Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2024

Data de publicação23 Abril 2024
ELIhttps://data.dre.pt/eli/acstj/4/2024/04/23/p/dre/pt/html
Número da edição80
SeçãoSerie I
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça
1/25
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2024
23-04-2024
N.º 80
1.ª série
SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2024
Sumário:O produto da venda dos bens penhorados em processo de execução, no qual tenha sido
proferida sentença de verificação e graduação de créditos, com trânsito em julgado, só é de
considerar pago ou repartido entre os credores, para os efeitos do artigo 149.º, n.º 2, do CIRE,
com a respectiva entrega. — O titular de um crédito reconhecido e graduado por sentença
transitada em julgado num processo de execução, apensado ao processo de insolvência do
devedor/executado, não está dispensado de reclamar o seu crédito, no processo de insol-
vência, se nele quiser obter pagamento.
Processo n.º9160/15.5T8VNG ‑H.P3 ‑A.S1 ‑A
Acordam no pleno das secções cíveis do Supremo Tribunal de Justiça
Vilaça & Salema—Construções Imobiliária,S.A., interpôs recurso para o pleno das secções cíveis
para uniformização de jurisprudência sob a alegação de que o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal
de Justiça (STJ) em 11 ‑10 ‑2022, já transitado em julgado, no processo n.º9160/15.5T8VNG ‑H.P3 ‑A.S1,
está em contradição, no domínio da mesma legislação e sobre duas questões fundamentais de direito,
com os seguintes acórdãos proferidos anteriormente pelo STJ: com o acórdão proferido em 30 -10 -2014,
no processo n.º2308/11.0TBACB.C1.S1 (acórdão fundamento 1) e com o acórdão proferido em 30 ‑06‑
‑2020, no processo n.º877/16.8T8AMT ‑B.P1.S2 (acórdão fundamento 2).
Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões foram os seguintes:
1—O presente recurso tem por objeto o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido nestes
autos, em 11/10/2022, já transitado em julgado, doravante acórdão recorrido, o qual está em contradição
com outros dois acórdãos deste mesmo Supremo Tribunal, anteriormente proferidos e já transitados
em julgado, por referência à mesma questão fundamental de direito.
2—Todos os acórdãos em presença foram proferidos no domínio da mesma legislação, não radi-
cando aí (numa eventual diversidade de enquadramento legislativo) o motivo da contradição, sabendo -se
e sendo certo que a orientação firmada no acórdão recorrido não está de acordo com jurisprudência
uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.
3—Há duas questões fundamentais de direito em que a dita contradição se manifesta e corporiza,
no confronto com outros tantos acórdãos, doravante referidos por acórdão fundamento 1 e acórdão
fundamento 2.
4—A primeira questão fundamental de direito sobre qual se verifica contradição de julgados con-
siste em saber se o produto da venda de bens penhorados efetuada em processo de execução fiscal,
aí já transitada em julgado a sentença de verificação de créditos, constitui ainda um bem integrante
do património do executado, depois declarado insolvente (declarado insolvente depois de realizada
a venda no processo e execução fiscal), suscetível de ser apreendido nos termos da norma enunciada
no n.º2 do artigo149.º do CIRE.
5— A esta questão respondeu o acórdão recorrido afirmativamente, considerando que, apesar
da venda realizada no processo de execução fiscal ser anterior à declaração de insolvência e de se
achar já transitada em julgado a sentença de verificação e graduação de créditos, o respetivo produto
(o produto da venda), no caso de não ter sido ainda entregue aos credores (exequente e reclamantes),
deve ser qualificado como bem do insolvente, antes executado, e apreendido, nos termos do n.º2 do
artigo149.º do CIRE.
