Acórdão nº 114/22.6T8SRE.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução10 de Outubro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I - AA, interpôs acção declarativa sob a forma de processo comum, contra A..., Lda. pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de €4.306,39 (quatro mil, trezentos e seis euros e trinta e nove cêntimos), a título de danos patrimoniais, correspondente a mesma à quantia necessária para a reparação e/ou eliminação dos defeitos, anomalias e deteriorações verificadas na obra, e também no pagamento da quantia de €2.000,00 (dois mil euros) a título de danos não patrimoniais, uma e outra dessas quantias acrescidas de juros de mora, calculados desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento.

Alega, para tanto, e em síntese, que, em Maio de 2021, contratou com a R. o fornecimento e montagem de um Kit Piscina e Acessórios num prédio de sua propriedade, pelo preço de € 8.913,20 acrescido de IVA, ou seja, de € 10.963,14, a pagar por duas tranches, uma com a adjudicação, e outra com a entrega, montagens e testes, contrato esse que configura como contrato de empreitada. Tal contrato englobava, designadamente: a) Aplicação de uma estrutura em aço; b) Aplicação de revestimento em tela armada; c) Montagem do revestimento e de casa das máquinas; d) Instalação de equipamentos de filtração; e) Instalação de equipamentos da casa das máquinas; f) Instalação de equipamentos de tratamento de água. Os trabalhos iniciaram-se em 15 de Junho de 2021 e foram concluídos no início de Julho. Contudo, a obra foi concluída com vícios que desvalorizam e impedem que a piscina realize cabalmente o fim a que se destina, designadamente: a) Necessidade de montagem de uma válvula de retenção à entrada da bomba, pois que esta estava desferrada dado que a água havia descido para a piscina porque a bomba estava instalada acima do nível de água sem válvula de retenção (contrariamente às boas artes); b) Necessidade de montagem de uma tubagem para esgoto para local próprio; c) Necessidade de corrigir a colocação das tubagens instaladas, uma vez que estas se encontravam penduradas e sem suporte; d) Reaplicação da tela, sendo notória a sua deficiente aplicação, tendo a tela rugas; e) Proceder à correcção no tratamento da água, uma vez que o cloro, o ph e a alcalinidade estavam em níveis muito baixos e com falta de filtração. A Autora interpelou a Ré para reparar ou eliminar os vícios/defeitos, ou, caso estes se não pudessem ser eliminados, a proceder a nova construção, o que acabou por não suceder. No que respeita à válvula de retenção a A. acabou por a solicitar à sociedade B..., que a instalou, pois que a R., apesar de se ter obrigado, em email, a suportar os custos relativos à mesma, o não fez, o que determinou a A. a relatar o sucedido no Livro de reclamações. No mais, considerando a posição da R., a A. solicitou um orçamento à empresa C..., Lda. para reparação dos defeitos, cifrando-se o mesmo em €4.153,96 (quatro mil, cento e cinquenta e três euros e noventa e seis cêntimos). Alega ainda a A. que, na sequência dos defeitos verificados na piscina, ficou profundamente triste e ansiosa, sentindo-se enganada e defraudada, devendo ser ressarcida no valor de €2.000,00 (dois mil euros) a título de danos não patrimoniais. A R. contestou, invocando, para além da excepção de incompetência territorial, a sua ilegitimidade, referindo ter fornecido o Kit Piscinas a BB, a pedido de CC, não tendo assumido a qualidade de empreiteiro da A., tanto mais que, como consta do documento que titula o contrato, a montagem e construção civil seriam realizadas por conta do cliente. Segundo ela, apenas se comprometeu a efectuar o acompanhamento (assessoria técnica) na montagem da piscina do seu cliente BB. O contrato de empreitada da construção da piscina (escavações, enchimento de cimento, nivelamentos, enchimento de terras) foi celebrado entre a A. e BB e por seus subordinados, com recurso a mão de obra, subcontratados pelo próprio, e materiais e bens adquiridos pelo próprio, limitando-se a R. a assessorar os trabalhos técnicos na construção e montagem da piscina, por parte de BB. No mais, impugnou os factos alegados na acção, referindo que durante a construção e montagem da piscina, afirmou, por diversas vezes, quer a DD quer a BB, que deveriam ser respeitados os tempos de secagem do betão e dos materiais, ou seja, foram alertados para a necessidade de respeitar o cumprimento das boas práticas no processo de montagem e construção civil, o que não terá sucedido, razão pela qual foram provocados os defeitos alegados na petição inicial. Deduziu ainda reconvenção, entendendo que a actuação da A., ao reclamar no livro de reclamações disponível online e, assim, acessível ao público, implicou que denegrisse a sua imagem, causando-lhe elevados prejuízos, ainda não quantificáveis, entendendo que o seu bom nome e reputação foram afectados, razão pela qual deve ser indemnizada, a título de danos não patrimoniais, em valor não inferior a € 1.500,00. Sustenta ainda que a A. litiga com má-fé, na medida em que anunciou no site Booking uma piscina perfeitamente operacional, no seu alojamento local e a funcionar na perfeição, sendo, assim, falso que haja um incumprimento definitivo do contrato que lhe seja imputável.

Na réplica a A. impugnou a versão dos factos referentes à litigância de má-fé, reiterando que o contrato foi celebrado entre ela e a R. e que o anúncio no Booking não colide com a verificação dos defeitos na piscina. No que respeita aos danos não patrimoniais alegados pela R., entende que os mesmos não se verificam, por não bastar a invocação à honra ou bom nome da R., sendo necessário que a mesma alegasse expressamente os danos, nomeadamente a título de lucros cessantes. E termina pedindo a condenação da R. como litigante de má-fé.

A A. foi notificada para responder às excepções deduzidas na contestação e a R. notificada para se pronunciar quanto à litigância de má-fé suscitada na réplica.

A A. respondeu à excepção de incompetência e de ilegitimidade processual, reiterando que o contrato foi celebrado com a R..

A R. respondeu ao pedido de condenação como litigante de má-fé.

Foi realizada audiência prévia, onde foi proferido despacho a admitir a reconvenção e despacho saneador, no âmbito do qual foram conhecidas as excepções processuais invocadas, e após, despacho de fixação do objecto do litígio e de enunciação dos temas da prova.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a R. a pagar à A. a quantia de €152,43 (cento e cinquenta e dois euros e quarenta e três cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% (ou outra que entre em vigor), desde a data da citação até efectivo e integral pagamento; bem como a quantia necessária para reparação dos defeitos nos termos mencionados em 4.1.11. e 4.1.13. dos factos provados, com excepção da válvula de retenção, a apurar em sede de liquidação de sentença, nos termos dos artigos 358.º, n.º 2, e 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, absolvendo tal R. do demais peticionado; julgou a reconvenção improcedente, absolvendo a A. do pedido, bem como julgou improcedentes os pedidos de condenação como litigantes de má-fé.

II - Do assim decidido apelou a R., que concluiu as respectivas alegações, com as seguintes conclusões: Da relação de consumo, entre Recorrente e Recorrida: 1. O presente Recurso vem interposto da sentença em crise, na medida em que julgou a acção parcialmente procedente, e incorpora impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada.

  1. A contradição entre factos provados e a decisão determina a nulidade da sentença, nos termos prescritos no artigo 615º, n.º 1 alínea c) do CPC.

  2. Caso assim não se entenda, poderemos estar perante um erro ou vício da decisão de facto, situações que encontram acolhimento na previsão do artigo 662º do CPC, relativamente à modificabilidade da decisão de facto, à luz do qual devem ser avaliadas.

  3. Com efeito, prescreve o artigo 1º-A do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8/04, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º 84/2008, de 21/05, conjugado com o disposto no artigo 2º n.º 1 da Lei 24/96 de 31/07, sendo a relação de empreitada de consumo aquela que é estabelecida entre alguém que destina a obra encomendada a um uso não profissional (o consumidor).

  4. Ora, nos factos dado como provados o Tribunal a quo considerou que a Recorrida “(…) a Autora anuncia a piscina, no seu alojamento local (…) 31 A piscina esteve aberta aos clientes que arrendam o espaço, em regime de arrendamento ou alojamento local”.

  5. Foi o próprio legislador que insofismavelmente qualificou os estabelecimentos de alojamento local como aqueles que prestam serviços de alojamento temporário, nomeadamente a turistas, mediante remuneração - artigo 2º, n.º 1, do Regime Jurídico do Alojamento Local.

  6. O legislador reforçou essa vertente de prestação de serviços no artigo 4.º, n.º 1, do mesmo diploma, de forma absolutamente clara, ao estipular que para todos os efeitos, a exploração de estabelecimento de alojamento local corresponde ao exercício, por pessoa singular ou colectiva, da actividade de prestação de serviços de alojamento.

  7. O próprio STJ considerou que “o alojamento local é inquestionavelmente uma prestação de serviços”.

    9. Apesar de a Recorrida ser uma pessoa singular, o TRL observou que consumidor é aquela pessoa singular que “(…) adquira bens ou serviços para uso pessoal ou familiar”.

  8. No entanto a Recorrida adquiriu o bem para uso profissional, retirando dele um benefício económico exclusivo (alojamento local) (pontos 4.1.27 e 4.1.28 dos factos dados como provados.

    11. Uma vez que de acordo com o testemunho do filho a Recorrida não reside na propriedade mas em ... (testemunho do Sr. DD aos 16:05 a 16:06) 12. Pelo que a Recorrida nunca poderia ter sido enquadrável como consumidora.

    Do contrato celebrado entre Autora e Ré: 13. A douta decisão recorrida considerou que Recorrente e Recorrida firmaram entre si um acordo, no...

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