Acórdão nº 00008/07.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 06-07-2023

Data de Julgamento06 Julho 2023
Ano2023
Número Acordão00008/07.5BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RElatório
A Fazenda Pública, inconformada com a sentença proferida em 2021-02-01 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial interposta por «X, S.A.» tendo por objeto as liquidações adicionais de IRC e correspondentes juros compensatórios, relativas aos exercícios de 2002, 2003 e 2004 no valor total de EUR 181.777,98, vem dela interpor o presente recurso.
A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES
A. Entende a Fazenda Pública, com todo o devido respeito, que a douta sentença errou ao ter considerada ilegal a correção meramente aritmética, apurada pelos SIT, que desconsiderou como custo do exercício de 2002 a contribuição autárquica do ano de 1995, no valor de € 5.357,98.
Senão vejamos
B. Os SIT procederam a correções nos exercícios de 2002 e 2003, uma vez que nesses exercícios estavam duplamente lançados os custos com contribuição autárquica, apurados em de 1995, o que não é permitido face à aplicação do princípio da especialização previsto no art.º 18.º do CIRC.
C. Alegava a Impugnante que não houve omissão intencional tendo em vista qualquer aproveitamento fiscal, nem resultou, do incumprimento do princípio da especialização, qualquer prejuízo para a administração fiscal.
D. Seguindo a fundamentação da Impugnante, considerou o Tribunal a quo que a correção é ilegal, por violação do princípio da justiça, que se deve sobrepor ao princípio da especialização, designadamente quando se está perante situações de não omissão voluntária.
E. Pelo que impendia, no entender do Tribunal a quo, à Autoridade Tributária e Aduaneira “o dever de solicitar a prova de que não se tratou de uma omissão intencional”.
F. Ora, com o assim doutamente decidido, não pode a Fazenda Pública conformar-se.
G. Refere a esse propósito o art, 18º n.º 1 que os proveitos e os custos do exercício, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que respeitam, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios.
H. Essa norma prevê, no seu n.º 1, exceções, nomeadamente quando na data de encerramento das contas daquele em que deveriam ter sido imputados, os custos eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos.
I. Considera assim a Fazenda Pública que a douta sentença erra ao fazer recair sobre a AT o dever de indagar junto do sujeito passivo, se se tratou de um lapso intencional ou não.
J. É certo que, em defesa do princípio da justiça, constitucionalmente consagrado, alguma jurisprudência tem introduzido alguma flexibilidade no princípio da especialização dos exercícios.
K. Contudo, como expressou muito recentemente o Tribunal Central Administrativo Sul, no seu recente acórdão de 30/09/2020 (proferido no processo 1011/09.6BESNT), o princípio da justiça não pode colmatar toda e qualquer omissão dos contribuintes – caso contrário tudo seria permitido.
L. Ora, no caso sub judice, a contribuição autárquica do ano de 1995 foi deduzida duplamente nos exercícios de 2002 e 2003, o que demonstra, só por si, um “lapso” (intencional ou não) grosseiro.
M. Pelo que, salvo melhor opinião não se descortina haver uma situação “flagrantemente injusta”, que justifique, à luz do princípio da justiça, o afastamento do princípio da especialização.
N. Pelo que, entende a Fazenda Pública que a sentença do Tribunal a quo, erra na interpretação e aplicação do art. 18 n.º 1 do CIRC, que prevê que não possam ser lançados custos, em determinado exercício, respeitantes a outros exercícios (com as exceções previstas no n.º 2), e isso independentemente da intenção subjacente a essa atuação.
Ainda que assim não se entenda, mas sem prescindir,
O. A sentença do Tribunal a quo deu como assente o seguinte facto:
W) O custo no valor de € 5.357,98 referente a contribuição autárquica do ano de 1995 não foi levado a custo por lapso no ano de 1995, apenas veio a ser reconhecido como tal em 2002, não tendo havido uma omissão intencional tendo em vista qualquer aproveitamento fiscal, da qual não resultou qualquer prejuízo para a AF.
P. Ora, com todo o imenso respeito que o Tribunal a quo no merece, este não poderia ter dado como assente este facto, na parte em que considerou não ter havido “qualquer prejuízo para a AF”.
Q. Para aferir tal facto, não basta comparar as taxas de IRC aplicadas em cada um dos exercícios, como argumenta a impugnante.
R. Obrigando, outrossim ao apuramento do rendimento coletável e da coleta do ano de 1995 - o que, salvo melhor opinião, não foi realizado no âmbito do presente processo.
S. Pelo que, entende a Fazenda Pública que, concatenando a prova produzida, não podia o Tribunal a quo ter dado como provado no ponto W do probatório “da qual não resultou qualquer prejuízo para a AF.”
POR TODO O EXPOSTO
T. Com a ressalva do sempre devido respeito, que é sempre muito, com o doutamente decidido não pode a Fazenda Pública conformar-se integralmente, porquanto considera que a douta sentença, no que respeita à correção referente a contribuição autárquica do ano de 2002, padece de erro de julgamento de facto, decorrente da errada valoração da prova produzida, e de erro de julgamento da matéria de direito, por errada aplicação do disposto nos art. 18º n.º 1 e 2 do CIRC.
Termina pedindo:
Deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida, na parte em que considerou ilegal a correção meramente aritmética, no exercício de 2002, referente a contribuição autárquica, com as legais consequências. Com o que se fará, como sempre, inteira e sã justiça!
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M.º Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da procedência do presente recurso.
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Os vistos foram dispensados com a prévia concordância dos Ex.mos Juízes Desembargadores-Adjuntos, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 657.º do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT.
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Questões a decidir no recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, tal como decorre do disposto nos arts. 635.º nºs 4 e 5 e 639.º do Código de Processo Civil (CPC), disposições aplicáveis ex vi art. 281.º do CPPT.
Assim sendo, no caso em apreço, atentos os termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso, há que apurar se a sentença padece dos erros de julgamento de facto e de direito que lhe são imputados, respetivamente, por ter dado como provado facto (identificado no probatório pela letra “w”) que não tem qualquer sustento na prova produzida, e por ter feito uma errada interpretação e aplicação ao caso concreto do princípio da especialização regulado no art. 18.º do CIRC e do princípio da justiça, anulando a correção feita pela Administração fiscal que não aceitou o registo contabilístico no exercício de 2002 de custos com contribuição autárquica apurados no ano de 1995.

II. Fundamentação
II.1. Fundamentação de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz:
IV – Matéria de facto
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Impugnante foi alvo de uma ação de inspeção levada a cabo pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças ..., iniciada em 17/11/2005, credenciada pela OI..........25, abrangendo os exercícios de 2002 e 2003 e para o ano de 2004, iniciada em 20/02/2006, credenciada pela OI00600201 – cf. fls. 47 e ss dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
B) No âmbito da aludida ação de inspeção foi elaborado relatório de inspeção de 09/05/2006 no qual se fixou matéria tributável de IRC por correções técnicas e métodos indiretos, para os anos de 2002 a 2004, nos seguintes termos e valores:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
cf. fls. 54 e ss do PA apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
C) Do referido RIT, os SIT exararam sob a epígrafe “descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria colectável” os seguintes considerandos:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
cf. fls. 57 e ss do PA apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
D) Do referido RIT, os SIT exararam sob a epígrafe “motivos e exposição dos factos que implicaram o recurso a métodos indiretos” os seguintes considerandos:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
cf. fls. 62 e ss do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
E) Do referido RIT, os SIT exararam sob a epígrafe “critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos” os seguintes considerandos:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
cf. fls. 70 e ss do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
F) A Impugnante foi notificada do RIT a que se alude na alínea antecedente em 12/05/2006 - cf. fls. 85 do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
G) Em 09/06/2006, a Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria colectável nos termos dos arts. 91 e ss da LGT - cf. fls. 86 e ss dos PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
H) Em 29/09/2006 reuniram os peritos da FP e do contribuinte não tendo sido obtido acordo tendo cada um elaborado o seu parecer- cf. fls. 165 e ss do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
I) Do parecer do perito do contribuinte extrai-se o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
cf. fls. 168 e ss do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
J) Do parecer do perito da FP extrai-se o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
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