Acórdão nº 4254/22.3T8CBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelJORGE ARCANJO
Data da Resolução16 de Novembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO 1.1.- Os requerentes - AA, casado, NIF ...43, residente em ..., e BB, casado, NIF ...20, residente em ... – instauraram processo especial para declaração de executoriedade de sentença estrangeira contra o requerido - CC, que também usa o nome de CC e ainda CC, residente na Rua ..., concelho de....

Alegou, em resumo: Requerentes e requerido foram partes numa acção judicial instaurada no ano de 2014, que correu termos no Tribunal de Grande Instância de ... – RG nº 14/08245, França.

O requerido foi citado para o acto que determinou o início da instância.

Por sentença de 3 de Dezembro de 2018, proferida pelo Tribunal de Grande Instância de ..., no âmbito da mencionada acção judicial RG nº 14/08245, o requerido foi condenado a pagar a cada um dos requerentes a quantia de € 75.000,00.

A referida sentença foi notificada às partes, tendo sido objecto de recurso interposto pelo requerido para o Cour d’Appel de ..., França.

Por acórdão de 1 de Junho de 2021 (acórdão nº 153/2021), o Cour d’Appel de ..., Polo ... – Secção 8 manteve a condenação do requerido no pagamento a cada um dos requerentes da quantia de € 75.000,00.

Sucede que, apesar de condenado no pagamento de tal quantia, o requerido nada pagou.

Pediu, ao abrigo do artigo 38º do Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, que seja decretada a executoriedade do Acórdão nº 153/2021, da Cour d’Appel de ..., França, - Polo ... – Secção 8, proferido em 1 de Junho de 2021, no processo RG 19/06670.

1.2. – Por sentença de 26/10/2022 decidiu-se: “Pelo exposto, declaro a executoriedade do Acórdão nº 153/2021 da Cour d’Appel de ..., França, - Polo ...– Secção 8, proferido em 1 de Junho de 2021, no processo RG 19/06670.

Custas pelo requerido (artigo 527º do C.P.C.).

Valor da causa: € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros).” 1.3. O requerido recorreu de apelação e a Relação de Coimbra, por acórdão de 2/5/2023, confirmou a decisão.

1.4. O requerido recorreu de revista, com as seguintes conclusões: 1)A jurisprudência dominante tem entendido que, aos processos de declaração de executoriedade de sentença estrangeira, não se aplicam os limites previstos no artigo 671.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, sendo admissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apesar da coincidência das decisões das instâncias, pelo que, o presente recurso de revista é admissível.

2)Entendeu o Tribunal a quo julgar improcedente o recurso interposto, da declaração de executoriedade do Acórdão nº 153/2021 da Cour d’Appel de..., França, - Polo ... – Secção 8, proferido em 1 de Junho de 2021, no processo RG 19/06670, em virtude de, bastando-se com as informações constantes da certidão redigida nos termos do Regulamento n.º 44/2021, ter decidido que o aqui Recorrente foi devidamente citado, não tendo existido qualquer ofensa à ordem pública portuguesa.

3)o Tribunal a quo que é «…indiferente nesta sede o conhecimento dos termos rigorosos como foi efetuada a citação, tanto mais que “não é possível, no procedimento tendente à concessão do exequatur, proceder à apreciação do mérito da sentença estrangeira, pelo que não pode a 1ª Instância, nem pode o Tribunal da Relação, apreciar se esta decidiu bem, ou seja se decidiu de harmonia com as regras processuais que era mister observar e em função de uma correcta apreciação crítica dos elementos disponíveis». Assim, o Tribunal a quo entendeu que o invocado, pelo Recorrente, “desrespeito pela ordem pública portuguesa, assente na aludida falta de citação, está totalmente arredado porquanto não se demonstrou que o Requerido não tenha sido citado na aludida ação”, tendo apenas apreciado as informações, meramente formais, constantes da referida certidão emitida pelo Tribunal francês, não tendo apreciado as provas trazidas aos autos pelo Recorrente.

4)Recorre o Requerido – e com o devido respeito – por não se poder conformar com o acórdão proferido pelo Tribunal a quo, no que alude à decisão aí proferida, quanto à aplicação do direito ao caso concreto, por não poder concordar com a interpretação por aquela feita, quando refere que o Tribunal da Relação não pode apreciar se o Tribunal francês (Polo... – Secção 8 do Cour d’Appel de ... -acórdão nº 153/2021) decidiu de harmonia com as regras processuais que era mister observar e em função de uma correcta apreciação crítica dos elementos disponíveis.

5)Estatui o artigo 34º: do Regulamento que uma decisão não será reconhecida, se o reconhecimento for manifestamente contrário à ordem pública do Estado-Membro requerido, sendo que o recurso à cláusula de ordem pública, no âmbito do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho de 22 de dezembro de 2000, como fundamento de recusa da declaração de executoriedade de sentença estrangeira, visa obstar à violação inaceitável da ordem jurídica do Estado-Membro requerido, nomeadamente por afronta a um seu princípio fundamental.

6)Não restam dúvidas de que a ordem jurídica portuguesa consagra, como direito fundamental, a exigência de um processo equitativo, como decorre do art. 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, e 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que faz parte integrante do direito português, sendo certo que o princípio da igualdade de armas constitui um elemento incindível do processo equitativo.

7)Assim, uma decisão em que não foi dada a possibilidade de o Réu tomar conhecimento de que um processo corre contra si, bem como o prazo e a forma de reacção – ou em que, pelo menos, não se apreciou se todos os esforços foram levados a cabo para efectivar a citação daquele – é uma decisão que afronta um princípio fundamental do estado de direito que é Portugal.

8) Num processo de reconhecimento e execução duma sentença estrangeira proferida à revelia, quando o demandado interpõe recurso da declaração de executoriedade com o fundamento de não ter sido notificado do “ato que deu início à instância” ou da sentença proferida, o Tribunal da Relação é competente para verificar a concordância entre as informações que figuram na certidão de declaração de executoriedade e as provas trazidas aos autos em sede de recurso.

9)Assim, não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT