Acórdão nº 361/19.8T8LLE-B.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução06 de Julho de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

* I – Relatório I.1 – Questões a decidir AA e BB instauraram em 01/02/2019 acção executiva contra a executada J..., Lda., para cobrança coerciva do montante de 10.891,05€, que, em virtude de cumulação de pedidos, passou a ser de 35.852,24€.

Entre outros bens, na referida execução procedeu-se em 03/02/2020 à penhora da fracção autónoma designada pela letra “B” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº 2348/19950105 e inscrito na matriz sob o artigo 4318. Sobre este imóvel a recorrente Hefesto STC S.A., detém garantia hipotecária com base na qual apresentou reclamação do seu crédito no montante de 339.456,08€.

Em 18 de Outubro de 2020 o Agente de execução notificou, por carta registada com aviso de recepção o recorrente CC, para a morada da fracção em causa, do registo da penhora sobre o prédio em causa advertindo-o da possibilidade de o bem ser vendido na execução (referência CITIUS ...51) dado constar no registo predial da referida fracção o registo da acção intentada por ele e DD, cujo pedido consistia em ser proferida sentença que produzisse os efeitos da declaração negocial da ré faltosa, transferindo o direito de propriedade da fracção autónoma correspondente ao contrato celebrado entre os autores e a ré J..., Lda., que esta lhes prometeu vender.

O imóvel foi colocado à venda na plataforma e-leilões, com data limite de 07/07/2021 para apresentação de propostas tendo a venda sido publicitada, designadamente, através da afixação de edital no prédio onde residem os recorrentes.

A proposta vencedora no leilão foi apresentada pelo recorrente EE, aqui recorrente.

Em 28/07/2021 CC e DD foram notificados, por carta registada, da venda do imóvel e para proceder à entrega do mesmo (ref. º CITIUS ...57), e, emitido título de transmissão a favor do terceiro adquirente do imóvel.

Os recorridos CC e DD apresentaram no processo executivo em 17/08/2021 um requerimento avulso, onde formularam os pedidos de: - Suspensão da execução nos termos do disposto no artigo 793º do CPC até prestação de caução, uma vez que requereram a insolvência da executada J..., Lda., que corre termos no Juízo do Comércio ...-J... sob o nº 97/21....; - Admissão do crédito no valor de 40.000,00 €, reconhecido por sentença proferida nos autos n.º 2484/19...., que correu termos no Juízo Central Cível ...-Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca ...; - Reconhecimento do direito de retenção sobre o prédio nos termos do artigo 755º, nº 1, alínea f) do Código Civil (CC); - Suspensão da entrega do prédio ao adquirente; - Declaração de nulidade da execução e sustação imediata de todos os actos praticados relativamente ao imóvel e venda.

O Tribunal de 1.ª instância, por decisão proferida em 30 de Outubro de 2021, indeferiu os pedidos formulados.

Interposto recurso de apelação desta decisão veio o Tribunal da Relação de Évora, por acórdão proferido em 15 de Dezembro de 2022 a julgar a apelação procedente e, em consequência, revogar a decisão recorrida que se substitui por outra que reconhece que o crédito dos apelantes está garantido por direito de retenção, devendo, por isso, ser suspensa a execução no respeitante à entrega da fração a terceiro adquirente, até que o seu crédito seja satisfeito.

A recorrente Hefesto STC S.A.

apresenta pedido de revista daquele acórdão ao abrigo do disposto no artigo 671.º n.º 1 do Código de Processo Civil, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: A.

Em 11/05/2020 a Hefesto STC S.A., na qualidade de Credora Hipotecária da fração autónoma designada pela letra “B” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº 2348/19950105 e inscrito na matriz sob o artigo 4318, juntou aos autos, na modalidade de “apensar a processo existente”, reclamação de créditos no valor de 339.456,08€, o qual foi graduado logo após as custas e o crédito de IMI (douta sentença com a referência ...27).

B.

O Agente de Execução (AE), em 18/10/2020, por carta registada com aviso de receção, notificou o recorrente CC, para a morada da fração aqui em causa, do registo da penhora sobre a mesma, advertindo-o da possibilidade de o bem ser vendido na execução (referência CITIUS ...51).

C.

Constam dos autos, com data de 28/01/2021 (referência CITIUS ...64) dois avisos de receção, devidamente assinados, relativos às cartas de constituição de CC e DD como terceiros fiéis depositários do imóvel.

D.

Em 25/05/2021 o imóvel foi colocado à venda na plataforma e-leilões, com data limite de 07/07/2021 para apresentação de propostas.

E.

O AE publicitou a venda do imóvel, designadamente, através da afixação de edital no prédio onde residem os recorrentes (referência CITIUS ...50).

F.

Em 28/07/2021 foi emitido título de transmissão a favor do terceiro adquirente do imóvel.

G.

Em 17/08/2021 os recorrentes CC e DD deram entrada nos autos de requerimento avulso, no qual pediram o seguinte ao Douto Tribunal: - Suspensão da execução nos termos do disposto no artigo 793º do CPC até prestação de caução; - Admissão do crédito no valor de 40.000,00 €, reconhecido por sentença proferida nos autos n.º 2484/19...., que correu termos no Juízo Central Cível ...-Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca ...; - Reconhecimento do direito de retenção sobre o prédio nos termos do artigo 755º, nº 1, alínea f) do Código Civil (CC); - Suspensão da entrega do prédio ao adquirente; - Declaração de nulidade da execução e sustação imediata de todos os atos praticados relativamente ao imóvel e venda.

H.

Em 30/10/2021 foi proferido Douto despacho, que indeferiu os pedidos formulados, pronunciando-se, em suma, nos seguintes termos: - Para que os Requerentes pudessem vir invocar o seu direito de retenção sobre a fração autónoma, era necessário que os mesmos, naquela ação nº 2484/19...., tivessem pedido o reconhecimento desse seu direito e que o vissem reconhecido, sendo certo que não o fizeram; - Os Requerentes não têm reconhecido o direito de retenção sobre a fração autónoma designada pela letra “B”, tendo apenas reconhecido um direito de crédito sobre a sociedade executada, o qual, poderiam reclamar no apenso de reclamações de créditos; - Ainda que se entendesse que os Requerentes tinham reconhecido o seu direito de retenção sobre a fração autónoma, a solução seria a mesma, porquanto esse direito teria caducado com a venda judicial; - O credor que goza do direito de retenção sobre a coisa apreendida judicialmente só tem direito a reclamar o seu crédito e fazer aí, valer a sua garantia real; - Não existe qualquer fundamento legal para declarar nulos os atos praticados nos autos de execução e para declarar sustada a execução.

I.

Em 11/11/2021 foi apresentado recurso do Douto Despacho (referência da peça: ...31). Contrariamente ao que decorre do Douto Acórdão, foram apresentadas contra-alegações de recurso pela ora recorrente (referência da peça: ...56).

J.

Do douto acórdão do Tribunal da Relação cabe recurso de revista por estar em causa uma decisão de mérito (artigo 671.º n.º 1 do CPC) encontrando-se preenchido o pressuposto previsto no n.º 1 do artigo 678.º do CPC, designadamente, a ora recorrente entende que a decisão recorrida é-lhe desfavorável em valor superior a metade da alçada da Relação, uma vez que reconhece a existência de um direito de retenção e um crédito no valor de 40.000 €, reconhecimento esse que teria como consequência prática a graduação deste crédito antes do crédito da ora recorrente, o que não se concebe.

K.

O presente recurso de revista tem como fundamento o disposto no artigo 674.º n.º 1 c), em conjugação com previsto no n.º 1, alínea d) 1.º parte, alínea c), 2.ª parte do artigo 615.º e no 674.º n.º 1, alínea b), 1.ª parte, todos do CPC.

L.

O objeto de recurso consistiu unicamente na omissão de pronúncia do Douto despacho proferido pela 1.ª instância quanto ao pedido de suspensão dos pagamentos. Não obstante, o Tribunal da Relação entendeu pronunciar-se, oficiosamente, ao abrigo do disposto no artigo 608.º n.º 2, 2.ª parte do CPC, sobre a existência de direito de retenção, afirmando que o mesmo não caducou com a venda judicial do bem.

M.

Quanto ao referido pedido, a decisão recorrida relegou para a 1.ª instância, para exercício do contraditório. Sucede, no entanto, que, em momento algum o douto acórdão aborda a questão da necessidade de os recorrentes reclamarem o crédito no apenso respetivo.

N.

Face ao objeto do recurso, e uma vez que o Douto Tribunal decidiu reconhecer a existência de um direito de retenção a favor dos recorrentes (afirmando que o mesmo não caducou com a venda judicial), impunha-se uma tomada de posição sobre se os recorrentes, seriam ou não credores nos autos e, nessa medida, se teriam ou não legitimidade para pedir a suspensão dos pagamentos.

O.

Determina o artigo 788.º n.º 3 do CPC que: “Os titulares de direitos reais de garantia que não tenham sido citados podem reclamar espontaneamente o seu crédito até à transmissão dos bens penhorados.”.

P.

Os recorrentes não apresentaram, no apenso criado para o efeito e até à transmissão do bem, a devida reclamação de créditos.

Q.

Nessa medida, não foram cumpridos os preceitos legais que garantem o devido contraditório, mormente, o artigo 789.º do CPC.

R.

Os recorrentes limitaram-se a apresentar um requerimento avulso no processo principal e em data posterior à venda judicial. Motivo pelo qual, os recorrentes, tal como pugnado pela 1.ª instância, não poderão ser considerados credores nos autos.

S.

O prazo constante do n.º 3 do artigo 788.º do CPC é um prazo preclusivo do direito, pelo que após a emissão do título de transmissão (28/07/2021) deixou de ser possível apresentar reclamação de créditos.

T.

Entende a ora recorrente que o Douto Acórdão ao não analisar estas questões previamente à eventual decisão de remeter o processo para a 1.ª instância para exercício do contraditório quanto aos pagamentos, deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar (artigo 674.º n.º 1 alínea c) e artigo 615.º n.º 1, alínea d), 1.ª...

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