Acórdão nº 01192/12.1BALSB 01192/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelCRISTINA SANTOS
Data da Resolução12 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

AA e CC, casados entre si, e o Vereador do Pelouro de Urbanismo e Mobilidade da Câmara Municipal do Porto, com os sinais nos autos, inconformados com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 06.06.2011 que declarou nulo o despacho da autoridade recorrida de 08.10.1996, dela vêm interpor recurso ao abrigo dos artºs.102º a 106º LPTA, concluindo como segue: A – Recurso de AA e mulher: a) O erro da douta sentença decorre de violação do estabelecido pelo artº 134° nº 1 e 137° do Código de Procedimento Administrativo; b) O acto nulo não produz qualquer efeito e é insusceptível de sanação; c) Pelo que é impossível a conclusão da douta sentença no sentido de que a posterior alteração do alvará de loteamento teria a virtualidade de, por artes de magia, eclipsar os efeitos intrinsecamente destrutivos daquelas nulidades, sarando milagrosamente os cancros de que padecem aqueles actos administrativos.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada parcialmente a douta sentença recorrida, por só assim se fazer Sã Justiça.

* B – Recurso do Vereador do Pelouro de Urbanismo e Mobilidade da C.M. do Porto: 1. Por sentença proferida, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em 6/06/2011, foi concedido provimento parcial ao recurso contencioso de anulação interposto pelos Recorrentes, e, em consonância, declarado nulo o acto do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo e Fomento Desportivo de 08.10.1996.

2. Tal decisão judicial alicerçou-se no entendimento segundo o qual o acto em apreço enferma de nulidade nos termos do preceituado no artigo 56º nº 2, b) do Decreto-Lei nº 448/91, de 20 de Novembro, em virtude da violação do disposto nos artigos 36º, nº 3 e 29º, nº 1 e) do mesmo diploma, entendimento com o qual o aqui Recorrente não pode concordar.

3. O acto cuja nulidade foi declarada no âmbito do presente processo consubstancia-se no deferimento de um pedido de alteração ao alvará de loteamento nº ...8, formulado pela recorrida particular A..., já na vigência do Decreto-Lei nº 448/91, de 20 de Novembro.

4. Para alteração das especificações previstas no artigo 29º, nº 1 e) desse diploma, exigia-se, nos termos do disposto no artigo 36º, nº 3, uma maioria qualificada de 2/3 dos proprietários dos lotes abrangidos pelo alvará, dos edifícios neles construídos ou das suas fracções autónomas, sendo que fora desse leque de situações as especificações do alvará de loteamento podiam ser alteradas mediante simples requerimento dos interessados, conforme o disposto no artigo 36º, nº 1 do mesmo diploma.

5. No caso sub judice, resulta dos elementos instrutórios constantes dos autos que a conformação do projecto de arquitectura com as especificações do alvará ...8, prendia-se tão só com a existência de entradas independentes e demais características das habitações de tipo unifamiliar tal como definidas no artigo 18º do Plano Azuelle.

6. E evidente que a alteração do referido alvará de loteamento, não era subsumível à disciplina constante do artigo 36º, nº 3, conjugada com o disposto no artigo 29º nº 1 e), ambos do Decreto-Lei nº448/91, e, por conseguinte, a sua viabilização não estava sujeita à obtenção da autorização de 2/3 dos proprietários dos lotes.

7. O pedido de alteração ao loteamento 18/88, apresentado pela recorrida particular A..., podia, efectivamente, ser deferido nos moldes em que foi, no sentido de garantir a total conformidade entre o projecto de arquitectura aprovado e aquele alvará de loteamento.

8. A alteração do alvará ...8, conforme já expendido em sede de contestação, ocorrera já por força do deferimento dos requerimentos ...0, da Fundação ..., e 2950/92, da recorrida particular A... - o primeiro destinado a obter autorização para construção de mais um piso, negativo, e o segundo, a aprovação do projecto de arquitectura - dado que estes contemplavam pedidos implícitos de alteração ao loteamento em causa.

9. Com o deferimento dos mesmos ocorreu, necessariamente, o deferimento dos implícitos pedidos de alteração ao alvará de loteamento, posto que tendo sido apresentados na vigência do regime consagrado no Decreto-Lei nº 400/84, tinham a virtualidade de determinar a alteração ao alvará de loteamento, a qual, nos termos desse diploma, podia operar mediante simples requerimento dos interessados. 10. De todo o modo, a declaração de nulidade do acto do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo e fomento Desportivo de 8.10.1996 revela-se, salvo melhor opinião, absolutamente despicienda, face à alteração do alvará de loteamento validamente operada pelo acto de deferimento do pedido de alvará de loteamento de 21.11.1996, conforme concluído pelo próprio Tribunal recorrido.

11. Conforme expressamente referido na decisão recorrida, “em virtude da prolação deste acto em 21.11.1996 “[“através do qual foi licenciada a alteração ao alvará de loteamento nº ...8 que passou a permitir a construção nos lotes ...6 a ...2, de edifício de habitação colectiva com cave e 3 pisos” - itálico nosso] “ e subsequente emissão de alvará de loteamento corrigido e devidamente publicado, passou a permitir-se a construção do edifício que tinha sido objecto das decisões emitidas em 4.12.1995 e 14.12.1995. 12. Tendo-se entendido que este último acto veio convalidar a situação fáctica subjacente à alteração de loteamento, não se vislumbra efeito útil na declaração de nulidade do acto de 8.10.1996, pese embora os seus diferentes destinatários. Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida, na parte em que declarou a nulidade do acto do Sr. Vereador do Pelouro do Urbanismo e Fomento Desportivo de 08.10.1996, assim se fazendo inteira justiça.

* C - Em contra-alegações, o Vereador do Pelouro de Urbanismo e Mobilidade da C.M. do Porto concluiu como segue: 1. A decisão recorrida, na parte em que manteve os actos recorridos de 4.12.1995, 14.12.1995, 21.11.1996 e 31.01.1997, não merece qualquer censura, pelo que deverá ser negado provimento ao recurso interposto pelos Recorrentes.

2. Como escrevem Pedro Gonçalves e Fernanda Paula Oliveira, in CEDOUA 2/99, págs 15 e ss, “ainda que sem produzir efeitos jurídicos típicos, o acto nulo pode comandar ou provocar a produção de efeitos materiais mediante a criação de situações de facto que só podem considerar-se-lhe imputadas, isto é, que devem considerar-se produzidas ou criadas ao abrigo do acto, que, no entanto, é nulo” 3. A este respeito, refere-se no parecer do Ministério Público, de 28.06.2005, no âmbito do processo 00052/05, que ‘a via da legalização das operações urbanísticas implica, após a declaração de nulidade dos actos administrativos em causa, a prática de novos actos de licenciamento das operações consolidadas, desta vez sem o vício causador da nulidade.” 4. No caso sub judicio, não se vislumbra, pois, qualquer efeito útil em declarar a nulidade relativamente a uma situação de facto que veio a ser validada por ato jurídico posterior e que, por conseguinte, se mostra plenamente válida e eficaz.

5. Se o decurso do tempo, em bom rigor, não faz degradar a nulidade, poderá conduzir, não obstante, à atribuição de certos efeitos jurídicos às situações de facto consolidadas.

6. Tal como se refere, e bem, na sentença recorrida “o acto proferido em 21.11.1996, através do qual foi licenciada a alteração ao alvará de loteamento nº ...8, que passou a permitir a construção, nos lotes ...6 a ...2, de edifício de habitação colectiva com cave e 3 pisos acima da cota da soleira não é ilegal”, sendo que “em virtude da prolação deste acto (...) e subsequente emissão de alvará de loteamento corrigido e devidamente publicado, passou a permitir-se a construção do edifício que tinha sido objecto das decisões emitidas em 4.12.1995 e 14.12.1995".

7. Forçoso concluir, com a douta sentença, que “apresenta-se como lógico e racional, para além de conforme aos princípios da proporcionalidade, boa-fé e justiça, considerar que a emissão da decisão de 21.11.1996, a que se seguiu a emissão do alvará de loteamento corrigido e publicado em 07.03.1997. procedeu à legalização da construção edificada nos lotes ...6 a ...2 a coberto das decisões de 4.12.1995 e 14.12.1995 devendo, consequentemente, aproveitar-se as mesmas.", 8. Sendo "despiciendo e inútil proceder nesta sede à declaração de nulidade dos sobreditos actos (...) uma vez que a decisão a proferir em sede executiva não deixará de oferecer o mesmo resultado prático”, posto que "em situações similares à presente, tem entendido a Jurisprudência que a primeira via a seguir, em sede executiva, é a da avaliação da possibilidade de legalização ou de conformação da construção com os normativos que determinaram a invalidade dos actos que a permitiram. E, em caso de resposta positiva, determinar a emissão dos actos ou operações materiais necessárias à legitimação e estabilização na ordem jurídica dos efeitos derivados cia situação ôntica, isto ó, da existência fáctica da edificação/construção.” 9. In casu, a legitimação e estabilização na ordem jurídica dos efeitos derivados da existência fáctica da edificação/construção, a admitir-se serem os actos de 4.12.1995 e 14.12.1995 nulos, o que não se concede, já se mostram alcançadas pela legalização da construção em causa, Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado improcedente, assim se fazendo inteira Justiça.

* Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos Juízes Conselheiros Adjuntos, vem para decisão em conferência.

* Em 1ª Instância foi julgada provada a seguinte factualidade: 1. Em 25/03/1988, a Fundação ... apresentou à Câmara Municipal do Porto pedido de aprovação da divisão de um terreno de sua propriedade, situado em ..., em 63 lotes e correspondente emissão do respectivo alvará de loteamento, pedido esse a que foi tramitado como processo ordinário...

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