Acórdão nº 0291/18.0BEBRG-S1 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução07 de Setembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO 1.

Relatório 1.1.

AA, vem, nos termos do art.º 150º do CPTA, recorrer, do acórdão do TCA Norte, datado de 22 de Janeiro de 2021, que concedeu provimento ao recurso interposto por BB do despacho saneador do TAF de Braga, considerando-a parte legítima na respectiva ACÇÃO ADMINISTRATIVA.

1.2. Na acção administrativa foi deduzido pedido de indemnização contra o HOSPITAL DE ... – ..., SA, a ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO NORTE, IP, o CENTRO DE DIAGNÓSTICO PNEUMOLÓGICO DE ... e AA, na quantia líquida de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), por todos os danos sofridos em resultado da má prática médica por parte dos RR., tudo acrescido de actualização.

1.2. O TAF de Braga no despacho saneador absolveu a recorrente da instância, por ilegitimidade passiva advinda da petição não lhe imputar a prática de actos clínicos, com dolo ou culpa grave (art.º 8° da Lei n.º 67/2007, 31 de Dezembro).

1.3. Interposto recurso para o TCA Norte, este concedeu provimento ao recurso jurisdicional, revogou a sentença recorrida e julgou improcedente a excepção de ilegitimidade passiva.

1.4. Deste aresto é interposto o presente recurso de revista, pela ora recorrente, concluindo, quanto ao mérito: «1.

O presente recurso visa aferir se, a factualidade alegada pelo Autor na sua petição inicial permitiria, em abstracto, a responsabilidade/condenação pessoal da ora recorrente pelos danos que (alegadamente) lhe terá causado.

(i) DAS RAZÕES DE DISCORDÂNCIA 2.

É consabido que a alegação de que o médico (in casu) agiu com dolo ou negligência grosseira é um facto essencial da causa de pedir, indispensável à responsabilização da ora recorrente pelo pagamento da indemnização peticionada, uma vez que só perante uma atuação daquele tipo haverá responsabilidade solidária do titular do órgão ou agente e da Administração.

  1. Como resulta já dos articulados desta recorrente, refuta-se, mais uma vez, qualquer comportamento, sequer, negligente.

  2. Não obstante, o certo é que da petição inicial resulta, apenas e só, a imputação a esta ré/recorrente de factos praticados com negligência, nada mais! 5.

    Salvo o devido respeito por opinião diversa, da petição inicial não resulta a concretização de que as alegadas lesões que deram origem aos prejuízos cujo ressarcimento é peticionado foram provocados com dolo ou negligência grosseira.

  3. Nunca, em momento algum, o Autor menciona um facto/acto doloso e, ao contrário do que vem agora alegar, “agir culposamente” não é, como é consabido, “agir dolosamente” ou “com culpa grave”, bem como alegar que a médica “podia ter actuado de modo diferente” não pode jamais significar que a mesma actuou com dolo.

  4. Não se trata de errónea interpretação dos factos alegados, trata-se de falta de alegação. Os factos alegados, não integram a modalidade de culpa (dolosa – quer por dolo directo, quer por dolo eventual) que a lei exige para responsabilizar os funcionários do Estado, in casu, a recorrente.

    DO DOLO 8.

    A alegação do Autor, salvo o devido respeito, só pode ter origem numa deficiente apreensão do conceito técnico-jurídico de dolo, pois nenhuma das actuações descritas se reveste das características de comportamento doloso – tal como é subentendido no art. 483º do Código Civil e do art. 7º do RCEEP.

  5. Da petição inicial não resulta, manifestamente, qualquer vontade da recorrente em provocar lesões de visão ao recorrido, nem resulta que, tendo-se apercebido da iminência dessas lesões, tenha mantido, conscientemente, qualquer comportamento responsável pelas mesmas.

    DA DILIGÊNCIA E ZELO MANIFESTAMENTE INFERIORES ÀQUELES A QUE SE ENCONTRAVAM OBRIGADOS EM RAZÃO DO CARGO 10.

    Mas mais: a factualidade alegada também não permite subsumir os factos ao conceito de negligência ou mera culpa por “diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do cargo”.

  6. A exigência da actuação com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que estavam obrigados em razão do cargo, é uma manifesta referência a uma modalidade de negligência grave que, por contraposição à negligência leve (a que alude o antecedente artigo 7.º, n.º 1), pressupõe a existência de uma culpa grosseira ou manifesta.

  7. Assim sendo, como é, também não pode afirmar-se que a factualidade vertida nos arts. 7º, 11º, 12º a 16º e 18º a 22º da petição inicial integre o conceito de negligência grosseira ou grave.

  8. Isto posto, nem o dolo, nem a negligência grosseira da ora recorrente resultam da factualidade trazida aos autos pelo Autor, sendo que a alegação de factos que integrassem qualquer desses conceitos seriam essencial para a aferição da legitimidade da Ré médica.

  9. O Acórdão sob censura viola, entre outras, as normas previstas nos arts. 7º e 8º da Lei 67/2007, de 31/12.»1.5. O recorrido – BB - contra-alegou, concluindo assim: “(…) Do objecto do recurso VIII.

    O Autor, ora Recorrido, que concretizou suficientemente factos que imputam à Ré, ora Recorrente, uma actuação cometida com dolo ou, pelo menos, uma negligência grave.

    IX.

    O não cumprimento da leges artis alegado pelo Autor, configura, por si só, a imputação de um comportamento culposo, mais concretamente, uma ação ou omissão ilícita, “cometida com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontrava obrigada em razão do seu cargo”.

    X.

    A actuação da Réu, ora Recorrente, cobre a situação em que o agente não adaptou as precauções necessárias para evitar o resultado danoso (culpa consciente) ou não previu sequer, por imprevidência ou descuido, a possibilidade de o facto ilícito ocorrer (culpa inconsciente), ao contrário do defendido pela mesma (conceitos estes que apenas vêm reforçar a tese do Autor).

    XI.

    In...

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