Acórdão nº 18987/21.8T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelDOMINGOS JOSÉ DE MORAIS
Data da Resolução24 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.o 18987/21.8T8LSB.L1.S1 Recurso de revista Relator: Conselheiro Domingos Morais Adjuntos: Conselheiro Mário Belo Morgado Conselheiro Júlio Gomes Acordam os Juízes na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I.

– Relatório AA intentou ação emergente de contrato individual de trabalho com processo declarativo comum, contra Carris – Companhia Carris de Ferro Lisboa, Lda., pedindo: a) ser a R. condenada a corrigir a fórmula de cálculo da retribuição/hora do A., contemplando na remuneração mensal (RM) todas as quantias auferidas por este, com carácter de regularidade; b) ser a R. condenada a pagar ao A. a diferença entre o que auferiu a título de rendimento mensal, entre a data da sua admissão e dezembro de 2020, que se cifra em € 27.720,90 (vinte e sete mil setecentos e vinte euros e noventa cêntimos), bem como as diferenças a apurar relativamente às retribuições auferidas a partir de 01/01/2021 e até integral pagamento; c) ser a R. condenada a contemplar no pagamento da retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal os valores correspondentes a média das prestações variáveis auferidas durante o ano civil; e, consequentemente; d) ser a R. condenada a pagar ao autor as diferenças correspondentes aos montantes auferidos a título de remuneração de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, e aqueles que o autor deveria ter auferido, que se cifram entre a data da admissão do autor e 31/12/2020 no montante de € 14.406,36 (Catorze Mil Quatrocentos e Seis Euros e Trinta e Seis Cêntimos), bem como as diferenças a apurar relativamente às retribuições auferidas a partir de 1/01/2021 e até integral pagamento; e) ser a R. condenada no pagamento dos descansos compensatórios, vencidos e não gozados, entre a data de admissão do A. e dezembro de 2011, no montante global de € 2.793,22 (Dois Mil Setecentos e Noventa e Três Euros e Vinte e Dois Cêntimos).

Mais deve a R. ser condenada ao pagamento de juros de mora à taxa legal em vigor, vencidos desde a data em que cada retribuição devia ter tido lugar e até integral pagamento.

  1. - A Ré contestou, pedindo a absolvição do pedido formulado pelo Autor.

  2. - Na 1.a instância foi julgada a ação parcialmente procedente e condenada a Ré a: a) Retificar o cálculo do valor hora do A., nos anos de 2006 a 2019, fazendo incluir nesse cálculo da retribuição mensal o subsídio de atividades complementares, com exceção do ano de 2007, além dos demais subsídios que já incluía; b) Pagar as diferenças retributivas que se venham a apurar serem devidas desse errado cálculo do valor hora de 2006 a 2019; c) Pagar as diferenças salariais na retribuição de férias e no subsídio de férias resultantes da inclusão na mesma dos valores médios recebidos pelo A. nos anos de 2006, 2008, 2009, 2010, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019 a título de trabalho suplementar e de suísidio de atividades complementares de 2006 a 2019 com exceção do ano de 2007.

  3. – A Ré apelou e o Tribunal da Relação decidiu: Em face do exposto, decide-se conceder provimento ao recurso e revogar a sentença no que concerne à condenação constante das alíneas a) e b) do dispositivo, absolvendo a recorrente do inerente pedido.

    No mais, mantém-se a decisão da 1.a instância.

  4. – O Autor interpôs recurso de revista, concluindo: 1. Vem o Recorrente interpor recurso da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por entender que a mesma é violadora das disposições constantes do Código do Trabalho, referentes à retribuição, nomeadamente quanto à fórmula de cálculo do valor hora da retribuição, quer quanto às atividades complementares à condução, quer quanto ao trabalho prestado em regime noturno e trabalho suplementar, estando em causa uma errada interpretação do disposto nos artigos 262.o, 264.o, 266.o e 271.o, todos do Código do Trabalho.

  5. Isto porque o Tribunal a quo entendeu, e bem, que o subsídio de atividades complementares deveria integrar a fórmula de cálculo do valor hora. Na verdade, e ao invés do que a Ré alega, este subsídio não é variável, mas antes constante, vencendo-se mensalmente, e mantendo o seu valor, que só é alterado em sede de negociação coletiva de trabalho.

  6. Mas o Tribunal da Relação de Lisboa veio considerar que o Subsídio de Tarefas Complementares da Condução não merece ser aí contemplado, revogando essa decisão.

  7. No entanto, andou mal o Tribunal da Relação de Lisboa, pois que ignorou a génese da criação deste subsídio e qualificou-o erradamente! Vejamos, 5. Este subsídio foi criado em 1997, e a sua criação teve como objetivo a descaraterização de trabalho suplementar a prestar pelos trabalhadores, pois que inicialmente os trabalhadores executavam essas tarefas dentro do seu horário de trabalho.

  8. A empresa, para efeitos de otimização dos recursos, negociou com os Sindicatos que essas tarefas passassem a ser feitas fora do horário de trabalho do trabalhador, para que as 8 (oito) horas de trabalho fossem em efetiva tarefa de condução.

  9. Assim, os trabalhadores tinham de executar estas tarefas ANTES do seu horário de trabalho, e DEPOIS do seu horário de saída, o que, normalmente daria lugar ao pagamento de trabalho suplementar. Ora, para evitar pagar trabalho suplementar, e porque o trabalho suplementar tem limites anuais que não podem ser ultrapassados (e que assim o seriam necessariamente) e para a empresa não ter de efetuar mais contratações, criou este subsídio, que na prática compensa o trabalhador desse tempo a mais que executa, diariamente, antes e depois do seu período normal de atividade de condução.

  10. Portanto, antes da criação deste subsídio, os Motoristas de Serviço Público e Guarda-freios desempenhavam estas mesmas funções (de cariz obrigatório) durante o seu horário normal de trabalho e eram devidamente remunerados com o seu vencimento normal.

  11. Mas o subsídio de tarefas complementares não é só devido pela execução das tarefas em si, mas também pelo tempo “extra” que os trabalhadores despendem a executá-las e que, de outra forma, ou não lhes seria pago, ou seria como trabalho suplementar, o que não era do interesse da empresa.

    Ou seja, 10. Todas as tarefas hoje denominadas como complementares, são “tarefas” que compõem e sempre compuseram as funções normais de qualquer Motoristas. A diferença quanto às restantes empresas é que os Sindicatos nunca conseguiram criar um subsídio com características idênticas; As referidas tarefas são prestação efetiva de trabalho e devem ser consideradas para todos os efeitos legais como tempo de trabalho; À semelhança do que acontece com o Subsídio de Agente Único: Este foi criado para fazer face a um acréscimo de funções, em virtude do desaparecimento de uma categoria profissional, que era o cobrador; Enquanto o Subsídio de Tarefas Complementares da Condução foi criado para potenciar um maior número de horas para que os trabalhadores possam desempenhar trabalho suplementar, sem que estas horas possam contar para esse cômputo; O pagamento do Subsídio de Tarefas Complementares da Condução é pago mensalmente, sendo o seu valor fixo; O AE não prevê nem nunca previu esse pagamento por cada dia trabalhado, sempre previu (desde a sua criação) o pagamento mensal à semelhança do que é pago (por exemplo) a retribuição-base: “Os trabalhadores no exercício efectivo da função de condução têm direito ao pagamento de um subsídio mensal de 4000$ pela prestação de tarefas complementares da condução.” (no 18 da cláusula 26a do AE/CARRIS/SITRA/1997) A forma do pagamento deste Subsídio é exatamente igual, apenas utiliza o sinonimo “Abono” em vez de “Subsídio”: ➢ à do pagamento do Subsídio de Agente Único antes da sua integração na tabela salarial (Abono mensal); ➢ à do pagamento do Subsídio de Ajuramentação antes da sua integração na tabela salarial (Abono mensal); ➢ à do pagamento do subsídio de horários irregulares (Abono mensal); ➢ à do pagamento do Subsídio de Instrução (Abono mensal).

  12. Caso fosse intenção negocial das partes que o pagamento do Subsídio de Tarefas Complementares da Condução seria apenas devido por cada dia de trabalho e não por cada mês, tê-lo-iam dito de forma clara e inequívoca, tal como o disseram quanto à forma do pagamento do Subsídio de pronto-socorro, pois este subsídio apenas é devido por cada dia em que o trabalhador seja escalado no serviço de pronto-socorro, e só se este vier a efetivar o serviço de pronto-socorro. (Conforme o disposto no no 2 da...

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