Acórdão nº 1178/21.5T8FNC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Dezembro de 2023

Magistrado ResponsávelNUNO PINTO DE OLIVEIRA
Data da Resolução12 de Dezembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1.

AA, ao lado de quem figuram como intervenientes principais BB e CC, intentou contra DD a presente acção declarativa com processo comum, pedindo: I. — que seja anulado o contrato de transacção concluído entre EE, pai da Autora, e a Ré DD; II. — que, em consequeência, a Ré DD seja condenada a indemnizar a Autora em montante a liquidar em execução de sentença; III. — que seja declarado que a fracção BX, integrada no prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número 679/960325 e inscrito na matriz sob o artigo 3266.º, foi adquirida exclusivamente por EE; IV.— que, em consequência [da procedência do pedido enunciado em III], [seja cancelado], “a favor do mesmo” [i.e, a favor de EE], o registo de aquisição na parte lavrada a favor [da Ré DD] pela Ap. 58 de 20/05/1999; ou, subsidiariamente em relação aos pedidos dedusidos III. e IV, IV. — que seja declarado que a Ré DD deve à herança aberta por óbito de EE a quantia de € 64.843,73, “acrescida de juros à taxa supletiva legal a partir da citação até integral pagamento, correspondente ao contravalor em euros da metade do preço total de Esc. 26.000.000,00 (vinte e seis milhões de escudos) efectivamente pago pela aquisição da referida fracção”.

  1. A Ré DD contestou, defendendo-se por impugnação e por excepção.

  2. O Tribunal de 1.ª instância julgou improcedente a acção, absolvendo a Ré dos pedidos.

  3. Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação.

  4. A Ré DD contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

  5. O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou, por unanimidade, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.º instância.

  6. O dispositivo do acórdão recorrido é do seguinte teor: “Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação e confirma-se a sentença recorrida”.

  7. Inconformada, a Autora AA interpôs recurso de revista.

  8. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1º Mostram-se preenchidos os requisitos gerais de recorribilidade exigidos pelo artigo 629º, nº 1, do CPC, bem como se verifica a oposição de julgados prevista no 672º, nº 1, al. c), também do CPC, concretamente entre o douto Acórdão recorrido, e o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 27/09/2018, proferido no processo 17/14.8TBVZL.C1.S1, 7ª Secção, publicado in www.dgsi.pt.

    1. Com efeito, o douto Acórdão ora recorrido entendeu que: “Por outro lado, não se acompanha a jurisprudência e doutrina citadas nas alegações da apelante, no sentido de que estaríamos perante uma nulidade secundária inominada, sanada por não ter sido arguida ao abrigo do artigo 199º do CPC, tendo em atenção que a nulidade resultante da violação do artigo 92º do EOA não pode considerar-se uma simples irregularidade que se converte em nulidade por influir na decisão da causa, constituindo antes uma violação de norma que pretende assegurar a dignidade, segurança e confiança na actividade do advogado e que pode ser arguida pela parte em sede de recurso, mesmo que não o tenha sido no momento em foi cometida na sua presença”.

    2. Já o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 27/09/2018, proferido no processo 17/14.8TBVZL.C1.S1, 7ª Secção, publicado in www.dgsi.pt, entendeuque:“O valor probatório de um depoimento prestado em infração do sigilo profissional não fica afetado de modo absoluto, podendo, quando muito, constituir nulidade processual inominada a ser invocada pelo interessado, sob pena de sanação”.

    3. Integrou o objecto da Apelação da Recorrente, em relação a elementos probatórios da máxima relevância para a prova da respectiva causa de pedir – mormente a prova testemunhal constituída pelo depoimento da testemunha FF, Advogado – que a mesma não se encontrava sujeita a sigilo; 5º Mas, ainda que por hipótese se entendesse que o estivesse, designadamente nada havia sido a esse respeito sido invocado, e, como tal, a nulidade que daí derivasse já estaria sanada, por não haver sido invocada em devidotempo – tal como entendido no referido Acórdãodo SupremoTribunalde Justiça, expressamente invocado para o efeito, entendimento este do qual o douto Acórdão ora recorrido veio a divergir.

    4. Na verdade, na senda do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, verifica-se que “o direito à prova está constitucionalmente consagrado no art. 20º, da Constituição da República Portuguesa, como princípio geral do acesso ao direito e aos tribunais, que a todos é assegurado para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegido” e “a protecção do segredo não constitui um valor absoluto, há que fazer caso a caso uma ponderação dos valores em conflito (averiguação da verdade ou a protecção de direitos dos cidadãos beneficiados pelo segredo), por forma a determinar qual deles deve prevalecer”.

    5. A oposição respeita à natureza do vício que se considera afectar a prova produzida em violação do dever de sigilo, se é ou não dependente de invocação, se é ou não sanável.

    6. No silêncio do depoente e das partes, não se pode fazer equivaler, sob pena de absoluta preterição do referido direito à prova ínsito ao art. 20º, da Constituição da República Portuguesa, à violação do sigilo profissional, o mesmo efeito que corresponde à recusa do seu levantamento, caso houvesse sido suscitado e requerido.

    7. Assim, na senda do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo nº. 1178/21.5T8FNC, e, bem assim, na senda da doutrina citada, deve entender-se que está em causa uma “nulidade processual inominada a ser invocada pelo interessado, sob pena de sanação”.

    8. Quando assim porventura se não entenda, isto é, se se entender que está em causa uma nulidade insanável, deve a mesma então determinar a anulação de todo o processado, a partir da sua prática, impondo-se para todos os efeitos o regresso do processado à fase processual em que devia então ter sido requerido o incidente de levantamento do sigilo profissional, seguindo-se os ulteriores termos processuais até final.

    9. Assim se pugna pela efectiva admissão do presente Recurso de Revista excepcional, bem como pela respectiva procedência, devendo ser revogado o douto Acórdão recorrido, e determinada a baixa do processo para a respectiva prossecução em conformidade, de modo a se fazer Justiça.

  9. A Ré DD contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade e, subsidiariamente, pela improcedência do recurso.

  10. A Formação prevista no artigo 672.º do Código de Processo Civil admitiu o recurso de revista por via excepcional.

  11. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. artigo 608.º, n.º 2, por remissão do artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a decidir, in casu, são as seguintes: — se, de acordo com o artigo 92.º, n.º 5, do Estatuto da Ordem dos Advogados, o depoimento do Dr. FF e os documentos juntos à petição inicial com os n.ºs 21 e 22 podem fazer prova em juízo; — se o depoimento prestado em violação do sigilo profissional...

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