Acórdão nº 3805/22.8T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL
Data da Resolução04 de Outubro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório AA intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra Caixa Geral de Aposentações e BB, no Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo de Família e Menores ... - Juiz ....

Formula os seguintes pedidos: 1.

Condenar a 1ª ré a reconhecer que a autora viveu em união de facto, com vivência em comum de entreajuda e partilha de recursos, com o falecido CC desde o dia .../.../2014 até ao dia 29 de Novembro de 2020, com última morada na Rua ..., ... esquerdo, ..., ... ...; 2.

Condenar a 1ª ré a reconhecer o direito da autora à pensão de sobrevivência por morte de CC, condenando-a ao seu pagamento; 3.

Condenar a 1ª ré a pagar à autora as pensões de sobrevivência que se venceram nos meses de Maio de 2022 a Novembro de 2022, e ainda os valores vincendos, com juros de mora à taxa de 4% ao ano, contados desde o vencimento de cada uma das indicadas pensões mensais; 4.

Condenar a 2ª ré a reconhecer que a autora viveu em união de facto, com vivência em comum de entreajuda e partilha de recursos, com o falecido CC desde o dia .../.../2014 até ao dia 29 de Novembro de 2020, com última morada na Rua ..., ... esquerdo, ..., ... ....

Para sustentar esses pedidos, alega em síntese que viveu em união de facto com o falecido CC desde o dia .../.../2014 até ao dia 29 de Novembro de 2020.

O indicado CC faleceu no dia .../.../2020, e era subscritor da 1ª ré.

No dia 02/02/2021 a autora requereu juntos dos serviços da 1ª ré a pensão de sobrevivência por óbito de CC, sendo que a 1ª ré deferiu o pedido da autora, fixando a pensão de sobrevivência na quantia mensal bruta de € 2.476,64.

A autora requereu a pensão de sobrevivência tempestivamente.

A 1.ª ré pagou à autora as pensões de sobrevivência respeitantes aos meses de Dezembro de 2020 a Abril de 2022, inclusive.

Entretanto a 2.ª ré também requereu à 1.ª ré a pensão de sobrevivência por óbito de CC, e intentou contra a ora autora uma acção cível no Juízo Local Cível ..., com vista a obter declaração de inexistência de união de facto.

Este processo terminou na fase de saneamento, com prolação de despacho a absolver da instância a ré por incompetência material do Tribunal.

A 1ª ré suspendeu o pagamento das pensões de sobrevivência que lhe vinha a fazer.

Por despacho liminar, e ao abrigo dos artigos 96º, 97º, e 99º CPC, o M.mo Juiz titular indeferiu a petição inicial, com fundamento em incompetência do Tribunal em razão da matéria.

Inconformada com esta decisão, a autora dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo (artigos 629º,1, 631º,1, 637º, 638º,1, 644º,1,a), 645º,1,a) e 647º,1 do Código de Processo Civil).

Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: A- A recorrida “CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P.” decidiu correctamente, por acto administrativo, atribuir a pensão de sobrevivência à recorrente, sendo que esse acto administrativo não foi revogado; B- A recorrente não viu a recorrida “CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P.” indeferir-lhe a atribuição da pensão de sobrevivência, daí que nos presentes autos a discussão não se desenvolva em torno de actos administrativos e, consequentemente, não esteja em causa, face ao objecto do processo e aos pedidos formulados na petição inicial, um caso de incompetência absoluta por infracção das regras de competência em razão da matéria; C- Somente pelo facto de ter concorrido à mesma pensão de sobrevivência uma terceira pessoa, mais concretamente a recorrida BB, foi suspenso o pagamento da pensão, até se decidir quem realmente vivia em união de facto com o falecido; D- O Juízo de Família e Menores ... é o tribunal materialmente competente para decidir o presente litígio, tanto na parte respeitante à existência da união de facto, como no que diz respeito ao pedido de condenação da recorrida “CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P.” no reconhecimento e pagamento da pensão de sobrevivência à recorrente; E- Sendo o pedido principal o reconhecimento, pelas recorridas, da união de facto da recorrente com o falecido CC, e para o caso de se entender que o pedido de condenação no reconhecimento e pagamento da pensão de sobrevivência que entretanto foi suspensa pela recorrida “CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P.” é da competência da jurisdição administrativa e fiscal, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, sempre se diga que este último pedido surge numa relação de dependência com o pedido principal, razão pela qual, nos termos do número 3 do artigo 82º do CPC, sempre seria o Juízo de Família e Menores ... o competente para apreciar ambos em pedidos.

F- Caso se entenda que o pedido de condenação no reconhecimento e pagamento da pensão de sobrevivência, que, entretanto, foi suspensa pela recorrida “CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P.”, é da competência da jurisdição administrativa e fiscal, então somente este pedido é que poderá ditar a absolvição da instância das recorridas e não, como foi decidido, o indeferimento liminar da petição inicial.

G- Daí que a sentença recorrida deva ser revogada.

A CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, Ré nos autos referenciados, notificada nos termos do nº 7 do artigo 641º do Código de Processo Civil dos termos do recurso interposto pela Autora do despacho de indeferimento liminar da petição inicial por si apresentada, veio dizer o seguinte: 1º A Autora, através da presente acção judicial, intentada no Juízo de Família e Menores ..., pretende que seja declarado que viveu em situação de união de facto com CC desde 2014 até à data da sua morte.

  1. Por sentença de 24 de Novembro de 2022, o Juízo de Família e Menores considerou ser materialmente incompetente para julgar a causa. Decidiu que a acção deveria ser intentada na jurisdição administrativa e não na jurisdição judicial.

  1. Não lhe assiste razão.

  2. Existindo dúvidas no âmbito do procedimento administrativo para atribuição de uma pensão de sobrevivência a um unido de facto, a acção de simples apreciação para apuramento da união de facto – a que alude o nº2 do artigo 6º da Lei nº 23/2010, de 30 de Agosto - deve ser intentada na jurisdição judicial e não na jurisdição administrativa.

  3. Só quando, ultrapassadas as dúvidas, a Caixa Geral de Aposentações profere uma decisão administrativa é que os interessados, caso descordem do sentido da mesma, podem impugná-la na jurisdição administrativa. Decorre da Constituição da República Portuguesa, mas também do ETAF, que a jurisdição administrativa é a jurisdição “comum” para o conhecimento de litígios emergentes de relações jurídicas administrativas.

  4. O conceito de relação jurídica administrativa deve ser entendido como o elemento chave de distinção na repartição de jurisdição entre os tribunais judiciais e os tribunais administrativos, sendo que, na falta de clarificação legislativa do conceito constitucional de relação jurídica administrativa, deve entender-se...

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