Acórdão nº 56/13.6GBCNT.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelHELENA BOLIEIRO
Data da Resolução24 de Maio de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório … Realizada a audiência de julgamento, a 1.ª instância proferiu sentença em que decidiu: - Condenar o arguido AA, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, por um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alíneas a) e e), por referência ao artigo 255.º, alínea a), numa pena de 6 meses de prisão, e por um crime de burla, previsto e punido pelo artigo 218.º, n.º 2, alínea a), todos do Código Penal, numa pena de 2 anos de prisão, sendo a pena única de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

- Condenar a sociedade arguida A..., Unipessoal, Lda., em concurso real, por um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alíneas a) e e), por referência aos artigos 255.º, alínea a), e 11.º , n.º 1, numa pena de 100 dias de multa, e por 1 (um) crime de burla, previsto e punido pelo artigo 218.º, n.º 2, alínea a), e 11.º, n.º 1, todos do Código Penal, numa pena de 240 dias de multa, sendo a pena única de 300 dias de multa à taxa diária de 10,00 €, num total de 3 000,00 €.

Mais julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por Infraestruturas de Portugal, S.A., e condenou solidariamente os arguidos AA e A..., Unipessoal, Lda., a pagar à demandante a quantia de 54 446,48€ (cinquenta e quatro mil quatrocentos e quarenta e seis euros e quarenta e oito cêntimos).

  1. Na sequência do recurso interposto pelos arguidos AA e A..., Unipessoal, Lda.

    , esta Relação proferiu acórdão em que declarou nula a sentença por falta de fundamentação e omissão de pronúncia e determinou a sua substituição por outra que suprisse a decretada nulidade.

    Os autos baixaram à 1.ª instância para que o tribunal a quo procedesse ao suprimento das nulidades, o qual proferiu nova sentença em que decidiu nos mesmos termos da primeira sentença … 3.

    Inconformados com a decisão, dela recorreram os arguidos AA e A..., Unipessoal, Lda.

    , os quais finalizaram a respectiva motivação com as seguintes conclusões … … 3- Tal discordância materializa-se nas penas aplicadas propriamente ditas, em decorrência da factualidade indevidamente dada como provada por insuficiência da prova produzida, não tendo sido observado o princípio in dubio pro reo, corolário do princípio da presunção de inocência, estatuído no art.32.º, n.º 2 da CRP e que determina que a dúvida a que se chega seja valorada em benefício dos arguidos, o que, no caso em apreço, conduziria, também, a uma decisão de absolvição.

    4- Sendo nosso entendimento que a douta sentença padece de vários vícios, nomeadamente no que concerne à existência de erro notório na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação, de acordo com o estipulado no artigo 410.º, n.º 2 do CPP, devendo, em consequência, a mesma ser declarada nula.

    5-Devendo ainda dizer-se que o tribunal a quo não supriu, na totalidade, as nulidades da 1.ª sentença proferida, nomeadamente a nulidade da sentença por falta de fundamentação e omissão de pronúncia quanto às questões indicadas no douto aresto do Tribunal da Relação de Coimbra e do art. 374.º, n.º 2 do CPP.

    6- O douto tribunal a quo para fundamentar a sua decisão e fazer prova da factualidade dada como provada limitou-se a descrever o que foi dito por cada uma das testemunhas, reproduzindo o que já tinha dito na 1.ª sentença, não enumerando, conforme decorre da lei, cada um dos factos dados como provados, tendo sido os recorrentes obrigados a “atribuir-lhe” uma numeração por parágrafo, para melhor identificação dos mesmos pelo Venerando Tribunal ad quem.

    … 20- Padecendo a decisão recorrida de erro notório na apreciação da prova, bem como de contradição insanável na sua fundamentação, ao considerar como verdadeiro um facto que, na própria fundamentação, refere o seu oposto, não tendo a testemunha conhecimento do local nem teve acesso ao material, o que configura a nulidade da sentença nos termos do disposto no art. 379.º, n.º 1, al. a), com referência ao art. 374.º, n.º 2, ambos do CPP.

    … 36- Ora, no caso dos autos, o Tribunal da Relação de Coimbra considerou a 1.ª sentença nula por falta de fundamentação e omissão de pronúncia, o que continua a verificar-se em alguns dos seus segmentos, não obstante as alterações introduzidas pelo tribunal recorrido no que à fundamentação da decisão diz respeito, a sentença ora recorrida continua ferida de nulidade, de acordo com o estipulado no artigo 379.º, n.º 1, alíneas a) e c) do CPP, porquanto, a fundamentação das decisões é essencial para permitir o exercício esclarecido do direito ao recurso e garantir a transparência e reflexão decisórias.

    … 38- Por outro lado, o Tribunal a quo tomou ainda em consideração, para formar a sua convicção, documentos que não foram examinados e produzidos em sede de audiência de julgamento, designadamente as Guias de transporte de fls.36 a 40 e o contrato de fls.311 a 320, em claro prejuízo da contraditoriedade imposta pelo art.327.º, n.º 2 do CPP que dispõe que os meios de prova apresentados no decurso da audiência, mesmo que tenham sido oficiosamente produzidos pelo tribunal, são submetidos ao princípio do contraditório, acolhido na segunda parte do nº 5 do art.32.º da CRP, estando, pois, a douta sentença recorrida em clara violação do preceituado nos arts.355.º, n.º 1 e 327.º, n.º 2, ambos do CPP e arts.18.º, n.º 1 e 32.º, n.º 5, ambos da CRP.

    39- Neste conspecto, a douta sentença padece de inconstitucionalidade por violação do disposto nos artigos 18.º, n.º 1 e 32.º, n.º 5 da CRP e, por tal motivo, Vossas Excelências retirarão as devidas consequências.

    40- Relativamente aos factos não provados, com todo o respeito que é devido, o Tribunal a quo continuou a ignorar toda a prova (produzida e não produzida) ao longo das várias sessões de julgamento, ao arrepio do preceituado no art. 355.º do CPP e que o mesmo devia observar, não tendo sido cumprido o determinado no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido nos presentes autos.

    … 43- Havendo contradição insanável entre os factos provados no parágrafo 11 e o parágrafo 13 dos factos não provados no que respeita ao aluguer de uma carrinha, de um camião grua e de uma máquina retroescavadora.

    44- Bem como, há contradição insanável entre o facto provado no parágrafo 42 dos factos provados, “considerando que todas as despesas inerentes ao corte e desmantelamento dos carris apreendidos foram suportadas pela sociedade arguida” e o parágrafo 26 dos factos não provados: “Até porque foi investido dinheiro da sociedade “A...” para a realização desta obra – desmantelamento de linha férrea” 45- Havendo ainda contradição insanável entre os parágrafos 42 e 43 dos factos provados e os parágrafos 29 em parte, 32 em parte e 43 dos factos não provados … 46- Bem como, há contradição insanável entre o facto provado vertido no parágrafo 42 da sentença recorrida e o facto não provado vertido no parágrafo 36 dos factos não provados … 47- Havendo ainda contradição insanável entre os parágrafos 38, 39, 40 e 41 dos factos provados e o parágrafo 30 dos factos não provados … 48- E, bem assim, há contradição insanável entre os parágrafos 11, 12, 13 e 14 dos factos provados … … 51- Em boa verdade, toda a prova produzida em julgamento e toda a prova documental junta aos autos (toda, conjugada entre si) impunha, necessariamente que esses factos fossem dados como não provados, tendo existido aqui, por parte do Tribunal a quo, erro de julgamento consagrado no art. 412.º, n.º 3 do CPP.

    … 120- Concatenando tudo o que se vem de expor, dúvidas não restam da violação manifesta do Princípio In Dubio pro Reo, na apreciação feita pelo Tribunal a quo da prova produzida em sede de audiência de julgamento, nomeadamente quanto à prova documental e testemunhal, o que conduziria necessariamente a decisão diversa da proferida nos presentes autos, entendendo os recorrentes que foram violadas proferida nos presentes autos pelo Tribunal a quo várias normas, mormente o art.127.º do CPP e ainda os arts. 32 .º, n.º 2 e 205.º n.º1 da CRP, fazendo-se, deste modo, uma interpretação inconstitucional do principio da livre apreciação da prova.

    … 136- … para a determinação da pena aplicada ao arguido AA, bem como a medida da mesma, o Tribunal a quo teve em consideração o relatório emitido pela DGRSP, bem como os CRC´s de fls. 484-486 (conforme consta da fundamentação da sentença), bem como quanto aos antecedentes criminais foi tida em conta a certidão relativa ao processo no âmbito do qual foi condenado, dado que no último CRC junto não consta já o averbamento de tal condenação.

    137- Ora, tal averbamento não consta do CRC do arguido AA junto aos autos em 2/07/2021, como já não constava aquando da prolação da 1.ª sentença pelo tribunal a quo, como foi decidido pela Relação no ponto 3.2 do douto Acórdão.

    138- Porém, estando o registo criminal do arguido “limpo”, o tribunal a quo entendeu solicitar uma certidão do processo que constava no CRC anterior, no qual consta que o arguido AA foi condenado em 04/09/2012 por um crime de Abuso de Confiança contra a Segurança Social, p. e p. pelos artigos 105.º, n.º 1 e 107.º, n.º 1 do Regime Geral de Infrações Tributárias, transitado em julgado a 04/10/2012 e com data de emissão do boletim a 30/10/2012, continuando a ser referido pelo Tribunal a quo para fundamentar a aplicação da pena de prisão ao arguido AA, ao invés da pena de multa (art.70.º do CP) que, “Atendendo ao antecedente criminal do arguido não se pode optar pela pena de multa por esta não satisfazer de modo adequado e suficiente as finalidades da punição, já quanto á sociedade arguida aplica-se pena de multa.

    (…) No que respeita à prevenção especial, que se prendem com a necessidade de conformação do arguido com os valores jurídico penais protegidos pelo tipo legal, as mesmas são medianas, pois o arguido tem um antecedente, não tendo a sociedade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT