Acórdão nº 00254/21.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-10-04

Ano2023
Número Acordão00254/21.9BECBR
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Coimbra)
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:

RELATÓRIO
«AA», residente na Rua ..., ..., ..., ... ..., propôs ação administrativa contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P., com sede na Avenida ..., ... ..., pedindo:
a) que a R. seja condenada à prática do ato legalmente devido, ou seja, a emitir decisão no sentido de lhe ser atribuída pensão de aposentação que contabilize, juntamente com a remuneração base, as gratificações de atribuição obrigatória por si auferidas, no período compreendido entre setembro de 1995 e dezembro de 2011, nos termos do Decreto-Lei n.º 232/87, de 11/06;
b) que a R. seja condenada a atribuir-lhe, a título de pensão de aposentação, quantia mensal nunca inferior a € 3.097,98;
c) que a R. seja condenada no pagamento da quantia de € 48.840,00, correspondente aos retroativos, desde a data da sua aposentação (outubro de 2014) até à presente data (€ 555/mês x 90 meses), acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Por decisão proferida pelo TAF de Coimbra foi julgada a acção procedente e, em consequência:
-condenada a R. à prática do ato legalmente devido, ou seja, a emitir decisão no sentido de ser atribuída ao A. pensão de aposentação que contabilize, juntamente com a remuneração base, as gratificações de atribuição obrigatória por si auferidas, no período compreendido entre setembro de 1995 e dezembro de 2011, nos termos do Decreto-Lei n.º 232/87, de 11/06;
-condenada a R. a atribuir ao A., a título de pensão de aposentação, a quantia mensal que se vier a apurar após a contabilização das gratificações e o recálculo referidos no ponto anterior;
-condenada a R. a pagar ao A. a quantia que se vier a apurar correspondente aos retroativos devidos a título de pensão, desde a data da sua aposentação (outubro de 2014) até à presente data, acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Ré formulou as seguintes conclusões:
1. Tal como fixado na Sentença recorrida (cfr. II - Questões a decidir: pág. 4 da Sentença), a questão que está em discussão nos presentes autos é a de “…saber se o A. tem direito a que, no cálculo da sua pensão de aposentação, sejam contabilizadas, juntamente com a remuneração base, as gratificações de atribuição obrigatória por si auferidas, no período compreendido entre setembro de 1995 e dezembro de 2011, nos termos do Decreto-Lei n.º 232/87, de 11/06….”
2. Como resulta da matéria de facto assente (cfr. pontos 2, 3, 4, 5, 7, 8 e 9 dos Factos Assentes), desde 2014-11-02 que o Recorrido está ciente de que a CGA considera que a gratificação de especialização prevista no artigo 1.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 232/87, de 11 de junho, não é suscetível de relevar no cálculo da pensão concedida por despacho de 2014-10-27.
3. Apesar de ter apresentado reclamação, logo em 2014-11-02 (cfr. 3 dos Factos Assentes), do despacho de 2014-10-27, argumentando que “…verifiquei que não foram contabilizados para o cálculo das respetivas parcelas a gratificação/subsídio de especialização que auferi de setembro de 1995 a dezembro de 2011”, o A. nunca impugnou aquele ato praticado pela CGA, deixando passar todos os prazos que a lei concede para deduzir a competente ação judicial.
4. A reclamação que o mesmo apresentou em 2021-02-15 configura uma tentativa de reabertura da mesma questão sobre a qual a CGA já se pronunciara em 2015-03-04, sendo que a comunicação dirigida à mandatária do A. em 2021-03-17 (cfr. 8 dos Factos Assentes) é explícita, ao afirmar que “…relativamente à gratificação de especialização que refere, mantém-se a informação já comunicada no ofício de 2015-03-04, isto é, que essa gratificação nunca poderia ser contabilizada no cômputo da pensão do utente, visto não estar sujeita a quotas, pelo que não se enquadra na alínea b) do artigo 47.º n.º 1 do Estatuto da Aposentação…”.
5. Pelo que, como a CGA defendeu nos artigos 1.º a 8.º da Contestação apresentada nestes autos em 2022-06-28, a presente ação é intempestiva, por não ter respeitado os prazos legalmente previstos para a sua propositura, sendo que o A. procurou em 2021 tentar reabrir uma questão sobre a qual a CGA já se pronunciara expressamente em 2015-03-04.
6. A conclusão do Tribunal a quo, de que “…para efeitos de apreciação da (in)tempestividade da propositura da presente ação, há que atender ao requerimento/reclamação de 15/02/2021 e ao respetivo indeferimento por decisão notificada por correio eletrónico em 17/03/2021.” (cfr. pág. 14 da Sentença) é incompreensível, em face do que ficou fixado em II - Questões a decidir (pág. 4 da Sentença) e em face dos pontos 3, 4, 5, 7 e 8 dos Factos Assentes.
