Acórdão nº 051/23.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução25 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, notificada da Decisão Arbitral proferida no Processo 390/2022-T, que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e em que são recorridos A..., B..., C..., D..., E..., e F..., que são representados pela Sociedade G..., S.A.

, melhor sinalizados nos autos, não se conformando com o seu conteúdo, vem dele interpor Recurso de Uniformização de Jurisprudência para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do disposto no artigo 152.º, n.º1 do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e do n.º 2, do artigo 25.º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), com fundamento em o mesmo se encontrar em contradição com Acórdão do STA de Uniformização de Jurisprudência, datado de 23.02.2023 e prolatado no Processo nº 102/22.2BALSB, quanto à mesma questão de direito, estando em causa a solução jurídica encontrada para a possibilidade de os vícios do valor patrimonial tributário poderem ser suscitados e conhecidos no âmbito de impugnação judicial.

Inconformada, a recorrente AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA formulou alegações, que terminou com as seguintes conclusões: A.

O Recurso Para Uniformização de Jurisprudência previsto e regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o STA, no caso concreto, proceder à anulação da decisão recorrida e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição, firmando e consolidando o sentido do julgamento acertado desta matéria.

B.

Para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos suscetível de recurso por oposição, é necessário que: i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas; ii) haja identidade na questão fundamental de direito; iii) se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta; e iv) a oposição decorra de decisões expressas e não apenas implícitas e v) que a orientação perfilhada na decisão recorrida não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo C.

No caso vertente encontram-se reunidos os supra elencados requisitos para que se tenha por verificada a alegada oposição entre a Decisão arbitral n.º 390/2022-T e o Acórdão fundamento n.º 102/22.2BALSB.

D.

Entre a Decisão Recorrida e a Acórdão fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto: E.

A decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado pelos contribuintes; F.

A arguição da ilegalidade dos atos de liquidação de imposto municipal sobre o património (IMI) e de adicional ao imposto municipal sobre o património (AIMI) G.

Pese embora no caso do Acórdão Fundamento esteja em causa o adicional (Adicional ao IMI), e na decisão recorrida, além do AIMI, também o IMI, o imposto base o núcleo essencial da estrutura tributária é idêntica, não havendo dissemelhanças suficientes para afastar a identidade que existe entre ambos os atos de liquidação; H.

Os atos de liquidação do IMI dos anos de 2016, 2017, 2018 e 2019, e Adicional Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI) dos anos de 2018, 2019 e 2020, no Acórdão fundamento está em causa a ilegalidade dos atos de liquidação do AIMI referentes aos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020; I.

Existindo identidade quanto aos anos de 2017 a 2020 não há alterações substanciais relativamente aos outros anos que justifiquem uma divergência suficiente para ser afastada a identidade das situações em apreço.

J.

Em ambas as situações de facto se verifica que não foram pedidas segundas avaliações relativamente aos VPT dos imóveis.

K.

As ilegalidades das liquidações impugnadas foram sustentadas na ilegalidade da fixação do valor patrimonial tributário (VPT) de terrenos para construção; L.

Conforme se pode desde já́ observar, entre a Decisão Recorrida e a Acórdão fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto, ou seja, em ambas as situações os vícios do VPT foram arguidos na impugnação da legalidade do ato de liquidação.

M.

Verifica-se, assim, que ambos os acórdãos versam sobre situações fáticas substancialmente idênticas que preencham a mesma hipótese normativa, isto é, concretizem a mesma fattispécie legal, conforme entendimento veiculado pelo acórdão do STA proferido a 2010.12.07 no âmbito do processo n.º 0511/06, N.

Por outro lado, as decisões em confronto pronunciam-se sobre a mesma questão fundamental de direito.

O.

Enquanto que no Acórdão fundamento se considera que os eventuais vícios do valor patrimonial tributário apenas podem ser invocados na sua impugnação e já não na impugnação da liquidação que com base no valor resultante da avaliação vier a ser efetuada.

P.

