Acórdão nº 02479/21.8BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução04 de Outubro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte - Subsecção Social -: RELATÓRIO «AA», com domicílio na Rua ..., no Porto, veio instaurar acção administrativa contra o Ministério da Educação, com sede na Avenida ..., ..., em ..., através da qual peticiona a sua condenação no pagamento à compensação devida pelo direito a férias nos anos de 2016 e 2017.

Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi julgada verificada a excepção de intempestividade da acção e absolvido o Réu da instância.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: I. Entende o Recorrente que o douto Saneador/Sentença se reveste de uma interpretação e fundamentação de Direito dada pelo Tribunal a quo verdadeiramente contraditória com o entendimento apresentado por aquele, acompanhado do entendimento quer da mais elevada Jurisprudência quer da mais elevada Doutrina.

  1. O Tribunal a quo considerou, erradamente, declarar procedente a exceção dilatória de intempestividade da ação arguida pela Ré, aqui Recorrida, pelo suposto motivo de caducidade do direito de ação pela adoção do meio processual que consistiu em demandar a Ré/Recorrida na ação de condenação à prática de ato devido e, nessa medida, não conheceu do mérito da causa absolvendo a Ré da instância.

  2. O Recorrente demonstrou cabalmente, através da enunciação de factos claros, objetivos e precisos, confirmados por elementos de prova cabais que a ação administrativa de condenação à prática de ato devido deveria proceder, configurando-se como meio processual adequado e correto à pretensão do Recorrente.

  3. Tal adequação do meio processual funda-se no facto de o aqui Recorrente ter apresentado requerimento ao órgão competente no dever de decidir – Direção do Agrupamento de Escolas ... – tendo este órgão, em resultado, notificado o recorrente em julho de 2020 sobre o indeferimento do requerimento, o qual se configurava como uma outra defesa do seu direito ao gozo das férias referentes aos anos de 2016 e 2017.

  4. Por tal, reside na esfera jurídica do Recorrente o direito a pedir a condenação à prática de ato devido por se verificar o pressuposto residente na alínea b), n.° 1 do artigo 67.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  5. Ademais, o Tribunal a quo deu provados os seguintes factos que, aliás, sustentam a legitimidade e veracidade da pretensão do Recorrente: “A) O Autor exerce funções de docente, sendo professor do Quadro de Nomeação Definitiva desde o ano letivo de 1990/1991 (cf. documento junto com a petição inicial sob o nº 1); B) Nos anos lecivos de 2015/2016 e 2016/2017, o Autor foi colocado no Agrupamento de Escolas ..., no Porto (cf. fls. 1 e seguintes do PA); C) A 31/08/2017, o Autor ficou colocado no Agrupamento de Escolas ... (cf. idem); D) De 04/04/2016 a 27/07/2017, o Autor esteve de baixa por razões médicas (cf. fls. 5 e seguintes do PA); E) A 19/12/2017, o Autor dirigiu à Directora do Agrupamento de Escolas ... um requerimento, do qual consta, designadamente, o seguinte: “(...) Face ao exposto, vem o signatário requerer junto de V. Exa. o seguinte: A) Seja realizado o apuramento total dos dias de férias não gozados nos anos civis de 2016 e 2017; B) Sela ressarcido dos valores correspondentes aos dias de férias não gozadas; C) Seja realizado o apuramento do valor total correspondente ao "subsidio de refeição" relativo ao período compreendido entre 28 de Julho de 2017 e 31 de Agosto de 2017; D) Seja ressarcido dos valores de "subsídio de refeição" correspondente ao período compreendido entre 28 de Julho de 2017 e 31 de Agosto de 2017.” (cf. fls. 9 e seguintes do PA); F) A 18/06/2018, a Directora do Agrupamento de Escolas ... comunicou ao Autor o seguinte: “(...) Pela presente informamos que, relativamente ao pedido de esclarecimento por nós solicitado à DGESTE no âmbito da matéria em Assunto, aqueles serviços «aguardam esclarecimentos superiores». Assim que os recepcionarmos daremos conhecimento dos mesmos.(...)” (cf. fls. 11 do PA); G) A 27/05/2020, o Delegado Regional de Educação enviou uma missiva ao Agrupamento de Escolas ..., com conhecimento ao Sindicato Independente de Professores e Educadores, na qual consta, designadamente, o seguinte: “(...) Relativamente ao assunto mencionado em epígrafe, e na sequência do nosso ofício ...18, de 14/06/2018, informa-se V.ª Exa. de que o n.° 1 do art.° 278.° da LTFP, aprovada pelo Decreto-Lei n.° 35/2014, de 20 de Junho, determina a suspensão do vínculo de emprego público o impedimento temporário por facto não imputável ao trabalhador que se prolongue por mais de um mês, nomeadamente doença, com os efeitos do art.° 129.° do citado diploma legal, enquadramento que de acordo com as orientações da Direcção Geral da Administração do Emprego Público, que é transversal a toda a Administração Pública, se aplicou até à emissão da Circular n.° 01/DGAEP/2020, de 21 de Fevereiro. Neste contexto e no caso em apreço, o docente venceu as férias a que tinha direito em 01/01/2016 e não venceu as férias em 01/01/2017, por se encontrar com o vínculo suspenso. (...)” (cf. fls. 12 do PA); H) A 16/07/2020, o Agrupamento de Escolas ... comunicou ao Autor, por via da sua Ilustre Mandatária, a resposta indicada supra (cf. fls. 13 do PA); I) A petição inicial foi apresentada neste Tribunal a 04/11/2021 (cf. fls. 1 e seguintes dos presentes autos).” VII. Portanto, o Saneador/Sentença proferido pelo Tribunal a quo faz uma apreciação jurídica dos factos desacertada.

  6. Como demonstrado, a relação jurídica de emprego público existente entre o Recorrente e a Recorrida em momento algum se suspendeu – inclusive no decorrer da baixa médica a que esteve sujeito o aqui Recorrente, entre 4 de abril de 2016 e 27 de julho de 2017.

  7. Tal se deve ao facto de “os trabalhadores da Administração Pública, que ingressaram em regime público, até 31 de Dezembro de 2005 ficam integrados no regime de protecção social convergente, ou seja, num regime de protecção social similar ao da Segurança Social, daí se chamar de convergente (Lei 4/2009 de 29/01)., emanado pelo Acórdão do STA, no âmbito do processo n.º 0109/17, datado de 28 de setembro de 2017.

  8. Regime este que se aplica ao caso concreto do aqui Recorrente, por tal “a ausência de norma especial que se refira aos efeitos das faltas por motivo de doença dos trabalhadores integrados no regime de proteção social convergente relativamente ao direito a férias, em conjugação com o disposto no artigo 15.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que é especificamente dedicado às faltas por doença, impõe, de acordo com os ditames da interpretação jurídica, a conclusão de que as faltas por doença daqueles trabalhadores ainda que superiores a 30 dias não determinam quaisquer efeitos sobre as férias.”, emanado pelo Acórdão do STA, no âmbito do processo n.° 0109/17, datado de 28 de setembro de 2017.

  9. O Recorrente aquando do seu regresso ao Agrupamento de Escolas ... decidiu dirigir um requerimento à Diretora daquele Agrupamento a solicitar o pagamento correspondente às férias não gozadas nos aludidos dois anos.

  10. Em resultado dessa apresentação, o aqui Recorrente viu o seu requerimento ser alvo de um indeferimento, consubstanciado num novo ato administrativo nulo por violar de forma manifesta o conteúdo essencial do direito a férias, consubstanciando este um direito análogo a um direito fundamental.

  11. Sendo as férias de um Trabalhador, como é o aqui Recorrente, um direito irrenunciável, pacificamente aceite quer pela Douta Jurisprudência que sobre a matéria já se versou, quer ainda pela mais vasta Doutrina, o seu não reconhecimento concretizado num ato administrativo configura, naturalmente, a violação de um direito.

  12. O direito a férias é, sem margem para dúvidas ou inquietações, um direito análogo a um direito fundamental.

  13. Como tal, o seu não reconhecimento contemplado num ato administrativo só pode contaminar o ato da invalidade mais grave, a nulidade, nos termos do artigo 161° n.° 2 alínea d) do Código do Procedimento Administrativo.

  14. E, neste seguimento, e nos termos do disposto no artigo 162° do Código do Procedimento Administrativo, a nulidade pode ser requerida a todo o tempo.

  15. Por tal, o Autor e aqui Recorrente socorreu-se da ação administrativa de condenação à prática de ato devido com a finalidade de ver a sua pretensão tutelada, isto é, decretada a nulidade do ato administrativo com a pretensão de ser emanado outro ato administrativo que reconhecesse este direito fundamental.

  16. Assim, e ao contrário daquilo que é proferido pelo Tribunal a quo no Saneador / Sentença, o meio processual adotado de condenação à prática de ato devido é adequado a tutelar a pretensão do Recorrente.

  17. Nesse sentido, elucida-nos a mais elevada Jurisprudência que “I - A condenação à prática de actos devidos pode ocorrer quer nas situações em que exista uma omissão por banda da Administração, quer exista uma recusa da prática de um acto, exigindo, o n.° 1 do artigo 66.° do CPTA, como requisito para a condenação à prática de acto devido, que a recusa ou omissão sejam ilegais.

    II - O meio processual adequado para reagir contra actos administrativos de indeferimento é a acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido, e não o processo de impugnação com vista à mera anulação ou declaração de nulidade do acto em causa.” conforme o Acórdão do TCA Norte, no âmbito do processo n.° 00584/14.6BEPRT, datado de 15 de setembro de 2016. (sublinhado e negrito nossos) XX. Por tal, o douto Saneador/Sentença prevarica o disposto no artigo 67.°, n.° 1, alínea b) do CPTA, e que nos elucida que pode a ação administrativa de condenação à prática de ato devido ser pedida quando tenha sido apresentado requerimento ao órgão competente no dever de decidir e “tenha sido praticado ato administrativo de indeferimento ou de recusa de apreciação do requerimento.”, o que desde já se releva e requer os consequentes e devidos efeitos legais.

  18. Ademais, o...

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