Acórdão nº 4035/18.9T8LRA.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2023
Magistrado Responsável | ALBERTO RUÇO |
Data da Resolução | 25 de Outubro de 2023 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, * Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço 1.º Juiz adjunto……… Carlos António Paula Moreira 2.º Juiz adjunto………. José da Fonte Ramos * (…) * Recorrente …………………..
AA; e Recorrido…………………… BB, Ambos melhor identificados nos autos.
* I. Relatório
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As partes são irmãos entre si e foram remetidas para os meios comuns no âmbito do processo de inventário aberto por óbito do respetivo pai, com o fim de aqui se averiguar se do património do inventariado CC faz parte um crédito de tornas deste inventariado sobre a ora recorrente AA, sua filha, atinente à partilha da herança efetuada em anterior inventário por óbito da mãe da ré AA e cônjuge do mencionado inventariado, e ainda se esta última fez suas indevidamente determinadas quantias retiradas da conta bancária do mencionado inventariado.
O recorrido instaurou então a presente ação peticionando o seguinte: Declarar-se que do património do falecido inventariado CC faz parte um crédito de tornas no montante de 27.698,89 euros e que a ré AA se apoderou de 27.900,00 euros que retirou da conta bancária do inventariado e que a Ré omitiu intencionalmente estas quantias na relação de bens que apresentou no inventário e se apropriou de valores pertencentes à herança.
A título subsidiário pediu a condenação da Ré a restituir à massa da herança a quantia de 27.698,89€, acrescida dos juros moratórios vencidos à taxa legal, contados desde 23-04-2016 (dia seguinte ao trânsito em julgado da sentença de partilhas) até 28-11-2018, da quantia de 2.883,72€ e os juros de mora que futuramente se vencerem sobre aquele capital desde a presente data até à respectiva partilha; condenar-se a ré a restituir à massa da herança a quantia de 27.900,00€, correspondente às quantias retiradas da conta bancária do falecido, acrescida dos juros de mora desde a citação e até à respectiva partilha e condenar-se a ré a relacionar no inventário o crédito de tornas e as acima referidas quantias monetárias, acrescidas dos juros moratórios devidos.
A ré contestou refutando o alegado e as conclusões tiradas pelo autor.
Realizou-se a audiência de julgamento e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Na decorrência de tudo o acima exposto: A. Declaro que o património do falecido CC integra o crédito de tornas, no valor de € 27.698,89 (Vinte e sete mil, seiscentos e noventa e oito euros, e oitenta e nove cêntimos).
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Condeno a ré AA a restituir à massa da herança aberta por óbito de CC, relacionando-a no respectivo inventário, a quantia acima referida de € 27.698,89 (Vinte e sete mil, seiscentos e noventa e oito euros, e oitenta e nove cêntimos), a que acrescem juros moratórios vencidos à taxa legal, contados desde 23-04-2016 (dia seguinte ao trânsito em julgado da sentença de partilhas) até ao dia 28-11-2018 (data da instauração da presente acção), da quantia de 2.883,72€ (Dois mil, oitocentos e oitenta e três euros, setenta e dois cêntimos) e os juros de mora que futuramente se vencerem sobre aquele capital desde a presente data até à respectiva partilha.
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No remanescente do peticionado pelo autor BB, absolvo a ré AA.
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Não condeno o autor BB como litigante de má-fé.
Custas pelo autor e pela ré na proporção de 40% e 60%, respectivamente.» b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte da ré AA, cujas conclusões são as seguintes: «I. Foi a Ré, ora Recorrente, condenada pela sentença de que se recorre a: (…).
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O Tribunal no ponto 29 dos factos provados julga provado que CC, apesar da sua idade, manteve vigor mental - ou seja capacidade para tomar decisões, fazer declarações e confissões -, até ao fim da sua vida, e julga na al. f) dos “Aspectos não provados” que não resulta como provado que nos últimos anos de vida CC fosse uma pessoa sugestionável e frágil.
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Contrariamente desconsidera a declaração de CC, constante em documento autenticado, assinado pelo declarante e autenticada por Advogado, de quitação das tornas da herança da sua falecida esposa.
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O Tribunal a quo contradiz-se no julgamento dos factos, viola as normas que impõem força probatória a documento autenticado e condena a Ré à restituição da quantia das tornas e juros à massa da herança aberta por óbito de CC.
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O documento autenticado faz prova plena da declaração emitida pelo declarante e nele atestada, bem como dos factos compreendidos na declaração na medida em que forem contrários aos interesses do declarante, prova esta que se impõe quer aos outorgantes quer a terceiros.
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Não foram alegados pelo Autor, nem foram considerados quaisquer factos na sentença recorrida que prove que não são verdadeiros os factos constantes da declaração emitida, nem qualquer invalidade da mesma, e que se mostram plenamente provados pelo documento autêntico ou pela confissão nele exarada.