A decisão recorrida conclui que: “(…)117. Ora, como a segunda avaliação não é obrigatória, nem está prevista no art. 77º, 1 do CIMI uma impugnação administrativa necessária – o que, insistamos, teria que ocorrer expressamente, por força do estabelecido no art. 185º, 2 do CPA –, também não existe um ónus de impugnação judicial do acto de fixação do VPT que tenha resultado da segunda avaliação: uma segunda avaliação que, de resto, o particular não está sequer vinculado a requerer, porque no art. 76º, 1 não se prevê essa segunda avaliação como uma forma de impugnação administrativa necessária, destinada a permitir o ulterior acesso à via contenciosa.” Q.

Ou seja, analisando a mesma questão, a de saber se no ato de liquidação podem ser impugnados vícios próprios do valor patrimonial tributário, a decisão recorrida responde de forma afirmativa, em contradição com o acórdão fundamento que sobre a mesma questão responde de forma negativa e uniformiza a jurisprudência sobre esta matéria.

R.

Em suma, entre a decisão recorrida e o Acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre as mesmas questões fundamentais de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que decida definitivamente a questão controvertida nos termos do entendimento propugnado pela AT em sede arbitral, bem como de acordo com a fundamentação invocada no Acórdão Fundamento.

Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por outra consentânea com o quadro jurídico vigente como é de Direito e Justiça.

Os recorridos A..., B..., C..., D..., E..., e F..., representados pela Sociedade G..., S.A.

vieram apresentar contra-alegações, concluindo o seguinte:

  1. O presente recurso foi interposto, pela Autoridade Tributária e Aduaneira, da Decisão Arbitral proferida no CAAD no âmbito do processo n.º 390/2022-T, nos termos do artigo 25.º, n.º 2 e n.º 3 do RJAT e do artigo 152.º do CPTA.; B) A Decisão Arbitral objeto do presente recurso julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, declarando ilegais e anulando parcialmente as liquidações de IMI de 2016, 2017, 2018 e 2019 e de AIMI dos anos de 2018, 2019 e 2020, no valor total de € 152.960,20 e condenando a AT a reembolsar o imposto pago a mais acrescido dos respetivos juros indemnizatórios; C) A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs o presente recurso por entender que a referida Decisão Arbitral se encontrava em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito com acórdão proferido pelo STA, no âmbito do processo n.º 102/22.2BALSB, de 23.02.2023; D) A douta Decisão Arbitral, de que a Autoridade Tributária e Aduaneira recorre, apresenta-se como justa e inequívoca, atendendo aos princípios processuais que devem ser observados; E) A Decisão Arbitral ora Recorrida não se encontra em oposição com a jurisprudência invocada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, porquanto o plano de discussão é manifestamente diferente; F) Conforme resulta da decisão arbitral, a matéria da revisão oficiosa é um dever da Administração. Recordando o teor da decisão, destacamos o seguinte: “Mas insistamos: tal regime dos actos destacáveis pura e simplesmente não tem, nem poderia ter, aplicação adequada em casos destes, porque neles estamos perante uma situação em que os contribuintes declararam correctamente todos os elementos, e os peritos avaliadores consideraram correctamente todos os elementos declarados pelos contribuintes, mas em que, fruto de uma fórmula pré-estabelecida e incorporada no sistema informático da AT – ou seja, fruto de um acto prévio aos procedimentos de avaliação, e inacessível para modificação ou emenda por parte dos avaliadores –, os VPTs que foram fixados na sequência da inclusão da informação declarada pelos contribuintes, e inseridos no ficheiro electrónico da AT, se tornaram ostensivamente ilegais (essa proeminência do factor informático e do algoritmo é devidamente sublinhada no ponto 3.2 do Acórdão do STA de 14 de Novembro de 2018, Processo nº 0398/08.2BECTB 0133/18). Estamos aqui, portanto, perante um elemento prévio aos procedimentos de avaliação, e sobre o qual nem os contribuintes nem os peritos avaliadores têm qualquer influência, seja em sede de primeiras avaliações seja em sede de segundas avaliações, o que bastará para retirar relevância ao tema dos “actos destacáveis”.

    G) Em suma, a decisão recorrida concluiu, de forma cristalina, nos seguintes termos: “Entender de outro modo, reafirmemo-lo, equivaleria a esvaziar totalmente a susceptibilidade de impugnação judicial de liquidações de IMI e AIMI com base em fundamento de errónea fixação do VPT no cálculo da base tributável daqueles impostos. Seria enveredar por um caminho que o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 410/2015, de 19 de Novembro, na sua interpretação do art. 54º do CPPT...

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