Acórdão nº 00057/09.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 09-11-2023

Data de Julgamento09 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão00057/09.9BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

A FAZENDA PÚBLICA interpõe recurso da sentença que julgou procedente a Ação Administrativa Especial deduzida por «AA» contra a o indeferimento do pedido de isenção de IMI referente a imóvel localizado na zona histórica do Porto.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
1.ª Por via do presente recurso pretende a Recorrente reagir contra a sentença proferida a 2018-02-05 pelo tribunal a quo, a qual determinou anular a decisão de indeferimento do pedido de isenção de IMI relativo ao prédio urbano propriedade da Recorrido;
2.ª Salvo o devido respeito, a decisão proferida pelo tribunal a quo padece de um duplo erro de julgamento (quanto à matéria de facto e à matéria de Direito), porquanto aquele areópago: (i) não apreciou convenientemente a certidão emitida pelo, então, IPPAR, corporizada no Documento 4 junto à p.i. e igualmente no Processo Administrativo; (ii) decidiu de acordo com jurisprudência do TCAN inaplicável ao caso vertente, uma vez que não existe identidade quanto aos factos e à questão fundamental de direito, esquecendo que no caso sub judice o bem cultural imóvel “Zona Histórica do Porto” não se confunde com o bem cultural imóvel “Centro Histórico do Porto” (subjacente àquele acórdão); (iii) não
interpretou correctamente o então artigo 40.º/1-n) do EBF, fazendo uma interpretação contra legem; (iv) olvidou as competências que legalmente assistem à Recorrente em matéria de verificação dos benefícios fiscais;
3.ª Considerou o tribunal a quo que certidão emitida pelo IGESPAR (cfr. Documento 4 da p.i. e igualmente constante do Processo Administrativo) refere o seguinte: «Da certidão a que se alude em 4, consta documento de onde decorre o seguinte: “(…) IPPAR “(…) Certifico que o imóvel (…) está classificado como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto n 67/97, DR 226 de 1997-12-31. (…)”»;
4.ª Não é aceitável como possa o tribunal a quo concluir como concluiu, porquanto o mesmo, incompreensivelmente, amputou a informação constante da certidão em causa, mediante a não transcrição daquilo que nela efectivamente consta, sendo que ao fazê-lo subverteu (aliás, grosseiramente) o sentido da informação ali patente;
5.ª O tribunal a quo refere que da certidão se extrai que o prédio urbano está classificado como de “Imóvel de Interesse Público”, contudo aquilo que a certidão do IPPAR veicula é que o prédio urbano apenas faz parte integrante do conjunto denominado “Zona Histórica do Porto”, esta, sim, classificada como Imóvel de Interesse Público”;
6.ª Daqui decorre que o exercício de amputação textual que o tribunal a quo fez levou, erradamente, à extracção de uma conclusão que a certidão do IPPAR em causa simplesmente não dá qualquer suporte;
7.ª Resultava da lei aplicável ao tempo que a atribuição do benefício fiscal patente no artigo 40.º/1-n) do EBF dependia da prévia comprovação da classificação cultural do prédio em causa, a qual era feita mediante certificação por parte da autoridade administrativa competente, sendo que à data dos factos, aquela autoridade administrativa era o IPPAR (posteriormente IGESPAR e hoje Direcção-Geral do Património Cultural);
8.ª O Recorrido obteve por parte do IPPAR a certidão corporizada no Documento 4 junto à p.i. e ao Processo Administrativo;
9.ª Tal certidão (constante de modelo oficial) contém três campos fundamentais para efeitos de aferição da situação jurídico-patrimonial dos imóveis: (i) o primeiro campo, quando assinalado, certifica que o imóvel em causa está individualmente classificado; (ii) o segundo campo, quando assinalado, certifica que o imóvel em causa está incluído num conjunto classificado; e (iii) o terceiro campo, quando assinalado, certifica apenas que o imóvel em causa está abrangido por uma zona de protecção, a qual pode ser geral ou especial;
10.ª No caso vertente, a certidão corporizada do Documento 4 junto à p.i. e no Processo Administrativo: (i) não atesta que o imóvel em causa está individualmente classificado, uma vez que o primeiro campo não está assinalado; (ii) apenas atesta que o imóvel em causa está incluído num conjunto classificado (como é o caso da “Zona Histórica do Porto”), uma vez que só este segundo campo está assinalado;
11.ª Contrariamente ao veiculado na sentença ora colocada em crise, o prédio não está individualmente classificado nem a certidão refere que o prédio estava efectivamente classificado como de “Interesse Público”, mas, sim, apenas o conjunto urbano no qual se localiza o prédio, o que é algo de radicalmente diferente, logo o tribunal a quo incorreu num claro erro de julgamento em torno da apreciação da prova e, ao fazê-lo, inquinou a sentença;
12.ª A decisão do tribunal a quo limitou-se essencialmente a seguir a jurisprudência recentemente emanada do TCAN sobre esta matéria, por julgar idênticas entre si a questão subjacente aos presentes autos e a questão discutida naqueles;
13.ª Também aqui andou mal o tribunal a quo, uma vez que o mesmo olvidou um facto essencial: não existe identidade entre o caso vertente e o dos acórdãos em causa, logo não poderia ter o tribunal a quo ter seguido, sem mais, o entendimento perfilhado pelo Tribunal Superior;
14.ª Não existe identidade quanto aos factos e à questão fundamental de direito, uma vez que nos presentes autos discute-se a isenção de IMI relativamente ao bem cultural imóvel “Zona Histórica do Porto”, ao passo que nos acórdãos do TCAN está em causa o bem cultural imóvel “Centro Histórico do Porto”;
15.ª Esta diferença é fundamental, porquanto, além de serem bens culturais distintos, os mesmos usufruem de classificações patrimoniais distintas e esta última característica é primordial na correta interpretação do artigo 40.º/1-n) do EBF (hoje 44.º);
16.ª A “Zona Histórica do Porto” não se confunde com o “Centro Histórico do Porto”, pois são duas realidades culturais distintas, não obstante a sua semelhança terminológica e proximidade geográfica;
17.ª A “Zona Histórica do Porto” está classificada como sendo um “Imóvel de Interesse Público” por via do Decreto 67/97 e da Portaria 975/2006, conforme corrobora a certidão junta pelo próprio Recorrido;
18.ª Por sua vez, o “Centro Histórico do Porto” está classificado como bem cultural de “Interesse Nacional” em decorrência da sua inclusão na Lista do Património da
Humanidade, conforme decorre do artigo 15.º/7 da LBPC, articulado com o Aviso n.º 15.173/2010, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 147, de 2010-07-30;
19.ª Basta comparar as plantas publicadas na Portaria 975/2006 (referente à “Zona Histórica do Porto) e no Aviso n.º 15.173/2010 (referente ao “Centro Histórico do Porto”) para se perceber como estamos a falar de duas realidades completamente distintas: enquanto a “Zona Histórica do Porto” se situa exclusivamente numa das margens do rio Douro, o “Centro Histórico do Porto” está implantado nas duas margens do rio Douro;
20.ª Ao seguir acriticamente a jurisprudência do TCAN sobre o “Centro Histórico do Porto” e, com isso, ao olvidar por completo que no caso vertente está em causa um outro bem cultural imóvel que não aquele, o tribunal a quo fez uma incorrecta aplicação da lei, ao concluir pela desnecessidade de uma classificação individual do prédio em apreço para efeitos da isenção de IMI;
21.ª Em decorrência directa do acabado de afirmar, verifica-se igualmente que o tribunal a quo errou ao aplicar, como aplicou, o então artigo 40.º/1-n) do EBF, na medida em que fez uma interpretação contra legem, desprezando por completo a letra da lei, ao concluir pela desnecessidade de prova da classificação individual do prédio aqui em causa, atento o facto de o mesmo se encontrar inserido numa malha urbana classificada;
22.ª Conforme resulta do Decreto 67/97, da Portaria 975/2006 e do próprio Documento 4 junto à p.i. e ao Processo Administrativo, a “Zona Histórica do Porto” está classificada como sendo um “Imóvel de Interesse Público”;
23.ª À data da classificação da “Zona Histórica do Porto”, em 1997, o regime base do património cultural português assentava no Decreto 20.985 de 1932, sendo que este regime jurídico do património cultural apenas previa três graduações do conceito de Classificação: (i) Monumento Nacional, (ii) Imóvel de Interesse Público e (iii) Valor Concelhio;
24.ª A classificação “Imóvel de Interesse Público” não se confunde minimamente com a classificação “Monumento Nacional”, como erradamente concluiu o tribunal a quo;
25.ª O legislador patrimonial foi inequívoco em atribuir à “Zona Histórica do Porto” a classificação de “imóvel de Interesse Público”, pelo que pretender conferir outro grau de classificação que não aquele (designadamente a de “Monumento Nacional”) é uma interpretação contra legem;
26.ª Estabelecia o então artigo 40.º/1-n) do EBF que «estão isentos de imposto municipal sobre imóveis (…) os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público, de valor municipal ou património cultural, nos termos da legislação aplicável»;
27.ª Tal como resulta de forma clara da letra da lei, apenas os prédios individualmente classificados como de “Interesse Público” estão isentos de IMI, mesmo aqueles que se encontrem dentro do perímetro de um Conjunto classificado;
28.ª No que tange às classificações de “Imóvel de Interesse Público”, “Valor Municipal” ou “Património Cultural” o legislador foi muito claro e preciso em fazer depender a concessão do benefício fiscal aqui em causa da existência de uma classificação individual sobre cada um dos prédios que compõem um conjunto patrimonial;
29.ª O recorrido não demonstrou, quer em sede procedimental quer em sede processual, que o seu prédio urbano está individualmente classificado, pelo contrário, a certidão que...

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