Acórdão nº 194/21.1PABCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelPAULO CUNHA
Data da Resolução15 de Maio de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO 1.

Decisão recorrida No âmbito do processo n.º 194/21...., que corre os seus termos no Juízo Local Criminal ..., foi proferida sentença, datada de 14.12.2022, que, além do mais, condenou o arguido AA, nos seguintes termos (transcrição): “(…) decide-se: 1. Condenar o arguido AA, pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Cód. Penal, na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão.

  1. Condenar o arguido BB, pela prática, em co- autoria material, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Cód. Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão.

  2. Suspender as penas de prisão ora aplicadas pelo período de um ano e seis meses, sujeitando tal suspensão a um regime de prova, assente em plano de reinserção social a elaborar pela DGRSP.

    (…) 5. Condenar solidariamente os arguidos AA e BB no pagamento ao ofendido CC da quantia de € 495,00, a título de compensação pelos danos patrimoniais ao mesmo ocasionados, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal, actualmente de 4%, desde a data da prolação da presente sentença até efectivo e integral pagamento.

    (…)”.

  3. Recurso Inconformado com esta decisão, o referido arguido recorreu da mesma, tendo concluído a respectiva motivação nos seguintes termos (transcrição): “(…) IV. No que à matéria de facto importa, cumpre salientar a contradição latente entre o facto provado elencado na alínea n) e as declarações prestadas pela testemunha DD que confirmou que o telemóvel que, entretanto, lhe foi apreendido lhe foi emprestado pelo arguido BB, no Verão de 2021, o qual aliás lhe havia confessado ter sido o mesmo proveniente de um roubo por si realizado.

    V.

    Pelo que é manifesta e latente a contradição, impugnando-se, ao abrigo do disposto no art.º 410.º n.º 2 alínea b) do CPP, a referida matéria dada como provada na alínea n).

    VI. No que concerne à matéria de direito, considerou o Tribunal recorrido que o Arguido cometeu, como co-autor, um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210.º, n.º 1, do Cód. Penal, e decidiu condenar o arguido na pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão, e, em conformidade com o disposto no n.º 1 do art.º 50º do Código Penal, suspender a execução da pena de prisão aplicada, pelo período de um ano e seis meses, subordinando-se tal suspensão a um regime de prova, assente em plano de reinserção social a elaborar pela DGRSP e ainda e solidariamente no pagamento ao ofendido da quantia de € 495,00, a título de compensação pelos danos patrimoniais ao mesmo ocasionados, acrescida de juros moratórios computados à taxa legal, actualmente de 4%, desde a data da prolação da presente sentença até efectivo e integral pagamento.

    VII. Na fixação da medida da pena é necessário, ordenar, relacionando-as, a culpa, a prevenção geral e a prevenção especial, tendo-se, para isso, em conta os quadros agravativos e atenuativos, sob pena de se frustrarem as finalidades da sanção, ou seja, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do Arguido na sociedade.

    VIII. Atentos os factos provados, e a esses teremos que nos reportar, há que valorar, para aferir e determinar a medida da pena, o grau de culpa do Arguido e, por outro lado, atender às necessidades de prevenção (artigo 71º. do CP) tecendo-se, por fim, os considerandos que fundamentam a pena concreta aplicável.

    IX. O art.º 27.º do Código Penal dispõe que “é punido como cúmplice quem, dolosamente, e por qualquer forma, prestar auxílio material ou moral à prática por outrem de um facto doloso”, X. A cumplicidade pressupõe um apoio doloso a outra pessoa no facto antijurídico doloso cometido por esta, não havendo na cumplicidade domínio material do facto, pois o cúmplice limita-se a favorecer a prática do facto.

    XI. Diferencia-se da co-autoria pela ausência do domínio do facto. O cúmplice limita-se a facilitar o facto principal, através do auxílio físico (material) ou psíquico (moral), situando-se esta prestação de auxílio em toda a contribuição que tenha possibilitado o facto principal ou fortalecido a lesão do bem jurídico cometida pelo autor.

    XII. Daqui resulta que a cumplicidade se traduz num mero auxílio, não sendo determinante da vontade dos autores nem participa na execução do crime, mas é sempre auxílio à prática do crime e nessa medida contribui para a prática do crime, é uma concausa da prática do crime.

    XIII. Assim, enquanto o co-autor tem um papel de primeiro plano, dominando a acção, já que esta é concebida e executada, com o seu acordo, inicial subsequente, expresso ou tácito, o cúmplice é um interveniente secundário ou acidental, isto é, só intervém se o crime for executado ou tiver início de execução e, além disso, mesmo que não interviesse, aquele sempre teria lugar, porventura em circunstâncias algo distintas. A sua intervenção embora seja concausa do crime praticado não é causal da existência da acção.

    XIV. Todos os factos dados como provados foram-no, exclusivamente, com base nas declarações do ofendido, pois, as restantes testemunhas, não viram ou presenciaram qualquer dos factos supra descritos.

    XV. A intervenção do aqui arguido, cingiu-se, segundo o ofendido, á acção de “tirar o casaco e o colete”.

    XVI. Não se sabe de que forma e em que circunstâncias, XVII. Não se sabe se aproveitou tal vantagem dos factos praticados pelo arguido BB ou não.

    XVIII. Questiona-se, então, se as circunstâncias em que actuaram os arguidos indiciam, sem qualquer margem para dúvidas, e ainda face às regras da lógica e da experiência comum, se existiu um acordo entre os arguidos no sentido de se apropriarem dos bens pertencentes ao ofendido? XIX. Porque não interveio o terceiro arguido? Porque não se locupletou com nenhum dos bens? Porque fugiram os três no final se só dois deles tinham tido intervenção? XX. A desproporção entre a actuação do arguido recorrente e o arguido BB é latente e manifesta.

    XXI. O arguido BB, abordou o CC, exigiu-lhe a entrega do seu telemóvel, desferiu-lhe uma bofetada na face, arrancou-lhe o telemóvel das mãos, exigiu que lhe entregasse as sapatilhas, exigiu que lhe desse o código de acesso, desferiu-lhe outra bofetada na face, o que levou a que o CC lhe revelar o código.

    XXII. O arguido AA apenas tirou o casaco e o colete que o CC trazia vestido, despindo-o e ficando-lhe com as ditas peças de roupa.

    XXIII. Atentos os factos dados como provados, pugnamos pelo que nos parece óbvio, isto é, de que a participação do aqui arguido se integra apenas na figura da cumplicidade, uma vez que a sua actuação foi diminuta, não tendo intervindo em qualquer dos outros factos ou acções anteriores ou posteriores, não tendo uma participação idêntica à do outro arguido, não foi de relevância para a consumação do crime como a do outro arguido, não tinha o domínio do facto.

    XXIV. Os factos provados relativamente ao arguido recorrente são somente suficientes para integrar o conceito de cumplicidade, já que revelam, de modo bastante, tão-só uma solidarização activa e ainda o influxo psíquico relativamente à prática do crime pelo co-arguido.

    XXV. Incorre, assim, a douta sentença, em erro na aplicação de direito, violando, mormente, o art.º 27.º, 203º nº 1 e 210.º, n.º 1, todos do Código Penal.

    XXVI. Caso a posição assumida pelo recorrente não for acolhida, o que não se concede, sempre se dirá que a condenação sofrida pelo arguido é excessiva e desproporcional, atento o disposto nos art.ºs. 40.º e 70.º, 71.º, 72.º e 73.º do Código Penal e art.º 4.° do Decreto Lei n.º 401/82 , de 23/9.

    XXVII. O arguido é pessoa jovem, contava à data dos factos, 18 anos de idade, vivendo uma “vulnerabilidade psíquica que à adolescência, em regra, corresponde, caracterizada, justamente, pela procura de uma nova identidade pessoal e social, normalmente alcançada através da experimentação, mais ou menos destemida, de um certo tipo de comportamentos (vide sentença)” XXVIII. Não tem antecedentes criminais, XXIX. Os crimes que lhe foram imputados foram episódios únicos na sua vida, XXX. Está inserido profissional e socialmente, XXXI. Apesar do histórico familiar nada favorável (AA é o único filho de um casal, tendo crescido aos cuidados da avó materna, após a intervenção da CPCJ (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens) de ..., quando o arguido contava 5 anos de idade, decorrente de um contexto familiar de violência doméstica vivenciado entre os pais. O arguido manteve contacto com os pais, aos fins-de-semana, até o casal se separar, há cerca de cinco anos, passando então a mãe a integrar o agregado da avó materna do arguido. Vide relatório Social) concluiu o 12.º ano de escolaridade, XXXII. Trabalha e aufere vencimento que lhe permite fazer face às despesas do seu quotidiano, da sua vida social e afectiva e ainda comparticipar para as despesas do agregado familiar, XXXIII. Interiorizou a sua postura e a sua conduta (o arguido reconhece a ilicitude da problemática criminal em causa e a existência de potenciais vítimas e/ou danos para terceiros. O arguido evidenciou sentimentos de vergonha face ao estatuto de arguido, partilhando o assunto, apenas com a namorada e o primo, com quem habitualmente convive. Vide relatório social), XXXIV. Face á matéria dada como provada a pena de 1 ano e três meses de prisão, suspensa na sua aplicação pelo período de 1 ano e seis meses é manifestamente excessiva.

    XXXV. Salvo o devido respeito por posição divergente, não teve o Tribunal a quo, verdadeiramente em conta e em consideração, na determinação da medida da pena, as circunstâncias do caso concreto, a culpa do agente e as exigências de prevenção, XXXVI. Nem a ausência de antecedentes criminais, o percurso de vida, social e escolar, a idade, e as circunstâncias actuais de vida do aqui Arguido e a sua posição perante a sua actuação e conduta, XXXVII. É de notar que a pena aplicada ao arguido AA pouco difere no prazo da pena aplicada ao também arguido BB, XXXVIII. Não se podendo comparar, mas...

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