Acórdão nº 9/20.8GEPLM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelEDGAR VALENTE
Data da Resolução07 de Novembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

No Juízo Central Criminal de … do Tribunal Judicial da Comarca de … corre termos o processo comum colectivo n.º 9/20.8GEPLM, tendo aí, após julgamento, sido proferido acórdão com o seguinte dispositivo (transcrição): “Pelo exposto supra, o Tribunal decide:

  1. ABSOLVER o arguido AA do cometimento de 1 (um) crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, n.º 1, alíneas c) e e) da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro; b) CONDENAR o arguido AA do cometimento, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25º, alínea a) do Decreto Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referência às Tabelas I-A e I-B anexas, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão; c) Suspender a execução da pena indicada em b) pelo período da sua duração (3 anos e 6 meses), subordinando-se a suspensão a regime de prova, a delinear e acompanhar pela DGRSP, fazendo pressupor, como condição intrínseca, o dever do arguido comparecer naqueles serviços e manter-se contactável aos técnicos responsáveis pelo acompanhamento da sua situação, seguindo as orientações pelos mesmos firmadas no plano a homologar por este Tribunal;” Inconformado, o MP interpôs recurso de tal decisão, extraindo da motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1ª – O objecto do recurso circunscreve-se à decisão de suspender a execução da pena de três anos e seis meses de prisão aplicada ao arguido; 2ª – Contra o arguido sobrelevam a expressiva quantidade das substâncias estupefacientes detidas (que levou o tribunal a alcandorar a ilicitude e a gravidade do facto a um “patamar relevante”), as quatro condenações penais em outros tantos processos já sofridas em momento anterior ao da prática dos factos (uma em pena de multa, duas em pena de prisão com execução suspensa e outra em pena de prisão efectiva, esta pela prática do mesmo crime), o cometimento posterior de novo ilícito criminal (pelo qual foi entretanto condenado) e a personalidade que assim se revela (desajustada de normas jurídicas que tutelam bens jurídicos de diversa natureza e pouco moldável pelo juízo de censura inerente às condenações já enfrentadas e até por pena de prisão já cumprida pela prática de crime da mesma natureza); 3ª – São consabidamente prementes as exigências de prevenção geral do crime de tráfico de estupefacientes; 4ª – As necessidades de prevenção especial, que o próprio acórdão qualifica como “relevantes”, revelam-se efectivamente acentuadas em função dos antecedentes criminais do arguido, da sua ligação duradoura ao consumo de canábis e da falta de evidências de uma interiorização sem reservas do desvalor da sua conduta; 5ª – Tanto quanto se afigura, o tribunal elegeu como critério preponderante da opção pela suspensão da execução da pena de prisão o que designou de “actual grau de enquadramento sócio-familiar” do arguido; 6ª – Porém, dos factos julgados provados decorre que à data do cometimento do crime em apreço o arguido já beneficiava de similar(e adequado) enquadramento familiar – factor à partida de protecção, mas que, no caso, não constituiu suficiente contra-peso à prática delituosa; 7ª – Por outro lado, a inserção social exprime-se no cumprimento das regras da vida em sociedade, das quais as que tutelam bens penalmente protegidos representam o expoente máximo, sendo certo que, após a prática dos factos objecto dos presentes autos (por força dos quais foi inclusivamente detido e sujeito a primeiro interrogatório judicial), o arguido incorreu, já no corrente ano de 2022, em novo ilícito penal; 8ª – Na verdade, as circunstâncias do crime cometido, as condições da vida do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao ilícito em apreço e a personalidade assim revelada não suportam a formulação de um juízo de prognose favorável sobre o seu comportamento futuro, nem autorizam a conclusão de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão – ainda que acompanhadas da imposição de regime de prova – realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição: protecção de bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade; 9ª – Por conseguinte, ao suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido o acórdão recorrido violou, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto, a norma constante do nº 1 do artº 50º do C.P.; 10ª – Interpretando-a e aplicando-a no sentido de que, perante a personalidade do arguido, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste (que emergem dos factos julgados provados), a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, quando a deveria ter interpretado no sentido contrário e rejeitado a sua aplicação no caso concreto.” Pugnando, em síntese, pelo seguinte: “Termos em que deverá o presente recurso merecer provimento e ser o douto acórdão recorrido revogado, na parte em que suspendeu a execução da pena de prisão aplicada ao arguido, determinando-se, em consequência, o cumprimento efectivo dessa pena.” O recurso foi admitido

    O arguido respondeu ao recurso nos termos que, em síntese, se expõem: “

    1. O Ministério Público não se conformando com o Douto Acórdão proferido pelo Douto Tribunal a quo, apenas e somente na parte da decisão de suspender a execução da pena de três anos e seis meses de prisão aplicada ao Arguido, apresentou o presente recurso

    2. O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sem prejuízo do dever de conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, designadamente dos vícios indicados no artº 410 nº 2 do CPP, tal como resulta das disposições conjugadas dos artsº 4 do CPP, 684 nº 3 e 690 nº 1 ambos do CPC; C) Grosso modo, as conclusões permitem que o Tribunal “ad quem” possa conhecer as razões de discrepância e discordância do recorrente em relação à decisão recorrida

    3. Citando o Professor Alberto dos Reis que referia: “... não é no corpo da alegação que se pode restringir o objecto do recurso, é nas alegações... o tribunal superior tem de guiar-se pelas conclusões da alegação para determinar, com precisão, o objecto do recurso; só deve conhecer, pois, das questões ou pontos compreendidos nas conclusões, pouco importando a extensão objectiva que haja sido dada ao recurso, quer no requerimento de interposição quer no corpo da alegação...”, bem como e mais recentemente de acordo com a posição defendida pelo Exmo. Senhor Juiz Desembargador Mouraz Lopes quando refere: “as conclusões são, por definição, a indicação resumida e cristalina daquilo que se expôs e considerou ao longo da alegação, com vista a clarificar o debate, quer para o exercício do princípio do contraditório, quer para o conhecimento do recurso…” E) O Ministério Público formulou as suas conclusões, as quais se dão aqui como integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais, pugnando, básica e exclusivamente pela revogação da suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido pelo Tribunal a quo

    4. Com o devido respeito e que muito é pelo Ministério Público, não podemos concordar com o recurso apresentado, o qual não deverá merecer provimento, como passaremos a demonstrar

    5. O Arguido, em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, não se refugiou nem se socorreu do silêncio, tendo prestado as suas declarações, na senda das quais assumiu quase na integra o vertido no libelo acusatório, demonstrou arrependimento e provou ao Douto Tribunal a quo que a sua vida não é o que a acusação lhe atribuía

    6. O Tribunal Colectivo proferiu um Acórdão sensato e adequado ao que resultou provado em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, pois constatou e decidiu de forma exemplar e digna de registo, que a ressocialização do Arguido pode passar por uma outra fase que não seja a de um cumprimento efectivo de uma pena de prisão, que é sempre a ultima ratio! I) É que concatenada toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento, perante a confissão do arguido no tocante aos produtos estupefacientes, perante o sincero arrependimento que demonstrou, tendo em conta toda a prova documental que o arguido juntou aos autos, perante o relatório social do mesmo, o Tribunal a quo aplicou a pena de três anos e seis meses de prisão ao mesmo, suspendendo a mesma na sua execução e mediante regime de prova, tendo atuado de forma correta, sensata e acima de tudo ponderada, fazendo um juízo de prognose favorável do arguido, para cumprimento da pena de prisão a executar na comunidade

    7. Cumprimento este no sentido da ressocialização do Arguido e do acompanhamento clinico do mesmo junto do CAT, cujos comprovativos de presença remetemos em anexo à presente resposta

    8. Acima de tudo o Douto Tribunal a quo, ao proferir...

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