Acórdão nº 00145/13.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-10-20

Data de Julgamento20 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão00145/13.7BECBR
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Coimbra)
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte -Subsecção Social-:

RELATÓRIO
«AA», residente em ..., n.º 1, ..., ... ..., propôs ação administrativa especial contra o MUNICÍPIO ..., com sede na Av. ... ..., indicando, na qualidade de Contrainteressada, «BB», com domicílio profissional na sede do R.,
pedindo (i) que seja declarado nulo ou anulado o ato impugnado, consubstanciado no despacho do Presidente da Câmara Municipal ..., de 10/12/2012, que indeferiu o recurso hierárquico interposto pela A., determinando a sua exclusão do procedimento concursal para preenchimento de um posto de trabalho na carreira de Técnico Superior – área de Planeamento Regional e Urbano, do mapa de pessoal do R., (ii) que seja reconhecido e declarado que a A. reúne as competências essenciais para o exercício das funções próprias do posto de trabalho em causa e (iii) que o R. seja condenado a avaliar a A. nos termos referidos na petição inicial e, em consequência, a mantê-la no concurso em causa.
Por decisão proferida pelo TAF de Coimbra foi julgada improcedente a acção e absolvida a Entidade Demandada dos pedidos.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões:
1ª A sentença em recurso confirmou a exclusão da Recorrente do concurso em causa nos presentes, assim incorrendo em vários erros jurídicos e atropelos à lei, não só porque julgou legal a Entrevista de Avaliação de Competências realizada à Recorrente quando a mesma não só assentou em critérios subjectivos, como foi realizada sem se ter definido o “perfil de competências” imposto por lei (v. nº 4 do artº 12º da Portaria 83-A/2009) e sem que se identificasse as matérias a que a Recorrente respondeu ou o que respondeu, em clara violação dos princípios da divulgação atempada dos critérios de selecção e da imparcialidade.
Para além disso,
2ª Aquela Entrevista concluiu pela incompetência da Recorrente para o exercício das funções postas a concurso quando foi a própria entidade recorrida quem a julgou perfeitamente competente para exercer tais funções em anterior concurso (v. doc. junto) e quando está provado que a Recorrente exerce estas mesmas funções noutra Autarquia há já vários anos, pelo que sempre o aresto que confirmou a exclusão da Recorrente terá que ser anulado.
Com efeito,
3ª O aresto em recurso começa por enfermar da nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artº 615º do CPC por não ter especificado nem dado por provado um facto que era absolutamente essencial para a decisão de direito que alcançou, uma vez que para poder concluir pela legalidade, isenção, imparcialidade e correcta duração da Entrevista era absolutamente essencial que se tivesse dado por provada a duração da mesma e factos que comprovassem a legalidade, isenção e imparcialidade com que a mesma decorreu.
Para além disso,
4ª Também o Saneador e o Despacho que indeferiu a prova pericial peticionada são claramente ilegais, pois ao rejeitar tal prova e ao ordenar a notificação das partes para produzirem alegações quando havia matéria de facto controvertida que era essencial para a boa decisão da causa à luz das várias soluções plausíveis da questão de direito e sem antes ter determinado a abertura de um período destinado à prova de tais factos violou-se frontalmente o disposto na alínea c) do nº 1 do artº 87º do CPTA, o direito fundamental à tutela judicial efectiva, e o princípio da igualdade das partes, consagrados nos artºs 2º e 6º do CPTA.
5ª Na verdade, a matéria de facto alegada na p..i que fundamentava e integrava os vícios de violação de lei assacados ao acto impugnado (v. artºs 25º, 27º 30º, 57º e ss. da p.i.) foi impugnada em sede de contestação (v. artº 2º da contestação do Município e artºs 18º, 20º, 40º, 50º e 51º da contestação da contra-interessada), pelo que eram factos controvertidos cujo apuramento era essencial para a boa solução da causa à luz das várias soluções plausíveis da questão de direito, sendo fundamental para que se pudesse proferir uma decisão justa e esclarecida que se apurasse, no mínimo, se a Recorrente executava diariamente as funções postas a concurso; se tinha as competências comportamentais necessárias para as executar e se a Entrevista que determinou a sua exclusão tinha efectivamente decorrido com a forma e duração necessárias ao apuramento das suas competências.
6ª Neste mesmo sentido, veja-se que o Tribunal Central Administrativo Sul já decidiu que havendo matéria de facto controvertida tem de ser aberto um período destinado à sua prova (v. Acº de 2003, Proc. nº 10868/01, da 1ª Secção, 2ª Subs.; v. igualmente o Acº do TCANORTE de 28/3/2014, Proc. nº 316/10.8BECBR), defendendo a doutrina que a decisão judicial que denegar a uma das partes a possibilidade de provar os factos por si alegados e que são controvertidos e essenciais para o julgamento da causa viola frontalmente o princípio da tutela judicial efectiva (v. CARLOS CADILHA, A prova em contencioso administrativo, in CJA nº 69º, págs. 46 a 49, COLAÇO ANTUNES, O juiz administrativo, súbdito da prova procedimental, in CJA nº 56, págs. 3 e segs.), tanto mais que o processo instrutor não faz fé em juízo e a sua valoração como meio de prova não pode implicar uma ofensa aos princípios da igualdade de armas nem desobrigar o juiz administrativo de definir os temas de prova à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito e de abrir o correspondente período de prova (v. CARLOS CARVALHO, O juiz administrativo e o controlo jurisdicional da prova procedimental do processo disciplinar, in CJA nº 101, pág. 23).
7ª Consequentemente, é por demais notório que ao não submeter a prova factos que eram controvertidos e essenciais para demonstrar a procedência dos vícios imputados ao acto recorrido, o saneador não cumpriu o que lhe era imposto pelo artº 87º /1/c do CPTA e atentou de forma inadmissível contra os princípios da igualdade das partes e da tutela judicial efectiva, tanto mais que julgou a acção improcedente por não se ter provado a matéria de facto por ela alegada para sustentar a procedência dos vícios invocados.
8ª Significa isto que para o Tribunal a quo a palavra de uma das partes e os documentos particulares que ela coloca no processo administrativo fazem prova plena de toda a factologia essencial para a decisão da causa, de tal forma que apesar de o administrado alegar factos que demonstram o erro nos pressupostos em que se baseou a decisão impugnada nem sequer vale a pena permitir-lhe provar o que alegara e demonstrar o erro da prova considerada pela Administração, o que temos por seguro representar um claro erro de julgamento e uma interpretação claramente contrária ao princípio da igualdade das partes e ao direito à tutela judicial efectiva.
Para além disso,
9ª O aresto em recurso incorreu em erro de julgamento ao julgar legal a Entrevista que exclui a Recorrente com base em itens como a “avaliação comportamental em contexto de trabalho”, o “relacionamento interpessoal” ou a “motivação” e sem sequer se ter identificado as matérias a que a Recorrente respondeu ou as suas respostas às mesmas, em clara violação do princípio da aplicação de critérios objectivos de avaliação, do dever de fundamentação e dos princípios da imparcialidade, transparência e prossecução do interesse público.
Acresce que,
10ª O desacerto do aresto em recurso resulta ainda do facto de não ter considerado violado o artº 12º/3 da Portaria 83-A/2009 e o princípio do mérito ao realizar uma Entrevista de Avaliação de Competências com um único técnico de RH, pois a verdade é que tais Entrevistas devem ser realizadas por um órgão colegial de forma a garantir total eficácia na avaliação do mérito demonstrado pelos candidatos, não devendo por isso tal juízo avaliativo estar dependente de uma só pessoa.
11ª Com efeito, o nº 3 do artº 12º da Portaria nº 83-A/2009 refere que tal prova deva ser efectuada por “...técnicos de gestão de recursos humanos (...) ou outros técnicos...”, ou seja, refere-se a tais técnicos sempre no plural (e não no singular), impondo assim que tal avaliação seja efectuada por um colégio, tal e qual, aliás, como nas outras Entrevistas – “entrevista profissional de selecção” e “avaliação psicológica” – em que o mérito é sempre avaliado por um colégio.
12ª A esta mesma conclusão se chega por outra ordem de razões.
Com efeito, se a “Entrevista Profissional de Selecção”, que é um método de selecção facultativo, exige, no mínimo, 2 avaliadores (v. artº 13º/3 da Portaria 83-A/2009), por maioria de razão também a “Entrevista de Avaliação de Competências” que é um método obrigatório, tem que ser realizada por, pelo menos, 2 técnicos, pois nada justificaria que um método de selecção obrigatório pudesse ser levado a cabo por 1 único técnico, enquanto um facultativo tivesse que o ser obrigatoriamente por 2, tanto mais que ambas as Entrevistas têm o mesmo objectivo: a análise comportamental em sede de experiência profissional.
Por outro lado,
13ª O aresto em recurso incorreu em flagrante erro de julgamento ao não anular o acto impugnado por violação do artº 12º/4 da Portaria 83-A/2009 e os princípios da imparcialidade e da prévia divulgação das regras do jogo que presidiriam à avaliação da Recorrente, pois contrariamente ao que impunha o citado preceito, não foi previamente definido qual o “perfil de competências” a aplicar na Entrevista de Avaliação, sendo certo que à Administração não basta ser imparcial, antes tendo também que parecer imparcial (v. MARIA TERESA RIBEIRO, in O Princípio da Imparcialidade da Administração Pública, 1996, pág. 98).
Na verdade,
14ª Apesar de o nº 4 do artº 12º da Portaria nº 83-A/2009 exigir claramente que seja definido um “perfil de competências” previamente à elaboração do próprio guião da Entrevista de Avaliação de Competência, nunca tal “perfil” foi definido, tendo a Recorrente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT