Acórdão nº 52169/22.7YIPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2023

Data12 Outubro 2023
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

* I - Relatório A Autora, veio intentar contra a Ré a presente ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) emergentes de contratos, peticionando a condenação desta a pagar a quantia de € 89,64, acrescida de juros de mora vencidos, no montante de € 0,84, e juros de mora vincendos à taxa legal.

Para tanto, sumariamente, alegou ter prestado serviços de saneamento à Ré, que a mesma não pagou.

Regularmente citada veio a Ré contestar, excecionando a autoridade do caso julgado e impugnando o contrato e as faturas juntas ao processo.

Concluiu, requerendo a improcedência da ação.

Os autos prosseguiram os seus termos, tendo sido proferido despacho em 06.07.2022, aquando da marcação da audiência de julgamento, no qual se indeferiu a invocação da autoridade do caso julgado pela Ré, concluindo-se nos seguintes termos: In casu, a Ré invoca a autoridade de caso julgado com referência à sentença proferida na ação n.º 1926/20.0T8STS, em que as partes são as mesmas dos autos, porém, a Autora impetrou o pagamento de faturas díspares, sendo que, em matéria de fundamentos de facto, o item I) dos factos provados afigura-se marcadamente denegatório, genérico e conclusivo, imprestável para induzir a autoridade de caso julgado em sede de relações de prejudicialidade.

Pelo supra exposto, indefere-se o requerido.

Esta decisão não foi objeto de recurso de apelação autónomo.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida sentença onde se julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, se decidiu: a) Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de 89,64€ (oitenta e nove euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos à taxa legal aplicável com referência às obrigações civis, computados desta a data da citação até integral pagamento; b) Absolver Ré do demais peticionado.

Nessa mesma sentença foi fixado à ação o valor de € 90,48.

A Ré interpôs recurso desta decisão para o Tribunal da Relação, onde impugnou o despacho proferido em 06.07.2022, que, por acórdão proferido em 20.04.2023, decidiu: Pelo exposto, julga-se procedente o presente recurso e, em consequência, revoga-se nos seguintes termos a decisão proferida: Tem-se por verificada a exceção perentória inominada do efeito de caso julgado e, em consequência, absolve-se a ré AA do pedido que contra si foi formulado nos autos pela autora Águas do Norte S.A.

A Autora veio arguir a nulidade deste acórdão e requerer a sua reforma, tendo sido proferido novo acórdão pelo Tribunal da Relação, em 29 de junho de 2023, indeferindo o requerido.

A Autora interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando o disposto nos artigos 674.º, n.º 1, a), b) e c), e 629.º, n.º 2, a) e d), ambos do Código de Processo Civil, tendo concluído as suas alegações de recurso do seguinte modo: 1. Vem o presente recurso interposto do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, que revoga a sentença proferida pelo tribunal de primeira instância, com o que, salvo devido respeito, a recorrente não se resigna.

  1. O acórdão recorrido, cuja fundamentação, com o devido respeito, é manifestamente parca e desadequada da realidade fático-jurídica, viola a legislação vigente e aplicável à relação material controvertida, viola a lei processual, mostra-se ferido do vício de nulidade, por excesso e por omissão de pronúncia, ofende o caso julgado formal, e é diametralmente oposto aos demais acórdãos proferidos pelo mesmo Tribunal da Relação no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, 3. O que levou a recorrente a interpor o presente recurso de revista, ao abrigo do estatuído nas als. a), b) e c) do n.º 1 do art. 674.º, e nas als. a) e d) do n.º 2 do art. 629.º, ambos do C.P.C., com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, nos devidos termos do vertido no art. 671.º, n.º 1 do art. 675.º e n.º 1 do art. 676.º do mesmo diploma legal.

    i) Da violação da lei substantiva 4. Escalpelizado o douto acórdão a que se reage, assistimos, em rigor, a uma desconsideração dos diplomas aplicáveis à relação sub judice, e sintetizados pela recorrente, designadamente o DL n.º 194/2009, de 20 de Agosto, DL n.º 93/2015, de 29 de Maio, DL n.º 72/2016, de 4 de Novembro e DL n.º 90/2009, de 9 de Abril.

  2. E, do mesmo passo, do Contrato de Parceria de 5 de Julho de 2013, e Contrato de Gestão dessa mesma Parceira de 26 de Julho de 2013.

  3. A ora recorrente sucedeu - não por via de nenhuma cessão da posição contratual, mas - legalmente - às Águas do Noroeste, S.A. enquanto entidade gestora da parceria.

  4. A legitimidade ativa da ora recorrente advém da sucessão legal a que se assistiu por força do Decreto-Lei n.º 93/2015, de 29 de Maio.

  5. Preceitua, designadamente, o n.º 4 do art. 63.º do DL n.º 194/2009, de 20 de Agosto que: “Quando a entidade gestora do serviço de abastecimento de água não seja responsável pelos serviços de saneamento e de gestão de resíduos, deve comunicar às entidades gestoras destes serviços uma listagem mensal dos novos utilizadores do serviço de abastecimento, considerando-se todos os serviços contratados a partir da data do início de fornecimento de água, caso estes não tenham sido objecto de contrato autónomo.” (sublinhados nossos) 9. É manifesto o erro perpetrado pelo Venerando Tribunal, ao preterir todo um regime legal expressamente previsto para a conformação da relação jurídica em apreço, como é manifesto o erro na interpretação e aplicação dessa mesma legislação, culminando por adulterar a qualificação jurídica dos factos de modo insustentado e, infundadamente.

  6. Salvo melhor opinião, o ajuizamento em consonância com essa mesma legislação resultaria em decisão distinta da proferida no douto acórdão, motivo pelo qual, por força da violação da legislação especial decorrente do DL n.º 194/2009, de 20 de Agosto, DL n.º 93/2015, de 29 de Maio, DL n.º 72/2016, de 4 de Novembro e DL n.º 90/2009, de 9 de Abril, ex vi da al. a) do n.º 1 do art. 674.º, do C.P.C., deverá o mesmo ser revogado em conformidade com os fundamentos realçados pela recorrente.

    SEM PRESCINDIR, ii) Da violação ou errada aplicação da lei de processo 11. Da análise do acórdão proferido, retira-se que os Venerandos Juízes Desembargadores, fundamentam a decisão numa incorreta interpretação e, consequentemente, erro na aplicação da lei de processo, assistindo-se, assim, a lapso manifesto, o qual é evidente e incontroverso.

  7. Falamos em concreto de erro na aplicação da norma (e sua interpretação) subjacente à alínea a) do n.º 2 do art. 629.º do C.P.C., não obedecendo o Digníssimo Tribunal aos requisitos processuais de admissibilidade do recurso com respeito à referida norma.

  8. Estipula o referido preceito legal que, “Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso: Com fundamento (…) na ofensa de caso julgado.» 14. A alínea a) do n.º 1 do artigo 629.º do C.P.C, admite recurso, independentemente da alçada ou sucumbência, de sentenças que ofendam o caso julgado, enquanto exceção dilatória.

  9. Do que se conclui que a autoridade de caso julgado não constitui fundamento recursivo, enquanto exceção perentória inominada, como bem a classifica o Tribunal da Relação no seu douto acórdão, não decidindo, porém, em consonância com essa mesma distinção.

  10. No presente caso, não se verifica a tripla identidade entre ações, que permita dar por verificada a referida exceção.

  11. O que está em causa, é, em boa verdade, saber se a sentença anteriormente proferida no processo n.º 1926/20.0T8STS poderia (ou não) ser imposta como autoridade de caso julgado numa ação posterior, como é o caso da presente.

  12. Sendo a resposta negativa, em face da nova matéria factual alegada e dada como provada nos presentes autos, faltando a necessária relação de prejudicialidade.

  13. Vale por isto dizer que sufragamos o entendimento de que inexistindo qualquer caso julgado violado, a (pretensa) autoridade deste não constitui fundamento de recorribilidade, nos termos e para os efeitos do estatuído na al. a) do n.º 2 do art. 629.º do C.P.C.

  14. Ora, estamos convictos que o ajuizamento em consonância com a lei processual vigente...

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