Acórdão nº 0764/18.5BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelNUNO BASTOS
Data da Resolução13 de Setembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. a representante da fazenda pública interpôs recurso da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial interposta por A..., LDA., titular do número de identificação de pessoa colectiva ..., com sede na Rua ..., ..., ..., ..., ..., contra a decisão de indeferimento tácito da reclamação graciosa deduzida contra o ato de liquidação praticado no âmbito do processo de cobrança a posteriori n.º 02/2017 da Alfândega ..., referente a direitos antidumping, direitos convencionais, IVA e juros compensatórios, no montante global de € 633.903,90.

Com a interposição do recurso apresentou alegações e formulou as conclusões que agora reproduzimos, alinhando a última [que vinha identificada pela (segunda) alínea “a)”] com as demais: «(…) a) Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial, em consequência, decidiu anular a liquidação de direitos antidumping, direitos convencionais, IVA e juros compensatórios, no montante global de € 633.903,90, referente às declarações de importação DAU ...15, de 17.06.2009, ...50, de 26.06.2009,...31, de 07.07.2009, ...53, de 10.07.2009, ...98, de 29.07.2009, ...16, de 06.08.2009, ...97, de 07.09.2009, ...21, de 18.03.2010, ...75, de 29.03.2010, ...09, de 16.10.2012 e 2014PT00034061107525, de 04.09.2014.

b) Para assim decidir, considerou a Meritíssima Juiz do tribunal a quo (a) ter ocorrido a violação do direito de audição prévia no procedimento inspetivo, em virtude de ter sido concedido à Impugnante um prazo de 15 dias para se pronunciar quando, em aplicação do nº 6 do artigo 22.º do CAU e do n.º 1 do artigo 8.º do AD-CAU, se impunha a concessão de um prazo de 30 dias e (b) não ser aplicável o princípio do aproveitamento do ato, em virtude de não ser possível afirmar que a audição da Impugnante não tinha a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada pela AT, conduzindo a um resultado diferente, nomeadamente se a Impugnante tivesse alegado, em sede de audição prévia, que o Regulamento n.º 91/2009 não podia ser aplicado face à sua revogação pelo Regulamento 2016/278.

c) O douto tribunal a quo ao decidir pela violação do direito de audição prévia no procedimento inspetivo, na medida em que, em aplicação do nº 6 do artigo 22.º do CAU e do n.º 1 do artigo 8.º do AD-CAU, se impunha a concessão de um prazo de 30 dias e não de 15, como aconteceu, incorreu, salvo o devido respeito, num evidente erro de julgamento.

d) No caso em questão, foram levados a cabo pelos agentes competentes [Direção de Serviços Antifraude Aduaneira] um conjunto de actos, nos termos definidos na lei, com vista a averiguar a factualidade relevante para efeitos de aplicação das normas tributárias, encontrando-se todas as fases (tais como a iniciativa, comunicação, instrução audição, relatório) do referido procedimento [inspetivo] disciplinadas pelo RCPITA.

e) Entende a Fazenda Pública que o exercício do direito de audição no âmbito do procedimento de inspeção em causa (ao qual se seguiu o processo de cobrança a posteriori n.º 02/2017 da Alfândega ...) deverá reger-se pelas disposições que lhe são próprias, nomeadamente quanto ao prazo para o exercício daquele direito.

f) Com efeito, como determina o artigo 60º do RCIPTA (na redação à data dos factos) a notificação deve fixar um prazo entre 15 e 25 dias para a entidade inspecionada se pronunciar sobre o referido projeto de conclusões, o que foi integralmente cumprido pela AT, tendo os serviços de inspeção concedido o prazo de 15 dias para a pronuncia sobre os factos apurados no dito procedimento inspetivo.

g) Acresce que, decorre do artigo 22.º, n.º 6, do CAU a necessidade das autoridades aduaneiras procederem à audição prévia do interessado em momento prévio à liquidação da dívida aduaneira.

