Acórdão nº 644/22.0PBEVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Dezembro de 2023
Magistrado Responsável | MARIA CLARA FIGUEIREDO |
Data da Resolução | 05 de Dezembro de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório
Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que correm termos no Juízo Local Criminal de … - Juiz …, do Tribunal Judicial da Comarca de …, com o n.º 644/22.0PBEVR, foi o arguido AA, filho de BB e de CC, natural de … (…), nascido em …1974, divorciado, pedreiro, com domicílio na …, Caixa N.º …., …, em …, condenado pela prática, na forma consumada, de um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152º, nº1 al. a) e c), n.º2, al. a), 4 e 5 do CP, na pena de dois anos e quatro meses de prisão, suspensa na sua pelo período de dois anos e quatro meses, subordinada a suspensão ao cumprimento de um regime de prova destinado a trabalhar as competências relativas controlo emocional e capacidade de reagir à adversidade e frustração, bem como de formular a sua atividade de acordo com a norma comunitária, bem como à frequência obrigatória de programa dirigido a agressores de violência doméstica
Mais foi o arguido condenado, ao abrigo do disposto nos artigos 65.º, n.º1, 152.º. n.º 4 e 5 do Código Penal e 35.º da Lei n.º 112/2009, na pena acessória de proibição de contactos com a vítima – incluindo o afastamento da residência e do local de trabalho daquela por distância não inferior a 300m – pelo período de dois anos e quatro meses, cuja fiscalização será realizada mediante recurso a meios de controlo à distância pelo período de dois anos e quatro meses, uma vez recolhido o consentimento da vítima, tendo sido dispensado o consentimento do arguido nos termos do artigo 36.º, n.º7 da Lei n.º 112/2009, em virtude de o recurso aos meios técnicos de controlo à distância ter sido considerado imprescindível para proteção dos direitos da vítima
Foi ainda condenado o arguido no pagamento à vítima da quantia de €700,00 (setecentos euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais
*** Inconformado com tal decisão, veio o arguido interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever: “1. Na sentença posta em crise, concluiu o tribunal que atenta a prova produzida, encontravam-se duas versões antagónicas a respeito do ocorrido, a do arguido o qual nega a ocorrência e a versão da ofendida a qual narrou com detalhe
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A restante prova relativamente as outras duas testemunhas considerou o tribunal a quo (essencialmente) indirecta 3. Quanto às declarações do arguido estas não mereceram a atribuição de particular credibilidade
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Considerando a versão da ofendida mais firme, assertiva e detalhada 5. O depoimento da ofendida/testemunha não pode ser considerado convincente e valorado da forma como o tribunal a quo o fez, por nitidamente parcial e principal interessada na condenação do arguido, quando se socorre de notas manuscritas, cujo a autoria das mesmas se desconhece
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O juiz não pode deixar-se fascinar por uma tese, uma versão, deve evitar convicções apriorísticas que levam a visões lacunares e unilaterais dos acontecimentos
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Não deve o juiz ter como certo que o acusado mente e a(o) ofendida(o) conta sempre a verdade
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Este tribunal não pode deixar de censurar a decisão do tribunal recorrido por este ter dado prevalência às declarações prestadas na audiência pela testemunha/ofendida
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O depoimento da testemunha/ofendida merece a mesma credibilidade que as declarações do arguido, em julgamento; 10. O Tribunal da relação não deve deixar de apreciar se a valoração dos depoimentos foi feita de acordo com as regras da lógica e da experiência, isto é, se os juízos de racionalidade, de lógica e de experiência confirmam ou não o raciocínio e a avaliação feita em primeira instância com base em depoimentos efectuados pela testemunha/ofendida com recurso a apontamentos os quais se desconhece a autoria dos mesmos, dando maior credibilidade ao seu depoimento em detrimento das declarações do arguido que negou os factos pelo qual vem acusado, e em que as testemunhas não confirmam os factos constantes da acusação
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O juiz não pode deixar-se fascinar por uma tese, uma versão, deve evitar convicções apriorísticas que levam a visões lacunares e unilaterais dos acontecimentos
O juiz deve fazer a apreciação da prova segundo as regras do entendimento correcto e normal, isto é, tem de avaliar as provas, não arbitrariamente ou caprichosamente, 12. Termos em que, tendo o acórdão recorrido violado, igualmente, esta disposição legal, deve a decisão em crise ser revogada, com as demais consequências legais
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A ofendida não deduziu pedido de indemnização civil, nem o arguido foi notificado do eventual arbitramento de indemnização civil
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Somente em fase de julgamento e quando nos termos do artº 352 do C.P.P o arguido não se encontrava na sala foi a ofendida questionada se prescindia ou não do arbitramento daquela indemnização
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Não foi assegurado o respeito pelo contraditório
