Acórdão nº 498/23 de Tribunal Constitucional (Port, 07 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelCons. Mariana Canotilho
Data da Resolução07 de Julho de 2023
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 498/2023

Processo n.º 601/2023

2.ª Secção

Relatora: Conselheira Mariana Canotilho

Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Instrução Criminal de Faro – Juiz 1, A. e B. vieram apresentar reclamação «para o Presidente do Tribunal Constitucional», do despacho proferido naquele tribunal, em 8 de maio de 2023, que não admitiu o recurso interposto para o Tribunal Constitucional.

2. Os aqui reclamantes requereram a intervenção hierárquica para impugnar o despacho do Ministério Público que, em 13 de março de 2023, indeferiu as diligências probatórias por si requeridas. Em 12 de abril de 2023, o Procurador da República, Diretor do Departamento de Investigação e Ação Penal (2.ª Secção de Faro) indeferiu o peticionado, por falta de fundamento legal (cf. fls. 523-526).

3. Inconformados com esta decisão interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional, nos seguintes termos (cf. fls. 618-621):

«(…)

O Arguido A. veio aos autos requerer as diligências probatórias em sua defesa que infra se transcrevem:

1. Se algum dos barcos se encontrava avariado» nomeadamente o barco de três motores.

2. Se havia na embarcação algumas ferramentas, requerendo-se que sejam sujeitas a perícias forenses para determinar quais são impressões lofoscópicas que existem nas mesmas e se as mesmas eram adequadas a solucionar o problema existente na embarcação.

3. Mais se requer a realização de uma perícia à referida embarcação para determinar que tipo de avaria é que é e qual o tipo de solução para reparar a mesma.

4. Se em algum momento se aproximou anteriormente uma embarcação do local e se sim qual.

5. Requer-se desde logo que não sejam alteradas quaisquer características da embarcação com os três motores fora de bordo e requer-se que seja preservadas essas características e que seja autorizada perícia independente por parte da defesa em relação à embarcação afim de não ser perturbada a prova e ser possível o exercício do contraditório por parte do arguido.

E o arguido B. requereu as seguintes diligências probatórias:

1. Se o mesmo se encontrava ou não desaparecido;

2. Se foi comunicado o seu desaparecimento às autoridades espanholas;

3. Se foi realizada alguma participação;

4. Se o mesmo havia ou não embarcado num barco de pesca;

5. Se sim em que data;

6. E qual a embarcação;

7. Devendo ser solicitado ao Reino de Espanha informações sobre se tal efectivamente ocorreu.

Por despacho datado de 13-03-2023 o Ministério Público por ausência de fundamento legal indeferiu o requerido, conforme infra se transcreve:

"Fls. 439 e Fls. 441 (requerimento dos arguidos A. e B.): Os presentes autos não contêm mais informações do que aquela que deles consta, sendo que o processo está inteiramente disponível para consulta pela defesa (pontos 1, 2 e 4 do requerimento do arguido A. e pontos 1 a 7 do requerimento do arguido B.).

Quanto à requerida perícia "independente" pela defesa ao "barco de 3 motores fora bordo" (pontos se 5 do requerimento de A.): a prova pericial tem lugar quando a percepção ou a apreciação dos factos exigirem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos (artigo 151.º Código de Processo Penal); a perícia é realizada em estabelecimento, laboratório ou serviço oficial apropriado ou} quando tal não for possível ou conveniente, por perito nomeado de entre pessoas constantes de listas de peritos existentes em cada comarca, ou, na falta ou impossibilidade de resposta em tempo útil, por pessoa de honorabilidade e de reconhecida competência na matéria em causa (artigo 152.º Código de Processo Penal); a perícia é ordenada, oficiosamente ou a requerimento, por despacho da autoridade judiciária, contendo a indicação do objeto da perícia e os quesitos a que os peritos devem responder, bem como a indicação da instituição, laboratório ou o nome dos peritos que realizarão a perícia (artigo 154.º Código Processo Penal).

No caso dos autos - de detenção dos arguidos em flagrante delito por transporte e posse, em embarcações do tipo lanchas rápidas semi-rígidas com quatro motores de alta potência fora de bordo, de 127 fardos de haxixe (4.450 Kg) -foram as embarcações em causa apreendidas no processo, como instrumentos usados para a prática de crime, com exame e avaliação também junto aos autos (como se disse, consultáveis), pelo que, também não se vislumbra qualquer relevância probatória na requerida perícia "independente" a qualquer das embarcações apreendidas, sendo que nenhuma delas tem três motores fora de bordo, mas quatro.

Face ao exposto e por ausência de fundamento legal, indefere-se o requerido.

Notifique

Inconformados os arguidos ora Recorrentes apresentaram recurso hierárquico ao imediato superior hierárquico do Magistrado do Ministério Público porquanto não foi permitido aos arguidos exercerem o seu direito de defesa e demonstrarem a sua inocência.

Por despacho datado de 12-04-2023 o Superior Hierárquico do Magistrado do Ministério Público indeferiu o pedido efetuado por falta de fundamento legal.

Os arguidos ora Recorrentes não se conformam com o despacho proferido pelo Ministério Público.

A interpretação dada pelo Ministério Público ao artigo 262.º do Código de Processo Penal de que os elementos solicitados não se afiguram essenciais à descoberta da verdade material nem às finalidades aí previstas é inconstitucional e viola o artigo

32.º, n.° 1 da...

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