Acórdão nº 395/23 de Tribunal Constitucional (Port, 14 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelCons. Rui Guerra da Fonseca
Data da Resolução14 de Junho de 2023
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 395/2023

Processo n.º 639/2023

Plenário

Relator: Conselheiro Rui Guerra da Fonseca

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional:

I. RELATÓRIO

1. O Presidente da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Mazedo e Cortes (Município de Monção, distrito de Viana do Castelo) veio requerer ao Tribunal Constitucional a verificação preventiva da constitucionalidade e da legalidade «de um referendo local para auscultação das comunidades em relação à continuidade da União das Freguesias de Mazedo e Cortes», nos termos do artigo 25.º do Regime Jurídico do Referendo Local (Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto, alterada pelas Leis Orgânicas n.º 3/2010, de 15 de dezembro, n.º 1/2011, de 30 de novembro, n.º 3/2018, de 17 de agosto, e n.º 4/2020, de 11 de novembro, doravante "RJRL").

A deliberação para a realização do referendo foi tomada em sessão extraordinária da Assembleia de Freguesia, em 31 de maio de 2023, e a pergunta a submeter a consulta popular é a seguinte: «Concorda com a separação da União das Freguesias de Mazedo e Cortes? Sim/Não».

2. O requerimento vem instruído com cópias certificadas (i) do projeto de deliberação (que constituiu a iniciativa do referendo) aprovado na sessão extraordinária de 31 de maio de 2023, da Assembleia de Freguesia; (ii) da minuta da ata daquela sessão extraordinária; (iii) do edital através do qual foi publicitada a convocação dessa mesma sessão extraordinária; (iv) da convocatória dirigida os membros do órgão; (v) da lista de presenças dos membros do órgão na sessão extraordinária de 31 de maio de 2023.

3. Por despacho do Vice-Presidente do Tribunal Constitucional, de 9 de junho de 2023, foi admitido o pedido e ordenada a distribuição do processo.

4. Discutido o memorando a que se refere o n.º 3 do artigo 29.º do RJRL e fixada a orientação do Tribunal, cumpre agora decidir de acordo com o que então se estabeleceu.

II. FUNDAMENTAÇÃO

5. Resultam dos autos os seguintes elementos, com relevância para a decisão:

a) Os membros eleitos pelo Partido Socialista da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Mazedo e Cortes apresentaram, datado de 24 de maio de 2023, o seguinte projeto de deliberação a este órgão, respeitante à realização de referendo local:

«Exmo. Presidente da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Mazedo e Cortes,

Considerando que:

1. É possível proceder à revisão do processo de agregação que ocorreu no âmbito da reforma administrativa nacional; pela agregação das antigas freguesias, nomeadamente da Freguesia de Mazedo com a Freguesia de Cortes, imposta sem a consulta à população pela Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, uma vez que foi aprovada e se encontra em vigor a Lei n.º 39/2021, de 24 de junho, que possibilita a reversão das Uniões de Freguesia.

2. Foi um compromisso de campanha dos membros do PS-Partido Socialista que forma o atual Executivo.

3. Ser um tema que tem despertado muita discussão e opiniões entre outros fatores.

Pelo exposto, os membros da assembleia de freguesia eleitos pelo Partido Socialista propõem, nos termos do disposto no artigo 10º, nº 1 da Lei Orgânica nº 4/2000, de 24 de agosto, na sua redação atual, diploma legal que aprovou o regime jurídico do referendo local, a realização de um referendo, o qual tem como objetivo saber concretamente qual é a vontade da população sobre a continuidade ou não desta União de freguesias.

O resultado possibilita, também, aos membros desta assembleia, obter em mãos dados fiáveis sobre a matéria, ajudando na sua tomada de decisão, possibilitando ir de encontro com a vontade efetiva da população.»

b) A Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Mazedo e Cortes, reunida em sessão extraordinária, em 31 de maio de 2023, deliberou por maioria (seis votos a favor, e três abstenções) aprovar o projeto de realização do referendo.

c) Na mesma sessão extraordinária, a Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Mazedo e Cortes deliberou também, pela mesma maioria (seis votos a favor, e três abstenções) aprovar a pergunta a submeter a referendo: «Concorda com a separação da União das Freguesias de Mazedo e Cortes?».

d) O requerimento para fiscalização preventiva da constitucionalidade e legalidade da deliberação é datado de 6 de junho de 2023, tendo dado entrada no Tribunal Constitucional no dia 9 de junho de 2023.

6. Compete ao Tribunal Constitucional, em fiscalização preventiva obrigatória, verificar a constitucionalidade e a legalidade da deliberação da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Mazedo e Cortes, de 31 de maio de 2023, de modo a determinar se estão reunidos os pressupostos e requisitos para a realização do referendo local (cfr. artigo 223.º, n.º 2, alínea f) da Constituição da República Portuguesa [doravante, "CRP"]; artigos 11.º e 105.º da Lei do Tribunal Constitucional [Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação em vigor, doravante "LTC"]; e artigos 25.º e seguintes do RJRL).

7. O requerente tem legitimidade para pedir a fiscalização preventiva do referendo local, na qualidade de presidente do órgão autárquico que deliberou a sua realização (artigo 25.º do RJRL).

8. Sendo a deliberação em apreço de 31 de maio de 2023, e tendo o requerimento para a respetiva submissão a fiscalização preventiva da constitucionalidade e da legalidade dado entrada no Tribunal Constitucional em 9 de junho de 2023, foi respeitado o prazo de oito dias estabelecido no artigo 25.º do RJRL.

9. O processo encontra-se regularmente instruído (artigo 28.º, n.º 1, do RJRL). Ainda que a cópia da ata da sessão em que foram tomadas as deliberações tenha sido aprovada em minuta, é jurisprudência constante do Tribunal Constitucional que a elaboração e aprovação de minuta da ata no final da sessão em que foi tomada a deliberação referendária assume valor certificativo equivalente ao da ata aprovada em sessão posterior (cfr. Acórdãos n.os 100/2009, 394/2010, 391/2012, 400/2012, 423/2020 e 452/2022).

10. Verifica-se a legalidade da iniciativa, que partiu dos membros eleitos pelo Partido Socialista da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Mazedo e Cortes, que apresentaram o mencionado projeto de deliberação datado de 24 de maio de 2023 (cfr. artigos 10.º e 11.º do RJRL).

11. A realização de referendo e o teor da pergunta foram aprovados pela Assembleia de Freguesia dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 24.º do RJRL, pelo que se mostra observado o disposto nos artigos 23.º e 24.º do RJRL, na parte aplicável.

A reunião da Assembleia de Freguesia, sendo extraordinária, ocorreu dentro dos prazos fixados no artigo 12.º, n.º 3, do Regime Jurídico das Autarquias Locais, aprovado em anexo à Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro (não se mostrando relevante que o edital pelo qual se procedeu à convocatória pública fizesse antes menção ao artigo 13.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, preceito revogado pelo artigo 3.º da Lei n.º 75/2013).

Nada obsta, pois, ao conhecimento do pedido.

12. O artigo 8.º do RJRL estabelece que «[n]ão pode ser praticado nenhum ato relativo à convocação ou à realização de referendo entre a data...

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