h) Na verdade, a liquidação da dívida aduaneira constitui uma decisão das autoridades aduaneiras na aceção do artigo 5.º, n.º 39 do CAU, conforme resulta, aliás, da redação do primeiro parágrafo do n.º 3 do artigo 102.º e do n.º 3 (que se articula com o n.º 4) do artigo 105.º do CAU.

i) O artigo 22.º, n.º 6, do CAU não impõe, no entanto, a audição prévia do interessado antes de findo o procedimento inspetivo, na medida em que o relatório de inspeção não constitui uma decisão na aceção do artigo 5.º, n.º 39 do CAU.

j) Não obstante esse facto, o artigo 9.º, n.º 1, alínea c) do AE-CAU admite que, verificadas certas condições, o direito nacional possa determinar que o mecanismo a que se refere o artigo 22.º, n.º 6, do CAU se integre no procedimento de inspeção tributária, sendo que uma dessas condições exige que as mercadorias objeto de inspeção aduaneira se encontrem ainda sob fiscalização aduaneira., condição que, no caso concreto, não se encontra preenchida.

k) O que inviabiliza, desde logo, que, nos termos do n.º 1 do artigo 9.º do AE-CAU, as autoridades aduaneiras tomem o mecanismo de audição prévia a que se refere o artigo 22.º n.º 6 do CAU parte do procedimento inspetivo.

l) O oficio circulado n.º 15753/2020, de 02/03/2020 a que a sentença faz apelo não tem enquadramento na situação aqui em causa, na medida em que trata de questões distintas e que respeitam ao pedido de estatuto de operador económico autorizado (AEO), e respetiva decisão, processo esse que, sim, acompanha os termos do art.º 22º do CAU, nomeadamente quanto ao prazo para o exercício do direito de audição.

m) Pelo que entende a Fazenda Pública que o mecanismo de audição prévia a que se refere o artigo 22.º, n.º 6, do CAU, e em particular o prazo de 30 dias indicado no n.º 1 do artigo 8.º do AD-CAU, não relevam no contexto do procedimento inspetivo desencadeado pela AT, e aqui em análise, sendo aplicável, no âmbito desse procedimento, o disposto no artigo 60.º do RCPITA, e nomeadamente o prazo entre 15 e 25 dias a que se refere o n.º 2 desse artigo.

n) Face ao exposto, conclui-se que foi concedido à Impugnante um prazo legalmente previsto para o exercício do direito de audição, pelo que não subsistem dúvidas de que não foi preterida qualquer formalidade legal.

o) Sem prescindir, entende a Fazenda Pública que, considerando o circunstancialismo do caso dos autos, o conteúdo do regulamento CE 91/2009, que, como vem defendendo a Fazenda Pública, vincula o Estado Português e é aplicável ao caso em análise, os dados recolhidos em sede de procedimento inspetivo e que não foram desmoronados, será seguro afirmar que, ainda que se considerasse que as formalidades essenciais não foram cumpridas, o sentido e conteúdo do ato [de liquidação] seria exatamente o mesmo, pelo que, com a devida vénia, nunca poderia ter sido declarada a sua invalidade pelo tribunal.

p) Pelo que, entende a Fazenda Pública que deverá ser dado provimento ao recurso e consequentemente ser revogada a sentença aqui em escrutínio.

q) A Fazenda Pública requer, muito respeitosamente a V. Exas., ponderada a verificação dos seus pressupostos, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no n.º 7 do art.º 6º do Regulamento das Custas Processuais [RCP].

».

Pediu fosse dado provimento ao presente recurso e fosse revogada a douta sentença recorrida com as consequências legais.

Mais pediu fosse dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais.

A Recorrida apresentou contra-alegações, que condensou nas seguintes conclusões: 1. A sentença recorrida não padece de qualquer erro de julgamento quando afirma que a Recorrente deveria ter concedido à Recorrida um prazo de 30 dias para efeitos...

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