Acórdão nº 701/20.7T9STC-E.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelRENATO BARROSO
Data da Resolução26 de Setembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA 1. RELATÓRIO A – Decisão Recorrida Nos autos nº 701/20.7T9STC a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo de Instrução Criminal, Juiz ..., foi proferido despacho de pronúncia em relação aos arguidos AA, BB e A..., Unipessoal, Lda, pela prática: - um crime de burla qualificada, p.p., pelas disposições conjugadas dos Artsº 14 nº1, 26,, 217 nº1 e 218 nº1 do C. Penal, por referência ao disposto no Artº 202 al. a) do mesmo Código, no que concerne ao ofendido CC; - um crime de burla qualificada, p.p., pelas disposições conjugadas dos Artsº 14 nº1, 26,, 217 nº1 e 218 nº2 al. a) do C. Penal, por referência ao disposto no Artº 202 al. b) do mesmo Código, no que concerne à sociedade ofendida B...– Sociedade Unipessoal, Lda; - um crime de burla qualificada, p.p., pelas disposições conjugadas dos Artsº 14 nº1, 26,, 217 nº1 e 218 nº1 do C. Penal, por referência ao disposto no Artº 202 al. a) do mesmo Código, no que concerne ao ofendido DD; Aquando do momento para designar dia para Audiência de Julgamento, o Juiz ... do Juízo Central Criminal ..., proferiu o seguinte despacho (transcrição): Como é sabido, os poderes autónomos de investigação do Tribunal supõem a declaração, no encerramento do inquérito, que se reuniram os indícios suficientes, conducentes à dedução da acusação (princípio da acusação) ou que, sujeitos às balizas legais da fase instrutória, os mesmos se verificam e, por isso conduzem à prolação do despacho de pronúncia, certo porém, que tais poderes quando cabalmente exercidos se hão de conter nos limites temáticos que determinam a sujeição do arguido a julgamento, e por isso mesmo, não os pode o tribunal livremente exceder (vinculação temática), Por isso, o objeto do processo coincide com o objeto da acusação ou da pronúncia, no sentido de que é esta que fixa os limites da atividade cognitiva e decisória do tribunal, ou dito noutros termos, o thema probandurn e o thema decidendum.

No exato rigor, o thema probandum, impõe que a atividade do tribunal penal, consubstanciada na investigação e prova de determinados factos não possa sair fora dos limites traçados pela acusação (ou pela pronuncia, no caso de ter sido a fixar o objecto processual, como sucede no caso concreto) no acervo fático em que converge a sujeição do arguido a julgamento.

A razão de ser desta primeira abordagem prende-se, naturalmente, com a enunciação que dos factos se fez, para a partir desta se concluir pela falta de competência territorial deste tribunal - de julgamento - para o seu conhecimento e valoração, É sabido que, a definição do critério atributivo da competência territorial, encontra-se consagrado no artigo 19,°/1 co Código do Processo Penal, que determina ser competente para o conhecimento do crime, o tribunal em cuja área se tiver verificado a consumação.

No caso em apreço, os tipos de crime imputados aos arguidos radicam no preenchimento dos arts. 217.

0 e 215.

0 (n." 1 e 2) do Código Penal.

O artigo 217.º do Código Penal, que tutela o bem jurídico património em geral tem como seus elementos constitutivos, a criação preordenada de um erro ou engano em que faz incorrer outrem sobre factos, em ordem à sua determinação na prática de atas causadores à vítima ou a terceiro de um prejuízo patrimonial, em benefício do próprio agente ou de terceiro.

O engano traduz-se num aproveitamento intencional de uma falsa representação da realidade pela vítima, encontrando-se a situação sob o domínio do agente, que assim mais que permite incentiva a vítima a laborar no erro que a leva à prática dos factos causadores do prejuízo patrimonial, em favor do agente ou do terceiro em prole de quem atua. O erro em que a vítima incorre pressupõe que a falsa representação operada por esta da realidade, derive da conduta ardilosa do agente, não se mostrando suficiente a simples casualidade da situação de erro em que se encontra a pessoa visada, sendo imprescindível que a fonte do erro em causa seja a conduta assumida pelo agente com vista à criação intencional dessa aparência de realidade.

Num caso e noutro, impõe-se de forma inelutável para o preenchimento do tipo a utilização de astúcia, no sentido mais expressivo e comum do termo, de que ressalta a ideia de que é o agente quem detém o completo domínio dos factos, por forma a que com o seu comportamento, pré ordenadamente determina a pessoa visada à adoção da conduta pretendida.

Verificadas as condutas descritas e imputadas aos arguidos no despacho de pronuncia, importa aferir da ocorrência, eri termos de causa-efeito, de um prejuízo patrimonial, da pessoa a quem o erro ou engano foi dirigido ou de outrem, e de um consequente enriquecimento do agente ou da pessoa que este pretendeu beneficiar. No que ao prejuízo patrimonial respeita, dentro da configuração legal do tipo de crime em causa, qualquer bem, interesse ou direito patrimonial, seja este pessoal ou real, pode ser objeto de lesão. Ainda, em consequência da conduta que vimos referindo, o próprio agente ou um terceiro terá que aceder a um ilegítimo enriquecimento. O enriquecimento tanto pode assumir a forma...

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