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Neste sentido e dando-se por integralmente reproduzido o acima exposto, quanto à valoração dos depoimento da ofendida e do arguido, e respectivo arbitramento de indemnização à vitima sem o respeito pelo exercício do contraditório (remissão que se faz em abono na economia processual); 17. A questão suscitada pelo recorrente, sendo na sua essência de facto, pressupõe uma questão de direito, relacionada com o valor probatório testemunha/ofendida e a violação do direito do contraditório
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O depoimento da ofendida não pode ser valorado considerando o seu recurso a notas manuscritas dos quais se desconhece a sua autoria e em dificuldade em relatar eventos recentes
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A valoração dada pelo tribunal ao depoimento da testemunha DD não pode ter uma valoração diferente da do arguido, tendo em conta como o mesmo foi efectuado com recurso a notas para factos alegadamente praticados à 8 meses
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O Tribunal fez uma errónea apreciação da prova, chegando mesmo a contrariar as regras da lógica e da experiência e a retirar relevância probatória a alguns factos apreciados, cometendo, neste particular, erro de julgamento 21. O Recorrente não se conforma com a genérica e liminar valorização da prova, que ficou muito aquém do que resulta da prova por si elencada
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Pelo que deve-se concluir pela nulidade de valoração realizadas pelo tribunal a quo sobre as provas apresentadas.” * O recurso foi admitido
Na 1.ª instância, o Ministério Público pugnou pela improcedência do recurso e pela consequente manutenção da decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1- O arguido AA interpôs recurso da Douta Sentença proferida no dia 05.07.2023, referência …, que o condenou nos presentes autos
2- Foram aplicadas ao arguido as seguintes penas: “a) Condenar o arguido AA, pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica agravado, previsto e punidos pelo artigo 152º, nº1 al. a) e c), n.º2, al. a), 4 e 5 do Código Penal, na pena de dois anos e quatro meses de prisão; b) Suspender, pelo período de dois anos e quatro meses a execução da pena de prisão aplicada ao arguido AA, subordinando a suspensão da mesma ao cumprimento de um regime de prova destinado a trabalhar as competências relativas controlo emocional e capacidade de reagir à adversidade e frustração, bem como de formular a sua actividade de acordo com a norma comunitária, bem como à frequência obrigatória de programa dirigido a agressores de violência doméstica
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Condenar o arguido AA ao abrigo do artigo 65.º, n.º1, 152.º. n.º4 e 5 do Código Penal e art. 35.º da Lei n.º 112/2009, na pena acessória de proibição de contactos com a vítima DD, incluindo o afastamento da residência e local de trabalho desta desta, por distância não inferior a 300m, pelo período de dois anos e quatro, cuja fiscalização será realizada mediante recurso a meios de controlo à distância pelo período de dois anos e quatro meses, uma vez recolhido o consentimento da vítima;(…)”
3- Para sustentar o seu recurso concluiu o arguido/recorrente, em síntese, nos seguintes termos: • Contesta que tenha sido dada credibilidade ao depoimento da ofendida; • Invoca que o Tribunal a quo devia ter dado credibilidade às declarações do arguido e descredibilizar a versão da ofendida; • Invoca que o Tribunal a quo fez uma genérica e liminar valorização da prova; • Invoca que “o depoimento da ofendida não pode ser valorado considerando o seu recurso a notas manuscritas dos quais se desconhece a sua autoria e em dificuldades em relatar eventos recentes”; • Entende que houve violação do contraditório na matéria respeitante ao arbitramento da indemnização civil, invocando que o arguido se encontrava afastado quando a vítima foi questionada se prescindia ou não do arbitramento, afirmando que a vítima não deduziu pedido de indemnização civil, nemo arguido foi notificado do eventual arbitramento de indemnização civil
4- Contudo, contrariamente ao pugnado pelo recorrente, a Douta Sentença recorrida não enferma de qualquer vício na decisão da matéria de facto e na apreciação da prova
5- Acresce que o Mmo. Juiz efetuou uma correta apreciação da prova produzida, bem como fundamentou de forma clara o raciocínio lógico-dedutivo que levou a dar como provados factos suscetíveis de integrar o crime de violência doméstica pelo qual o arguido foi condenado
6- Com efeito, consideramos que andou bem o Tribunal a quo ao dar credibilidade à vítima e dar menor credibilidade ao arguido
7- Acresce que o próprio arguido admitiu condutas que integram os elementos objetivos do tipo de crime de violência doméstica, apesar de procurar desvalorizar as suas condutas
8- Contrariamente ao afirmado em sede de recurso, a Douta Sentença recorrida contém uma explicação concreta para não atribuir credibilidade à versão do arguido e para credibilizar o depoimento de DD
9- Contrariamente ao defendido pelo recorrente ,o recurso a notas manuscritas pela testemunha foi legítimo e foi permitido pelo Tribunal
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- Acresce que não foi invocada qualquer irregularidade ou outro vício no decurso do...
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