Acórdão nº 00002/23.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução03 de Novembro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Norte: I.RELATÓRIO 1.1.

[SCom01...] LDA.

, pessoa coletiva n.° ...16, com sede na Rua ..., em ... – ..., moveu o presente processo de contencioso pré-contratual contra o ESTADO , MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL – ESTADO -MAIOR-GENERAL DAS FORÇAS ARMADAS, pessoa coletiva n.° ...80, com sede na Avenida ..., em ..., indicando como contrainteressado, [SCom02...], LDA.

, pessoa coletiva n.°...39, com sede Rua ..., ..., no ..., e na qual formulou o seguinte pedido: “(...) 1. Ser anulado o ato de adjudicação e igualmente o contrato, caso já tenha sido celebrado o contrato entre a ré e a contrainteressada [SCom02...], LDA, por serem manifestamente ilegais e inválidos. 2. Ser a ré condenada a proceder à reavaliação da proposta da autora e a graduá-la em primeiro lugar. 3. Ser a ré condenada à prática do ato de adjudicação da proposta da autora, por o mesmo ser legalmente devido. (..)”.

Para tanto, alegou, em síntese, que no procedimento concursal em referência apresentou um pedido de esclarecimento no sentido de saber se atentas as especificações técnicas definidas era possível “(..) apresentar uma solução de mesa motorizada de uma só coluna lateral, que permita que a zona central de encaixe das pernas fique livre com total acesso a cadeira de rodas, de diferentes modelos e alturas. (..)”; Em resposta, foi-lhe dito que : “Admite-se que o equipamento da solução proposta venha equipado com uma única coluna em substituição da coluna definida no Caderno de Encargos. (...)” – pelo que, apresentou a sua proposta em conformidade.

Acontece que, pese embora no relatório preliminar a sua proposta tenha sido ordenada em primeiro lugar, após o exercício do direito de audição prévia por parte da Contrainteressada, e em sede de relatório final, veio a ser excluída.

Em sede de contraditório, sustentou que a sua proposta cumpre as especificações técnicas estipuladas na cláusula 28º alínea a) do Caderno de Encargos (CE) e, bem assim, o declarado nos esclarecimentos prestados.

Não obstante, a decisão de exclusão foi mantida e proposta a adjudicação do contrato à Contrainteressada, o que veio a ocorrer, conforme lhe foi notificado, em 12/08/2022.

Conclui pela invalidade do ato de exclusão da sua proposta e pela invalidade da adjudicação da proposta da contrainteressada e subsequente contrato, por erro grosseiro e manifesto de apreciação.

Pede que atento o critério de adjudicação definido e em face da invalidade do ato de adjudicação e subsequente contrato, o Réu seja condenado a adjudicar a sua proposta, ou subsidiariamente, proceder à reavaliação da mesma, graduá-la em primeiro lugar e adjudicá-la.

1.2. Citado, o Estado Maior General das Forças Armadas deduziu contestação, na qual suscitou, além do mais, o erro de citação e a sua ilegitimidade passiva para a presente lide.

Por despacho de 20.02.2023, foi determinada a citação do Ministério da Defesa Nacional.

1.3.Citado, o Ministério da Defesa Nacional não contestou.

1.4.Por despacho de 28/03/2023 foi determinada a absolvição da instância do Estado Maior General das Forças Armadas.

1.5.Citada, a Contrainteressada contestou, defendendo-se por impugnação, pugnando pela legalidade do ato de exclusão/ adjudicação proferido.

Termina pedindo a improcedência da ação.

1.6. Dispensou-se a realização de audiência prévia, indeferiu-se a produção de prova testemunhal, proferiu-se despacho saneador tabelar e fixou-se o valor da causa 58.000,00€ (cinquenta e oito mil euros).

1.7. Em 29/08/2023, proferiu-se saneador-sentença que julgou a ação improcedente, constando do mesmo o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, decido julgar improcedente a presente ação, por não provada, e em consequência absolvo a R. do pedido.

Custas pela A., nos termos do artigo 527º n.1 do Código de Processo Civil.

Registe e notifique.» 1.8. Inconformada com o saneador-sentença que julgou a ação improcedente, a Autora intentou o presente recurso jurisdicional de apelação, o qual culmina com a formulação das seguintes CONCLUSÕES: «1 - A ré aceitou, após o pedido de esclarecimentos efetuado pela recorrente, o equipamento proposto por esta, aceitando assim um equipamento com uma coluna lateral.

2 - O produto em causa, e possuindo como possui apenas uma barra lateral, tem obrigatoriamente, por forma a suportar o peso do equipamento a colocar no tampo superior, um tampo inferior de contrapeso.

3- O equipamento proposto pela recorrente e admitido pela ré, apenas o foi por possuir Certificado CDM, ou seja, por possuir certificação pela Infarmed, nomeadamente o designado Certificado CDM - Código de Dispositivo Médico.

4 - Sendo como é um dispositivo médico, o equipamento proposto pela recorrente está certificado como sendo um conjunto, ou seja, Mesa + Laser, portanto, o Certificado CDM está atribuído ao equipamento como um todo.

5 - Estando a certificação atribuída ao equipamento como um todo, este equipamento nunca, em momento algum, teria obtido esta certificação, bem como a Certificação CE atribuída pelo Organismo Europeu de Certificação, se a mesa não fosse usável por utente em cadeira de rodas.

6 - Por isso, sendo como é um equipamento (Mesa+Laser) com dupla certificação, nomeadamente CE e pelo Infarmed, é um equipamento usável por utente em cadeira de rodas, caso contrário nunca teria obtido esta certificação.

7 - Nem tão pouco a proposta da recorrente poderia ter sido admitida ao concurso se esta não houvesse apresentado estes documentos, que constituíam documentos obrigatórios da proposta.

8 - Daí que, dúvidas não poderão restar de que a recorrente cumpriu com as especificações técnicas constantes do caderno de encargos.

9 - E, a existência de uma barra metálica não poderá constituir em momento algum motivo de exclusão da proposta da recorrente, pois, caso contrário, como supra se referiu, o equipamento proposto pela recorrente não haveria conseguido obter a dupla certificação que obteve.

10 - Deverá, portanto, o Tribunal revogar a sentença proferida, substituindo-a por outra, admitindo assim a proposta da recorrente, propondo a sua adjudicação, e anulando o ato de adjudicação já celebrado, bem como o Contrato celebrado com a contrainteressado por serem manifestamente ilegais e inválidos.

Espera assim de VVas. Exas. a Costumada Justiça.» 1.9. O Réu contra-alegou, formulando as seguintes CONCLUSÕES: «I. A recorrente veio em sede de recurso alegar que, por força da certificação CE e do INFARMED (CDM) dos equipamentos que propôs a concurso, estes estão aptos a serem utilizados com ou sem uma cadeira de rodas.

  1. Esta questão apenas foi submetida à apreciação em sede recurso e, nessa medida, constitui uma “questão nova”.

  2. Os recursos ordinários têm a função de permitir que o Tribunal “ad quem” proceda à reapreciação da decisão proferida pelo Tribunal “a quo” e essa reapreciação há-de se mover dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal recorrido quando proferiu a decisão, donde decorre que o Tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida.

  3. A lei processual civil, concretamente os artigos 425.° e 651.° ambos do CPC, possibilitam a junção de documentos ao processo com as alegações ou contra-alegações de recurso e apenas quando não tenha sido possível a respectiva apresentação em momento anterior ou quando a junção de documentos se torne necessária em virtude do julgamento proferido em primeira Instância.

  4. Assim, não podem ser admitidas como documentos as duas fotografias constantes do corpo das alegações da recorrente (a págs. 18) porque, ademais, a recorrente nada alegou ou demonstrou quanto à impossibilidade da sua apresentação em momento anterior.

    Sem prescindir, VI. O processo de codificação de dispositivos médicos levado a cabo pelo INFARMED, I. P. tem em vista a criação de um repositório de informação que permita que permita aos prestadores de cuidados e às instituições de saúde ter acesso à informação relevante para a utilização correta e segura destas tecnologias, bem como para a caracterização do mercado de dispositivos médicos.

  5. A atribuição de CDM pelo INFARMED, I.P. não configura uma autorização para comercialização de dispositivos médicos, nem um certificado para a sua utilização em toda e qualquer circunstância, nomeadamente, com ou sem cadeira de rodas, conforme alega a recorrente.

  6. A marcação CE, aposta pelo fabricante, é um pré-requisito para a colocação no mercado dos dispositivos médicos e sua livre circulação, constituindo uma garantia de que estes produtos foram avaliados estando conformes com os requisitos essenciais que lhes são aplicáveis, sendo que este igualmente nada certifica quanto à aptidão dos dispositivos médicos para serem utilizados com ou sem cadeiras de rodas.

  7. A recorrente questionou o júri do concurso sobre se seria possível apresentar uma solução de mesa motorizada de uma só coluna lateral, que permitisse que a zona central de encaixe das pernas ficasse livre com total acesso a cadeiras de rodas, de diferentes modelos e alturas.

  8. O júri admitiu que fosse apresentada uma proposta com uma única coluna, porém, a solução a apresentar teria, em todo o caso, de permitir o total acesso as cadeiras de rodas de vários modelos e alturas – o que não é caso do equipamento proposto pela recorrente.

  9. Aderimos sem reservas à sentença recorrida quando este diz que: “(...) o esclarecimento pedido não foi completo e como tal não teve uma resposta inequívoca. É que a A. não mencionou no seu pedido de esclarecimento que o facto de a mesa ser composta por coluna única lateral implicaria que a mesma integrasse, igualmente, uma barra metálica na zona do chão. E, sendo assim, a resposta prestada no sentido de que é admissível a coluna única, não afasta o requisito de possuir a “zona central de encaixe das pernas livre com total acesso a cadeiras de rodas...

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