Acórdão nº 03133/18.3T8BRG-B.G1.S1 de Tribunal dos Conflitos, 05 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução05 de Julho de 2023
EmissorTribunal dos Conflitos

Acordam, no Tribunal dos Conflitos: 1.Em 9 de Junho de 2018, Vilaminho – Inovação Imobiliária, SA, instaurou no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, ao abrigo do disposto nos artigos 96.º e 42.º, n.º 2, al. c), e n.º 3, ambos do Código de Expropriações, procedimento contra o Município de Braga, pedindo o reconhecimento do direito da requerente à expropriação de todas ou qualquer uma das parcelas identificadas nos artigos 16.º e 17.º e a que fosse determinada “a constituição da arbitragem e demais tramitação legal nos termos previstos nos artigos 42.º, n.º 1”.

Baseou o direito que invoca na “aplicação analógica das normas previstas no art. 106.º da Lei 2110, de 19 de Agosto de 1961 (e que mesmo veio a ser confirmada pela nova lei de Bases do Solo, Lei n.º 31/2014 de 13 de Maio, no art.º 18.º)”.

Em síntese, alegou que, em 14 de Maio de 1996, adquiriu duas parcelas de terreno, praticamente contíguas e localizadas no sítio de ..., em Braga, denominadas “Campo ...” e “De ...”, id.

nos artigos 16.º e 17.º da petição inicial; que, no momento da aquisição, tais parcelas de terreno estavam classificadas como solo urbano e urbanizável, com aptidão construtiva de alta/média densidade, e integravam a área de expansão urbana da cidade de Braga, definida no Plano Diretor Municipal; que, todavia, apesar de ter tentado, durante 11 anos, aproveitar a edificabilidade que lhe era concedida pelos instrumentos de gestão territorial vigentes, nunca foi dado início, nem ao procedimento expropriativo das parcelas, nem à tentativa de aquisição das mesmas pela via do direito privado.

Mais alegou que viu serem-lhe sucessivamente indeferidos os pedidos de licenciamento que apresentou e as suas parcelas de terreno oneradas com verdadeiros vínculos de inedificabilidade e reservadas para posterior aquisição municipal.

Citado, o réu contestou, concluindo pela improcedência da ação. Por entre o mais, sustentou a inaplicabilidade do artigo 106.º da Lei n.º 2110, por inexistência de lacuna.

Em 31 de Janeiro de 2022, o Município de Braga veio requerer que “seja declarado o erro na forma do processo com consequente incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, ou, se assim não se entender, seja declarada a impossibilidade superveniente da lide”.

Sustenta, em suma, que a factualidade invocada pela requerente constitui causa de pedir de uma ação de indemnização e não de uma expropriação a pedido. Concordantemente, afirma, a competência para apreciar tal ação cabe aos tribunais administrativos.

Por despacho de 10 de Maio de 2022, o Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Cível de Braga – Juiz ..., pronunciou-se no sentido da inexistência de erro na forma do processo e pela não verificação da invocada incompetência absoluta do Tribunal para conhecer do pedido formulado.

Ali se sustentou, em suma, que a pretensão da requerente “tem apoio no entendimento de que o a solução preconizada no artigo 106° da Lei 2110, de 19 de Agosto de 1962 se aplica às situações de expropriação de caráter substancial, entendimento plausível, tanto assim que assim se decidiu no Acórdão do TRP de 06/11/2007, processo 0625139, relatado por Marques de Castilho, e no Acórdão do TRG de 25/05/2016, processo 6244/15.3T8VNF.G1, ademais se dirá que, independentemente do mérito, a verdade é que só através do incidente de que lançou mão pode a requerente obter a tutela pretendida pois que na ação indemnizatória a que alude o artigo 171° do RJIGT não pode obter, certamente, o reconhecimento do direito que se arroga a ser expropriada, havendo até, isso sim, incompetência absoluta da jurisdição administrativa para conhecer de tal pedido.

Como tal, inexiste erro na forma de processo e, consequentemente, inexiste incompetência absoluta deste Tribunal para conhecer do pedido formulado.

” Inconformado, o Município de Braga interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães.

Por Acórdão de 29 de Setembro de 2022, o Tribunal da Relação de Guimarães julgou a apelação procedente, revogando a decisão recorrida, e declarou o Tribunal Comum materialmente incompetente para o conhecimento da presente ação, absolvendo o réu da instância.