7. O conteúdo da comunicação remetida à mandatária do A. em 2021-03-17 (ponto 8 dos Factos Assentes) é explícita, ao afirmar que “…relativamente à gratificação de especialização que refere, mantém-se a informação já comunicada no ofício de 2015-03-04, isto é, que essa gratificação nunca poderia ser contabilizada no cômputo da pensão do utente, visto não estar sujeita a quotas, pelo que não se enquadra na alínea b) do artigo 47.º n.º 1 do Estatuto da 7 Aposentação…”, configurando, assim, um ato confirmativo, que remete expressamente para a informação que já havia transmitido à mandatária do A. em 2015-03-04.
8. Como ensina Mário Aroso de Almeida, em “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 4ª edição revista e actualizada, p. 163: “…o acto meramente confirmativo também não pode ser impugnado por quem, estando constituído no ónus de impugnar o acto anterior dentro dos prazos legais, não o tenha feito, na medida em que, de outro modo, se estaria a permitir que o litígio fosse suscitado sem observância dos prazos legais.”, sendo que, segundo Rogério Soares, em “Direito Administrativo (Lições)”, Sérvulo Correia, em “Noções de Direito Administrativo”, e Marcello Caetano, em “Manual de Direito Administrativo,” um ato confirmativo nada inova na esfera jurídica do destinatário, nem nada altera o “status quo ante”, limitando-se a manter uma situação anteriormente criada, sem produzir qualquer efeito e sem nada acrescentar ou retirar ao seu conteúdo.
9. Para que um ato administrativo seja confirmativo de outro, é necessário, além da identidade dos sujeitos, que os dois actos tenham os mesmos pressupostos, a mesma fundamentação e o mesmo regime jurídico (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 2006-10- 11, tirado no proc.º 0614/06). Dito de outro modo, um ato é confirmativo quando emana da entidade que proferiu decisão anterior, apresenta objeto e conteúdo idênticos aos desta e se dirige ao mesmo destinatário, limitando-se a repetir essa decisão, perante pressupostos de facto e de direitos idênticos (cfr. Acórdão do STA de 2007-06-19, proc.º 0997/06).
10. No caso dos autos, em face do que ficou fixado em II - Questões a decidir (pág. 4 da Sentença), o ponto 8 dos Factos Assentes demonstra, inequivocamente, que a comunicação remetida à mandatária do A. em 2021-03-17, se limitou, quanto à matéria em questão, a reiterar, com base na mesma fundamentação e no mesmo regime jurídico “…a informação já comunicada no ofício de 2015-03-04…“ sem nada acrescentar ou retirar ao seu conteúdo, pelo que considera a CGA que, ao contrário do entendimento defendido pelo Tribunal a quo, para efeitos de apreciação da tempestividade da presente ação, a decisão a considerar teria de ser a de 2015-03- 04 e não uma praticada 6 anos depois, em 2021-03-17.
11. Por outro lado, o Tribunal a quo, para além de condenar a CGA a recalcular a pensão do Recorrido, decidiu, ainda, atribuir efeitos retroativos a esse recálculo, reportados a 2014 (data em que foi concedida a aposentação), acrescidos de juros de mora, o que contente com o disposto no n.º 2 do art.º 38.º do CPTA, onde se estabelece que “a acção administrativa comum não pode ser utilizada para obter o efeito que resultaria da anulação do acto inimpugnável”.
12. Como ensinam Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira “não se pode ir “buscar” à acção comum - independentemente de o acto ilegal ainda ser (ou não) impugnável – os efeitos complementares ou “executivos” (…) caracteristicamente associados ao juízo próprio de ilegalidade, ao juízo anulatório, sejam, por exemplo, os relativos ao restabelecimento in natura da situação jurídica ilegalmente criada, porque isso corresponderia ou pressuporia uma verdadeira anulação do acto, a sua eliminação da ordem jurídica” – cfr. CPTA anotado, vol. I, pág. 278.
13. Não se encontra fundamento para se retroagir os efeitos do direito peticionado a outubro de 2014 (quase 7 anos antes da sua propositura da ação!!), ao que sempre obstaria o disposto no artigo 38.º, n.º 2, do CPTA, sendo que, conforme decidiram, entre outros, os Acórdãos do 8 Tribunal Central Administrativo Sul de 2009-03-26 (proc.º 04714/09) e de 2009-06-25 (proc.º 05141/09) “… o fundamento da inimpugnabilidade dos actos de execução, em tudo semelhante ao que justifica a inimpugnabilidade dos actos meramente confirmativos, radica na consolidação da estatuição jurídica estabelecida em acto anterior, exigida pelo interesse público da estabilidade dos actos administrativos, sendo pois de presumir “jure et de jure” a concordância dos respectivos destinatários através da respectiva inércia contenciosa durante certo período de tempo.” 14. Mas ainda que se entendesse ser de dar provimento à pretensão do Recorrido, nunca o recálculo da pensão poderia ter efeitos retroativos, já que haverá que observar as regras constantes quer no art.º 168.º do CPA quer no art.º 79.º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro, que aprovou as bases gerais do sistema de segurança social, segundo as quais, uma vez que sejam ultrapassados os prazos...

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