Acórdão nº 5242/17.7T8CBR-E.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelPAULO CORREIA
Data da Resolução12 de Setembro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelação n.º 5242/17.7T8CBR-E.C1 Juízo de Comércio de Coimbra – Juiz ...

_________________________________ Acordam os juízes que integram este coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]: I-Relatório AA suscitou o presente incidente (que corre os seus termos por apenso dos autos de insolvência) contra Massa Insolvente de BB, A..., S.A.

e Credores da Insolvência pedindo o decretamento da nulidade da venda do prédio urbano composto de casa de habitação de rés-do-chão, sótão, anexos, quintal e logradouro, sito em Quinta ..., ..., freguesia ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo ...57, descrito na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis ... sob o número ...14 da freguesia ... e de 93/250 avos do prédio rústico composto de terreno de semeadura, sito em ..., freguesia ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz predial rústica da referida freguesia sob o artigo ...02, descrito na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis ... sob o número ...15 da freguesia ..., agendando-se nova venda através da qual possa o requerente exercer o seu legítimo e legalmente reconhecido, direito de preferência.

Alegou, em síntese, - na venda efetuada pelo Sr. Administrador de Insolvência ocorreu uma manifesta desigualdade de tratamento dado ao proponente a à licitante que adquiriu o imóvel, pois o AI bem sabia, desde a apresentação da proposta inicial por parte do requerente, que este necessitaria de recorrer ao crédito bancário e de que tal operação implicaria tempo, não consentâneo com os 15 dias de antecedência com que foi surpreendentemente notificado o requerente da celebração do negócio; - mesmo que se considere que não existiu desigualdade de tratamento, certo é que o requerente detinha o direito de preferência sobre a verba 4, correspondente ao prédio rústico, por dele ser comproprietário, manifestou a intenção de o adquirir e exercer o direito de preferência e manifestou a possibilidade de efetuar o pagamento do respetivo preço e solicitou ao Administrador de Insolvência que indicasse o respetivo preço, o qual ignorou tais pedidos – não fornecendo qualquer reposta a tais solicitações - tendo a referida verba sido vendida por dezassete mil e quinhentos euros, valor que o requerente só tomou conhecimento após lhe ter sido fornecida cópia do título de compra e venda pela Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e dos Automóveis de ...; - foi violado o direito de preferência do requerente tanto para a aquisição das verbas em conjunto, como também da verba n.º 4, cujo preço nem sequer sabia para poder exercer a preferência, não existindo qualquer motivo plausível para alienar conjuntamente tais verbas, uma vez que o requerente é proprietário de parte do prédio rústico vendido (verba n.º 4), o que inviabiliza que os bens tenham uma relação de complementaridade ao seu uso e fruição, ao contrário do referido pelo Administrador de Insolvência.

* Contestaram os requeridos Massa Insolvente e A..., S.A., pugnando ambos no sentido da improcedência do requerido por inexistência de fundamentos para a anulação, tendo ainda a A..., S.A. peticionado, na eventualidade da procedência da anulação, a condenação da Massa Insolvente no pagamento de indemnização no montante de € 136.007,12, correspondente ao preço da venda , impostos, honorários e emolumentos notariais pagos.

* Produzida a prova testemunhal e por declarações, foi, a 09.05.2023, proferida sentença, contendo o seguinte dispositivo “julgando improcedente o presente incidente de anulação da venda, o Tribunal, decide-se absolver os réus dos pedidos formulados”.

* O Requerente interpôs recurso dessa decisão, fazendo constar nas alegações apresentadas as conclusões que se passam a transcrever:“ 1 – O presente recurso interposto pelo aqui recorrente tem por objecto a decisão que considerou improcedente o pedido de anulação da venda do prédio urbano composto de casa de habitação de rés-do-chão, sótão, anexos, quintal e logradouro, sito em Quinta ..., ..., freguesia ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo ...57, descrito na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis ... sob o número ...14 da freguesia ... e de 93/250 avos do prédio rústico composto de terreno de semeadura, sito em ..., freguesia ... e ..., concelho ..., inscrito na matriz predial rústica da referida freguesia sob o artigo ...02, descrito na Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e Automóveis ... sob o número ...15 da freguesia ..., pela Massa Insolvente de BB a A..., Lda..

2 – O recorrente discorda, no que concerne à decisão relativa à matéria de facto, com o julgamento do ponto 26.º dos factos provados, nomeadamente do facto de se considerar que o mesmo “declarou não dispor do preço e demais montantes necessários para preferir nos termos em que o projecto de negócio lhe foi comunicado”, sem que se considerasse que tenha declarado que dispunha de montante suficiente para preferir na aquisição da verba correspondente ao prédio rústico de que era comproprietário.

