Acórdão nº 2687/22.4T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelMÁRIO BRANCO COELHO
Data da Resolução07 de Novembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora No Juízo do Trabalho de Faro, AA propôs acção de processo comum contra J…, Lda.

, pedindo o reconhecimento da justa causa na resolução do contrato de trabalho que mantinha com a Ré e a condenação desta a pagar-lhe € 2.093,62 a título de acréscimo com deslocações decorrentes da transferência para local de trabalho diverso, € 912,00 a título de horas de formação profissional não proporcionada; € 6.400,63 a título de indemnização devida pela resolução do contrato por iniciativa da trabalhadora; e € 8.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, tudo acrescido de juros de mora vencidos e vincendos.

Para o efeito, invocou assédio praticado pela entidade patronal que tornou praticamente impossível a manutenção da relação laboral.

Contestando, a Ré excepcionou a caducidade do direito, pois decorreram mais de 30 dias até à data de comunicação da resolução do contrato pela trabalhadora, e impugnou os factos alegados na petição inicial.

Alegando a ilicitude da resolução do contrato, a Ré deduziu reconvenção no montante de € 1.330,00.

Respondeu a A., alegando ter comunicado atempadamente a resolução do contrato.

Após julgamento, a sentença julgou improcedente a excepção de caducidade e, em relação aos pedidos, decidiu: A) Julgar a acção parcialmente procedente, reconhecendo que a A. procedeu à resolução do contrato de trabalho com justa causa, condenando a Ré a pagar uma indemnização no valor de € 5.689,44 (calculada com referência a 40 dias de retribuição base por cada ano completo de antiguidade), bem como € 912,00 a título de horas de formação profissional não proporcionada, e € 8.000,00 pelos danos não patrimoniais, tudo acrescido de juros legais; B) Absolver a Ré do restante peticionado; C) Julgar improcedente o pedido reconvencional.

Inconformada, a Ré recorreu.

Visto que as suas conclusões não são, propriamente, um modelo de capacidade de síntese, como exigido pelo art. 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aqui deixamos identificadas as questões que ali são abordadas: 1.ª Impugnação da matéria de facto – a Recorrente propõe que se considerem não provados os factos constantes da sentença nas als. S) a QQ), VV) a AAA), DDD) e EEE); 2.ª Excepção de caducidade – a Recorrente propõe que esta excepção seja julgada procedente, pois a trabalhadora esteve de baixa médica no período de 13.06 a 21.09.2021, e apenas comunicou a resolução do contrato por carta expedida a 18.10.2021; 3.ª Em consequência, deve ser julgado procedente o pedido reconvencional; 4.ª A indemnização por danos não patrimoniais, no valor de € 8.000,00 não tem fundamento factual nem jurídico.

Não foi oferecida resposta.

Nesta Relação de Évora, a Digna Magistrada do Ministério Público produziu parecer, propondo que ao recurso seja negado provimento.

Cumpre-nos decidir.

Impugnação da matéria de facto (…) Em resumo, a impugnação da matéria de facto deduzida pela Recorrente vai julgada totalmente improcedente.

A matéria de facto fixa-se assim: A) A Autora foi admitida ao serviço da empresa J…, Lda., em 01 de Maio de 2015 e pelo período de 1 ano, com início a 01 de Maio de 2015 e termo em 30 de Abril de 2016, para sob as suas ordens, direcção e fiscalização lhe prestar, mediante retribuição, os serviços correspondentes à categoria caixeira de 3ª e acessoriamente tarefas de limpeza da loja, mediante o pagamento do montante mensal ilíquido de 505,00 € (quinhentos e cinco euros), acrescido de subsídio de alimentação no valor diário de € 5,47 e abono para falhas no valor de € 15,82;[1] B) A A. auferia ultimamente € 665,00 de vencimento base; C) O horário de trabalho acordado foi de 40 horas semanais, distribuídas entre segunda a domingo, em regime de horário flexível; D) A sociedade Ré tem por objecto comercial o exercício da actividade de hotelaria e comércio de vestuário e acessórios de moda, a retalho; E) Consta da cláusula 3.ª do acordo de trabalho celebrado entre A. e R. que o trabalho seria prestado pela Autora no Centro Comercial Fórum Algarve, Loja …, em Faro; F) A A. beneficiou de licença de maternidade até dia 26 de Julho de 2018; G) Poucos dias antes do término da licença de maternidade, a A. solicitou à Ré que a sua actividade fosse prestada no turno da manhã, já que não tinha como compatibilizar a sua vida familiar com horários de trabalho mais tardios; H) A Autora contava apenas, como rede de apoio na prestação de cuidados à criança, com uma avó de idade avançada e com o progenitor, este a trabalhar em turnos rotativos; I) A Ré demonstrou abertura à solicitação apresentada e, poucos dias antes do regresso da Autora ao trabalho, apresentou à mesma um horário do qual decorria que a actividade passaria a ser prestada no estabelecimento da empregadora no Mar Shopping, em Loulé; J) Nesta sequência a, A. veio a prestar, por instruções da Ré, os seguintes dias de actividade no Mar shopping Loulé: 4 dias em Julho, 24 em Agosto, 21 em Setembro, 23 em Outubro, 20 em Novembro, 24 em Dezembro de 2018, 20 em Janeiro, 22 em Fevereiro, 18 em Março, 24 em Abril, 21 em Maio, 23 em Junho, 14 em Julho, 8 em Agosto, 17 em Setembro, 19 em Outubro, 14 em Novembro, 14 em Dezembro de 2019, 15 em Janeiro, 12 em Fevereiro, 10 em Março, 13 em Agosto, 14 em Setembro, 12 em Outubro, 13 em Novembro e 15 em Dezembro de 2020; K) A A. reside e residiu, durante todo o período do vínculo laboral, na Praia de Faro; L) Da Praia de Faro ao Centro Comercial Mar Shopping, em Loulé, distam 13,8 km; M) Da Praia de Faro ao Centro Comercial Fórum Algarve distam 7,1km; N) A transferência da Autora para o estabelecimento de Loulé, significou um acréscimo de 6.70km por trajecto, importando um acréscimo de deslocações por cada dia de trabalho prestado no Mar Shopping de 13,40km (6.70km x 2); O) Em virtude da dita transferência, a Autora necessitou percorrer as mencionadas distâncias em viatura própria; P) A R. não ministrou à A. formação profissional nos anos de 2015 a 2018 e de 2020 e 2021; Q) A A. enviou à R. carta datada de 18.10.2021, que a R. recebeu, com o seguinte teor: “Durante a vigência do meu contrato de trabalho tenho vindo a ser submetida a condições de trabalho indignas, que constituem assédio moral, por parte de V. Exa, entidade empregadora, na pessoa da Exma. Senhora BB. As situações a que sou submetida têm vindo a agravar-se, tornaram-se numa escalada crescente de abusos, chegando a um ponto insustentável, destruindo a minha dignidade e degradando a minha saúde mental e impossibilitando a subsistência de qualquer relação laboral. Entre estes abusos passo a relatar alguns exemplos praticados de forma repetida e continuada pela Exma. Senhora BB. No cumprimento das minhas funções fui, reiteradamente, obrigada, por V. Exa, a vender artigos por si seleccionados, os quais diferenciava e diferencia, com o preço marcado a verde e código "01", sem que os mesmos fossem registados no respectivo programa de facturação, por forma a que o resultante da venda não fosse devidamente facturado, não apresentando assim a empresa tanto lucro e consequentemente não pagando os respectivos impostos e comissões de venda aos centros comerciais, onde se situam as duas lojas de V. Exa. Tudo isto com a agravante de não poder entregar a respectiva factura ao cliente, sempre que este a solicitava posteriormente, fazendo-me passar por constrangimentos e exposição ao enxovalho dos clientes sempre que estes voltam mais tarde e solicitam o referido documento ou pretendessem realizar uma troca, o que se tomava impossível pois não existia factura e V. Exa proíbe trocas se o cliente não apresentar factura. Sempre manifestei a V. Exa a minha repulsa por esta prática que V. Exa me obrigava a realizar sob pena de ser despedida, ouvindo de V. Exa frases desestabilizadoras e atemorizadoras como: "estás mal despede-te, porque é que não te despedes? ", "estás mal muda-te". Sempre que eu argumentava e dizia que nunca me iria despedir, porque sou mãe solteira de uma criança de 3 anos, e necessito muito do meu salário, V. Exa rebatia com "vais te despedir vais, porque eu não despeço ninguém, faço com que se despeçam". Fui também coagida a mentir aos clientes sempre que estes perguntavam se existia outra tabacaria no centro comercial e quando respondia que sim, explicando onde ficava e V. Exa estava presente ameaçava-me com frases como: "se não concordas com as minhas ordens despede-te", "no final do mês vais receber à outra tabacaria". Era ainda obrigada a dizer aos clientes IQOS que não sabia da existência da Pop-Up IQOS quando estes tinham ordens de troca de dispositivos para esse ponto de troca e não para a tabacaria de V. Exa, causando-lhes transtorno, sendo obrigada a mentir-lhes dizendo que teriam que ligar novamente para a linha de apoio e pedir a troca para a tabacaria de V.Exa. pois era um engano da Tabaqueira II SA e não existia outro ponto de trocas no centro comercial além do de V.Exa. Essa pressão que V. Exa exercia sobre mim tinha o intuito de gerar números...

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