Acórdão nº 2544/23.7T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Setembro de 2023
Magistrado Responsável | MARIA JOSÉ CORTES |
Data da Resolução | 28 de Setembro de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, os Juízes que integram a 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – RELATÓRIO 1.1. AA requereu contra BB procedimento cautelar não especificado pedindo a procedência do mesmo e, em consequência, sem prévia audiência do requerido, que se ordenasse o encerramento do estabelecimento e proibir o requerido de aí exercer atividade, por si ou por interposta pessoa.
Para tanto alegou, em suma, que pretendeu explorar um bar e contratar o requerido como gerente do mesmo; ambos na qualidade de cessionários, celebrou com o requerido um contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial; por razões burocráticas, ficou o requerido como titular da licença de exploração, mas o requerente investiu o valor inicial, tendo entregue 43.000,00 € ao requerente e comprou bens para o bar no valor de 1.320,97 €; o requerente era visto a dar ordens no bar, quer ao requerido quer aos demais empregados, que foram por si contratados; no dia 30/06/2022 o requerido mudou a fechadura do estabelecimento, impedindo a entrada do requerente.
Deve ser determinada no imediato a suspensão de qualquer atividade comercial do estabelecimento instalado naquele local, seja pelo requerente seja pelo requerido, até que o litígio seja resolvido, seja pela sugerida liquidação da sociedade irregular, seja por nova determinação judicial de ação a instaurar.
*1.2.
Citado o requerido, veio dizer, em suma, que o requerente é parte ilegítima e existe caso julgado (o objeto destes autos coincide com o procedimento cautelar de restituição da posse do processo 2112/22.0T8PTM).
Alega, também, a caducidade da arguição de anulabilidade do contrato de cessão de exploração celebrado entre os cedentes e o requerido (e do qual o requerente não é parte).
De resto, impugna os factos e diz, em suma, que assinou um novo contrato de cessão de exploração do bar, no qual o requerido consta como único cessionário e a atividade, desde as licenças à contratação de funcionários, ficou unicamente para ele. O requerente fez um empréstimo ao requerido, que este já liquidou àquele.
*1.4.
O Tribunal a quo entendeu estar em condições de conhecer das exceções invocadas e do mérito da causa, proferindo decisão na qual julgou improcedente a exceção da ilegitimidade ativa, a exceção de caso julgado e totalmente improcedente a pretensão do requerente, absolvendo o requerido do pedido contra si formulado.
*1.5.
Inconformado com a sentença proferida, dela apela o requerente, pedindo a procedência da providência cautelar, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “
-
O pedido do Requerente relativo ao encerramento do estabelecimento e a proibição de aí ser exercida actividade pelo Requerido tem assento na matéria de facto e de direito que apresentou no seu articulado inicial e em que relatou convenientemente os primordiais a relação negocial entre Requerente e Requerido no que respeita à exploração do estabelecimento comercial e o esforço monetário empreendido pelo Requerido nesse sentido e as subsequentes desventuras e querelas entre ambos.
-
O Requerido foi citado e apresentou oposição e que apresentou defesa por excepção e impugnação, pese embora o Requerente nunca tenha sido convidado a pronunciar-se quanto às alegadas exceções (o momento processual adequado, sem que tenha sido notificado a fazê-lo por escrito) seria a audiência, que nunca foi designada.
-
O Tribunal a quo apreciou matéria de excepção sem ter conferido o devido contraditório ao Requerente, o que redunda em nulidade processual.
-
O Tribunal apenas apreciou leviana e superficialmente o primeiro dos requisitos que elencou na sua decisão: a) probabilidade séria da existência de um direito; b) justo e fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável (do direito que o requerente se arroga na acção em curso ou a instaurar); c) adequação da providência requerida para obstar à lesão (esta adequação há-de ser aferida perante cada caso concreto); d) não resultar do procedimento cautelar prejuízo superior ao dano que o mesmo pretende evitar; e) inaplicabilidade de qualquer tipo de procedimento cautelar nominado, para afirmar não ter o requerente alegado de que forma o procedimento cautelar iria acautelar o efeito útil da decisão.
-
O Tribunal a quo determinou a citação do Requerido sem nunca ter proferido despacho de aperfeiçoamento do articulado inicial, o que seria expetável face à decisão final ora proferida. Assim, sempre teria o Tribunal a quo a obrigação demandar aperfeiçoar o requerimento inicial antes de proferir sentença em que vaticina a ausência de factualidade argumentativa. Não tendo o Tribunal a quo a coberto do poder dever de gestão processual expresso no artigo 6.º do CPC agido em conformidade está a sentença ferida de validade por nulidade processual.
-
Verifica-se igualmente uma nulidade processual na prolação da própria sentença sem que as partes tenham sido advertidas sobre tal circunstância e sem que o Requerente tenha sido convidado a pronunciar-se quanto à matéria de oposição apresentada pelo Requerido.
G ) Nos termos do artigo 3.º, n.º 3, do CPC: O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
-
Ora, a decisão da qual se recorre foi decidida de mérito de direito sem que o Requerente tenha sido convidado ao contraditório, que proíbe as ditas decisões surpresas.
-
Acresce que a decisão proferida carece da devida fundamentação prevista no artigo 154º do CPC. In casu, é manifesto que a sentença recorrida está longe de densificar as razões de direito que determinaram à cabeça a improcedência do pedido, com base numa conclusão ténue e carente de que “ (...) Não se vislumbra nem o requerente o diz, como é que o encerramento do estabelecimento vai acautelar o efeito útil de uma ação (...) e“ Assim, ainda que se provassem todos os factos alegados pelo requerente, não poderia a sua pretensão proceder e, consequentemente, terá de se julgar improcedente a providência requerida”.
-
Não se alcança nem se enquadra a fundamentação opinativa e sem base factual alguma da legislação do foro laboral (o requerido alega ter contratado novos trabalhadores).
-
O Tribunal extrapolou os seus poderes de cognição ao afirmar sem produção de prova tal segmento e nessa medida se cabe no vício do excesso de pronuncia, será com certeza, novamente em termos de falta de fundamentação.
-
O Tribunal a qual estava obrigado a prosseguir os autos designar audiência e ouvir as testemunhas pelas circunstâncias de facto alegadas. O processo de restituição da posse não teve efeito útil, o Requerente não tem acesso ao estabelecimento, nem controlo das contas nem consegue concretizar os seus direitos, existindo múltiplas querelas desavenças e processos-crime entre Requerente e Requerido. As querelas irão subsistir e o crédito emergir.
-
O Requerentes expôs a sua atuação judicial no que respeita à providência cautelar de restituição da posse e de que forma a mesma não surtiu qualquer eficácia prática, o que motivou o início do presente e apenas o encerramento garante que o direito do Requerente não é continuamente violado e que o crédito não cresça exponencialmente ao ponto de não ser cumprido. Existindo dúvidas efetivas em relação à exploração do estabelecimento por que razão deve ser dado privilégio ao Requerido e não ser ambos colocados em igualdade de circunstâncias pelo impedimento de exploração do Bar, até que a ação principal (demorada) que determine a efetividade dos direitos.
-
A providência cautelar iria assim acautelar o efeito da ação a intentar no que respeita à legitimidade da exploração do estabelecimento comercial da forma que entender, seguindo os métodos unipessoalmente determinados, a fama que concede ao espaço e acumular dos créditos a favor do Requerente. O que justifica efetivamente a tutela cautelar.
-
Todas as nulidades elencadas são passives de ser invocadas em sede de recurso da decisão.”*1.6.
O requerido contra-alegou, pugnando no sentido de ser o recurso liminarmente indeferido ou, caso assim não entenda, ser negado provimento à apelação, tendo concluído o seguinte: “1. O presente recurso de apelação deve ser imediata e liminarmente indeferido, uma vez que o pedido sobre o qual o mesmo assenta é manifestamente infundado.
-
Não se vislumbra que o Tribunal a quo tenha violado no seu despacho saneador-sentença qualquer uma das disposições previstas no artigo 615.
º do Código de Processo Civil, não podendo a sentença ser declarada nula.
-
Porquanto, anuindo ao princípio da gestão processual, entendeu o tribunal a quo estarem reunidos todos os factos essenciais e notórios, bem como a prova necessária para conhecer...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO