Acórdão nº 017/22.4BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução28 de Setembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para uniformização de jurisprudência Recorrente: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) Recorrida: “A..., S.A.” 1. RELATÓRIO 1.1 A AT veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida em 22 de Dezembro de 2021 no processo 78/2021-T (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?id=6005.

) pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), por oposição com o acórdão de 6 de Maio de 2019 da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo com o n.º 939/12.0BEBRG (Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/3bd0ae74885f6ca880258412003dbc91.

), transitado em julgado, tendo apresentado alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «A. A questão em dissenso formula-se nos seguintes moldes: O ónus de comunicar a regularização do IVA ao adquirente devedor previsto no n.º 11 do artigo 78.º do Código do IVA é aplicável nos casos em que o adquirente devedor se tenha extinguido juridicamente em momento posterior ao crédito se ter tornado incobrável nos termos do n.º 7 do artigo 78.º do Código do IVA? B. O presente recurso vem interposto nos termos do n.º 1 do art. 152.º do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e n.º 2 do art. 25.º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), e tem por objecto a Decisão Arbitral proferida no processo n.º 78/2021-T CAAD pelo Tribunal Arbitral constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), por se encontrar em contradição com o acórdão fundamento, proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo, a 06-05-2019, no processo n.º 0939/12.0BEBRG, no segmento decisório em que entendeu verificar-se o incumprimento da obrigação de comunicação ao devedor adquirente prevista no artigo 78.º n.º 11 do Código do IVA (CIVA) e que tal incumprimento tornava ilegítima a regularização efectuada pelo sujeito passivo nos termos do artigo 78.º n.º 7 do CIVA.

  1. Ora, a decisão arbitral sob recurso entendeu que: «Parece-nos, em concordância com a Requerente, que, nos casos sobre os quais incidiram as liquidações adicionais aqui impugnadas, não era obrigatória a comunicação prevista no n.º 11 do artigo 78.º do CIVA, pelo que a data em que as mesmas foram enviadas não preclude o exercício do direito à regularização».

  2. Por seu turno, na decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo, a 06-05-2019, no processo n.º 0939/12.0BEBRG, convocada como fundamento, entendeu o seguinte: «No caso dos autos, a impugnante, ora recorrida, não cumpriu o pressuposto, estabelecido no n.º 11 do artigo 78.º do IVA, da comunicação à devedora insolvente da intenção de proceder à anulação do IVA, em tempo oportuno, pelo contrário, fê-lo em data posterior à extinção da devedora o que torna tal comunicação juridicamente irrelevante, conforme refere a Exma. Magistrada do MP» E.

    In casu, estão verificados os requisitos de admissibilidade deste recurso, designadamente: · as situações de facto são substancialmente idênticas; · há identidade na questão fundamental de direito; e, · nos dois arestos foi perfilhada solução oposta, ambas de formas expressa; F. A decisão arbitral recorrida julgou parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela sociedade A..., S.A., determinando a anulação de liquidações adicionais emitidas pela AT na sequência de procedimento inspectivo, com fundamento no incumprimento do dever de comunicação ao devedor adquirente da regularização de IVA, previsto no n.º 11 do artigo 78.º do Código do IVA (doravante, CIVA) respeitante a créditos considerados incobráveis nos termos do n.º 7 do mesmo artigo.

  3. De acordo com o Relatório de Inspecção Tributária (RIT), o incumprimento do ónus de comunicar as regularizações, previsto no n.º 11 do artigo 78.º do CIVA, deveu-se ao facto de o sujeito passivo ter enviado as comunicações aos respectivos adquirentes devedores sociedades comerciais quando estes já se haviam extinguido juridicamente por encerramento da liquidação e cancelamento da matrícula, o que, no entender dos Serviços de Inspecção Tributária (SIT), tornou tais comunicações ineficazes.

  4. Também no acórdão fundamento, a liquidação impugnada teve como fundamento comunicações enviadas com intenção de dar cumprimento ao n.º 11 do artigo 78.º do CIVA, mas que o foram já após a morte jurídica do seu destinatário, i.e. após o encerramento da respectiva liquidação e consequente cancelamento da matrícula.

    I. Em causa, em ambos os processos, está a aplicabilidade do n.º 11 do artigo 78.º do CIVA, enquanto requisito do direito à regularização de IVA a favor do sujeito passivo, a casos em que os adquirentes devedores se extinguiram juridicamente após o respectivo crédito se considerar incobrável à luz do n.º 7 do mesmo artigo.

  5. Resulta, assim, demonstrada a identidade da questão fundamental de direito na decisão recorrida e no acórdão fundamento, já que em ambos, em concreto, foi decidida a mesma questão de direito, a saber se é de admitir a regularização de IVA quando a comunicação prevista no n.º 11 do artigo 78.º do CIVA foi efectuada quando o adquirente devedor já se havia extinguido juridicamente.

  6. Perante situações factualmente idênticas, a decisão recorrida entendeu não ser aplicável o ónus de comunicar a anulação do imposto prevista no n.º 11 do artigo 78.º do CIVA, com fundamento no facto de o adquirente devedor não ser sujeito passivo à data da regularização, enquanto o acórdão fundamento entendeu que «a formalidade indevidamente cumprida, que se afigura “ad substanciam”, impede a legalidade da regularização do IVA efectuada pelo credor e consequentemente o provimento do recurso».

    L. Nestes termos, lê-se no recurso fundamento, o seguinte: «No caso dos autos, a impugnante, ora recorrida, não cumpriu o pressuposto, estabelecido no n.º 11 do artigo 78.º do IVA, da comunicação à devedora insolvente da intenção de proceder à anulação do IVA, em tempo oportuno, pelo contrário, fê-lo em data posterior à extinção da devedora o que torna tal comunicação juridicamente irrelevante, conforme refere a Exma. Magistrada do MP.

    Acompanha-se ainda o MP quando afirma que “face às vicissitudes do processo de insolvência que … não poderia ignorar, impunha-se que, independentemente da data da regularização do IVA, procedesse à comunicação à devedora insolvente da intenção de proceder à anulação do IVA contido no crédito incobrável em processo de insolvência, pelo menos em data anterior à do encerramento da liquidação, ou seja anteriormente à morte jurídica da devedora, … o que não o fez” sendo caso “para dizer que, se não o fez, no momento próprio e juridicamente relevante, sibi imputet”».

  7. Em suma, entre a decisão recorrida e o acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por nova decisão que, definitivamente, decida a questão controvertida, nos termos do entendimento propugnado pela AT em sede arbitral, bem como de acordo com a fundamentação invocada no acórdão fundamento, a cujo teor se adere na totalidade. Senão vejamos, ~I~ N. O tribunal arbitral fundamentou a sua decisão com recurso à argumentação que julgamos poder resumir da seguinte forma: i. Começou por aderir à argumentação da então Requerente, segundo a qual o pressuposto do direito à regularização do IVA previsto no n.º 11 do artigo 78.º do CIVA apenas existe quando o adquirente devedor seja sujeito passivo no momento da regularização.

    ii. De seguida, escorou a sua decisão no argumento de que a extinção do adquirente devedor configuraria uma situação de incobrabilidade de crédito que, embora não conste do elenco do n.º 7 do artigo 78.º do CIVA, deverá sempre legitimar a sua regularização a favor do sujeito passivo.

    iii. O tribunal arbitral entendeu ainda que a comunicação prevista no n.º 11 do artigo 78.º do CIVA «não pode ser aplicada aos casos de sociedades dissolvidas e extintas», nomeadamente “para efeitos de rectificação inicialmente efectuada”, porque «a aplicação desta formalidade a sociedades que já não existem no momento em que o sujeito passivo credor toma conhecimento da respectiva dissolução é impraticável, não sendo possível proceder à comunicação mencionada no artigo».

  8. Importa desde já clarificar um ponto, que se nos afigura transversal a todos os elementos da presente questão: P. Quando os créditos se tornam incobráveis nos termos do n.º 7 do artigo 78.º do CIVA, os respectivos adquirentes devedores não se encontram juridicamente extintos – o sujeito passivo é que exerceu o seu direito à regularização em momento em que aqueles já se extinguiram juridicamente. Como ressalta do probatório, no caso sub judice, vários meses separaram a data em que os créditos passaram a poder qualificar-se como incobráveis para efeitos de IVA e a data das malogradas comunicações às entidades entretanto extintas.

  9. Resulta da tese preconizada pelo tribunal a quo que, se o adquirente devedor já não tiver o estatuto de sujeito passivo no momento em que sujeito passivo decide exercer o direito à regularização de IVA de crédito considerado incobrável nos termos do n.º 7 do artigo 78.º do CIVA, então o sujeito passivo não é obrigado a comunicar a anulação do IVA nos termos do n.º 11 daquele artigo.

  10. O tribunal arbitral não diz expressamente quais os motivos por que entende que a Recorrida tem razão a este respeito. Depois de rebater os argumentos da AT relativamente à tese expendida pela então Requerente e de passar ao argumento da “incobrabilidade definitiva” (que analisaremos abaixo), afirma apenas: «Parece-nos, em concordância com a Requerente, que, nos casos sobre os quais incidiram as liquidações...

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