Acórdão nº 8/22.5GECUB.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelCARLOS DE CAMPOS LOBO
Data da Resolução12 de Setembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam em Conferência na Secção Criminal (2ª subsecção) I – Relatório 1.

No processo nº 8/22.5GECUB da Comarca ... – Juízo de Competência Genérica ..., e após Acórdão que anulou sentença proferida em 7 de novembro de 2022, na parte respeitante à escolha e determinação da medida da pena, foi prolatada nova sentença em que se decidiu condenar, o arguido AA, filho de BB e de CC, natural da freguesia e concelho ..., nascido a .../.../1966, divorciado, manobrador de máquinas, residente na Estrada ..., ..., ... ..., mantendo todo o anteriormente decidido, como autor material de: - um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152º, nºs 1, alínea a) e 2, alínea a) do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; - um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353º do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa; - um crime de violação de domicílio, previsto e punido pelo artigo 190º, nº 1 do Código Penal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa; - em cúmulo jurídico, na pena única de 210 (duzentos e dez) dias de multa, à taxa diária de 5,00 € (cinco euros), o que perfaz um montante total de 1.050,00 € (mil e cinquenta euros).

Mais se decidiu em condenar o arguido: - nas penas acessórias frequência de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica e de proibição de contactos com a vítima DD, por qualquer meio, seja diretamente, seja por interposta pessoa, incluindo o afastamento da sua residência e do local de trabalho, pelo período de 3 (três) anos, nos termos do artigo 152.º, n.ºs 4 e 5 do Código Penal; - no pagamento do montante de 2.000,00 € (dois mil euros) a DD, a título de reparação da vítima; 2.Inconformado com o decidido, recorreu o arguido questionando a decisão proferida, concluindo: (transcrição)[1] I) Antes de mais, o presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Juízo de Competência Genérica ..., pertencente ao Tribunal Judicial da Comarca ..., datada de 11/05/2023, que decidiu condenar o Arguido pela prática de um crime de violência doméstica agravado, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, alínea a), do C.P., na pena de 3 (três) anos de prisão.

II) Neste sentido, entendeu o Tribunal a quo que não pode ser substituída a pena de prisão aplicada ao Arguido pela suspensão da sua execução, por alegadamente se poder concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de punição.

III) Por conseguinte, o presente recurso é interposto do despacho proferido no dia 11/05/2023, o qual determinou que a audiência realizada nos autos no dia 10/05/2023, não se tratou de uma diligência de prova suplementar, nos termos das disposições conjuntas dos artigos 369.º e 371.º, ambos do C.P.P., mas sim de uma reabertura da audiência, em virtude da anulação de parte da sentença anterior, determinada por este Tribunal da Relação de Évora.

IV) Por fim, o presente recurso é ainda interposto do despacho prolatado no dia 09/05/2023, o qual indeferiu a realização da elaboração de novo relatório social e a inquirição do técnico da D.G.R.S.P. que o elaborou, a título de realização de prova suplementar, por não se mostrarem alegadamente necessárias e por serem extemporâneas.

V) Porém, salvo o devido respeito por opinião contrária, por os entendimentos adoptados pelo Tribunal a quo vertidos na sentença de 11/05/2023 e nos despachos de 09/05/2023 e 11/05/2023, improcederem quer de facto, quer de Direito, não podem os mesmos merecerem qualquer acompanhamento por parte do Recorrente.

VI) Desde logo, a suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que se mostrar mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos.

VII) Nesta medida, tendo sido fixada a pena em que o Recorrente foi condenado em medida inferior a 5 (cinco) anos de prisão, resulta preenchido o pressuposto formal estabelecido pelo artigo 50.º, n.º 1, do C.P., para que o Tribunal deva equacionar a suspensão da respectiva execução.

VIII) Assim, verificado o pressuposto formal de que a pena de prisão fixada não seja superior a 5 anos, é necessário que o julgador possa fazer uma apreciação favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido, no sentido de antecipar ou prever a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição.

IX) Reportando-se, porém, ao momento da decisão e não ao da prática do crime e sopesando em conjunto as circunstâncias do facto e da personalidade, atendendo às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior aos factos que constituem o objecto do processo.

(…) XII) No caso concreto, o Tribunal a quo, a este propósito, limitou-se a concluir de forma automática que o único modo de se realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição é o cumprimento pelo Arguido de pena de prisão efectiva, por o mesmo ter cometido o mesmo tipo de crime durante o período de suspensão de execução de outra pena e contra a mesma vítima.

