Acórdão nº 01008/20.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução30 de Junho de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * * I – RELATÓRIO 1. «AA», Autora nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA em que é Réu o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, I.P.

, vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou improcedente a presente ação.

  1. Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) I. Vem o presente Recurso interposto do Saneador-Sentença proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o qual julgou improcedente a pretensão da ora Recorrente, fundamentando, para o efeito, que as comissões de verificação gozavam de discricionariedade técnica, olvidando que a Recorrente cuidou proceder à junção de diversos elementos de médicos reputados nas respetivas áreas de atuação.

    1. O mesmo é dizer que não cuidou o Tribunal recorrido de analisar, com o rigor que lhe impunha, os pareceres técnicos constantes das deliberações suprarreferidas, pois que se o tivesse feito, sempre concluiria que os mesmos padecem de erro grosseiro e patente, constituindo a deliberação sub judice um juízo arbitrário — que, ao não respeitar as normas técnicas e as lege artis aplicáveis, extravasou manifestamente os limites da discricionariedade técnica —, bem como vício de violação da lei, por incorreta do regime de proteção na invalidez, assente no DL n.° 187/2007, de 10/05, confluindo na manifesta ilegalidade do ato impugnado, razão pela qual não pode a Recorrente conformar-se com a decisão recorrida, conquanto a mesma, para além de incorrer em manifesta nulidade, padece de flagrante erro de julgamento de facto e de Direito, razão pela qual deverá ser removida da ordem jurídica e substituída por outra que acautele os direitos fundamentais da Recorrente.

    2. Entende a Recorrente, antes de mais, que a sentença recorrida é nula, porquanto o Tribunal incorreu em contradição no sentenciado, na medida em que considerou como provado que, quer em 20.06.2017, quer em 28.01.2020, a Recorrente poderia recuperar a capacidade de auferir, no desempenho da sua profissão, mais de 50% da retribuição correspondente, dentro dos próximos 3 anos” (cfr. factos provados 4 e 15), concluindo que a comissão de verificação se insere na discricionariedade técnica e que apenas poderá sindicada em caso de erro grosseiro, assumindo que não “ (...) vislumbramos a existência de erro grosseiro ou manifesto” (destaque nosso).

    3. O mesmo é dizer que a argumentação que reiteradamente tem vindo a ser veiculada desde 2017 de que a Recorrente pode recuperar nos próximos três anos, não configura, no entendimento do Tribunal recorrido, qualquer erro grosseiro, mesmo que já tenham decorrido mais de cinco anos (!) V. É flagrante a contradição em que incorre o Tribunal recorrido ao admitir que a comissão de verificação de incapacidades goza de discricionariedade técnica e ao não reconhecer que se assiste a um erro grosseiro nos pareceres emitidos, quando dos factos provados resulta clarividente que a capacidade de a Recorrente recuperar dentro de três anos é manifestamente impossível.

    4. Neste desiderato, dúvidas não restam de que a sentença é nula nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do artigo 615.° do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, uma vez que os factos considerados provados (a incapacidade de a Recorrente recuperar em três anos) sempre imporiam uma decisão distinta.

    5. Significa isto que os fundamentos existentes na decisão recorrida são manifestamente contrários ao sentido decisório que veio a ser vertido na sentença, circunstância geradora de nulidade que, para todos os legais efeitos, expressamente se invoca.

    6. Acresce que, entende a Recorrente que a sentença recorrida é ainda nula, porquanto incorre em omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 615.° do Código de Processo Civil.

    7. A Recorrente imputou, ao ato impugnando, o vício de falta de fundamentação, pelo que se impunha ao Tribunal averiguar se o ato, de facto, padecia daquele vício, sendo certo que tal questão não se confunde com a putativa discricionariedade técnica que possa assistir aos técnicos que elaboram as deliberações das Comissões de Verificação.

    8. Porém, certo é que não logrou o Tribunal pronunciar-se sobre o vício de falta de fundamentação que foi imputado ao ato impugnado...

    9. Aliás, sempre se diria que, caso o Tribunal recorrido se tivesse debruçado sobre esta questão, a decisão alcançada seria — como bem se demonstrará infra — diametralmente distinta, uma vez que do ato apenas consta que “Fundamenta esta situação: Com elementos clínicos que justifiquem decisão”, pelo que assoma à evidência que o ato impugnado padece de manifesta falta de fundamentação.

    10. Aqui chegados, resulta por demais evidente que se deve concluir que, ao não se pronunciar sobre tal vício, incorreu o Tribunal a quo em omissão de pronúncia, à luz da já citada alínea d) do n.° 1 do artigo 615.° do Código de Processo Civil, tal circunstância configura uma nulidade - a qual se invoca para todos os devidos e legais efeitos.

      1. DO RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO XIII. A sentença recorrida padece de clamoroso erro na apreciação da matéria de facto porquanto, tendo em conta a prova produzida, nunca o Tribunal a quo poderia ter considerado inexistirem factos não provados com relevância para a decisão da causa.