Afirmou que o pedido formulado nos autos é o reconhecimento do direito à expropriação de todas ou qualquer uma das parcelas identificadas nos art. 16° e 17° da p.i., e que a causa de pedir é constituída pelos sucessivos indeferimentos de pedidos de licenciamento em face de "reserva para posterior aquisição municipal" e consequente "vinculo de inedificabilidade".

Assim, “em face deste pedido (coadjuvado com a causa de pedir), está em causa uma relação jurídica administrativa nos termos da qual um dos sujeitos é uma entidade pública – Município de Braga – que actua com vista à realização de um interesse público legalmente definido – construção de estradas, equipamentos públicos, espaços verdes, etc – regida pelo direito administrativo (PDMs, Planos Territoriais, etc).

Com efeito, o reconhecimento por um tribunal de que o proprietário tem direito a ser expropriado equivale a uma declaração por utilidade pública. Assim, se esta é da competência da administração latu sensu também aquele reconhecimento deve ser da competência do Tribunal Administrativo sendo este o tribunal especializado para, em face da legislação administrativa, designadamente de ordenamento do território, apurar se se mostram reunidos os requisitos do reconhecimento do direito à expropriação (quer este resulte expressamente de disposição legal, quer seja de ponderar a eventual aplicação analógica de determinada disposição).

No caso de ser reconhecido o direito do particular a ser (total ou parcialmente) expropriado, então competirá ao tribunal comum, nos termos do art. 42.°, n.° 2 c) e n.° 3, 43.° do CE., promover a arbitragem, i.e., a fixação da indemnização devida, a pedido daquele. No caso de não aceitação do valor arbitrado na decisão arbitral tem o expropriado a faculdade de interpor recurso também para o tribunal comum.

Como vimos supra, situação distinta é o direito que o proprietário pode ter a ser indemnizado no caso de, não havendo D.U.P. e não sendo reconhecido o direito a ser expropriado, a sua propriedade sofrer restrições decorrentes designadamente de planos territoriais (art. 171.° do RJUGT) – a denominada "expropriação do plano", "de sacrifício", "de acto individual, sendo que para este pedido é competente o tribunal administrativo.

Concluímos no sentido de não serem os tribunais comuns os competentes para o pedido apresentado pela autora nesta acção, sendo antes competentes os tribunais administrativos (art. 4.º, n° 1 a) do E.T.A.F.).”.

”.

  1. Inconformada, a requerente interpôs recurso de revista para o STJ, pugnando pela competência material do Tribunal Comum para a apreciação da causa.

    Nas alegações que apresentou, formulou as seguintes conclusões: « I. Por Acórdão datado de 29 de Setembro de 2022, decidiu o Tribunal a quo julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogar a decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, declarando os tribunais "comuns" materialmente incompetentes para o conhecimento da presente acção, absolvendo o aqui Recorrido da instância, não se conformando a aqui Recorrente com tal decisão; Daí o presente recurso! II. No caso dos autos não há, nunca houve, declaração de utilidade pública, invocando a Recorrente o seu direito a ser expropriada à luz do disposto nos arts. 42°/2 alínea c) e n.°3 e 96° do Código de Expropriações (CE) que, na sua letra, dispõe "caber ao juiz de direito da comarca do local da situação do bem ou da sua maior extensão em qualquer dos seguintes casos: (...) c) Se a lei conferir ao interessado o direito de requerer a expropriação de bens próprios" e que "o disposto nas alíneas b), c), d) e e) do número anterior depende de requerimento do interessado, decidindo o juiz depois de notificada a parte contrária para se pronunciar no prazo de 10 dias", (sublinhados nossos) III. O pedido e causa de pedir da Recorrente assentam, ainda, no disposto no art. 96° do CE que, como se sabe, remete para aquele art. 42°/3 do mesmo código, dispondo o mesmo o seguinte: "Nos casos em que, em consequência de disposição especial, o proprietário tem o direito de requerer a expropriação de bens próprios, não há lugar a declaração de utilidade pública, valendo como tal, para efeitos de contagem de prazos, o requerimento a que se refere o n° 3 do artigo 42°." IV. O elemento literal presente no disposto nos art.s 42°/2 e 3 e 96° do CE que, não tendo sido derrogados, importa a atribuição expressa de competência aos Tribunais Judiciais para decidir (logo, emitir uma apreciação de mérito) sobre "se a lei confere, ou não, ao...

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