6—Já o acórdão fundamento 1, porém, deu a esta mesma questão fundamental de direito uma
resposta radicalmente contraditória, como evidencia a leitura do seu sumário: “II— Tendo transitado
em julgado a sentença de verificação e graduação de créditos proferida no processo de execução fiscal
que correu termos contra os insolventes, ficou determinada a forma pela qual o produto da venda do
prédio penhora seria repartido pelos credores. III—Assim, cabendo apenas ao competente serviço de
2/25
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2024
23-04-2024
N.º 80
1.ª série
finanças—na qualidade de fiel depositário do preço —, proceder à entrega material dos respectivos
montantes, deve aquele processo considerar ‑se extinto e não pendente para efeitos de apreensão dos
bens prevista no art.85.º, n.º2, do CIRE. [...] V—Vendido o imóvel e transitada em julgado a sentença
de verificação e graduação de créditos, não podem as quantias provenientes da venda ser tidas ainda
como património dos executados, devendo antes ser consideradas como propriedade dos credores
que viram os créditos por si reclamados ali graduados e reconhecidos, pelo que, nesta situação, não
pode ocorrer a apreensão para o processo de insolvência da quantia referente ao produto da venda,
nos termos do artigo85.º, n.º2, do CIRE”.
7—Quanto a esta (a primeira) questão fundamental de direito, de modo a superar a contradição,
deve uniformizar -se jurisprudência no sentido da orientação sufragada no acórdão fundamento 1,
decidindo -se que o produto da venda, feita em processo de execução fiscal, é um bem que passa a ser
dos credores, ou que, pelo menos, deixa de ser do devedor, não podendo, em qualquer caso ser apreen-
dido no processo de insolvência que, posteriormente, contra ele se inicie e desenvolva.
8—A segunda questão fundamental de direito sobre qual se verifica contradição de julgados con-
siste em saber se o titular de um crédito reconhecido e graduado por sentença transitada em julgado,
em processo de execução, entretanto apenso ao processo de insolvência do devedor, antes executado,
está ou não dispensado de o reclamar neste último.
9—A esta questão respondeu o acórdão recorrido negativamente, considerando que o titular de
um crédito reconhecido e graduado em processo executivo por sentença transitada em julgado neces-
sita de observar o regime insolvencial, não estando dispensado do ónus de reclamar esse crédito sobre
o devedor insolvente.
10— O acórdão fundamento 2, porém, em flagrante contradição com o acórdão recorrido, dá
uma resposta radicalmente diferente (no sentido afirmativo) à mesma questão fundamental de direito
(a segunda das duas previamente anunciadas), nele se podendo ler que “tendo havido apensação do
processo de execução fiscal, onde o crédito do recorrente estava reconhecido e graduado como pri‑
vilegiado, estava este dispensado de proceder à sua reclamação formal no processo de insolvência”.
11—Quanto esta (a segunda) questão fundamental de direito, de modo a superar a contradição,
deve uniformizar -se jurisprudência no sentido da orientação perfilhada pelo acórdão fundamento 2,
decidindo -se que, tendo havido, como houve no caso julgado pelo acórdão recorrido, apensação do
processo de execução fiscal ao processo de insolvência, o credor ali reconhecido e graduado, está
dispensado de proceder à sua reclamação formal no processo de insolvência.
A massa insolvente de AA, ré no processo onde foi proferido o acórdão recorrido, respondeu. Na
sua resposta alegou, em síntese, que não havia contradição entre os acórdãos postos em confronto
pela recorrente, pelo que era de rejeitar o recurso para uniformização de jurisprudência, mas que, caso
assim se não entendesse, pedia se julgasse improcedente o recurso, negando -se o pedido formulado
pela recorrente.
O relator admitiu liminarmente o recurso, considerando:
• Que entre o acórdão recorrido e o acórdão do STJ proferido em 30 -10 -2014, no processo
n.º2308/11.0TACB.C1.S1, havia contradição no domínio da mesma legislação sobre a seguinte questão
fundamental de direito: “saber se o artigo149.º, 2, do CIRE, em sede de apreensão de bens para a massa
insolvente determinada pelo n.º 1 desse artigo149.º, conjugado com o artigo85.º, 1 e 2, do CIRE, se
aplica—e em que termos se aplica—ou não ao produto da venda de bens efectuada em processo de
execução fiscal, uma vez transitada em julgado a correspondente sentença de verificação, reconheci‑
mento e graduação de créditos, considerando ‑se ou não como um bem integrante do património do
executado esse mesmo produto, declarado insolvente depois de realizada a venda desses bens;
• Que entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido em 30 ‑06 ‑2020, no processo
n.º877/16.8T8AMT ‑B.P1.S2, havia contradição no domínio da mesma legislação sobre a seguinte ques-
tão fundamental de direito: “saber se a verificação e graduação de um crédito em processo exec utivo,

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT