Acórdão nº 06/23.1BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução21 de Junho de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO RELATÓRIO 1.1.

A Autoridade Tributária e Aduaneira veio, ao abrigo do preceituado nos artigos 152.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 25.º, n.º 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), interpor Recurso para Uniformização de Jurisprudência, alegando que a decisão recorrida, proferida a 2-12-2022, no processo nº 224/2022 –T, e a decisão fundamento, proferida a 11-1-2019, no processo nº 180/2018-T, foram realizados julgamentos opostos relativamente à mesma questão de direito.

1.2.

As alegações de recurso mostram-se finalizadas com as seguintes conclusões.

A.

O presente recurso por oposição de acórdãos vem interposto do acórdão arbitral de 2022/12/05, proferido nos autos supra referenciados, na parte em que o mesmo concede provimento à pretensão do, entendendo o seguinte: «Assim, conclui-se que a aquisição das participações sociais da B... enquadra-se no conceito de gastos incorridos «para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC», adoptado no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC e a dedutibilidade não é afastada por qualquer disposição especial. Por isso, a correcção efectuada ao abrigo do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC e as liquidações de IRC e juros compensatórios com base nela efectuada, bem como a demonstração de acerto de contas, enfermam de vício de erro sobre os pressupostos de direito, que justificam a sua anulação [artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT].» B.

Em suma, e no que diz respeito à questão essencial de direito objeto do presente recurso para uniformização de jurisprudência, a mesma consiste em saber se, os empréstimos ocorridos intra grupo para financiamento de transações entre sociedades, pode ser considerado como um gasto dedutível à luz do disposto no art. 23.º do CIRC.

C.

Isto porque, entendeu o acórdão sob recurso, que «Por outro lado, o facto de a Requerente se integrar num grupo e a circunstância de a obtenção dos empréstimos se inserir na sua estratégia empresarial não pode afectar o juízo sobre a dedutibilidade dos encargos à face do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC para determinação do lucro tributável da Requerente, pois, mesmo nos casos em que é aplicável o regime especial de tributação de grupos de sociedades, a determinação do lucro tributável tem de fazer-se, em primeira linha, a nível de cada sociedade que o integra, como se infere do artigo 70.º, n.º 1, do CIRC, em que se estabelece que «o lucro tributável do grupo é calculado pela sociedade dominante, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo», o que tem ínsito que a determinação do lucro tributável é efectuada com ponderação do interesse empresarial dos gastos de cada uma das sociedades e não à luz do interesse do grupo.» D.

Quanto aos pressupostos necessários para que se verifique uma oposição quanto à mesma questão fundamental de direito, entende-se que os mesmos estão preenchidos no presente recurso uma vez que, o mérito prende-se com o enquadramento a adotar quando estejam em causa empréstimos intra grupo para financiamento de transações entre sociedades relacionadas, dentro de uma estratégia do grupo, no âmbito do artigo 23.º do CIRC.

E.

Quanto aos factos são essencialmente os mesmos para o efeito ora em apreço por serem subsumíveis às mesmas normas de direito e suscitarem uma pronúncia sobre a mesma questão fundamental de direito.

F.

Veja-se que, no acórdão recorrido a questão final de determinar o enquadramento dos encargos financeiros no artigo 23.º do CIRC, teve como pressuposto os empréstimos concretizados no seio do mesmo grupo económico.

G.

O mesmo sucedendo com o acórdão arbitral fundamento, a qual teve de dar resposta a idêntica questão fundamental de direito como pressuposto necessário a poder concluir quanto à sua subsunção no artigo 23.º do CIRC.

H.

Entendeu o acórdão ora recorrido, quanto à questão fundamental de direito, e conforme se transcreve do acórdão a fls. 44, o seguinte: «Por outro lado, em face da obtenção de lucro tributável pela Requerente em todos os anos de 2014 a 2019, inclusive, não pode deixar de entender-se que, apesar de ter contraído os empréstimos, as está em condições de obter lucros. Para além disso, os empréstimos proporcionaram imediatamente à Requerente os rendimentos das rendas, que pagou como arrendatária e que lhe foram imputados por via da aplicação à B... do regime de transparência fiscal, pelo que, no mínimo, haveria erro da Autoridade Tributária e Aduaneira ao desconsiderar a relevância como gastos da totalidade dos encargos financeiros suportados com os empréstimos (na parte em que não foram utilizados para efectuar empréstimos), pois há uma relação de causalidade indirecta comprovada entre a aquisição das participações da B... e a obtenção de rendimentos das rendas, tributáveis em IRC, que tal aquisição proporcionou à Requerente. Na verdade, trata-se de rendimentos que a Requerente não obteria se não tivesse efectuado essa aquisição, assumindo a propriedade indirecta do imóvel do centro comercial, o que só lhe foi possível através dos financiamentos. Por isso, não corresponde à realidade a afirmação que consta do RIT de que «as operações de obtenção de financiamento não produziram qualquer efeito significativo na posição económica das sociedades intervenientes», que desde logo, conduz à conclusão de que a correcção efectuada enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto.» I.