    11. Segundo o que dispõe o n.° 1 do artigo 640.° do CPC aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, impende sobre o Recorrente da matéria de facto invocar, em concreto, quais os concretos factos que deveriam ser considerados como provados e, bem assim, a prova que sustenta tal aditamento.

    12. Em cumprimento das alíneas a) (por omissão), b) e c) do referido artigo 640.° do CPC aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, atendendo à vasta prova documental constante nos autos deveria ter sido considerado provado que: 1. Em 17.04.2017, a Dra. «BB», médica de família, atestou que a Autora “(...) encontra-se incapacitada para a sua actividade laboral, para a realização de tarefas domésticas (como por exemplo, descascar batatas, cebolas, alhos, fazer a cama, etc.) e neste momento para a condução, embora, poderá voltar a conduzir, daqui algum tempo, em curtas distâncias” - cfr. Documento n.° ...8 junto com a Petição Inicial; 2. Em 24.04.2017, a Dra. «CC», médica especialista de psiquiatria, atestou que “A doente [a Autora] apresenta, associada a esta situação de doença muito penosa, no que se refere a dores intensas, uma marcada baixa da sua autoestima, uma crença na sua incapacidade de melhorar, o que se constitui numa sintomatologia Depressiva Major, sendo que tem incapacidades para manter tarefas, alterações do sono, e uma inabalável falta de crença na possibilidade de melhoria. Antecipa com, grande sofrimento a possibilidade de voltar a ser a pessoa ágil e trabalhadora que sempre foi, sendo que esta incapacidade é sentida pela doente de forma catastrófica. É meu parecer que a doente não reúne condições de estabilidade ou de melhoria clínica que lhe permita continuar a trabalhar, e creio-a severamente incapacitada” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 5 junto com a Petição Inicial; 3. Em 26.04.2017, o Dr. «DD» emitiu um Atestado Médico de Incapacidade Multiuso, no qual confirmou que “(...) o utente é portador de deficiência que, nesta data e conforme o quadro seguinte, lhe confere uma incapacidade permanente global de 60%” — cfr. Documento n.° ...9 junto com a Petição Inicial; 4. Em 18.05.2017, o Dr. «EE», de Clínica ..., atestou que a Autora “Tem realizado tratamento de MFR por cervico-dorsalgias incapacitantes que não tem melhorado com respetivo tratamento, mantendo acentuada incapacidade funcional com diminuição de força muscular dos membros superiores (+ a drta) que a incapacitam da realização de algumas tarefas da vida diária, nomeadamente condução automóvel que a tornam incapaz para o desempenho da sua profissão” - cfr. Documento n.° ...8, pág. 6 junto com a Petição Inicial; 5. Em 28.06.2017, o Professor Dr. «FF», Diretor do Serviço de Neurocirurgia do Centro Hospitalar ..., emitiu parecer no sentido que “De acordo com a solicitação efetuada confirmo o Relatório Clínico de 02.04.2017 e esclareço que a incapacidade para a actividade laboral da Exma. Sr.ª Dª. «AA» é definitiva” — cfr. Documento n.° ...8, pág. 8 junto com a Petição Inicial; 6. Em 11.10.2017, a Autora foi submetida a uma intervenção cirúrgica para remoção de lesão intradural extramedular D2-D3 com monitorização neurofisiológica com PEM e PESS -estudo anatomo-patológico definitivo de Meningioma meningotelial (OMS, grau I) - cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 7. Por informação clínica datada de 12.10.2017, atestou que “Mais de 1 ano após duas cirurgias e dada a persistência dos sintomas dolorosos e incapacitantes, e pela profissão da doente que implica viagens prolongadas, em minha opinião esta doente deve ser considerada incapaz para a profissão habitual” — cfr. Documento n.° ...8, pág. 9 junto com a Petição Inicial; 8. Em 15.11.2017, o Dr. «GG», médico de medicina física e de reabilitação do Centro Hospitalar ..., atestou que “Da última observação, em novembro de 2017, sem noção de melhoria evidente da mobilidade dos ombros, mantendo parestesias de ambas as mãos e dor de características neuropáticas a nível da região dorsal sobre a cicatriz e com irradiação à região especular direita”- cfr. Documento n.° ...8, pág. 10 junto com a Petição Inicial; 9. Em 23.11.2017, foi decido pela equipa médica que a acompanhava a Autora a reintervenção cirúrgica - cfr. Documento n.° ... junto com a Petição Inicial; 10. Em 15.01.2018, a Professora Dra. «HH», médica especialista em Medina Legal, asseverou que “Atendendo aos aspetos atrás descritos, podemos concluir que relativamente ao caso de «AA», é de considerar o seguinte: a) Incapacidade Parcial Permanente fixável em 89.837%, com deficiência motora; b) Total e definitivamente incapaz para o exercício da sua atividade...

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