Acórdão nº 2280/22.1T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução04 de Outubro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório AA e mulher, BB instauraram ação declarativa sob a forma de processo comum contra CC, formulando as seguintes pretensões: «a) Declarar-se válida e eficaz a oposição à renovação do contrato de arrendamento identificado no art.º 3.º desta petição inicial, deduzida pelos AA. mediante comunicação remetida ao R. e por ele recebida aos 24/02/2022 e que a mesma produziu os seus efeitos aos 30/06/2022; b) Declarar-se que o R. está em mora quanto à obrigação de entrega do locado e do respetivo recheio desde 30/06/2022; c) Condenar-se o R. a restituir aos AA. o locado, livre e devoluto de pessoas e bens; d) Condenar-se o R. a restituir ao AA. os equipamentos, mobiliário e demais recheio alugados conjuntamente com o imóvel identificado no Art.º 1.º da petição inicial, os quais devem ser entregues, procedendo à substituição desses bens por outros ao mesmo nível de qualidade ou indemnizando os AA. pelo valor correspondente aos mesmos, na eventualidade dos bens em causa se terem, entretanto, deteriorado ou deixado de estar aptos para o fim a que se destinam; e) Condenar-se o R. a pagar aos AA. a importância de € 500,00 (Quinhentos) euros, correspondente à indemnização vencida pelo atraso na restituição do locado; f) Condenar-se o R. a pagar aos AA. a indemnização correspondente ao dobro da renda convencionada (2 x € 250,00), rendas vincendas contadas desde a data da entrada em juízo da presente ação e data da efetiva restituição da fração arrendada.

(..)».

Para o efeito alegam, no essencial, que por “Contrato de Arrendamento para fim habitacional com prazo certo”, celebrado aos 14-06-2014, o autor marido, no estado de solteiro, deu de arrendamento ao réu a fração autónoma que identificam no artigo 1.º da petição inicial. Tal ajuste incluiu, também, o aluguer de um conjunto de equipamentos, mobiliário ou recheio e foi celebrado pelo prazo de 3 anos, com início em 01-07-2014 e términus no dia 30-06-2017, renovando-se automaticamente no termo daquele prazo, por períodos sucessivos de 1 ano. Por carta registada com aviso de receção, datada de 22-02-2022, que o réu rececionou, o autor comunicou ao réu a oposição à renovação do contrato, pelo que o mesmo cessaria no final do mês de junho de 2022. Apesar de tal comunicação, o réu, que persiste em não aceitar a cessação do contrato de arrendamento celebrado, não procedeu à entrega do locado, permanecendo no imóvel e recusando-se a entregá-lo ao senhorio, ora autor, o que leva à necessidade de recurso à via judicial para que a entrega do locado possa efetivar-se.

O réu contestou, aceitando que entre as partes foi outorgado o contrato de arrendamento para fim habitacional, com prazo certo, aludido e junto aos autos, o qual, por força das sucessivas renovações e da alteração legal aludida pelos autores, em 1 de julho de 2019, se renovou pelo prazo de 3 anos, ou seja, até ao dia 30 de junho de 2022. Mais reconhece que rececionou a missiva junta aos autos como documento n.º ..., destinada à oposição à renovação do contrato de arrendamento em causa, excecionando, porém, que a mesma enferma de vícios que a tornam ineficaz, já que, para produzir os seus legais efeitos teria de ser assinada pelo autor, senhorio, ou então por mandatário judicial munido de procuração forense com poderes especiais para tal efeito, o que não sucedeu no presente caso. Mais alega que os autores não cumpriram o prazo de oposição à renovação do contrato, que era de 240 dias, sendo que a carta foi recebida com pouco mais de 120 dias de antecedência sobre a data da renovação contratual, motivo pelo qual o contrato de arrendamento em causa nos presentes autos não cessou no dia 30 de junho de 2022, nem em qualquer outro. Por último, invocou o regime excecional e transitório previsto no artigo 6.º-E, n.º 7, alínea c), da Lei n.º 13-B/2021 de 5-04 para obstar à entrega do locado. Conclui no sentido da improcedência da ação.

Os autores exerceram o contraditório, respondendo às exceções invocadas pelo réu e pugnando pela respetiva improcedência.

Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença julgando a ação procedente, a qual se transcreve na parte dispositiva: «Pelo exposto e atentas as considerações expendidas, julga-se a presente acção procedente, por provada e, consequentemente, decide-se: - declarar válida e eficaz a oposição à renovação do contrato de arrendamento celebrado com o Réu, levada a cabo pelos Autores AA e esposa BB mediante comunicação remetida ao Réu DD e por ele recebida em 24 de Fevereiro de 2022, a qual produziu os seus efeitos em 30 de Junho de 2022; - declarar que o Réu DD está em mora quanto à obrigação de entrega do locado e do respetivo recheio desde 30 de Junho de 2022; - condenar o Réu DD a restituir aos Autores AA e esposa BB o locado, livre e devoluto de pessoas e bens, bem como os equipamentos, mobiliário e demais recheio alugados conjuntamente com o imóvel; - condenar o Réu DD a pagar aos Autores AA e esposa BB a importância de € 500 correspondente à indemnização vencida pelo atraso na restituição do locado; - condenar o Réu DD a pagar ao Autores AA e esposa BB a indemnização correspondente ao dobro da renda convencionada, rendas vincendas contadas desde a data da entrada em juízo da presente ação até efetiva restituição da fração arrendada.

Custas a cargo do Réu, pois deu azo aos presentes autos e nele decaiu – cfr. artigo 527º, do Código de Processo Civil.

(…)».

Inconformado, o réu apresentou-se a recorrer, pugnando no sentido da revogação da sentença, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. O Tribunal “a quo” não valorou nenhum dos argumentos expendidos pelo recorrente, nomeadamente o incumprimento da formalidade na carta de oposição de oposição à renovação.

  1. A carta de oposição à renovação do contrato de arrendamento foi assinada por mandatário, não pelo senhorio, ora recorrido.

  2. O artigo 9º, n. 1 do NRAU estabelece que as comunicações relativas à cessação do contrato de arrendamento são realizadas mediante escrito assinado pelo declarante e remetido através de carta registada com aviso de receção.

  3. O Tribunal “a quo” entendeu que tal missiva podia ser assinada por mandatário, ao abrigo de um mandato com representação, e que tal obedecia aos formalismos previstos no referido n.º 1.

  4. E que se o recorrente tivesse alguma dúvida acerca dessa representação, deveria ter solicitado prova de tal representação, nos termos do artigo 260º do Código Civil.

  5. É de todo desrazoável estar a impor ao recorrente que reaja a uma missiva formalmente mal efetuada, ou seja, assinada por quem não tem legitimidade para esse efeito.

  6. Tal desrazoabilidade ainda mais latente pelo facto do subscritor da referida carta ser Advogado, logo com a obrigação de saber que para demonstrar a legitimidade da sua atuação, deveria anexar procuração outorgada pelo recorrido a conceder-lhe poderes especiais para efetuar a oposição à renovação do contrato de arrendamento.

  7. O NRAU é uma lei especial que contém regras específicas que têm de ser respeitadas por senhorios e arrendatários, lei esta que prevalece sobre a lei geral, ou seja o Código Civil.

  8. O n.º 1 do artigo 9º do NRAU não prevê que as comunicações aí referidas, nomeadamente as relativas à cessação do contrato de arrendamento, sejam assinadas por mandatários, mas sim pelos próprios declarantes.

  9. Contrariamente ao referido pelo Tribunal “a quo” não nos parece que possam ser efetuadas por mandatário, mesmo que munido dos devidos poderes para esse efeito.

  10. Se tal tivesse sido a pretensão do legislador, então teria consagrado tal possibilidade, tal como o fez no n.º 7 do mesmo artigo 9º do NRAU.

  11. Versando sobre a comunicação pelo senhorio destinada á cessação do contrato de arrendamento por resolução, o referido n.º 7), na sua alínea b), refere que a mesma pode ser efetuada mediante contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente de execução, comprovadamente mandatado para o efeito.

  12. O n.º 1 do artigo 9º do NRAU não prevê tal hipótese, ou seja, as comunicações relativas à cessação do contrato de arrendamento têm de ser assinadas pelos declarantes, ou seja, senhorio ou arrendatário.

  13. Mesmo não prevendo tal hipótese, fazendo uma interpretação muito extensiva da lei, se tal comunicação fosse assinada por um advogado ou mandatário, no mínimo o que seria exigível é que a mesma fosse devidamente instruída com procuração com poderes especiais para esse efeito.

  14. O recorrente considera ainda que o recorrido não cumpriu o prazo mínimo de comunicação da oposição à renovação do contrato de arrendamento.

  15. A carta foi recebida pelo recorrente com a antecedência de mais de 120 dias sobre a data em que o contrato cessaria, oposição à renovação deduzida nos termos do artigo 1098º, n.º 1, alínea a) do Código Civil, conforme referido no item 15º da petição inicial.

  16. Para a oposição à renovação ao contrato de arrendamento para fins habitacionais, com prazo certo, por parte do senhorio, aplica-se o estatuído no artigo 1097º, n.º 1, alínea a) do mesmo diploma legal, nos termos da qual a comunicação para impedir a renovação do contrato de arrendamento teria de chegar ao conhecimento e posse do arrendatário, ora recorrente, com a antecedência mínima de 240 dias sobre a data em que a renovação se operaria.

  17. O Tribunal “a quo” refere que o recorrido cumpriu o prazo dado que entende que é aplicável à presente situação o previsto no artigo 1097º, n.º 1, alínea b) do Código Civil, dado que o contrato foi celebrado por três anos.

  18. O recorrente não pode concordar com tal interpretação dado que a relação arrendatícia por força do prazo inicial de celebração do contrato e das suas renovações já vigora desde 1 de Julho de 2014, ou seja, no momento em que o recorrido pretendeu opor-se à sua renovação, vigorava há oito anos.

  19. Estando o contrato de arrendamento em vigor há oito anos, o prazo mínimo para o senhorio deduzir oposição à sua renovação...

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