Por sua vez, a decisão arbitral fundamento, quanto à mesma questão fundamental de direito, entendeu o seguinte, conforme se transcreve de fls 20: 48. Deve considerar-se, além disso, que o objeto social da C... consistia na “compra e venda do imóvel do centro comercial designado como ..., bem como o arrendamento, exploração e gestão do ..., bem como quaisquer outros atos ou transações diretamente relacionadas com a supra mencionada atividade”. Ora, dificilmente se poderá discernir qualquer a ligação da aquisição de 70% do capital da D... com o seu objeto social da C.... Com efeito, esta não tem como atividade estatutária a compra e venda de participações sociais.

J.

Ainda quanto aos factos, vejamos o probatório do acórdão recorrido, nos seus pontos F, H, I e L: F) Em Outubro de 2007, a Requerente adquiriu 100% das participações sociais da sociedade B..., S.A. (doravante designada por "B..."), a qual detinha (e ainda detém) a propriedade do imóvel do centro comercial A... (designado, à data dos factos, por "…"); H) O activo da B... era unicamente composto pelo imóvel correspondente ao centro comercial do …, o qual foi avaliado em € 171.677.000, conforme avaliação feita pela entidade independente ...

(documento n.º ... do pedido de pronúncia arbitral do processo n.º 577/2017-T, cuja certidão está junta ao presente processo como documento n.º ..., cujo teor se dá como reproduzido); I) O passivo da B... correspondia a uma dívida bancária, no valor de € 55.000.000, contraída para financiar a construção do centro comercial (páginas 20 e 21 do Relatório da Inspecção Tributária); L) A Requerente é, desde 2002, arrendatária única do centro comercial detido pela B..., pagando, em contrapartida, rendas anuais que ascenderam, em 2017, a € 4.200.000,00 (Relatório da Inspecção Tributária)

K.

Quanto aos factos, o probatório do acórdão recorrido, considerou nos seus pontos 3, 9, 10 e 18 que: «3) Na data de constituição da C..., esta era detida pela sócia única E... Mbh (atualmente F...:Mbh, com sede na ....

(Documento ..., ...) 9) Em 01.11.2002, a C..., que, nos termos da certidão permanente, tinha como objeto social "a compra e venda do imóvel do centro comercial designado como ..., bem como o arrendamento, exploração e gestão do ..., bem como quaisquer outros atos ou transações diretamente relacionadas com a supramencionada atividade" (Documento ..., ...); 10)Em 01.11.2002, a C... tomou de arrendamento o CC... à D... (D...), cujo objeto social consistia na "compra e venda de imóveis, bem como a simples ou mera administração do seu imóvel próprio mantido para fruição e destinado ao CC..., neste se incluindo designadamente o seu arrendamento, bem como quaisquer outros atos ou transações diretamente relacionados com a supra mencionada atividade"; (Documento ..., ...) 18) A D... havia contraído um empréstimo no montante de 135.175.000.00 € para a construção/aquisição do imóvel do CC....

(Documento ..., ...)

L.

Quanto aos critérios que permitem concluir pela oposição quanto à mesma questão fundamental de direito, os mesmo foram já sobejamente concretizados pelo STA, nomeadamente no acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, acórdão de 26/09/2018, no processo nº 0406/18.9BALSB, disponível em www.dgsi.pt.

M.

Não sendo exigível uma coincidência absoluta entre os factos descritos na decisão recorrida e no acórdão fundamento, exige-se apenas que os factos em causa sejam subsumíveis às mesmas normas legais, devendo, por conseguinte, a solução jurídica ser a mesma para ambas as situações.

N.

O que cremos verifica-se na presente situação, pelo que se requer a admissão do presente recurso por estarem reunidos os respetivos pressupostos legais.

O.

Quanto ao mérito do recurso, a Requerida, ora Recorrente, invoca em abono da sua tese o entendimento quanto ao direito que sustentou o acórdão fundamento e cujos argumentos se encontram explanados a fls. 28 e seguintes da respetiva decisão, para cujo teor se remete, concluindo nos seguintes moldes: «50. Não se compreende, pois, a necessidade e racionalidade económica da operação em causa - para além dos ganhos fiscais que manifestamente acarreta - do ponto de vista da atividade estatutária da C... e do seu próprio e exclusivo interesse...

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