Acórdão nº 606/10.0GBPRD-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Junho de 2023

Data21 Junho 2023
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º: 606/10.0GBPRD-A.P1 Origem: Juízo Local Criminal de Paredes (Juiz 2) Recorrente: AA Referência do documento: 17041128 I1.

O ora recorrente impugna, com o presente recurso, decisão proferida no Juízo Local Criminal de Paredes (Juiz 2) do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, que, findo o respetivo prazo de duração, e julgando culposo o incumprimento, por sua parte, de condição a que tinha ficado subordinada a suspensão da execução de pena de prisão que lhe foi imposta nos autos principais, determinou o cumprimento do período de privação da liberdade fixado na decisão condenatória.

  1. Com efeito, por decisão proferida na então Secção Criminal de Paredes (Juiz 2) da Instância Local do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este em 28/04/2015 (confirmada por acórdão proferido por esta Relação em 28/04/2015), foi o ora recorrente condenado, pela prática, «como autor material na forma consumada e em concurso efectivo» de um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e de um crime de abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4, alínea a), do Código Penal, nas penas, respetivamente, de 1 ano de prisão e de 1 ano e 6 meses de prisão, e, em cúmulo, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sob a condição de «o arguido pagar ao ofendido/demandante, no prazo de um ano, a quantia de € 12.000,00 (doze mil euros), correspondente a parte do pedido do prejuízo causado ao ofendido» (que foi fixado na quantia global de € 14.000).

  2. Esta decisão transitou em julgado no dia 09/05/2019.

  3. Tal condenação correspondeu à prática dos seguintes factos: «1. O ofendido BB no mês de Abril de 2010 adquiriu o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-UG de marca BMW de cor cinzenta a CC; 2. Aquando da referida compra o ofendido ficou na posse da declaração de venda relativa à aquisição do referido veículo para que posteriormente comunicasse a alteração da propriedade na Conservatória do Registo Automóvel e assim registar o mencionado veículo em seu nome o que, contudo, acabou por não efectuar; 3. O ofendido por ter sido questionado pelo arguido nesse sentido decidiu que caso surgisse alguma oportunidade procederia à venda do aludido veículo; 4. Assim, no dia 7 de Junho de 2010 o arguido disse ao ofendido que tinha uma pessoa interessada em adquirir o seu veículo automóvel de matrícula ..-..-UG tendo nessa data solicitado ao ofendido que lhe deixasse levar o aludido veículo para mostrar ao interessado, ao que o ofendido acedeu; 5. O arguido levou, então, com ele o aludido veículo que continha no seu interior todos os documentos relativos ao mesmo, designadamente, livrete, título de registo de propriedade e a declaração para registo de propriedade preenchida na parte respeitante aos elementos identificativos do veículo e do vendedor do mesmo, o já mencionado CC e onde constava com adquirente do aludido veículo o ora ofendido BB sendo que na referida declaração constavam todos elementos identificativos do ofendido bem como se encontrava devidamente assinada; 6. Quando se viu na posse do mencionado veículo o arguido elaborou um plano com vista a apropriar-se do mesmo e a obter vantagem patrimonial indevida à custa do empobrecimento do ofendido e resolveu então apoderar-se do aludido veículo e vendê-lo a terceiros e deste modo apoderar-se do valor referente à venda do veículo; 7. Assim e como o arguido tinha na sua posse os documentos referentes ao veículo bem como a declaração de venda emitida a favor do queixoso quando aquele comprara o mencionado veículo e onde constavam todos os seus elementos identificativos bem como estava devidamente assinada, o arguido resolveu desde logo preencher uma outra declaração de venda (requerimento de registo automóvel) onde fez constar como vendedor do aludido veículo de matrícula ..-..-UG, o ora queixoso BB; 8. Assim em local não determinado e data não concretamente apurada mas situada entre 7 de Junho de 2010 e 8 de Junho de 2010, o arguido preencheu uma nova declaração para registo de propriedade referente ao mesmo veículo, com os dados pessoais do queixoso na parte que no documento se alude ao vendedor na qual fez constar como sujeito passivo (vendedor) o nome do queixoso "BB" e demais elementos identificativos nomeadamente apondo o número de contribuinte do ofendido, seu bilhete de identidade bem como a sua morada; 9. Ainda de acordo com o plano por si delineado apôs, pelo seu próprio punho, no local a tanto destinado à assinatura do “vendedor” do aludido veículo, na declaração de registo de propriedade, o nome do ofendido “BB” tentando desenhar tal inscrição da forma mais próxima possível da própria assinatura do ofendido; 10. O arguido preencheu e assinou a referida declaração de venda para desta forma poder vender o aludido veículo a terceiros e possibilitar que estes pudessem dessa forma averbar o competente registo na Conservatória do Registo Automóvel, e dessa forma não levantar suspeitas quanto à ilegitimidade da aludida venda; 11. Com a “declaração de venda” assim preenchida e por si assinada cia forma descrita, o arguido ainda no dia 7 de Junho de 2010 veio a vender o aludido veículo a DD no seu stand de automóveis denominado “A...” sito em ..., em Paredes pelo preço de 10.000 euros; 12. O ora arguido entregou o aludido veículo ao referido comprador, bem como os respectivos documentos bem como a declaração de venda que forjou da forma acima descrita onde constava como vendedor o ora ofendido BB e relativamente à qual o arguido havia falsificado a aludida assinatura; 13. Deste modo, o referido DD procedeu ao registo do veículo de matrícula ..-..-UG em seu nome contra a vontade e sem o conhecimento do queixoso; 14. Acresce, ainda, que o arguido apoderou-se em proveito próprio da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) pelo qual conseguiu vender o aludido veículo; 15. O ofendido apenas teve conhecimento da utilização abusiva dos seus elementos identificativos e do seu nome na referida declaração de venda em Julho de 2010 quando veio a saber que o arguido já havia vendido o aludido veiculo a DD; 16. O arguido tomou para si o referido veículo automóvel bem como do preço pelo qual posteriormente o vendeu e que integrou no seu património contra a vontade do ofendido; 17. O arguido agiu da forma descrita sem o consentimento do ofendido, apondo no aludido documento factos juridicamente relevantes que sabia não corresponderem à verdade e usando, posteriormente, o mencionado documento na forma acima descrita, assim obtendo um benefício económico que não lhe era devido, causando ao ofendido o correspondente prejuízo, uma vez que ficou desapossado do veículo e do respectivo valor pecuniário; 18. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

    Do pedido de indemnização civil: 19. Em consequência da actuação do arguido o ofendido viu-se privado da utilização do veículo e durante cerca de 6 meses teve de partilhar com a sua esposa o único veículo de que dispunham; 20. O demandante sofreu incómodos, ansiedade e nervosismo com a situação causada pelo arguido.

    [...]» 5.

    Entretanto, findo o respetivo prazo e verificando-se que não tinha ele efetuado o pagamento a que ficou subordinada a suspensão da execução da pena que lhe havia sido imposta, procedeu-se à audição do ora recorrente, após o que foi proferida a decisão subsequente: «O arguido AA foi condenado pela prática de um crime de falsificação de documento e abuso de confiança, na pena única de dois anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, subordinada à condição de o arguido pagar ao ofendido/demandante civil, no prazo de um ano, o valor de €12.000,00, correspondente a parte do valor do pedido de indemnização civil em que foi condenado [...].

    Veio o Ministério Público promover não seja revogada a suspensão da execução da pena de prisão decretada, devendo, contudo, o condenado ser advertido de que deve cumprir, escrupulosamente, os deveres que lhe foram impostos na sentença e constantes do plano de reinserção social, e ainda, se dilate período da suspensão da pena, com a condição [...] do arguido mostrar aos autos, durante o período da suspensão da pena, comprovativos de pagamento faseado da dívida ao demandante, com cadência trimestral.

    Cumpre apreciar e decidir.

    [...]*Vertendo aos presentes autos, verificamos que o arguido incumpriu os deveres impostos na sentença, designadamente o de pagar ao ofendido/demandante civil, no prazo de um ano, o valor de €12.000,00, correspondente a parte do valor do pedido de indemnização civil em que foi condenado [...].

    Ora, o critério material para decidir sobre a revogação da suspensão é exclusivamente preventivo, isto é, o tribunal deve ponderar se as finalidades preventivas que sustentaram a decisão de suspensão ainda podem ser alcançadas com a manutenção da mesma ou estão, irremediavelmente, prejudicadas em virtude da conduta posterior do condenado.

    Atento à postura adoptada pelo arguido aquando da sua audição, à ausência de notícia da prática de factos similares aos factos que fundamentaram a condenação na prática dos crimes em causa, bem como ao facto de se encontrar insolvente e ter parte do salário penhorado, estando socialmente inserido, afigura-se-nos que não se indicia que as finalidades da suspensão não possam ainda surtir efeito, pelo que entendemos que as razões que estiveram subjacentes à suspensão da execução da pena de prisão ainda podem surtir efeito sobre o condenado.

    Tudo conjugado, no caso dos presentes autos, não vislumbramos motivos que permitam concluir que o juízo de prognose favorável, inicialmente formulado, tenha sido frustrado.

    Ora, no caso concreto, não nos parece que as finalidades que estiveram na base da suspensão da execução da pena nestes autos se encontrem irremediavelmente comprometidas.

    Ora, concluímos que o referido incumprimento da obrigação que sobre si...

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