Acórdão nº 758/22.6T8AGD-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Dezembro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução07 de Dezembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. Caixa Geral de Depósitos, Lda.

intentou execução para pagamento de quantia certa contra AA e BB, tendo por base terem avalizado as livranças em execução, as quais foram emitidas para garantia das operações identificadas nas livranças PT ...............92 - Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente e PT ...............93 - Contrato de Prestação de Garantia Bancária.

Os executados deduziram oposição, alegando, entre outros fundamentos, a excepção de prescrição.

Foi proferido saneador sentença que decidiu julgar improcedentes os embargos de executado, determinando o prosseguimento da execução.

Inconformados, interpuseram os executados recursos para o Tribunal da Relação do Porto, pedindo a alteração da decisão relativa à matéria de facto e a reapreciação da decisão de direito.

Por acórdão de 20-04-2023, o recurso foi julgado improcedente, confirmando-se, com fundamentação essencialmente convergente e sem voto de vencido, a decisão do acórdão recorrido.

2.

Vieram os executados interpor recurso, por via excepcional, para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual foi admitido por acórdão da Formação prevista no art. 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

3.

Formularam os Recorrentes as seguintes conclusões: [excluem-se as conclusões relativas à admissibilidade do recurso por via excepcional] «II - As duas decisões que aqui são alvo de recurso confundem conceitos e, de forma contraditória e obscura, analisam uma questão que em bom rigor não é a que lhes foi colocada, ainda que tentem, depois, chegar a uma conclusão que tente justificar a improcedência da exceção que lhes foi trazida à colação! Aliás, aplicam um regime jurídico específico/solução jurídica para uma situação fáctica que não é a que foi invocada pelos Recorrentes.

III - Há uma manifesta confusão, por parte destas doutas instâncias, que até citam jurisprudência relativamente a situações de facto completamente distintas da vertida nos presentes autos, entre aquilo que é relação subjacente/causal e aquilo que é a relação cambiária e os respetivos regimes de prescrição (distintos) aplicados a cada uma destas (distintas) relações.

IV - Os Recorrentes não põem em causa que o prazo de prescrição de uma livrança (e/ou da obrigação/relação cambiária) é de três anos, nos termos previstos no artigo 70.º da LULL, o que invocam na realidade – e sobre isso ambas as instâncias acabam por não tomar concreta posição numa verdadeira omissão de pronúncia que aqui vai à cautela invocada – é que a obrigação causal, ou seja, o crédito que integra a relação subjacente está prescrito (por lhe ser aplicável o prazo de cinco anos nos termos supra referidos e contando o vencimento desde a data de insolvência, nos termos supra melhor desenvolvidos).

V - E que isso, no seu modesto entendimento, implicava necessariamente a extinção da relação jurídica da garantia que lhe era meramente acessória – in casu duas livranças – citando para o efeito até (a parca) jurisprudência de referência com esta posição jurídica. Ainda para mais quando à data do preenchimento da livrança este prazo de prescrição já tinha decorrido na sua integra e se extinto a obrigação causal.

VI - A questão que aqui colocamos – nomeadamente quais são os efeitos jurídicos do reconhecimento da prescrição do crédito que integra a relação subjacente na relação jurídica da garantia que lhe é acessória, i.e, na relação cambiária – tem sido alvo de parca discussão jurisprudencial e doutrinal.

VII - Se a obrigação causal se extingue por efeitos da prescrição – ou até por outra causa jurídica (novação, etc.) – porque é que a relação cartular também não se extinguirá? Irrelevar/isentar de qualquer efeito (prático) a prescrição/extinção do crédito que integra a relação subjacente na acção cambiária não será esvaziar o instituto jurídico da prescrição como causa de extinção da obrigação por completo? E pôr em causa a tutela e a defesa dos consumidores e o tráfego comercial? Porque é que o prazo de prescrição do título dado à execução (sendo cheque, livrança ou letra) se há de impor/substituir ou neutralizar o efeito da prescrição do crédito que integra a relação subjacente? O Exequente poderá ficar desprovido de meios de defesa – à luz dos institutos e regimes previstos no Código Civil - em situações em que apesar da dívida que contraiu há muito, pelo decurso do tempo, se ter extinguido, o credor continuar a exigir-lhe o respetivo pagamento por este ter assinado uma livrança ou letra em branco? VIII - Importa, assim, respondendo às questões que aqui suscitamos, fixar e balizar os termos, efeitos, consequências e limites que a prescrição/extinção da obrigação causal importa ou importará na relação cartular/cambiária, em especial existindo acção executiva ocorrer em que exista título dado à execução cuja data de vencimento aposta seja inclusivamente posterior à data em que se verificou ocorrer a prescrição do crédito que integra a relação subjacente.

