2005 e 2006, pois, as anomalias detectadas, ainda que susceptíveis de influenciar os resultados dos exercícios, não inviabilizavam o apuramento da matéria tributável por simples calculo aritmético, conclusão que não poderá deixar ser revista e pelo Tribunal ad quem.
L- No método interpretativo da A.F. os contratos de suprimentos concluídos entre os sócios e a sociedade "A..., Lda." deverão ser reclassificados como lucros, por duas ordens de razão: (i) inexistência de deliberações sociais, reflectidas em actas, as quais deverão reflectir as condições de realização do contrato de suprimento, (ii) inexistência de documentos que demonstrem a realização do suprimento.
M- Nos termos do art. 243º, n.º 6 do CSC decorre a inexigibilidade de uma particular figuração exterior para o acordo celebrado, pode o mesmo ser acordado entre os sócios e a sociedade por mero ajuste verbal.
N- Dispõe o n.º 3 do art. 244º do CSC que os contratos de suprimento podem ser celebrados entre os sócios e a sociedade independentemente de qualquer autorização estatutária ou deliberação social nesse sentido.
O- Tendo em vista a satisfação de necessidades financeiras da sociedade "A..., Lda.", obstando a novas entradas de capital social, os sócios, no decurso dos anos de 2004, 2005 e 2006, foram constituindo suprimentos a favor da sociedade.
P- Dada a natureza consensual do contrato de suprimento, nem o montante, nem as condições dos suprimentos constituídos, foram precedidos da deliberação social reduzida a escrito.
Q- Na hipótese sub judice, dado que os contratos de suprimentos realizados pelos sócios em beneficio da sociedade, foram celebrados com observância das normas legais e estatutárias, não pode o Tribunal a quo alegando apenas a falta de documento escrito pôr em causa a materialidade dos contratos realizados, e que deram origem aos correspondentes lançamentos contabilísticos (até porque, como perversamente se omitiu) a sociedade e os sócios estavam objectivamente impossibilitados de provar a realização de suprimentos por meio de documentos, uma vez que os mesmos foram apreendidos, no âmbito do processo-crime sancionado com o n.º ../05.0ZRPRT (cfr. doc. n.º 3 e 4 juntos com a P.I.).
R- O rendimento tributável fixado pela A.F. é completamente desajustado da capacidade contributiva da Alegante, quer por não corresponder ao valor dos proveitos que se diz omissos à tributação, quer por não ser coerente com as anomalias que determinaram a avaliação indirecta.
S- Tendo-se demonstrado em sede de procedimento de revisão e, repetido em sede testemunhal e documental que o preço (médio) para os serviços prestados correspondia ao valor de € 400,00 para 2004 e 2005 e de € 575,00 para 2006, não seria impossível, nem mesmo muito oneroso obter o valor exacto do rendimento omitido, com o intuito de aproveitamento patrimonial ilegítimo.
T- Adopção do método de avaliação directa, permitiria obter um valor correcto e exacto do rendimento adveniente das prestações de serviços que a Alegante na óptica da A.F. terá subtraído à facturação, evidenciando assim a concreta situação contributiva da Alegante em cada um dos exercícios em exame, que por especial referência à tabela de preços praticados (sem tomar em linha de conta os factos supra tecidos relativamente à circunstâncias sociais e económicas em que a venda dos serviços se processava), permitiram obter um valor bem inferior, mas reflexo da sua capacidade contributiva.
U- Salvo o devido respeito, a Sentença a quo, incorre em erro de julgamento, por incorrecta apreciação e valoração da prova produzida, com a consequente errada aplicação do direito.
V- A livre apreciação da prova por parte do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade, está aniquilada, dado que a Audiência Contraditória foi realizada na presença do Meritíssimo Juiz AA e a sentença foi proferida pela Juiz [d]e Direito BB.
W- A convicção do Tribunal deve formar-se a partir da dialéctica que se cria entre os dados objectivos fornecidos pelos documentos e outros meios de prova com os depoimentos das testemunhas, em função da sua razão de ciência, da sua (im)parcialidade, das certezas e das hesitações, das inflexões de voz, da serenidade, da coerência de raciocínio, da seriedade e do sentido de responsabilidade evidenciados, das coincidências e inverosimilhanças que apenas transparecem na Audiência Contraditória.
X- O Meritíssimo Julgador a quo, não está em condições de livremente formar a sua decisão, por não ter assistindo à revelação dos depoimentos das testemunhas, não está em condições de com razoabilidade, com recurso lógica e às regras de experiencia controlar a formação da sua convicção sobre a realização de suprimentos por parte dos sócios, ou omissão de proveitos à tributação.
Y- Não tendo o Meritíssimo Juiz a quo indicado os concretos fundamentos que impediram a consideração da prova testemunhal, e em consequência a realização de proveitos por parte dos sócios, a decisão encontra-se indevidamente fundamentada.
Termina a Recorrente pedindo que seja dado provimento ao presente recurso.
A Recorrida (RFP) apesar de regularmente notificada para o efeito não apresentou contra-alegações.
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Os autos foram com vista ao Digno agistrado do Ministério Público junto deste Tribunal (cf. fls. 434 e segs. dos autos – paginação do SITAF).
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Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.

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II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância:
1. No dia 02/05/2002, foi outorgado...

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