Acórdão nº 01734/14.8BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 31 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelGUSTAVO LOPES COURINHA
Data da Resolução31 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações B..., S.A.

vem recorrer da decisão proferida pelo Mmo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela intentada contra o indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada do ato de liquidação de taxa municipal de ocupação do espaço publico municipal de Cascais, no valor global de € 10.508,10 euros.

Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 171 a 196 do SITAF; 1ª - Como decorre dos autos, o objeto da presente impugnação judicial está delimitado em torno da apreciação da (i)legalidade dos atos de liquidação de taxas de ocupação do espaço público municipal de Cascais, com as referencias IVP/0128/14 e IVP/0095/14, no montante global de €10.508,10 ( dez mil, quinhentos e oito euros e dez cêntimos), praticados pela Câmara Municipal de Cascais em razão de duas obras de intervenção realizadas na infraestrutura subterrânea de distribuição de energia elétrica instalada na área territorial do referido município.

  1. – Mais concretamente, submeteu-se à apreciação judicial a questão de saber se a RECORRENTE tem direito à isenção de pagamento de taxa de ocupação do espaço público municipal estabelecida no contrato de concessão de distribuição de energia elétrica em baixa tensão celebrado com o RECORRIDO; se (in)existe a necessária correspectividade (sinalagma jurídico) entre os montantes exigido a titulo das referidas taxas de ocupação e um beneficio especifico e individualizável na esfera da RECORRENTE; se os atos de liquidação sob apreciação violam do disposto no artigo 3º, nº4, do Decreto-Lei nº 230/2008, de 27 de novembro; e finalmente, se tais atos são igualmente ilegais por falta de fundamentação.

  2. Chamado a dar resposta às questões que lhe foram colocadas, o Tribunal a quo, circunscrevendo a sua análise i) ao alegado direito à isenção estabelecido no mencionado contrato de concessão de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, ii) à (in)existência de sinalagma jurídico e iii) à (in)existência do vício de forma por falta de fundamentação dos atos de liquidação, julgou a presente ação de impugnação judicial improcedente, tendo, para o efeito, e no que em concreto diz respeito à primeira e segunda questões, invocado jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Sul (mais especificamente os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 7 de outubro de 2008, proferido no processo n.º 01944/07, de 11 de janeiro de 2011, proferido nos processo n.º 03809/10, e de 9 de abril de 2013, proferido no processo n.º 06359/13).

  3. Sucede, porém que, o thema decidendum da presente ação de impugnação deve, em boa verdade, ser reconduzido (rectius, circunscrito) à questão de saber se a liquidação de taxas relativas à ocupação do espaço público municipal com infraestruturas e outros equipamentos afetos às redes de alta e média tensão de distribuição de energia elétrica, consubstancia uma violação ao disposto no artigo 3.°, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro — questão esta, sublinha-se, que, não foi analisada nas decisões judiciais do Tribunal Central Administrativo Sul invocadas pelo Tribunal a quo para fundamentar a Sentença recorrida, nem, por conseguinte, apreciada pelo Tribunal a quo no âmbito do presente processo de impugnação.

  4. Ora, como vem preclaramente estabelecido no artigo 3.°, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro — diploma que revogou o regime jurídico à luz do qual incidiu a análise do Tribunal Central Administrativo Sul nas referidas decisões (e, nessa medida, à luz do qual recaiu a análise efetuada pelo Tribunal a quo) — a «obrigação de pagamento da renda anual pelas concessionárias da atividade de distribuição de energia elétrica em baixa tensão fica sujeita à atribuição efetiva da utilização dos bens do domínio público municipal, nomeadamente do uso do subsolo e das vias públicas para estabelecimento e conservação de redes aéreas e subterrâneas de distribuição de eletricidade em alta, média e baixa tensão afetas ao Sistema Elétrico Nacional (SEN), com total isenção do pagamento de taxas pela utilização desses bens» (os destacados são da RECORRENTE).

  5. Dito de outro modo, o legislador determinou de forma inequívoca, através do transcrito artigo 3.°, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, que a utilização dos bens do domínio público municipal por parte das concessionárias da atividade de energia elétrica em baixa tensão, com infraestruturas e outro equipamento de alta e média tensão (e, obviamente, de baixa tensão), é comutada pela renda paga no âmbito da concessão de distribuição de energia elétrica em baixa tensão, «com [a consequente] total isenção do pagamento de taxas pela utilização desses bens» 7.ª Neste sentido, impondo-se, no artigo 3.°, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, que os municípios sejam financeiramente compensados pela ocupação do seu espaço público com as infraestruturas de distribuição de eletricidade — seja em baixa tensão, seja em alta e média tensão — através da renda que lhes é paga pela concessionária (no caso, a RECORRENTE) ao abrigo da referida concessão, não se pode deixar de concluir que qualquer taxa dirigida a comutar essa mesma ocupação padece do vício de violação de lei.

  6. De resto, contrariamente ao que vem defendido pelo RECORRIDO, este quadro legal é aplicável igualmente às concessões da atividade de distribuição de energia elétrica estabelecidas em data anterior à da entrada em vigor do referido diploma legal, como decorre claro do disposto no artigo 71.º, n.ºs 2 e 3, do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro.

  7. Por último, registe-se que também a alegação de que «o diploma legal supra citado, ao criar uma isenção fiscal, estaria a violar o disposto nas alíneas i) e q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), pelo que padece de inconstitucionalidade orgânica» deve ser rejeitada, pois que o disposto no artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, com o sentido interpretativo acabado de se expor, encontra-se plena e perfeitamente conforme com a Constituição da República Portuguesa.

  8. Em face de todo o exposto, impõe-se, pois, concluir pela ilegalidade dos atos de liquidação da taxa municipal de ocupação sub judice, revogando, em consequência, a Sentença recorrida e declarando a presente ação impugnatória procedente, com a consequente anulação de tais atos.

I.2 – Contra-alegações Não foram produzidas contra-alegações.

I.3 – Parecer do Ministério Público Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer com o seguinte conteúdo: “I. Objecto do recurso.

  1. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo TAF de Sintra que julgou improcedente a ação...

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