[excluem-se as conclusões relativas à admissibilidade do recurso por via excepcional] X - Os Recorrentes estão convencidos que não lhes pode ser exigido o pagamento de um crédito que prescreveu, ainda que não tenha ocorrido a prescrição do título cambiário que foi, posteriormente, dado à execução, não podendo, de todo, aceitar a interpretação extensiva e manifestamente ampla que é feita pelas duas instâncias da lei, em especial com recurso a um diploma especial (LULL) que não derroga claramente a lei geral (Código Civil), quanto a este tema/matéria, nem se pode sobrepor aos efeitos legalmente previstos que decorrem para o devedor/credor perante a extinção da obrigação de pagamento.

XI - No presente processo e até à presente data, a única questão que verdadeiramente se decidiu foi que face aos factos assentes as livranças não estavam prescritas, o que não é de todo o que constitui o objeto da exceção invocada em sede de embargo executada e dos posteriores(s) recurso(s) que recaíram sobre a sentença/acórdão e sequer foi posto em causa! XII - Sem prejuízo de se reconhecer grande consideração aos excelentíssimos julgadores que subscreveram a sentença e o acórdão nestes autos, fazer-se a interpretação que os mesmos fazem será permitir a cobrança infindável, e/ou, a exigência judicial eterna, de um qualquer crédito, já que se aceita, sem qualquer fundamento legal razoável ou lógica, que a prescrição do crédito não tem quaisquer efeitos quando existe uma livrança ou letra em branco cuja data de vencimento pode ser aposta livremente pelo credor.

[excluem-se as conclusões relativas à admissibilidade da revista por via excepcional] XXV - O Acórdão alvo de recurso padece, na nossa modesta opinião, de algumas imprecisões e contradições, que inquinam irreversivelmente a decisão dele constante, pelo menos quanto à decisão/questão supra melhor identificada e que constitui o objeto do presente recurso.

XXVI - Discordam, desde logo, os Recorrentes com a improcedência da exceção de prescrição do crédito que integra a relação subjacente, oportunamente invocada no seu embargo de executados, a qual sendo reconhecida teria necessariamente de implicar a extinção da relação cambiária e, logicamente, da instância executiva.

- Conforme resulta até da matéria de facto dada por provada e com interesse para a apreciação do presente recurso: o Recorrente AA era gerente e sócio da sociedade M..., Lda, que veio a ser declarada insolvente a 5 de Abril de 2016; A operação bancária mencionada na livrança n.º ................81 (PT...............92) refere-se a um contrato de abertura de crédito em conta corrente, datado de 27 de Julho de 2010; E segundo a demonstração da Nota de Débito junta pela Exequente na sua Reclamação de Crédito (no referido processo de insolvência), a data da “última prestação paga” (a 17.ª) foi “01/10/2014”, quando o capital em dívida era de € 72.200,00. Tendo a Exequente, com referência a este contrato, reclamado, à data da insolvência, um crédito de € 81.882,20; A outra livrança executada (n.º ...............73), refere-se a um contrato para prestação de garantia bancária (com operação n.º ...........93), datado de 9/12/2010 (e não de 13/12/2010, conforme resulta das cartas de interpelação juntas pela Exequente), em que foram pagas pelo menos 13 prestações, segundo documentação do próprio Banco; A livrança n.º ................81 tem como data de emissão 27/09/2010, data de vencimento 24/09/2021 e valor de 120.765,00€; A livrança n.º ...............73 tem como data de emissão 09/12/2010, data de vencimento 24/09/2021 e valor de 3.605,00€; Os Recorrentes foram citados da acção executiva ora em crise no final de abril de 2022.

XXVII - Ora, dos elementos supra fornecidos resulta claro que os créditos em causa já prescreveram por lhes ser aplicável o prazo de prescrição quinquenal previsto na alínea e) do artigo 310.º do Código Civil, conforme defende a melhor jurisprudência.

XXVIII - Aliás, salvo melhor opinião, parece assente e indiscutível, nos presentes autos (e na jurisprudência portuguesa!), que o prazo de prescrição dos créditos que integram as relações subjacentes nos autos é de cinco anos, porque embora acabem por decidir noutro sentido (desvirtuando o que efetivamente está em discussão e o ponto de partida da discussão suscitada pelos Recorrentes: a prescrição do crédito causal), o certo é que quer a sentença, quer o acórdão, ora em crise, aceitam esta posição.

XXIX - É que na sua fundamentação, a sentença é a primeira a citar o Acórdão de Uniformização de jurisprudência 6/2022 publicado no DR I S, de 22.09.2022, que à data tinha meras semanas e de igual forma, o Acórdão ora em crise, aceita que o prazo de prescrição eram cinco anos, mas inexplicavelmente vem referir, sem quaisquer elementos nos autos que suportem tal alegação, que por os créditos terem sido reclamados nos autos de insolvência, tal importou interrupção da prescrição nos termos do artigo 323.º do Código Civil, o que não faz qualquer sentido e até é...

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