Acórdão nº 78/20.0GACUB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Dezembro de 2023

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução05 de Dezembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal da Relação de Évora: A - Relatório: Nos autos de Inquérito supra numerados que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca ... - Juízo de Competência Genérica ... - e em que é arguido AA, a Mmª Juíza lavrou despacho a 27-01-2023 a considerar não se ter “regularmente notificada a acusação ao arguido por”: - a acusação pública foi notificada em língua portuguesa (cfr. fls 78), sendo que resulta abundantemente dos autos que o arguido não domina a língua, tanto mais que prestou TIR em espanhol.

- da notificação de fls. 78 não se descortina qual das assinaturas é a do arguido, que deve estar, naturalmente, identificada.

* Inconformado, o Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido interpôs recurso do despacho, com as seguintes conclusões: 1. Em sede do despacho recorrido, a MM.ª Juíza de Direito decidiu devolver os autos ao Ministério Público para reparação da irregularidade processual de falta de notificação regular do arguido.

  1. Com tal decisão, foram violados os artigos 32.º e 219.º da Constituição da República Portuguesa e artigos 118.

    º, 123.º, 262.

    º e 311.º do Código de Processo Penal.

  2. Embora não se considere como certa a irregularidade da notificação, uma vez que não existem certezas nos autos que o arguido não domine a língua portuguesa, admitisse que traria maiores certezas da regularidade da notificação se a acusação tivesse sido traduzida em língua espanhola, razão pela qual não colocamos em causa a irregularidade da notificação apontada pelo Tribunal ad quo.

  3. Concordamos inteiramente com o teor do despacho recorrido quando se refere que a falta de notificação do arguido é uma irregularidade processual.

  4. Porém, nos termos do artigo 118.

    º e 123.º do Código de Processo Penal, tal regularidade não é de conhecimento oficioso, porquanto não contende com direitos de defesa do arguido.

  5. Pelo que, não poderia a MM.ª Juíza de Direito ter apreciado da irregularidade da notificação sem alegação por parte de um sujeito processual.

  6. Ainda que considerássemos que tal vício corresponde a uma irregularidade de conhecimento oficioso, a decisão recorrida põe em causa a independência e autonomia do Ministério Público, violando os artigos 32.º e 219.º da Constituição da República Portuguesa.

  7. O Ministério Público não recebe ordens nem directivas de quaisquer outras entidades.

  8. O Ministério Público é a autoridade judiciária a quem cumpre promover o processo penal e a direcção do inquérito, conforme artigos 48.º e 262.

    º do Código de Processo Penal.

  9. Com o devido respeito por opinião contrária, não cabe no leque de competências do Juiz ordenar ao Ministério Público (ainda que indirectamente), a prática de quaisquer actos processuais.

  10. O artigo 123.º, n.º 2 do Código de Processo Penal é claro quando refere que “ordena-se oficiosamente a reparação da irregularidade”.

  11. A irregularidade mantém-se com a remessa dos autos ao Ministério Público, pelo que o acto ordenado pelo Tribunal ad quo em nada contribuiu para a sanação de tal vício processual.

  12. Apenas impôs ao Ministério Público a prática de um acto processual que visa a reparação da irregularidade.

  13. Tendo o Tribunal conhecimento da morada do TIR, o mesmo certamente poderia proceder à notificação da acusação traduzida.

  14. Tal solução, além de mais célere, é também uma que não colocaria em causa a independência e autonomia do Ministério Público e a que nos parece mais conforme a Constituição da República Portuguesa.

    Pelo exposto, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, e, em consequência, o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que receba a acusação deduzida pelo Ministério Público ou, caso se considere que, que estamos perante uma irregularidade de conhecimento oficioso, substituindo-o por outro que determine a reparação dessa irregularidade pela secretaria do Juízo de Competência Genérica ..., o que se requer aos Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação de Évora.

    * O arguido não apresentou resposta.

    Nesta Relação, a Exmª Procuradora-geral Adjunta, emitiu parecer.

    Foi observado o disposto no nº 2 do artigo 417° do Código de Processo Penal.

    ***** B - Fundamentação: São elementos de facto relevantes e decorrentes do processo os que constam do relatório que antecede, os que se indicam de seguida, bem como o teor do despacho recorrido, que se transcreve: «Compulsados os autos, verifica-se que foi expedida carta rogatória para notificação da acusação pública ao arguido (cfr. ofício datado de 27-10-2022).

    Porém, constata-se igualmente que a acusação pública foi notificada em língua portuguesa (cfr. fls 78), sendo que resulta abundantemente dos autos que o arguido não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT