Acórdão nº 630/20.4T9VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelPEDRO FREITAS PINTO
Data da Resolução19 de Setembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes que integram a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães.

I – Relatório Decisão recorrida No âmbito do Processo Comum nº 630/20.4T9VRL, do Tribunal Judicial da Comarca de – Juízo Local Criminal ..., foi proferida no dia 14 de fevereiro de 2023, [1] decisão judicial que não admitiu o requerimento de abertura de instrução formulado pelos arguido, dado não ter sido subscrito pelo advogado.

*Recurso apresentado Inconformados com tal decisão, os arguidos AA, BB e CC vieram interpor o presente recurso e após o motivarem, apresentando as seguintes conclusões e petitório: “i) Os arguidos AA, BB e CC apresentaram o requerimento de abertura de instrução, após terem sido notificados do douto despacho de acusação contra si deduzido; ii) A 30 de janeiro de 2023, foram os arguidos notificados para ratificar o teor da peça processual, através de mandatário judicial, tendo-lhe sido conferido o prazo de 5 (cinco) dias, para o efeito, tendo tal despacho o seguinte teor: "Antes de mais, notifique a Ilustre Mandatária dos arguidos, para, em cinco dias, proceder à ratificação do requerido"; iii) Perante a ausência de ratificação, foi doutamente não admitido o requerimento de abertura de instrução por considerar-se ser, o mesmo, legalmente inadmissível, uma vez que não fora subscrito por advogado; iv) A ratificação é a declaração de vontade pela qual alguém faz seu, ou chama a si, ato jurídico realizado por outrem em seu nome, mas sem poderes de representação (cf. art.0 268.0, do CC); v) O requerimento de abertura de instrução foi apresentado pelos arguidos e subscrito por estes; vi) O requerimento de abertura de instrução é, antes de mais, apenas e só um requerimento - até sem formalidades especiais - que visa o acesso do Arguido, à fase da instrução (cf art.º 98.º, n.º 1, do CPP); vii) E o próprio artigo 287º do mesmo Código quem garante ao Arguido a faculdade de, de motu próprio, lançar mão do requerimento de abertura de instrução ao prever na al. a) do nº 1 de tal preceito que a abertura de instrução pode ser requerida pelo Arguido, estipulando no subsequente n.º 4 que no despacho de abertura de instrução o Juiz nomeia defensor ao Arguido que não tenha Advogado; viii) O artigo 64º do C.P.P. discrimina quais os atos em que é obrigatória a assistência de defensor, não estando aí contemplado o requerimento da abertura da instrução; ix) Se a assistência do defensor visa proteger o Arguido, a falta daquele não pode justificar sem mais uma agravação da posição processual deste (cf. neste sentido AC. TRC; Proc. n.0 2320/12.2TALRA•, data: 03/06/2015; Relator: Des. Cacilda Sena); x) Impõe-se perguntar o que significa, também ao nível jurídico, a ratificação. O ato ou efeito de ratificar é o mesmo que confirmar, corroborar, validar, aprovar, comprovar, reafirmar, consentir expressa ou tacitamente, dando validade ao que se fez ou que se prometeu anteriormente, que, por vício de forma ou de fundo, é suscetível de nulidade; xi) Considera-se que a decisão de indeferimento viola o disposto nos artigos 98.º, nº1, 287º, nº1, 2 e 3 e 283º n.º 3 do Código de Processo Penal, bem como os artigos 20º e 32º da Constituição da República Portuguesa, o que determina a invalidade daquela decisão e a sua substituição por outra que admita o requerimento de abertura de instrução apresentado pelos Recorrentes e declare aberta fase de instrução; xii) Basta consultar as variadas decisões emitidas pelos doutos tribunais superiores para se constatar que a maioria delas conferem um prazo de 10 (dez) dias para serem juntos aos autos requerimento com ratificação do processado, subscrito por defensor advogado, sendo que esse prazo não pode nem deve ser reduzido para 5 dias, sob pena de denegação de justiça e violação dos princípios de igualdade e de proporcionalidade (cf. Ac TRG nº 1508/09.8TAGMR, Relator: Des. Paulo Fernandes, Data: 06/05/2013).

xiii) Sendo assim, nos termos do previsto no artigo 4º do Código de Processo Penal é previsto o seguinte, «Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal». - -, como forma de suprimento da apontada irregularidade. Deve ordenar-se a notificação do Arguido para, no prazo geral de 10 (dez) dias (nos termos do artigo 105.º, nº1, do Código de Processo Penal, é referido o seguinte: «Salvo disposição legal em contrário, é de 10 dias o prazo para a prática de qualquer ato processual») providenciar pela ratificação do processado por parte do seu defensor, o qual deve igualmente disso ser notificado, dentro do prazo de 10 dias, sob pena de se considerar inadmissível a instrução e, pois, ser a mesma rejeitada. Em sentido que se tem por similar veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10.02.2009, in CJ, tomo páginas 164 a 166. Em sentido diverso, defendendo que o requerimento para abertura de instrução pode ser apresentado apenas pelo arguido - veja-se o Acórdão da mesma Relação de 13.11.2008, in www.dgsi.pt; xiv) Os próprios recorrentes já requereram, por mais do que uma vez, e em outros Tribunais, que não o do ..., requerimentos de abertura de instrução, como arguidos e também na posição de assistentes, tendo-os subscrito e nunca tais requerimentos foram indeferidos, muito menos com o fundamento na falta de ratificação da peça processual por mandatário judicial, nunca tendo qualquer dos arguidos, no âmbito desses Processos, sequer sido notificados para ratificar o requerido. O presente RAI havia de ter sido admitido e valorado, sob pena de se considerar que o "julgador" tem "dois pesos e duas medidas" quando atua na salvaguarda do princípio da igualdade; xv) O vaticínio não pode manter-se, por, tendo, in casu, ocorrido incorreta aplicação do direito, com violação do seu direito ao acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva; xvi) A falta de assistência de defensor não justifica a rejeição, sem mais, da instrução, sob pena de ilogismo: se a assistência do defensor visa proteger o Arguido, a falta daquela não pode justificar sem mais uma agravação da posição processual deste cf. ac. TRP, de 25 de junho de 2014, Proc. nº30/13.2PCPRT, Relator: Des. Alves Duarte; xvii) O presente recurso tem por objeto o douto Despacho que rejeitou o requerimento de abertura de instrução, por inadmissibilidade legal – artº 287º nº 3 CPP; xviii) A instrução, que tem carácter facultativo, visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento; xix) A fase processual da instrução é formada pelo conjunto dos atos de instrução — diligências de investigação e de recolha de provas que o juiz entenda levar a cabo — e por um debate instrutório, oral e contraditório, o qual visa permitir uma discussão, perante o juiz sobre se no decurso do inquérito e da instrução resultam indícios de facto e elementos de direito suficientes para justificar a submissão do arguido a julgamento; xx) A instrução concretiza o princípio do contraditório, uma vez que nela tem o requerente [no caso, o arguido] a possibilidade de contrariar os fundamentos, de facto ou de direito, que suportam a peça processual [no caso, a acusação do Ministério Público] que encerra fase do processo [a do inquérito] dominada por quem acusa; xxi) A instrução surge como uma fase intermédia, entre o inquérito e julgamento, dirigida por um juiz e pensada no interesse do arguido e do assistente. Configurando direito disponível — dado o seu carácter facultativo —, nem por isso deixa de representar a garantia constitucional da judicialização da fase preparatória do julgamento, de controlo judicial da atuação do Ministério Público. Nas palavras de Souto de Moura, «O n.º 2 do artº 287º, parece revelar a intenção do legislador de restringir o mais possível os casos de rejeição do requerimento da instrução. O que aliás resulta diretamente da finalidade assinalada à instrução pelo nº do artº286º: obter o controlo judicial da opção do MP. Ora, se a instrução surge na economia do Código com o carácter de direito, e disponível, nem por isso deixa de representar a garantia constitucional da judicialização da fase preparatória. A garantia constitucional esvaziar-se-ia se o exercício do direito à instrução se revestisse de condições difíceis de preencher ou valesse só para casos contados»; xxii) Constata-se que o requerimento para abertura da instrução só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução. Esta decisão não está na discricionariedade do Tribunal. Interessa-nos, neste caso, apenas a inadmissibilidade legal da instrução. Trata-se de conceito que abarca realidades distintas — sobre as quais se debruçou, de forma exaustiva, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 7/2005, de 12 de maio de 2005, de fixação de jurisprudência — e de que deriva a inutilidade da instrução. Nele se incluem as situações em que da própria lei resulta, inequivocamente, como não admissível a instrução; i) quando requerida no âmbito de processo especial — sumário ou abreviado [artigo 286º, nº 3, do Código de Processo Penal]; ii) quando requerida por quem não tem legitimidade para o efeito — pessoas diversas do arguido ou o assistente; iii) quando requerida pelo arguido ou pelo assistente, mas fora dos casos previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 287º do Código de Processo Penal; iv) quando o requerimento do assistente não configure uma verdadeira acusação v) quando, requerida pelo arguido, se reporte a factos que não alterem substancialmente a acusação do Ministério Público, isto é, nos casos em que o assistente deduz acusação (artigo 284º do CPP) e, vi) quando, requerida pelo assistente, em caso de acusação pelo Ministério Público, se reporte a factos circunstanciais que não impliquem alteração substancial da acusação pública...

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