3 – Tal facto pode ser aferido por confronto com as declarações de parte proferidas pelo ora recorrente na audiência de julgamento, a 11:00 m do seu depoimento, quando afirmou que se deslocou ao local onde foi celebrado o título de transmissão de propriedade, tendo na sua posse um valor superior a €.: 17500,00 (dezassete mil e quinhentos euros) 4 – Perante a valoração de tais declarações prestadas pelo ora recorrente, deveria ter sido considerado como provado que o requerente, apesar de não dispor de montante suficiente para preferir nos termos do projecto de negócio tal qual lhe foi comunicado, dispunha de um valor suficiente para pagar o preço da verba sobre a qual detinha direito de preferência.

5 – Por outro lado, o recorrente não concorda que se tenha considerado como não provado que o Administrador de Insolvência desconhecia que o ora recorrente teria necessidade de recorrer ao crédito bancário para a aquisição das verbas.

6 – O que pode ser aferido pelo confronto do teor dos documentos 3 e 4 apresentados pelo recorrente no seu requerimento inicial, onde informa que necessita de recorrer ao crédito bancário, com as regras de experiência comum.

7 – Pelo que deveria tal ponto ser considerado como provado.

8 – O requerente não concorda, ainda, com que tenha sido dado como não provado que só tenha tomado conhecimento do preço de venda das verbas após lhe ter sido fornecida cópia do título de compra e venda pela Conservatória dos Registos Civil, Predial, Comercial e dos Automóveis de ....

9 – O que pode ser aferido por confronto com o teor dos documentos 8 a 10 juntos pelo recorrente no seu requerimento inicial, nos quais manifesta a sua intenção de preferir na aquisição da verba correspondente ao imóvel rústico de que era comproprietário, solicitando ao AI a indicação do respectivo valor, para efeitos do exercício do direito de preferência.

10 – Pelo que, tal ponto deveria ser igualmente considerado como provado.

11 – No que concerne à matéria de Direito, a sentença recorrida errou na aplicação do disposto no artigo 838.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, ao considerar como processualmente inadequada a reação do recorrente.

12 – Deveria tal norma ter sido interpretada no sentido de se considerar o modo de impugnação da venda como o adequado, uma vez que, por um lado, ao recorrente não foi facultado direito de preferência sobre uma das verbas alienadas e, por outro lado, não foi tido em linha de conta a oneração sobre o imóvel abrangido pelo direito de preferência do recorrente ao agrupar-se as duas verbas vendidas.

13 – Foi igualmente violado o artigo 195.º, n.º 1 do C.P.C., ao não se considerar a venda nula por omissão de formalidades legais.

14 – Deveria tal norma ter sido interpretada no sentido de se considerar a venda nula, atento o tratamento desigual dado aos licitantes e por não ter sido facultada em tempo útil, ao recorrente, toda a informação tida por necessária para o exercício do seu legítimo direito de adquirir a verba de que era comproprietário.

15 – Razões pelas quais deverá ser revogada a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por outra que declare nula a venda judicialmente homologada”.

* A Massa Insolvente, representada pelo Administrador da Insolvência, respondeu defendendo a improcedência do recurso, sintetizando o alegado com as seguintes conclusões: (…).

* Responderam também os credores Banco 1..., S.A.

e B..., S.A.

, pugnando no sentido da improcedência do recurso, com os seguintes fundamentos alinhados nas respetivas conclusões: (…).

Finalmente, também a adquirente dos bens A..., S.A.

respondeu ao recurso que culminou com as seguintes conclusões: (…).

* Foram colhidos os vistos e realizada conferência, com a prévia obtenção dos votos, contributos e sugestões dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos.

* II-Objeto do recurso Como é sabido, ressalvadas as matérias de conhecimento oficioso que possam ser decididas com base nos elementos constantes do processo e que não se encontrem cobertas pelo caso julgado, são as conclusões do recorrente que delimitam a esfera de atuação deste tribunal em sede do recurso (arts. 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.ºs 1, 2 e 3 e 640.º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPC).

No caso, perante as conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a apreciar e decidir: Saber se: a) a decisão relativa à matéria de facto deve ser modificada nos termos pretendidos; b) a sentença, ao considerar processualmente inadequada a reação do recorrente, errou na aplicação do art. 838.º do CPC e se c) foi violado o disposto no art. 195.º, n.º 1 do Código Civil, devendo essa norma ser interpretada no sentido de ser considerada a venda nula, dado o tratamento desigual dado aos credores e por não ter sido facultado, em tempo útil, toda a informação necessária para o exercício do direito de preferência.

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