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CC declarou que se dá como pago das tornas da herança de sua falecida mulher e que, na sequência da sua declaração, não se considera credor da referida quantia.
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A declaração de quitação emitida perante advogado, que nos termos legais autenticou a declaração em que foi plasmada e a assinatura do declarante, é oponível aos demais, nomeadamente credores da pessoa objecto de tal declaração e herdeiros do declarante.
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A Ré DD está desonerada pela declaração do seu credor que afirma estar pago das tornas em documento autenticado que formaliza o cumprimento da sua obrigação de pagamento de tornas, o ónus da prova dos elementos constitutivos do seu cumprimento perante o declarante e seus herdeiros fica satisfeito com a simples apresentação de tal documento.
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Os documentos autênticos e autenticados fazem prova plena dos factos neles atestados – art.º 371º C. Civil., fazendo prova plena do respectivo conteúdo, tendo ambos a mesma força probatória dos documentos autênticos – art.º 377º C. Civil.
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A quitação, consubstanciada em declaração unilateral voluntária e validamente emitida, goza da presunção legal inerente à plenitude probatória inerente ao documento, bastando a apresentação do documento válido que a titula para a sua prova.
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A sentença recorrida nada refere nomeadamente a vício de vontade ou divergência entre a vontade e a declaração, nem enumera qualquer facto consubstanciador do vício ou divergência, pelo contrário declara provado que o declarante estava e esteve são mentalmente até ao final da sua vida.
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Há que alterar a matéria erradamente dada como provada em 35 e 36 dos factos provados, decidindo em conformidade e dar como não provado que a ré AA, em vida de CC, não pagou o crédito de tornas, bem como que a ré omitiu tal crédito de tornas na respectiva relação de bens que apresentou.
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O Tribunal a quo na sua decisão violou, entre outras, as disposições contidas nos art. 377º; 371º; 385º, 342º, nº 2 e 350º, nº 1, todos do C. Civil.
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A sentença recorrida deve ser substituída por outra que reconheça a quitação invocada pela recorrente, nos exactos termos vertidos na declaração de quitação emitida pelo seu pai, que declara que recebeu as tornas da herança da sua falecida esposa e que a filha nada mais lhe deve.
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O Tribunal a quo cometeu erro de julgamento seja quantos aos factos, seja na aplicação do direito aos factos e à prova apresentada pela Ré Recorrente, pelo que o decidido não corresponde à realidade ontológica e à normativa, traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei que consistiu num desvio à realidade factual.
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A Ré Recorrente apresentou um documento valida e legalmente autenticado, contudo a sentença recorrida sem fundamentação descartou a força probatória do documento, o que constitui uma nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil.
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A sentença recorrida é ainda nula, vide artigo 615.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Civil, por erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la, ou seja, os fundamentos invocados pelo juiz - por um lado que o declarante da quitação dada à Ré quanto a tornas plasmada em documento autenticado esteve mentalmente são até ao fim da sua vida, que a sua assinatura foi feita perante advogado que autenticou a declaração e a assinatura do declarante e por outro lado decide descartar a força probatória de tal documento - conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido diferente: verificaria a validade da quitação e não condenaria a Ré, ora recorrente.
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Verificando-se as nulidades invocadas deve a sentença recorrida ser substituída por outra que reconheça a validade e força probatória imposta por lei, e ser a Ré, ora Recorrente, absolvida da condenação que foi objecto.
NESTES TERMOS, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá, consequentemente, a decisão proferida ser revogada e substituída por outra que declare a validade do documento autenticado, que o mesmo seja considerado como prova do pagamento das tornas no valor de €27.698,89, absolvendo a Ré Recorrente de as restituir à massa da herança.
Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!» c) Foram produzidas contra-alegações cujas conclusões são as seguintes: « (…) 3.ª) A douta sentença recorrida não enferma da nulidade, por insuficiência da fundamentação, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea b), do CPC, porquanto, o tribunal a quo apresentou a motivação acerca da desconsideração do documento nº 2, junto com a 1ª contestação, que, aliás, a própria apelante transcreve no ponto 4º da motivação recursória.
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) Tendo concluído que a pretensa força probatória conferida não encontrou coeso eco em todos os restantes meios de prova integrados nos presentes autos, bem como nas declarações das testemunhas inquiridas e no depoimento prestado pela ré.
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) Além disso, a douta sentença recorrida também não enferma da nulidade prevista artigo 615º, nº 1, alínea c), do CPC, por alegada contradição entre os fundamentos e a decisão, porquanto, o ponto 35 da matéria de facto provada, em nada se contraria com...
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