XIII) Contudo, parece olvidar o Tribunal recorrido que nessa prognose deve atender-se à personalidade do arguido, às suas condições de vida, à conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, ou seja, devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornem possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido, atendendo somente às razões da prevenção especial, não sendo de excluir liminarmente do benefício da suspensão da execução da pena determinados grupos de crime.

XIV) In casu, ainda que o Tribunal recorrido se tenha pronunciado sobre a possibilidade de suspensão da execução da pena, fê-lo de forma ligeira e vaga, sem a justificação concreta e específica da situação sub judice na actualidade, sendo que a justificação que é dada é meramente automática e insuficiente.

XV) Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, conforme se verifica do texto da sentença recorrida, o Tribunal a quo não fundamentou devidamente a razão da denegação da suspensão da execução da pena, repetindo, inclusive, a pouca fundamentação existente, reportando-se única e exclusivamente ao passado e não ao presente, nem ao passado.

XVI) Em bom rigor, o Tribunal recorrido não formulou um juízo de prognose de onde resulte, de forma segura e inequívoca, as razões pelas quais a ameaça de prisão e a censura do facto não são bastantes para afastar o Arguido da prática de novos crimes, limitando-se apenas a assinalar o facto de o Recorrente ter sido condenado pela prática do mesmo crime e contra a mesma vítima, alheando-se completamente das circunstâncias actuais do caso concreto e das actuais condições de vida do Recorrente e da Ofendida.

XVII) Tendo, no entanto, todos os crimes pelos quais o Arguido foi anteriormente condenado em comum o facto de terem ocorrido durante o matrimónio que o mesmo manteve anteriormente com a Ofendida e que já se mostra dissolvido, bem como se encontram reguladas as responsabilidades parentais do filho menor de ambos, encontrando-se actualmente salvaguardado qualquer perigo de aproximação ou de contacto relativamente à Ofendida.

XVIII) Deste modo, o juízo de prognose favorável reporta-se ao momento em que a decisão é tomada e pressupõe a valoração conjunta de todos os elementos que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do Arguido, no sentido de que irá sentir a condenação como uma solene advertência, ficando o eventual cometimento de novos crimes prevenido com a ameaça de prisão, daí se extraindo, ou não, se a sua socialização em liberdade é viável.

(…) XX) Bem vistas as coisas, na sua fundamentação para o afastamento do instituto da suspensão da execução da pena de prisão relativamente ao Recorrente, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo fundou-se apenas em considerações ou juízos de culpa e nos antecedentes criminais do Arguido, não valorando devidamente as razões ou fundamentos que presidem à formulação de um juízo de prognose sobre o seu comportamento futuro.

(…) XXII) Assim sendo, não são considerações de culpa que devem ser tomadas em conta, mas sim juízos prognósticos sobre o desempenho da personalidade do agente perante as suas condições de vida, o seu comportamento e as circunstâncias de facto, que permitem supor que as expectativas de confiança na prevenção da reincidência são fundadas.

XXIII) Ora, o Arguido apresentou em audiência um juízo crítico e de auto-censura, bem como mostrou arrependimento pelos factos que foram julgados como provados, não se podendo ainda descurar que a prática dos crimes pelos quais o Arguido foi condenado nos presentes autos ocorreram durante o período de tempo em que o Arguido e a Ofendida reataram a sua relação, como resulta do facto provado 53.

XXIV) Tendo, porém, os mesmos pernoitado por várias vezes, quer em casa da Ofendida, quer em casa do Arguido, como foi relatado com isenção e assertividade pelas testemunhas EE, FF, GG e HH, razão pela qual os crimes pelos quais o Recorrente foi condenado não puderam deixar ser facilitados pela própria Ofendida, a qual, apesar de separada de facto do Arguido, nunca rompeu em definitivo a sua relação com o mesmo, chegando a aliciá-lo por diversas vezes para pernoitarem juntos, o que aconteceu.

XXV) Por conseguinte, no decurso da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação que lhe foi aplicada, o Arguido tem desde então mantido um comportamento adequado e totalmente cumpridor das obrigações a que está vinculado, não tendo sido registada até ao presente qualquer situação anómala.

XXVI) Além disso, actualmente o Recorrente mantém-se social, familiar e profissionalmente inserido, beneficiando de várias ofertas de trabalho, como é o caso da promessa de contrato de trabalho assim que for restituído à liberdade, como resultado do facto provado 56.

XXVII) Além...

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