Acórdão nº 2730/19.4T9PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA FIGUEIREDO
Data da Resolução07 de Novembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

Nos presentes autos de processo comum com intervenção do Tribunal Singular que correm termos no Juízo Local Criminal de … - Juiz …, do Tribunal Judicial da Comarca de …, com o n.º 2730/19.4T9PTM, foi a arguida AA, viúva, reformada, filha de BB e de CC, natural de …, nascida a …1958, residente na Rua da …, …, Lote …, em …, condenada da seguinte forma: - Como autora material de um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelos artigos 255º alínea a) e 256º nº 1, alíneas d) e e) do C.P, na pena de 7 (sete) meses de prisão; - Como autora material de um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelos artigos 255º alínea a) e 256º nº 1, alíneas d) e e) do C.P, na pena de 7 (sete) meses de prisão; - Como autora material de um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelos artigos 255º alínea a) e 256º nº 1, alíneas a), c) e e) do C.P, na pena de 7 (sete) meses de prisão; - Em cúmulo jurídico, foi a arguida condenada na pena única de 18 (dezoito) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 18 (dezoito) meses, com a advertência expressa de “que a prática de novos crimes no período da suspensão da execução da pena constitui fundamento para a revogação da suspensão e poderá determinar o cumprimento efetivo da pena de 18 meses de prisão em que foi condenada”

*** Inconformado com tal decisão, veio o Ministério Público interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever: ““I – Vem o presente recurso interposto da sentença proferida e depositada no dia 24 de Maio de 2022, no âmbito do Processo Comum, Tribunal Singular, que condenou a arguida AA, pela prática de: - um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelos arts. 255º alínea a) e 256º nº 1 alíneas d) e e) do C.Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão; - um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelos arts. 255º alínea a) e 256º nº 1 alíneas d) e e) do C.Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão; e - um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelos arts. 255º alínea a) e 256º nº 1 alíneas a), c) e e) do C.Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão

Assim, e após realização do cúmulo jurídico, foi a arguida condenada numa pena única de 18 (dezoito) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período

II - Analisada a sentença proferida nos autos, o Ministério Público não se pode conformar com a mesma, por duas ordens de razões: - em primeiro lugar, por entender que as penas de em que o Douto Tribunal a quo condenou a arguida, em virtude dos crimes de falsificação de documentos cometidos por esta, não são proporcionais e adequadas à gravidade dos factos praticados pela arguida, nem têm em devida consideração os antecedentes criminais da mesma, não satisfazendo, em nosso entender, as necessidades de prevenção e a defesa do ordenamento jurídico; - em segundo lugar, por entender que a pena de prisão em que a arguida deverá ser condenada, nos termos já peticionados, não deverá ser suspensa na sua execução, mas sim cumprida de modo efectivo (ainda que se admita que o possa fazer em regime de permanência na habitação)

III - (…) (não se transcreve o restante texto desta conclusão em virtude de o mesmo conter apenas a transcrição de parte da sentença condenatóri

  1. VI – Ora, analisando a fundamentação da determinação concreta da medida da pena constante da douta sentença, sobressai desde logo a circunstância de a mesma mencionar a maioria das circunstâncias relevantes para a determinação concreta da pena – nomeadamente as que constam do artigo 71.º do Código penal -, mas não lhes dar a devida importância nem extrair as consequências que as mesmas necessariamente impõem; VII - No caso dos autos, há que salientar, em primeiro lugar, a gravidade da ilicitude e da culpa da arguida, considerando, como muito bem refere o Tribunal, «o tipo de documentos adulterado e forjado e a circunstância de terem sido, sem qualquer pudor, apresentados em Tribunal, perante uma autoridade judiciária, em processo que corria termos contra a aqui arguida. Cumpre não esquecer o motivo que esteve subjacente às condutas da arguida, que simplesmente não desejava assumir qualquer responsabilidade pelos factos praticados e ainda ser desonerada do pagamento das multas processuais pelas faltas de comparência, absolutamente injustificadas»

    VIII - Por outro lado, a culpa da arguida também se revela elevada, assumindo a modalidade de dolo directo, que é muito intenso - uma vez que a arguida quis praticar aqueles factos, agindo com absoluto desprezo e desrespeito pela autoridade dos Tribunais, que quis enganar, ao apresentar documentos médicos adulterados por sua ordem, sendo que, em nosso entender, a sua atitude revelou mesmo um desafio ao próprio Tribunal e à sua inteligência -, tendo o resultado por si previsto e querido sido alcançado; a arguida actuou de forma livre, voluntária e consciente, conhecedora que era, necessariamente, da potencialidade dos documentos utilizados para ludibriar o Tribunal, sendo certo que nem sequer se tratou de uma conduta isolada, que se possa dizer que foi um acto irreflectido e impulsivo, pois que se tratou de três documentos distintos, que foram utilizados em sessões de julgamento

    IX - Já no que concerne às exigências de prevenção geral do crime de falsificação de documentos, revelam-se as mesmas muito elevadas, atenta a frequência com que se verificam factos semelhantes”, sendo que se trata de crimes que “abalam fortemente a confiança nos documentos e afetam o comércio jurídico”

    X - Por último, há que salientar evidentemente as exigências de prevenção especial que no caso se fazem sentir, que também se nos afiguram “muito elevadas” – pois que do certificado de registo criminal da arguida constam condenações por crimes de auxílio à imigração ilegal e falsificação de documento, numa pena de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, sendo certo que, como muito bem salientou o Tribunal a quo, a arguida praticou os factos aqui em causa escassos meses após o termo da referida suspensão

    XI - Tal retrata uma personalidade particularmente avessa ao Direito, concluindo-se que tal pena não surtiu qualquer efeito no sentido da arguida adequar a sua conduta às regras do direito penal… não se pode olvidar que a arguida, ao usar atestados médicos adulrados, fê-lo para se furtar à responsabilidade pelos factos pelos quais estava a ser julgada naquele processo e ainda para se eximir ao pagamento de multas processuais, por ter faltado injustificadamente às sessões de julgamento que tiveram lugar no referido processo, ludibriando o próprio Tribunal que a estava a julgar, o que importa uma motivação altamente desvaliosa!! XII - Assim e considerando as molduras penais abstractamente aplicáveis aos crimes em apreço e o teor da própria fundamentação para a determinação da medida concreta das penas, não podemos concordar com estas

    XIII - Na verdade e desde logo, o Tribunal a quo fixou uma pena muito próxima do mínimo legal, quando os factos foram praticados pouquíssimo tempo depois do termo da suspensão da execução da pena de prisão em que foi condenada, no âmbito do Proc. 124/10.6…, pela prática de um crime de falsificação de documentos e um crime de auxilio à emigração ilegal, na pena de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, e desatendendo a todas as outras circunstâncias supra mencionadas e às quais a medida concreta da pena deve sempre atender - a culpa com que a arguida actuou, o bem jurídico violado, a gravidade das circunstâncias, as necessidades de prevenção geral e especial e as finalidades da punição

    XIV - Ora, sendo a moldura penal a aplicar à arguida pela prática do crime de de falsificação de documentos de 1 mês a 3 anos, deveria o Tribunal ter condenado a mesma, pelo menos, em 20 meses de prisão, por cada um deles, sob pena de não se assegurarem as elevadas necessidades de prevenção geral e elevadíssimas necessidades de prevenção especial que, no caso, se fazem sentir

    XV - O Por tudo o exposto, com o devido respeito e salvo melhor opinião, o Tribunal a quo ao aplicar pena de 7 (sete) meses de prisão em que condenou a arguida, por cada um dos crimes de falsificação de documentos, violou o disposto nos artigos 40.º e 71.º do Código Penal

    XVI - Assim sendo, tudo ponderado, atendendo aos limites abstractos das penas, afigura-se adequado aplicar à arguida AA, pela prática de cada um dos crimes de falsificação de documentos, dois deles previstos e punidos pelos arts. 255º alínea a) e 256º nº 1 alíneas d) e e) do C.Penal, e o outro p. e p. pelos arts. 255º alínea a) e 256º nº 1 alíneas a), c) e e) do C.Penal, a pena de 20 meses de prisão por cada um deles

    XVII – Atendendo ao disposto no artigo 77.º, n.º 2, do C. Penal, a pena única aplicada à arguida AA situar-se-á entre os 20 meses de prisão (mais alta das penas parcelares) e os 5 anos de prisão (soma da totalidade das penas aplicadas)

    XVIII - De acordo com o disposto no artigo 77.º, n.º 1, do Código penal, na determinação da pena única a aplicar ao agente dos crimes são considerados, em conjunto, os factos e a sua personalidade

    XIX - Tendo em atenção as considerações expendidas sobre a determinação das penas parcelares, e analisando a globalidade da factualidade que se deu como provada, revelando a conduta da arguida uma acentuada ilicitude, anti-socialidade e danosidade social, devendo a medida da pena única reflectir também a natureza contra a sociedade e patrimonial dos crimes, a que acresce a personalidade da arguida e o juízo de prognose que não se pode fazer favoravelmente para o futuro, entende-se adequado fixar a pena única da arguida AA em 3 anos e 6 meses de prisão

    XX - Assim e caso o recurso tenha provimento, a pena única em que a arguida AA foi condenada também deverá ser reformulada

    XXI - Resta avaliar se a pena de prisão em que a arguida deve ser condenada deve ou não ser suspensa na sua execução

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